À Meia-Noite escrita por Cupcake de Brigadeiro


Capítulo 2
Capítulo 2


Notas iniciais do capítulo

Nossa, cara! Só tenho que agradecer a todos os que comentaram anteriormente no prólogo, que também foi o nosso primeiro capítulo, de modo que nem sei mesmo como agradecer, somente enxergando que eu tenho que me dedicar ainda mais para trazer capítulos cada semana melhores!
Espero que aproveitem, com todo o amor do mundo! Obrigada mesmo!
Obs.: coloquei o link da música onde está o nome da mesma e um gif no final do capítulo, mas está linkado



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/717251/chapter/2

E mais um foi por água abaixo

Oh, por que não posso conquistar o amor?

E posso ter pensado que éramos um só

Queria lutar nessa guerra sem armas

 

E eu queria isso, queria muito isso

Mas havia tantas bandeiras vermelhas

Agora mais um vai por água abaixo

Sejamos honestos, não confiarei em ninguém

 

Você não me rompeu

Ainda estou lutando por paz

 

Bem, eu tenho uma pele grossa e um coração elástico

Mas sua lâmina pode ser muito afiada

Eu sou como um elástico, até que você puxe com muita força

Sim, eu posso estourar quando me aproximar

Mas você não me verá cair

Porque eu tenho um coração de elástico

— Elastic Heart, Sia ft. The Weeknd

Após o primeiro dia na arena, com oito baixas, e quatro pessoas em nosso grupo, que incluía eu, Peeta, Finnick e Maggs, não fizemos muitas amizades, não eu, pelo menos, optando, então, por ser a primeira a ficar de guarda na primeira noite, mesmo que por relutância.

— Só uma hora — Acalmei Peeta, sentindo os olhos de Finnick nos examinarem da cabeça aos pés todo o tempo.

— Mas você precisa descansar. Enobaria por pouco não te mata afogada, Katniss — Isso é absurdamente verdade, porém não confio suficientemente em Finnick.

— Estou bem. E não vou conseguir dormir depois do dia de hoje — falei, dando de ombros, sentando-me sobre a relva, descansando minhas costas em uma pedra. — Isso sem contar que você acertou o campo de força, e seu coração parou de bater por quase dois minutos.

Seus olhos azuis calmos ficaram levemente irritados, mas o cansaço estava por todo seu corpo, eu o conheço bem o bastante para saber disso.

— Ok, mas só uma hora — aceitou, em um suspiro, ficando ao meu lado, sentado, porém com a cabeça em meu ombro. Sorri, limitando-me até mesmo de beijar o alto de sua cabeça, com carinho, observando-o fechar as pálpebras, caindo em um sono silencioso.

Finnick salvou sua vida, com respiração boca a boca, e massagem cardíaca, fazendo Peeta voltar, voltar para mim e o nosso bebê, formando uma dívida enorme da qual não sei se vou poder pagar um dia, mas me esforçaria ao máximo para fazer isso, mesmo que eu ainda não confie nele, meus gritos e choro descontrolado por pensar que perdi Peeta foram assustadores o bastante por toda uma eternidade. Só parei de tremer há poucas horas, depois de somente andar com ele ao meu lado. Até agora estou com medo.

— Como ele está? — O loiro bronzeado perguntou em um tom baixo, depois que acomodei Peeta deitado perto de mim, para não acordar com dor nas costas depois.

— Só um pouco desidratado, como todos nós, mas vai ficar bem — respondi, internamente agradecida. — Não conseguiu achar água?

Balançou a cabeça em negativa, aparentando também um forte cansaço, com os lábios bem rachados, ainda no primeiro dia.

Então, raios cortaram o céu, batendo vinte e quatro vezes em uma árvore que estava um pouco alta, a maior de todas, há bons e seguros metros de distância de nós.

— Seria o número de tributos? — perguntei, sem entender, depois que o silêncio tomou conta da arena mais uma vez.

— Ou as horas — pensou, dando de ombros. — Olha, se você não vai descansar, eu vou. Não consigo ficar nem mais um segundo acordado.

— Você pode descansar — falei, calma. — Não estou com sono.

