Fiat Ignis escrita por SophieRyder


Capítulo 15
Capítulo 14 ou “Esta digressão não é inútil”


Notas iniciais do capítulo

Um capítulo mais calmo dessa vez. Por favor tenham paciência com a escritora.



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Era uma manhã ensolarada nas terras de Artois, mas a sala no interior do castelo estava isolada de quaisquer luzes que não as das chamas das tochas ameaçadoramente enfileiradas nas paredes. O marquês era um homem destituído de ostentações, mas aquela sala abafada no subterrâneo do castelo, imponente com seu trono e o estandarte vermelho enorme bordado com o brasão da casa Artois, era seu verdadeiro centro de poder – de onde ele impunha respeito e medo aos seus vassalos. Disso Frederick entendia muito bem, desde que pusera os pés pela primeira vez naquele lugar aos 11 anos, depois de muito insistir que tinha algo para contribuir nas reuniões que ali ocorriam.

Ao contrário dos bons hábitos da nobreza que valorizavam salões suntuosos e bem iluminados, o marquês gostava de realizar suas reuniões no subterrâneo, com um descomunal controle dos membros participantes, não permitindo que ninguém além deles sequer se aproximassem do local. A sala onde tais atividades eram realizadas era ampla, com paredes de pedra escura, cercada em vários pontos por estantes abarrotadas de pergaminhos, e tinha um acentuado odor de mofo. Em seus fundos, em frente ao trono, havia uma mesa larga cercada por algumas cadeiras, com um mapa aberto sobre ela. Ali estavam debruçados, em frente ao mapa, o jovem Frederick, Aldric, também conhecido como Barão de Dampierre, seu filho Vincent, e o próprio marquês, enquanto o Visconde de Toulosse, de pé diante da mesa, lia em um longo pergaminho as expectativas de colheita de cada um dos feudos dos vassalos do marquês. A cada informação mencionada, Fred tão logo tomava nota colocando marcas no mapa, e Aldric anotava algo em um pergaminho.

 

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Bernard interrompeu a narrativa, incomodado.

— Espere, mestre Charles. Você quer que eu acredite que essa sala imensa e toda essa preparação era apenas para os cinco nobres que já conhecemos? Se o marquês era tão poderoso e influente, o alcance de seus domínios não deveria ser muito mais amplo?

— Naturalmente, havia dezenas de barões e viscondes de menor importância. Mas você sabe que eu procuro me ater apenas aos detalhes relevantes. Por que você acha que nunca falamos do treinamento daquela coruja inútil? - Charles apontou com uma de suas orelhas para Noctowl, que dormia com pequenos roncos no topo da estante de livros atrás de Bernard.

— Eu diria que às vezes acho que nos desviamos para você rir às custas dos desleixos das figuras de seu passado. Me pergunto se tudo isso ocorreu de verdade mesmo.

— Quando seus leitores reclamarem de verossimilhança, por favor relate-os que a sua fonte foi um gato de cento e doze anos. Aham!

 

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 - Atualizações. - A voz do marquês era firme enquanto pequenos nobres se apressavam para por pequenas peças sobre o mapa.

— Nossos patrulheiros aéreos identificaram que o Conde de Arles tem movimentado suas tropas ao leste. Acreditamos que ele está interessado em se aproveitar das confusões que têm aflorado nas terras germânicas.

Frederick, que desde o início estava inteiramente concentrado no mapa, levantou os olhos com uma expressão desconfiada.

Dois vassalos, até então quietos, trocaram risos.

— Germânicos sendo germânicos, não é mesmo? Hahahaha.

— Minha mãe é germânica. - Os olhos frios do marquês cortaram as risadas dentro das próprias gargantas dos vassalos, deixando apenas um misto de vergonha e, principalmente, medo.

A porta do salão se abriu fazendo eco, e um homem de grande estatura entrou com uma postura altiva. Todos que estavam presentes na sala tinham algum título de nobreza, mas decerto aquela figura se destacava em termos de aparência de grandeza. Seu rosto de meia idade era coberto por rugas evidentes, e seu queixo angular escondia-se por baixo de uma barba curta e bem aparada. O manto que caia sobre suas costas estava um pouco sujo, provavelmente porque ele havia chegado direto da estrada para a reunião, mas ainda assim era possível ver em suas costas um bordado refinado, ainda que sóbrio, de um Onix. Acompanhando-o, entrou um Excadrill.

Animais de guerra, exceto os do próprio marquês, não eram permitidos dentro do salão, de modo que os nobres da sala começaram imediatamente um burburinho ao verem a figura que caminhava sem hesitação em direção aos fundos.

