Livros e Cigarros escrita por Martíou Literário


Capítulo 3
Capítulo 2 - Tudo por causa de um sabão (parte 2)




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Ítalo voltou pra casa, preocupado.

Ficou pensando, roubaram sua casa semana passada, e os cara com cara de bandido por quem passou mais cedo, com certeza pensaram “ta vendo esse moleque? Todos os dias ele chega às dez e meia em casa. Quando ele chegar, vamos estar esperando para ele abrir o portão de sua casa e nós invadirmos.”.

Ítalo era cheeeio de hipóteses.

Além disso, acabara de arriscar sua vida para salvar o tipo de cara que ele tinha mais costume de zoar.

O fato do seu pai ter enrolado com esse sabão em pé mais isso o deixou bem apreensivo e exasperado por dentro, mesmo que naquele momento tentasse conter.

E só depois de ter chegado em sua casa com o sabão, sentiu o corpo todo tremido. Primeiro sentou-se na rede com um copo de água querendo se acalmar o quanto antes. Até quando respirava, o ar saia tremido. Era como a temperatura ao redor tivesse abaixado. Fechou os olhos, inspirando e soltou.

Demorou quase uma hora, mas não esperou mais nada, foi logo lavar sua roupa, tentando voltar a rotina a fim de se livrar da sensação e lembrança mais maluca de sua vida.

E ainda por cima a centrífuga inventou de não funcionar.

Seu pai começou a dar uns tapas na máquina e ajeitar de forma que ela pudesse funcionar. Márcia sorria, achando engraçado.

— Ítalo tá até sem paciência, coitado.- e riu. Sua mãe tinha esse inconveniente aspecto de querer tirar graças de situações irritantes. – Cadê aquele príncipe da mamãe que ficava com um sorriso impecável sempre que ficava inspirado?

Fabrício afastou-se da maquina, com o peito rubicundo, observava-a dali. Depois volveu sua atenção para os dois.

— Isso é porque ele não dorme.

Ítalo queria revirar os olhos naquele momento.

Fabrício e ítalo era como dois homens envaidecidos, que sempre tentavam mostrar que sabiam seus erros e seus acertos. Mas quando nenhum dos dois admitiam um para o outro, era quando o verdadeiro caos naquela casa começava.

— Eu durmo, pai, to irritado porque o senhor me deixou irritado. – replicou, impaciente. Sentiu a voz um pouco tremida, fazendo ele se xingar por dentro pensando o que tinha passado, mas continuou – e não tem como me concentrar em escrever quando tem um diabo dum som causando um terremoto no meu quarto. – completou respondendo a mãe.

— Nãaao. Isso é por que tú não dorme e fica ai todo estressado. – seu pai insistiu.

— Pai, o senhor que me deixou com raiva. Eu pedi para o senhor comprar o sabão não sei quantas vezes. – explicou, nem porra ia revelar o que mais contribuiu para esse seu estresse foi sua quase morte.

— Sim, ítalo, mas tem que ver que eu to cheio de coisas pra fazer.

— Sim. – imitou-o. – Eu perguntei várias vezes se o senhor tinha certeza. E o que me respondeu? Sim, meu filho, vou comprar. E agora vem dizer que tinha um monte de coisa pra fazer, então por que não disse que não podia? – Ítalo sentiu-se orgulhoso por dizer tudo sem gaguejar, mas seu coração tava sentindo de novo os tremores ao falar daquele jeito, e tentou respirar um pouco, não querendo ter um ataque tão jovem.

Márcia olhou de um para o outro, e incrédula diante da situação, estendeu às mãos.

— Vocês estão mesmo brigando por um pacote de sabão?

E o apelo todo começou. E no momento que isso aconteceu, Ítalo levou a mão à cabeça, respirando de forma que seu peito mexia assustadoramente. Fechou os olhos e tentou controlar uma explosão prestes a acontecer nele.

— Não, sinceramente, quando eu morrer, acho que vocês vão poder viver em paz, é isso que vocês querem.

— Cala a boca. – sussurrou Ítalo.

— O problema Ítalo é que tu achas que és o dono da verdade, é, é isso sim.

— Cala a boca. – sussurrou Ítalo mais uma vez. E Fabrício começou a contar nos dedos mais revoltas.

— Tu não me respeita, não me escuta, tem que ver que eu sou seu pai.

— Cala. A. Boca. – disse, cuidadosamente, entre dentes, seu rosto vermelho e algumas veias pulsando.