— Não vou contestar — respondeu, e eu apenas assenti, vendo ele ir para onde Maggs estava, pouco mais de dois metros de distância de onde eu e Peeta estávamos.

Justamente por não estar acontecendo nada demais, quase peguei no sono inúmeras vezes, e novamente senti o bebê se agitar em meu ventre, chutando, ou socando, bem, não faço a menor ideia, apenas sei que a ideia me assusta.

Levei as mãos para onde eu estava sentindo o que se passava.

— Por favor, não é hora para você fazer isso — sussurrei, sentindo meu coração disparado no peito, nervosa. É como se um peixinho estivesse dentro de mim, se debatendo, e isso me dá muito medo. Mas não há nada mais do que se esperar de mim além de pavor de coisas que não consigo compreender.

Hoje me arrependo de não ter contado para minha mãe, de repente ela poderia me contar que essas coisas acontecem, e são normais, eu acho, não sei. Sempre odiei saber desse assunto, me deixa muito nervosa.

Mas mesmo tão longe, eu podia sentir o silêncio da Capital para poder me ouvir falar mais uma vez com o bebê.

Encostei a cabeça na pedra, fechando meus olhos, com o coração ainda acelerado de nervoso, mas meus dedos não tinham controle, e continuavam a fazer carinho na base da minha barriga, e aos poucos a vida que estava crescendo dentro de mim se acalmava, tranquilamente, sem o menor stress. Não segurei o pequeno sorriso de alívio.

Depois que todos os movimentos pararam, mas eu sabia que o bebê estava ainda aqui dentro, inúmeras vezes, quase caí de sono, até que ouvi o barulho de algumas gotas caindo no chão, então, quando olhei ma direção, uma fumaça esverdeada vinha, destruindo algumas folhas que tocava, mas o sono e o cansaço não me despertaram para o que estava por vir, até que eu ergui um pouco o braço, e meus dedos tocaram a névoa, fazendo um grito de pura dor atravessar minha garganta.

— CORRAM! CORRAM! — gritei em plenos pulmões, me pondo de pé. — A NÉVOA É VENENOSA!

Só vi nós quatro correndo em puro desespero na direção contrária da névoa, que aumentava sua velocidade rapidamente, esgueirando-se pelas árvores, entre tudo, traiçoeira, e abríamos espaço as cegas, orando internamente para não haver outro campo de força, e Peeta me puxava, eu o puxava, até que eu tropecei, ficando presa, pois as trepadeiras pareciam ser postas do nada apenas para nos ver cair, ele voltou, e a névoa pegou boa parte das suas costas, fazendo-o ficar simplesmente sem forças para reagir. Eu mal conseguia por mim mesma.

Chamei por Finnick, que carregava Maggs com muita dificuldade, não entendi o que se passou, somente que logo Maggs se deixava ser engolida pela névoa.

Não teve tempo para luto, as dores eram muito intensas, profundas, até cairmos em uma espécie de vale, mas muito mais raso, com no máximo quatro metros de profundidade, poderíamos sair dali, mas não dadas circunstâncias. Pensei que fosse morrer, mas por alguma intervenção que só poderia ser Divina, não morri, nem Peeta, nem Finnick. Só que estando em uma arena, em um mundo pós-apocalíptico, estar vivo nunca é uma dádiva.

A morte é silenciosa. Depois que tudo fica mudo e escuro, há paz, enquanto viver é morrer de forma aguda, clara e nítida, sem que você possa fazer qualquer coisa.

Acho que ouvi Peeta me chamar, depois que eu, ele e o Quatro caímos no vale e alcançamos o chão, porém não estou tão certa disso, somente que quando enfim meu corpo parou de cair, e todo meu rosto ardiam de arranhões, apenas fechei meus olhos, apagando, só sentindo mais uma vez o bebê se mexer um pouco impaciente, como se desejasse saber se eu estou bem.

Mas nem eu sei.

*

Conseguimos água na manhã seguinte, depois de recebermos uma cavilha de um patrocinador, e Haymitch quem nos enviou, com um bilhete "beba", mas foi necessário duas horas de pura observação para descobrirmos o que é e o que faz, mas por fim me recordei que meu pai e eu usávamos na floresta muitas vezes.