A Pyroar fêmea do marquês levantou-se de onde estava deitada obedientemente, e espreitou o homem com o olhar de uma caçadora, colocando-se no espaço entre ele e a mesa de madeira onde estava seu mestre e soltando um rosnado baixo. O homem parou, encarou-a por alguns instantes avaliando a situação, e então abriu um largo sorriso.

A leoa pulou nos ombros dele, desequilibrando-o para trás, e começou a esfregar sua cabeça em seu peito, com um audível som de ronronado.

— Você está três dias atrasado. – Disse o marquês, encarando-o com frieza.

— Desculpe, eu tive problemas na estrada, e acabei enviando meu filho na frente por conta disso. – O homem acariciava a Pyroar, tentando tirá-la de cima dele. Ela parecia satisfeita.

A desculpa não pareceu afetar o péssimo humor do marquês, que ainda o encarava com intensidade.

— Até onde eu sei, seu filho não é o Conde de Martel.

O jovem, filho do Conde, que há pouco havia feito vinte seis anos, se moveu desconfortavelmente em um canto da sala. Os outros nobres prenderam a respiração, receosos com a tensão que o marquês produzia no ambiente.

— Certamente eu encontrarei um jeito de compensá-lo depois. Além disso, não vejo o Visconde de Dreux por aqui ainda.

— Ele foi o primeiro a chegar. – Respondeu o marquês, se voltando novamente para o mapa diante de si.

Seu Arcanine, que desde o início estava sentado encarando um ponto fixo na parece, soltou um leve rosnado em tom de ameaça.

Alguns nobres deixaram escapar sons sufocados de desconforto quando um pequeno ponto escuro apareceu no local que o Arcanine estava observando. O ponto se ampliou e se retorceu, se expandindo em uma linha vertical, que então se deformou e abriu de cima abaixo como um zíper, expondo uma fenda escura. Dali, saiu primeiro um homem vestido de preto, e depois, um Banette. Assim que os dois estavam completamente fora do portal, ele se fechou.

— Eu jamais consigo escapar do Odor Sleuth de seu Arcanine, monsieur.

— E eu já o avisei para não usar Phantom Force no meu castelo. Vocês dois abusam de seus privilégios. Tirem esses bichos daqui.

— Minhas sinceras desculpas. – Disse o homem de aparência sinistra, fazendo uma leve reverência.

— Onde vocês estavam antes de eu chegar? – Perguntou o Conde de Martel descontraidamente, ignorando a tensão que havia preenchido o salão.

— Movimentos de tropas ao leste. – Respondeu Frederick prontamente.

— Os negócios do Conde de Arles não me dizem respeito, já que ele não pertence aos meus domínios. – Disse o marquês. - Entretanto, se ele se movimentar em direção à nossas terras, eu quero ser avisado o mais cedo possível. Continuem observando-o.

— Meu pai, se me permite, eu tenho minhas dúvidas se ele realmente planejaria um ataque contra alguma das nossas terras. – Disse Frederick, seu raciocínio finalmente desenrolando-se em palavras.

— Prossiga. – Assentiu o pai.

— Em situações normais, a primavera seria propícia para iniciar uma campanha oportunista ao leste, e nesse processo de expansão nossas terras no oriente poderiam ser saqueadas para garantir algum cerco ou alimentar as tropas de vanguarda. O Conde de Arles sempre age com oportunismo quando ele detecta uma fraqueza nos seus vizinhos, mas as duras derrotas que ele sofreu ao conter uma rebelião em suas terras nos últimos meses devem fazer com que ele perca essa chance. Certamente a rebelião atrasou as suas colheitas e afetou o quanto ele irá produzir esse ano. Ele deve estar movendo suas tropas para garantir que a colheita deficiente dele não seja mais prejudicada do que já foi.

 Confiante diante das reações impressionadas dos outros nobres, mas especialmente os olhos atentivos do marquês, Frederick deu continuidade.

— Tendo isso em mente, seus movimentos representariam pouca preocupação para nós, a não ser pelo fato que, em resposta a isso, nós estamos desviando as rotas de suprimento do castelo muito ao oeste, ao passo que também estamos movimentando nossas aves de escolta ao leste para observá-lo, criando um ponto cego dentro de nosso próprio território. É uma brecha muito perigosa.

