Velhas estradas, novos caminhos escrita por Lady Salieri
Notas iniciais do capítulo
Chegamos ao capítulo final. Um beijo, minha amiga secreta linda !
A última vez que vi Alícia foi no dia do resultado das eleições. Imaginando que ela não suportaria a vitória do Collor, corri até sua casa, contra a maré de carros em passeatas e contra os fogos de artifício.
Ao chegar lá, sua mãe disse que ela não estava e que se preocupava por onde devia estar. Não tive dúvidas. Corri para a filial da rede globo da nossa cidade para encontrá-la jogando pedras e tentando romper as vidraças do local.
Segurei-a com os dois braços, abraçando-a por trás:
— Alícia, para! Você pode ir presa! Vamos sair daqui!
— Me solta, Adônis, me solta!
Levei-a como pude até um local mais tranquilo. Ela se desvencilhou de mim com calma e sentou-se na beirada da calçada, incapaz de conter as lágrimas:
— O que as pessoas querem, Adônis? O que as pessoas REALMENTE querem?
— Serem felizes, eu acho.
— Sério? E como elas querem isso?
Sentei-me ao lado dela:
— Eu não sei...
— Você escuta os fogos? Escuta a marcha de carros comemorando isso? É como cantar correndo para o abismo. É isso que estamos programados para fazer para sempre e sempre?
— Mas o Collor poderá ser um bom presidente... Como vamos saber?
— Estudando história, eu acho...
— A história mostra também que o socialismo não deu certo.
— E que o povo nunca deu conta efetivamente de revolucionar nada...
Ela deitou a cabeça no meu ombro.
— Talvez um dia você viva num mundo que você não entenda e sinta o que estou sentindo agora...
Eu acariciava seu cabelo quando disse:
— A única coisa que eu sei agora é que sinto alguma coisa por você que não entendo.
E foi o passo de ela levantar a cabeça e me olhar que cedi ao ímpeto de colar meus lábios aos seus.
Além da estranheza do ato, certeza de que eu era o primeiro garoto que a beijava, alguma coisa explodiu na minha alma, como uma granada de cor e vida que me assustou mais do que nunca. E eu tinha medo de tentar investigar isso a mais a fundo, descobrir o inevitável, então fiz a coisa mais humana que um ser humano podia fazer: deixei-a em casa como um perfeito cavalheiro, dei-lhe um beijo de despedida e fugi. Tão logo pude, fui para a capital estudar e nunca mais retornei àquela cidadezinha onde passei a minha infância.
No mito de Adônis, ele, tendo seduzido Afrodite e Penélope, ele escolheu Afrodite. Eu escolhi a mim mesmo.
E o gosto amargo fica na boca às vezes, o gosto da covardia, do medo, daquele "e o que poderia ter sido..."
Não quer ver anúncios?
Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!
Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!Notas finais do capítulo
Espero que tenham gostado. Quero incluir muita coisa nessa história pra uma versão final, especialmente no que diz respeito às eleições de 1989, fatos históricos e essas coisas. Mas por enquanto fica aqui a espinha dorsal que é bem essa mesma.