Encontramos, ainda no vale, uma pequena piscina artificial de água salgada, que melhorou bastante nossas feridas, porém logo começamos a ser atacados por macacos enormes, sendo mais uma batalha que eu pensei que não fosse sobreviver, mas Peeta me salvou diversas vezes, assim como Finnick – mesmo o mais psicologicamente afetado de todos, por ter perdido Maggs, que tratava-o como filho, bem na sua frente –, foi de muito auxílio para mim que fiquei completamente desnorteada depois de escorregar ao sair da pequena piscina, batendo a cabeça com tudo no chão.

Uma morfinácia do Seis deu a própria vida para salvar a de Peeta, quando estávamos já com um pé na praia, e a partir daí os macacos logo retornaram para onde nunca deveriam ter saído. Tudo passou como um vulto diante os meus olhos, então, Peeta cuidava para que a morfinácea tivesse seus últimos momentos em paz. Ele não saiu do lado dela, que fez um desenho que não consegui ver com a ponta dos dedos ensanguentados, na bochecha dele, que sorriu, muito emocionado, agradecendo-a. Peeta indicou o nascer do Sol, falando coisas que eu não entendia, porque eram eles quem conversavam nos treinamentos, sobre camuflagem e pinturas, mas o comovente foi ver o quanto ela prestava atenção nele, como uma aluna dedicada, e ele continuava a falar, com um sorriso, esperançoso, segurando seu corpo pequeno e frágil, com pouco sangue, mas era claro que todo o seu corpo estava arrebentado por dentro, seus órgãos vitais aos frangalhos.

Então seus olhos ficaram vidrados.

Nunca tinha visto Peeta chorar, tampouco por causa de um tributo, mas ali ele se despediu da mulher, passando uma mão sobre os olhos dela, que se fecharam, então deixou o corpo dela flutuar sobre as águas, finalmente em paz. Mal deu tempo de ele chegar até a areia quando o aeroesterilizador chegou para buscar o corpo dela.

Finnick estava na beira da água, sufocado por seu próprio luto, e eu em um monte de areia, sem conseguir acreditar nos últimos acontecimentos, em um verdadeiro estado de estupor, infeliz, magoada, arrasada... tudo um pouco. Mas sai do meu lugar para abraçar Peeta, que ainda estava na água, que batia em seus joelhos.

Da minha boca não saiu nada, apenas lágrimas dos meus olhos e carinho das minhas mãos, que passearam por seus braços protetoramente, para acalmá-lo e trazer paz. Não é nenhum mistério que eu não sou carinhosa, mas foi apenas um meio que eu acreditei que pudesse ajudá-lo, que sempre torna um dia horrível em um dia incrível somente sendo quem ele é.

Quando se recuperou, eu o levei até a areia, um pouco longe de Finnick, para dar privacidade, e busquei água em uma cesta que eu trouxe, feita por Maggs, que estava presa ao meu cinto, assim como uma faca curta, mas bem afiada que o loiro do Quatro pegou de um outro tributo.

A água mudou completamente a nossa perspetiva aqui dentro. Eu me sinto duplamente mais confiante.

— O que é aquilo ali? — perguntei, tocando o ombro de Finnick, que agiu como se estivesse despertando, ficando em alerta, empurrando-me para trás com cuidado, escondendo-nos atrás de algumas palmeiras com folhas bem grandes. Peeta se manteve atrás de mim, espiando também, as três pessoas cobertas de sangue, eu acho, que vinham na direção do nosso pequeno acampamento.

— Johanna? — Finnick perguntou, com uma mão cobrindo os olhos do sol, para ver melhor a morena do distrito Sete, que carregava um machado altamente afiado em uma mão, e uma espécie de adaga na outra, sem parecer se incomodar com o peso.

— Finnick?! — exclamou de volta, e um sorriso brilhante surgiu no rosto do loiro, um sorriso muito sincero e aliviado. Ele largou seu tridente completamente perigoso e ofensivo, assim como ela as próprias armas e os dois se abraçaram, depois de irem na direção um do outro, demonstrando um afeto construído com o passar dos anos, sem se importar com o sangue – só podia ser isso –, Finnick passou um braço por cima dos ombros dela, beijando suas bochechas, depois de passar os polegares na área. Até pareciam um casal.