— Hahahahahaha. Mas à oeste está o mais forte bastião desse marcado, território que está sob os cuidados meus e do Visconde de Dreux. Não precisa de modo algum se preocupar. – Bradou com gosto o Conde de Martel, batendo em seu próprio peito, enquanto se aproximava da mesa. – Ainda assim, de todas as joias que já escavei, nenhuma brilha mais que a mente do nosso jovem futuro marquês. – Ele bagunçou o cabelo do rapaz do mesmo jeito e com a mesma gargalhada com que sempre fizera. Frederick lançou a ele um olhar aborrecido.

— Mesmo assim, vou pedir aos meus mensageiros para que algumas das aves retornem para o oeste. – Completou o Visconde de Dreux, o chefe da inteligência do marquês.

— Falemos das coisas importantes então. – Disse o Conde. - E quanto aos preparativos para o festival?

O marquês assentiu, dando permissão para Frederick prosseguir com o novo assunto. O jovem se prontificou para responder, abrindo um dos pergaminhos que estava a seu lado.

— Está tudo encaminhado. Eu e Vincent estamos cuidando dos preparativos para receber os convidados e suas famílias, assim como da segurança do castelo. As atividades já foram decididas e as provisões necessárias encomendadas, mais guardas foram contratados para o evento e estão em treinamento, e Charlotte está cuidando da organização do torneio. Talvez precisemos, porém, de uma soma um pouco maior do que o previsto para cobrir as despesas.

— Muito bem. – Disse o marquês. - Depois me mostre seus cálculos.

— Sim senhor.

 

—--

— Mestre Charles, eu achava que esta história era sobre minha professora. Por que estamos falando sobre reuniões da nobreza?

— Tudo que eu te digo tem um bom motivo para estar na história.

— Entretanto, isso não me parece verdadeiro. Não tenho interesse em problemas políticos. De fato, é aconselhável ao trabalho de pesquisador que se afaste de tais questões contingentes e dispersivas.

— Abigail concordaria com você em teoria, mas a experiência dela mostrou que nem sempre é possível ignorar certos acontecimentos de matéria “inferior”. Além disso, a própria universidade só existe e se sustenta porque ocupa e defende uma posição política dentro desta cidade. Ou você acha que é possível manter uma estrutura deste tamanho sem se envolver com certos jogos de poder?

Bernard resmungou, aborrecido com o sermão. É claro que ele sabia que política era um requisito para a própria existência da universidade, mas não era isso que o estava incomodando. Charles, obviamente, captou o desconforto do aprendiz.

— E de qualquer modo, em algum momento você irá entender por que os negócios da família Artois são parte indissociável da vida de sua mestra. Agora, pare de interromper minha narrativa.

Charles tentou retomar o que estava dizendo, mas parou de novo quase que  imediatamente, ao perceber que Bernard segurava a pena distraidamente, com o olhar perdido em algum canto da sala, distante da conversa.

— Você parece inquieto hoje, Bernard. O que se passa?

— Nada demais, mestre Charles. - Ele tinha um sorriso bobo estampado no rosto.

— Você sabe que é inútil tentar esconder algo de mim. Será melhor se você me poupar de vasculhar sua mente.

Bernard assentiu, aceitando a derrota.

— A Lucile sorriu para mim hoje.

— Bernard, ela é uma mercadora. O trabalho dela é sorrir para estudantes idiotas feito você, tão carentes de alguma atenção que gastam moedas e moedas em melões achando que isso vai lhes dar alguma chance com ela. E não foi você que estava falando agora mesmo sobre se afastar de coisas dispersivas?

— Não, Charles. Eu senti ali uma conexão, uma troca furtiva de olhares. Sabe, eu acho que – Ai. - Um livro pesado que outrora estava na estante caiu na sua cabeça. E outro. E mais outro, até que uma de suas prateleiras estava vazia e Bernard desconfortavelmente coberto dos pesados volumes.

— Podemos continuar? - A resposta foi um gesto de confirmação com a mão e um consentimento abafado de um estudante que finalmente se rendia a seu mestre.

 

—--

A reunião foi interrompida pela segunda vez, quando a porta do salão se abriu de novo.

— Saiam da frente, eu quero passar.

Em meio a cotoveladas e empurrões, Morgan atravessou a massa de pequenos nobres e finalmente apareceu no campo de visão do marquês. Como ele havia passado pelos guardas que controlavam rigorosamente a entrada no longo corredor que levava ao salão subterrâneo era fonte de desconforto para vários dos homens ali presentes, e algo que precisaria ser averiguado.

— Eu quero participar da reunião. Já tenho a idade que o Fred tinha quando ele começou a vir.