— Sabe o que é isso? – perguntou retoricamente Fabrício, enquanto Ítalo se virava, com as mãos ainda nos cabelos e o rosto vermelho, mas tão vermelho que Márcia começou a se preocupar.

Esse merda não sabe o que ta fazendo.

— Amor. – disse ela.

Mas Fabrício ergueu a mão, interrompendo-a.

— Isso é porque tú te isola na porra daquele teu quarto, não fala comigo e com tua mãe, não pergunta nem se a gente tá bem. Olha, quando vai ver, isso vai te dar sinais de depressão, e meu filho. – disse, assentindo com a cara de razão dele que Ítalo mais odiava. – Entrar nela é fácil, mas sair.... – Igual a adolescência, pensou Ítalo, entrar é fácil, mas sair... E sobre a depressão, Ítalo ria por dentro, por saber que Fabrício não sabia o que dizia, por saber que já se salvara da depressão, na verdade, ela nem chegou a se apoderar dele, ele e sua escrita a venceram, mesmo que demorasse dois anos nesse conflito. E Fabrício falar como se soubesse de tudo, só o fazia perder a cabeça mais ainda, tanto que apertava os dedos nela para ela não sair do lugar. Você não sabe de nada, pensava, não me venha com essa de sociologia, eu já lidei com isso sem precisar deles. Ele sempre fazia isso, sempre dizia que viu algo ali, aqui. Mas que merda! Ele achava o que, só porque aconteceu com os outros iria acontecer comigo? Isso não ia acontecer, Ítalo sabia, a palavra dele bastava.

Fabrício, por mais louco que parecesse, pareceu ter se empolgado, trazendo bases teóricas para isso. – ontem mesmo eu li um artigo sobre um sociólogo....

— Você não sabe de nada. – sibilou ele.

— Monstros, Ítalo. Todo mundo possui. Todos somos torturados por eles de uma maneira única. É claro que eu não sei. Mas estão ai, estão tomando conta de ti.

Ítalo odiava quando Fabrício conseguia de alguma forma usar as palavras contra ele.

E riu por dentro. Monstros. Até parece! Ítalo era ítalo, se tinha um ladozinho perverso, mostrava, deixava logo evidente que não era um anjo, um ser bom, que quando vê um mendigo que já vai ajudá-lo, que vê uma pessoa fazendo besteira, entregava-lhe a verdade nua e crua. Mesmo que tenha acabado de salvar alguém e não sabia o porquê. Não precisava de monstros. Ele os domava e fazia proveito. Sempre soube que o cérebro era tão poderoso que não achava possível desvendá-lo completamente, mas sempre teve ciência que deveria instruí-lo para si para não ser dominado por ele. Tolice, monstros, depressão, não, não com ele, ele era invencível a isso, a esses disparates.

Droga, o que ele ta falando? A raiva está tomando conta de novo. Depressão é coisa seria, mas seu pai parecia o insultar com isso. Mas não. Não vai deixar. E se for pra encolerizar-se, que fosse por ter certeza.

A raiva crescia dentro dele tão incontrolável que parecia estar passando por uma segunda puberdade. Ele sentia isso. Tudo no seu corpo mudava. A raiva, a felicidade, a tristeza. Antes sentia e se recuperava. Naquele momento sabia o que ia acontecer e também que demoraria para se recuperar. Nada era mais como antes. Ele mudava e sentia necessidade de mudar as coisas ao redor. Não conseguia fazer isso junto de outras pessoas. Era dele. Só dele esse momento. E ter alguém como Fabrício lhe falando uma torrente de asneiras era como uma máquina disfarçada em corpo para disparar frases irritantes, que mexesse deliberadamente com o psicológico de uma pessoa.

Ítalo respirava fundo, franzido todo o rosto, seu corpo entrava em um momento estranho, um momento único na qual ele não podia mais, não podia mais mesmo lidar. O clima parecia esfriar em volta e seu coração batia como se estivesse ao ar livre, sentindo brisas, o corpo num calor mortal.

Então Ítalo explodiu.

— Foda-se eles. – berrou como um leão, espantando tanto Fabrício quanto Márcia. - Foda-se Karl Mark, Friench, Friedri, fri, fri, ah porra, não lembro o nome. Foda-se. Eles morreram. Supera o nome deles, supera esse merdas. Fica toda hora tentando revive-los, hein, em vez de evitar que eu me afaste, fica trazendo eles. Da um tempo. Tenta não afasta que não ta vivo.