Eu e Peeta saímos do esconderijo detrás das palmeiras e plantas, e eu guardei a flecha que estava preparada na alijava, indo em passos calmos até mais próximo deles, enquanto Wiress parecia em estado de estopor, murmurarmos algo sobre um relógio, e Beetee já estava na água, limpando-se, mas eu pude ver o corte em suas costas, não muito fundo, mas que precisa de alguns pontos.

— Onde está a Maggs? — Johanna perguntou, procurando a senhora, e um silêncio constrangedor pairou sobre eu, Peeta e Finnick. Luto. — Como...?

Johanna parecia muito abalada, em estado de choque.

— Durante a névoa, Katniss não conseguia mais andar, e quando voltei para buscá-la, nos atrasamos. Ela não ia conseguir, e nenhum de nós também não — Peeta explicou, com sinceridade, recebendo um olhar agradecido de Finnick, por não precisar falar sobre algo que claramente o afeta, mais do que qualquer um de nós, pois Maggs era de seu Distrito, e foi sua mentora também, cinco anos atrás, nos Jogos dele. A convivência ainda maior gera ainda mais apego ou aversão as pessoas, e no caso dele está bem claro o que a senhora representava para ele.

Porém, no instante seguinte, pouco tempo tive para raciocinar, já que Johanna me acertou um tapa estalado no rosto, empurrando-me no chão com toda a força, fazendo eu perder o equilíbrio, e por muito pouco a consciência, assim como as pessoas ao meu redor.

— Você é louca?! — perguntei, sentindo meu rosto ficar vermelho de raiva, com minhas mãos afundadas na areia, comigo ainda no chão, mas logo me levantei, com Peeta e Finnick ao meu lado, para me ajudar a manter-me de pé. Estão surpresos.

— Você é a responsável pela morte da Maggs! Você é responsável por todos nossos maiores problemas e ainda ousa me perguntar uma grande idiotice dessas?! — gritou, furiosa.

— Johanna, shhhh, não foi culpa da Katniss — o loiro do Quatro interviu, como se lembrasse-a de algo que só os dois sabiam — e ela está grávida.

— Grávida uma ova! Uma grande mentira! — ela continuou gritando, e pegou o machado, para passar por cima da minha barriga, que eu passei meus braços em volta, como reflexo, mas não passou de um reflexo, já que Finnick a tirou do chão e Peeta me puxou para trás também. Sem pensar, peguei uma flecha e armei meu arco, depois que Finnick tirou as armas da mão dela, que arfava, cheia de um ódio enorme por mim, mas eu agora nutro um sentimento idêntico por ela.

— Você nunca mais ouse fazer isso! — eu exclamei, sem disparar, mas a corda estava puxada e a flecha no lugar certo mesmo. — Nunca mais tente qualquer tipo de coisa contra a vida do meu filho, está me ouvindo?!

Ela riu, sarcástica, jogando a cabeça para trás, e eu senti vontade de cravar uma das minhas flechas bem no meio da garganta dela.

— O que vai fazer? — perguntou, desafiadora, mesmo que os braços de Finnick a prendessem. — Me matar? Mata, garotinha em chamas.

Sua resposta fez meu sangue esquentar e causar uma forte dor de cabeça, somada ao sol forte.

Finn falou algumas coisas no ouvido dela, que bufou, concordando minimamente com a cabeça, mas não tirou os olhos de mim, nem Peeta tirou um braço da minha cintura, lembrando-me de me acalmar.

— Mato mesmo você, e depois queimo o seu corpo — ameacei, com a minha expressão facial mais convincente, provando as minhas palavras. Surtiu efeito, pois mesmo com o sangue manchando seu rosto, eu podia ver o leve rubor em suas bochechas, e os olhos um pouco assustados.

— Isso não foi uma advertência — continuei — isso é um aviso. Mato você antes que termine de falar ou tentar alguma coisa novamente, fui clara?

Quis cuspir na cara dela, mas não o fiz. Ela apenas arfou, afastando Finnick.