— Os talentos do seu irmão para estratégia e com os números vão além dos direitos que ele detém como primogênito. – O marquês não deixou sua expressão nem seu tom de voz se alterarem, enquanto respondia o filho mais novo com frieza. - E tais talentos ele demonstrou desde bem cedo. Os seus, por outro lado, eu espero ver durante o torneio. Gilles, escolte meu filho para os seus aposentos.

— Sim, meu marquês. – Respondeu depressa o nobre extravagante.

Gilles, no entanto, não andou mais do que dois passos antes de paralisar-se frente o olhar intenso do jovem Morgan.

Os olhos estavam fixos nos de seu pai. Frederick reconhecia em seu irmão mais novo a mesma ferocidade que próprios olhos do marquês frequentemente expressavam. O caçula nascera mais semelhante ao pai do que todos os outros filhos, uma fonte tanto de orgulho para o marquês quanto de preocupações para sua mãe e seus irmãos – era bem sabido que, de todos os filhos, os caçulas e os bastardos sempre foram os com menos a perder e tudo a ganhar. Morgan temia ou respeitava o pai, uma distinção que pouco importava a seu progenitor, mas cada vez mais ele arriscava desafiar os limites a fim de seguir suas vontades.

E Morgan via nos olhos do pai a força indomável de alguém que nunca foi contrariado sem graves consequências. Força que ele pretendia, um dia, superar.

— Vamos para o campo, Gilles. Cerberus precisa treinar antes do torneio. – Foi a resposta que o caçula deu, depois de alguns segundos de tensão silenciosa. Somente depois de girar todo seu corpo rumo a saída que Morgan quebrou o contato visual com seu pai.

— Amanhã você usará Sombra, sem as correntes que a limitam. Mostre-me o que foi capaz de ensiná-la. – Disse o marquês, sem olhar o garoto sair da sala.

Frederick tinha plena consciência do perigo que seu irmão mais novo representava para o equilíbrio das relações dentro sua família. Morgan só sabia respeitar um atributo: a força

 

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Quando Frederick finalmente terminou de marcar no mapa as últimas informações que precisavam ser discutidas na reunião, o marquês levantou-se, deixando a mostra sua figura imponente, e mandou que todos os homens, exceto Aldric e o Conde de Martel, se retirarem. Frederick também se levantou, enrolou um dos pergaminhos que estava ao seu lado e se juntou a Vincent, acompanhando os nobres que saiam do salão em meio a burburinhos.

Quando o último deles fechou a porta, Aldric deixou escapar um suspiro aliviado, e retirou uma garrafa de vinho de um dos armários

— Se me permitem, eu preciso de álcool. – Disse ele, enchendo uma taça, e oferecendo outra para o marquês, que a aceitou prontamente. – Todo ano, cada vez mais caótico. Por que você tem tantas terras?

O marquês o ignorou, e encarou o Conde de Martel, que havia acabado de tomar um grande gole de sua taça.

— Na próxima vez que seu filho for anunciado como Conde de Martel, eu vou presumir que ele te enterrou a sete palmos embaixo da terra. – Disse ele com a um raro sorriso sarcástico.

Ele se referia, é claro, ao fato de que poucos dias atrás o primogênito do Conde havia chegado ao castelo carregando o estandarte e o nome de seu pai.

— Estamos velhos, Ed, já faz tempo que as únicas batalhas que eu quero batalhar são as de exibição no seu torneio, quando eu posso te derrubar sem correr o risco de perder a cabeça. Temos que deixar que as novas gerações carreguem nosso fogo.

— Você fala isso porque seu herdeiro já é bem mais velho que os nossos. Vince ainda é mais um moleque do que um lorde. – Reclamou Aldric, sentando-se sobre a mesa.

— Você ainda é um moleque, Aldric. – Retrucou Edgar.

— É importante manter a ilusão de ser jovem.

— Vocês dois eram moleques quando se juntaram ao meu batalhão. – Disse o conde, puxando a cadeira que há pouco fora ocupada por Frederick e se sentando. - E eram dos mais problemáticos. Só de olhar para essas suas rugas, eu me sinto extremamente velho.

— Ora Gregor, isso é porque você está acabado, parece que foi atropelado por uma manada de Rhyhorns. – Aldric falava enquanto estampava no rosto seu sorriso torto.

— Cale a boca. – Falou o conde com frieza, mas logo depois riu. – Eu lembro muito bem que você ficou muito pior do que isso quando resolveu irritar um Piloswine com filhotes em uma de nossas campanhas.

— Aquilo foi estúpido. – Concordou Edgar, deixando escapar uma risada.

— E o motivo? Isso sim foi o ponto alto de sua estupidez.