E ficou respirando como um animal enorme, o peito rubicundo, rápido, assustador e louco. Ele olhou para baixo e virou-se de costas novamente, como se contasse até dez. Ítalo explodiu. Explodia a cada uma vez ao ano, ou continha-se. E sabia que levaria um bom tempo para se recuperar.

E um estrondo o espantou, fazendo pai quicar o pés na lajota e os óculos entortarem na cara e Ítalo cair de bunda na rede.

Levantou, tentando se recuperar e mirou os olhos delgados no gato no muro, como se quisesse incinera-lo mentalmente. Ítalo, então, aproveitando o vigor da raiva, se comunicou telepaticamente.

Seu maldito!

Tanto faz, humano.

O gato deu uma andada bem cara de pau sobre o muro, sob o olhar de Ítalo, Fabrício e Márcia. Parou uns passos depois, virou a cara e disse:

Quer saber, vá à merda!

E saiu correndo como um raio quando Ítalo arremessou, com toda sua raiva acumulada, na beira do muro perto dali, causando um estrépito de bater o coração de todos. E ficou respirando, o peito rubicundo, aparentemente subindo e descendo, parecendo maior. Não tinha coragem de uma coisa dessas, estava realmente sem paciência, tirado do sério. Desse jeito virou-se para seus pais, que estavam brancos. Além deles, Emilia estava no degrau que descia para a área, o encarando, chocada.  

Esse foi o dia em que Ítalo perdeu a paciência.

Determinado tomar uma atitude para mudar isso.

Mas deixaria pra depois, pois logo que se virou para os pais, um tremor aconteceu.

Foi uma coisa estranha sentir como se sua casa tivesse pulado do lugar, até mesmo vertiginoso, e não era exatamente como se fosse cair, mas todos estavam com os braços meio erguidos como se prevenissem equilíbrio.

O tremor durou apenas alguns segundos. E ao parar, o pai de Ítalo ficou olhando para todos os cantos. Márcia ainda assustada, mas com uma postura impressionantemente robusta.

Depois de não achar algo que ele parecia procurar, Fabrício o encarou, chocado. Era diferente. Em um momento o encarava com uma alerta nos olhos como se se metesse com ele, ficaria doido, mas agora parecia ofendido. Olhava ofendido para Ítalo. O estudante nem mesmo havia absorvido o que acabara de acontecer e já olhavam para ele como se ele tivesse culpa daquele tremor esquisito.

@0_o@

Ítalo entrou em seu quarto e se atirou de costas na cama, sem medo de quebrá-la, com o foda-se ligado em todos os membros e sentidos e na sua alma.

Emilia apareceu logo depois, fechando a porta, trancando-a e ligando a luz. Ele ouviu todos os sons para concluir isso. Só abriu os olhos porque além do drama de fechar a porta com chave e tudo, sentiu-a parada de costas para a porta. Estava de braços cruzados com uma expressão inquiridora no rosto, como se exigisse uma explicação para o que acabara de presenciar.

Quem deveria uma explicação era ela por estar ali do nada, pensou ele.

Emilia era o tipo de mulher que se tivesse o azar de aturar uma discussão familiar na frente dela, ainda mais dos seus amigos, tinha pelo menos o direito de saber o porquê. Mas antes mesmo dele começar a explicar, o surpreendeu com uma resposta a sua cólera.

— Você tava com raiva mesmo, hein. – disse, curvando a boca num gesto impressionado. – Tanto que deve a audácia, seu segundo nome, de berrar um supere esses merdas de sociólogos que não sabem nada da vida.  – imitou, engrossando a voz. Ele revirou os olhos. - Até porque, não é como se você não quisesse ser lembrado como um dos melhores escritores de Santana.

Ítalo a encarou, embasbacado, abrindo os lábios, como se estivesse sendo injustiçado. Ela batia os pés no chão e arqueou uma sobrancelha sobre a reação dele. Resignado, ajeitou-se para se sentar, enfiando uns travesseiros atrás da costa, e volveu os olhos para os pés esticados, envergonhado.

Ela suspirou, como se já fosse o bastante seu sermão, e aproximou-se da cama, se sentando no espaço que ele liberou. Ela estava bonita naquela regata escura e no short curto branco. Emília era uma mulher tão linda, de lábios carnudos e beijáveis, cabelos lisos e bem cortados até a base do pescoço e com a pele sedosa cor de oliva. De suas três amigas mais próximas, ela representava a sedução para ele.