— Se eu me lembro bem... Você o desafiou a subir em cima dela, e disse que ia dar uma moeda de ouro e sua parte do jantar para ele se conseguisse.

— E ele disse: pode começar a preparar minha comida!

— Há. Aquela porcaria quase me matou. Ainda tenho as marcas. – Disse Aldric, e puxou uma corrente de dentro de seu manto, com algo dourado preso na ponta. – Mas eu ganhei uma moeda de ouro, não é?

— Ainda mantenho que foi o auge da sua burrice. – Concluiu o marquês.

— Quem é que sobre em uma Piloswine selvagem por só uma moeda e um pedaço de pernil? – Gregor completou.

— Mas não era qualquer moeda de ouro, era a que nós roubamos do monsier Guillhaume, aquele bastardo. – Aldric carregou as últimas palavras com seu refinado tom de sarcasmo. – E vocês se esquecem que, naquela época, aquela moeda era mais do que tudo que nós tínhamos quando nossa companhia se desfez.

— Jamais. – Respondeu Edgar. - Aquele muquirana ainda por cima ofereceu só uma moeda de prata de recompensa para cada uma de nossas cabeças.

— Ela tem até a cara fedorenta dele estampada. – Disse Aldric, admirando seu pequeno tesouro.

— Nada como carregar o rosto de um homem odiado no peito. – Ironizou Gregor.

— Antes da gente matá-lo, eu costumava esfregar ela no saco para dar boa sorte.

— E funcionava? – Edgar levantou uma sobrancelha.

— Para ele, pelo visto não.

Os três riram com gosto, enchendo o salão vazio de gargalhadas.

— Mas vocês têm que admitir que eram tempos muito divertidos. Eu não aguento mais calcular excedentes da colheita e investigar qual será o próximo visconde que vai tentar pagar menos impostos do que deve. – Aldric levantou e balançou seu copo em um claro gesto de frustração, enquanto fechava os olhos e franzia o cenho. – É um tédio absoluto!

— Por isso eu disse que nós estamos velhos. – Gregor reclamou.

— Eu preciso de mais vinho. – Resmungou Aldric, e se levantando para buscar outra garrafa.

Ao abri-la, ele se desequilibrou e derrubou vinho no tapete. Aldric e Gregor olharam para a mancha, depois se entreolharam, e então encararam Edgar.

— Eu mando o Barão de Tursan limpar, ele adora lamber minhas botas. – Foi a resposta do marquês, que arrancou mais gargalhadas.

— Ed, conte-me, como anda sua esposa? – Perguntou Gregor. -  As coisas entre você e ela melhoraram?

Aldric deixou escapar um resmungo desconfortável.

— Ainda trancada naquela maldita torre. – Respondeu o marquês, acariciando a cabeça de sua Pyroar.

— Mulheres. Sempre temperamentais e arruinando nossa paz.

— Diga isso perto de Charlotte, e quando perceber, você terá perdido a língua. – Aldric falou entre risos, servindo mais vinho para os dois velhos companheiros de batalha.

— Bem... Fui eu que a criei. – Completou o marquês, após tomar um grande gole de sua taça.

 

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Quando Vincent e Frederick se afastaram o suficiente dos outros nobres para não serem ouvidos, o garoto mais velho tocou o ombro de seu amigo.

— Você ainda parece incomodado, Fred. O que se passa?

— Não consigo esconder nada de você, não é mesmo? – Disse Frederick, franzindo a sobrancelha. - Tem algo estranho nessa situação, mas é algo que eu não ousei pronunciar naquela sala.

— Você sabe que não precisa guardar segredos de mim.

Frederick assentiu com um movimento da cabeça, e baixou mais a voz.

— Nossa inteligência já tem sido orientada ao leste muito antes da mobilização do Conde de Arles ou sequer da intensificação dos conflitos germânicos. Por conta disso, ela tem deixados buracos pontuais ao longo do oeste, o que passaria despercebido para muitos. Porém, são buracos grandes o suficiente para que pequenos contingentes pudessem se locomover sem serem vistos.

— Alguém queria que não víssemos algo, é isso? E onde foram esses buracos?

— Nas redondezas do Chateau Dreux.


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Notas finais do capítulo

Bernard: Por que você só está escrevendo sobre personagens secundários?
Eu: Por que eu tenho um plano... Que eventualmente... Vai acontecer... E eu gosto deles ok?
Bernard: *sons de irritação*

É isso por hoje, obrigada por lerem até aqui. O próximo capítulo será sobre o Norbert, e depois voltaremos para as crianças. Se vocês gostaram, deixem um comentário para eu não me sentir tão solitária.



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