— Ah, mano, sinceramente, não da mais. – reclamou ele, jogando a cabeça no travesseiro e depois olhando para o quadro a frente.

Ela o encarava como se dissesse “Sério mesmo?”. Ele desviou do quadro para ela, arqueando um das sobrancelhas.

— Não, sério, olha pra minha cara, não to conseguindo nem me acalmar. - e despencou a cabeça de novo, revirando os olhos depois dela rir.

Depois de uns segundos, viu o quadro na parede balançando, e ergueu de novo.

— Vem, cá, a gente de alguma forma ignorou que a terra tremeu? Quer dizer, não tremeu como terremoto nem microterremoto, eu acho, mas porra, ela tremeu.

— Verdade, mano, que diabos foi isso? A briga em família tava tão interessante, que meu Deus.

— Verdade, e a senhorita viu como ele me olhou – sussurrou. - pareceu me olhar como se eu tivesse feito aquilo, até isso é minha culpa. - Ela parou de olhar preocupado e jogou um travesseiro nele rindo, fazendo a cara de novo de “Serio, mesmo, Ítalo?” e se levantou.

— Sério que até quando a terra treme tú faz questão disso ser sobre tú mesmo.

Ele não comentou, com os braços cruzados e olhando qualquer outro ponto para desviar de uma vez dessa questão.

Já tava mais calmo também. Com um suspiro, se levantou para acompanha-la.

— Pelo menos não vou mais você sabe onde. – disse, referindo à feira.

Ela riu, vergando a cabeça para trás ao atravessar a porta, pensando consigo mesma, vai sonhando, ele a empurrando com as mãos em suas costas.

O clima ficou leve novamente. Eles brigavam em família, claro, brigavam sim. Mas depois passava, e nada melhor que um amigo pra ajudar nisso. E essa coisa de tremor já tava ate vendo os vizinhos comentando, mas ia passar, ah se ia.

E foi só pensar nisso que o som mais assustador da sua vida foi acionado. Poderia ter sido a sirene da cidade, mas foi o do plantão da globo.

Ele e Emilia pararam na porta aberta da sala para ver aquilo. Sua mãe, Márcia encontrava-se ali, sentada no sofá com seu pai. Eles nem reparam direito nos dois, tinham a atenção nos microfones sobrevoando o globo da emissora. Então, apareceu a imagem da telejornalista.

— Um microterremoto acaba de ocorrer no município de Santana, no estado do Amapá, a causa é desconhecida, sendo não possível vir do choque de placas tectônicas, vulcões ou deslizamentos visto que pegou fonte nova inteira, e explosões estão sendo descartados por não haver mina. Um fenômeno misterioso que já está sendo investigado pelos sismólogos. Segundo eles, causas como essa são consideradas raras no Amapá, e essa em Santana, improvável. Já houve casos em que tremores aconteceram no Oiapoque, onde a defesa civil afirmou que a intensidade foi de 2 pontos na escola Ritcher. O maior tremor foi na Guianna Francesa, cuja intensidade foi de 5,2 graus na mesma escala. A distância de Santana para o epicentro é muito maior, no entanto a intensidade foi de 3 pontos na escala Ritcher. Podemos voltar a qualquer momento com mais informações.

https://www.youtube.com/watch?v=gqn7gOUrwHo Milck monster

Era como se o mundo se tornasse lento com tudo ocorrendo.

Os olhos de Ítalo estavam incisivos para a tela. Sua mãe entrou em desespero, culpando o clima ruim da casa e afirmando que só podia ser coisa de Deus. Seu pai foi logo verificando se havia rachaduras em algum lugar.

Quando Ítalo viu o impossível acontecer, olhou para sua mão, e fechou-a, assim como seus lábios. Pensou em uma besteira, mas que fazia lhe arrepiar. Podia ser que seus monstros estavam se libertando? Estavam influenciando em tudo ao redor? Ele tinha que tomar uma atitude?

Seu avô uma vez disse “Um homem sempre reconhece seu poder. Basta entregar-se e sentir.”.

Ele fechou os olhos, sentindo uma lágrima sorrateira escapar. Culpou o dia agitado que teve por suas emoções estarem tão confusas. Sua lágrima estava sendo limpa por um polegar. Abriu-os e viu um olhar terno de Emilia, sorrindo como uma mãe, com as claras vermelhas.

Emilia tinha um brilho diferente nos olhos, como se fosse outra mulher. Era como se pudesse sentir ele e tomar sua dor, ou estaria ele vendo coisas?

Que dia mais confuso!

Ela passou o polegar pela sua bochecha, indo e vindo e descendo pelo seu ombro, dando um confortante aperto. Ele sorriu de volta.

Depois, olharam para baixo, fungando e limpando suas lágrimas, como se nada tivesse acontecido. Eles saíram dali. Emilia passava os dedos pelos olhos, estes revirados para cima, assoprando.

Já na frente do portão, esperando a carona dela, Emilia comentou:

— Estranho, isso não é lá muito possível pelo que eu me lembre.

— Ouvir falar de tremores ai pra fora, mas aqui. – ele cruzou os braços, olhando a rua tranquila, e estranhando por não ter nenhum vizinho conversando sobre isso. Ele soltou um suspiro de tranquilidade. – Sempre achei que estivesse seguro.

— Estranho. Deve ser a cobra grande. – brincou Emilia.

Ele, que estava absorto nas ervas daninhas na calçada, foi despertado por esse comentário.

— Não duvido depois desse mistério. – disse, no exato momento uma moto desceu e parou perto deles.

Ela revirou os olhos.

— Tchau, cabeçudo, te vejo na feira. – disse ela pegando o capacete e metendo na cabeça. – com tudo isso, a gente nem conversou direito, te ligo mais tarde, pode ser?

Ele concordou com a cabeça, tava querendo descansar depois de tudo mesmo.

Mas fechou os olhos, com um suspiro cansado.

Ainda tinha que terminar de lavar a metade das roupas.

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Jânio estava deitado em sua cama, com os olhos longe, fumando de cueca enquanto uma mulher ajeitava a alça do sutiã ao mesmo tempo que colocava os saltos. Mulheres. Era admirador para ele em elas serem habilidosas em fazer tudo ao mesmo tempo e ainda sim demorarem séculos.

Quando mostrou o dedo para ele, a gata rosnou, intimidando-a com os pelos faciais eriçados e as presas aparentemente intravenosas. E passou a só ronronar e rondar por ali quando a mulher se aquietou receosamente com o queixo erguido. Volveu seus olhos para ele que tragava com os orbes claros fitos no teto. Ele parecia tão entretido em pensamentos que nem reagiu em percepção quando sua gata saltou para cima da cama e fundava suas patas rosadas para perto da cintura e se alinhava ao seu lado. Ainda com os olhos presos remotamente no teto, com uma mão retirava o cigarro da boca e soltava as ondulações acinzentadas e transparentes no ar enquanto com a outra mão, com toques sorrateiramente relaxadas e soltos, fazia um cafuné em sua gata.

Melissa abriu a porta virou o rosto para ele.

— Tchau, Jânio. – e sem uma resposta, bufou zangada e bateu a porta bem forte fazendo a pobre da gata dar um salto na cama.

Em outro bairro de Santana, Ítalo se jogou em uma cama, frustrado, estressado, confuso, sensível e sem paciência pra essa vida. E depois da briga com seu pai, pareceu-se esquecer da quase morte, e pareceu estranho lembrar, ainda tinha o tremor que persistia com mais confusão em sua cabeça. Passou a mão pelos cabelos. Gostava de suas amigas, mas ás vezes era sufocante, mas gostou dessa conexão com Emília. E sobre família, era bom, mas precisava de seu espaço, mesmo que isso mudasse sua vida.

Enquanto isso, Jânio estava refletindo, o que fazia enquanto sua namorada discutia de maneira monologa com ele. Mirava os olhos claros remotamente para o teto, com a mente pensando em como solucionar seus problemas com as despesas. Jânio gostava de seus amigos, suas noites de festa, de fumar, de beber, mas precisava de alguém responsável pra dividir as contas. Alguém consciente, limpo, consciente de espaço, respeitoso e nada folgado. Ainda naquela noite pensou no letrado que salvou sua vida, sentiu que fosse qualquer coisa, mas não um humano. Ainda estava incrédulo com aquele garoto.

Um rapaz que precisava de alguém pra dividir as contas e um jovem que precisava desesperadamente de independência.

Os dois bufaram. E disseram.

— Preciso mudar isso.


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