— Salvei esses idiotas para você, e é dessa forma que me trata, docinho — então, entendi o que tudo significou. Mas não me pronunciei, apenas fiz Peeta me soltar, e fui para onde Wiress estava, ainda murmurando alguma canção infantil sobre um rato e um relógio.

— Tic-tac! — exclamou rindo de forma estranha para mim, que sorri, ajudando-a a chegar até a água, onde a fiz sentar onde não poderia se afogar.

— Tic-tac — falei de volta, passando água em seus cabelos, que estavam banhados de sangue, e me deixou extremamente enjoada, com ânsia de vômito, mas não esbocei qualquer tipo de reação assim, somente continuei dando banho nela, apenas esfregando seus cabelos lisos até os ombros com muito cuidado para não machucá-la, ouvindo-a ainda cantar "tic-tac, tic-tac".

Daí, quando a ajudei a voltar para a areia, foi como um estalo. Tic-tac.

— É um relógio — falei, agachando-me ao lado de Finnick e Peeta, que conversavam calmamente sobre algo que não me interessa, e eu os interrompi.

— Hã? — Peeta perguntou, franzindo cenho, confuso. — O quê?

— Tudo! Tudo isso é um relógio, a arena é um relógio gigante, e a cada hora uma ameaça diferente, acompanhem meu pensamento — respondi, encaixando diversas peças em minha cabeça.

— Isso faz o total sentido — Beetee disse, passando os dedos pela barba, em um gesto pensativo. — Estive desconfiado, mas estava com dúvidas. Só precisamos esperar até...

Antes que terminasse de falar, raios cortaram o céu mais uma vez, caindo na mesma árvore grande e diferente das demais, poucos metros de nós, porém seguro. Mas dessa vez foram doze vezes.

Meio-dia.

Finnick chamou Johanna, que estava deitada de bruços na areia, com duas folhas de palmeira sobre sua cabeça, para impedir a luz solar atrapalha-la, então se juntou a nós, e sua carranca aborrecida estava visível agora que tomou banho.

— Acho melhor irmos para a Cornucópia para termos maior precisão — Peeta sugeriu, com um semblante cansado, porém tinha uma ponta de esperança para me mandar para casa com vida caso consigamos matar a grande charada da arena, enquanto eu pretendo levar minha gestação pelo máximo de tempo possível, para que ele saia vivo, e eu morra, mas com a tecnologia da Capital, consigam ao menos salvar nosso filho.

Enquanto caminhávamos para a Cornucópia, sem o stress que foi para sair daqui depois que os Jogos começaram, cruzei meus braços na altura do peito, pensando no quanto ainda soa como se não fosse comigo. Nosso filho é algo que soa estranho, diferente e amargo até na minha boca.

Não que eu culpe o bebê de algo, eu nunca seria capaz de algo assim, no entanto, é muito difícil aceitar esse fato, de que se eu viver, serei mãe, terei um bebê, o meu bebê, que está crescendo no meu ventre, e Peeta é o pai.

Johanna e Beetee foram na frente para ver se estava tudo bem ali, então, chamaram todos nós, que ficamos próximos da boca.

Peeta desenhou um relógio, dividindo em doze partes, então, começamos a dizer o que aconteceu em cada horário, aproximadamente, e fomos nos dando conta que realmente, nada além de um relógio.

A ponta da Cornucópia aponta para a árvore, que está no norte.

— A selva é um pesadelo — murmurei, mas Finnick me escutou, concordando.

— Por isso nós devemos colocar dois acordados. É aqui que os que ainda estão vivos querem ficar, não podemos voltar, ou isso significa a morte de mais um — todos ficamos em silêncio, infelizmente concordando, mas e depois? O que viria a seguir? Johanna será a primeira a se virar contra mim, depois de tentar algo contra Peeta, tenho certeza.

— Precisamos somente ficar em alerta de não entrar nessas áreas no momento errado — Peeta aconselhou. — Ainda precisamos da selva para encontrar suprimentos, como água e comida.

— Mas comida podemos encontrar na praia — Beetee disse. — Quanto menos tempo passarmos longe da selva, muito melhor será.

— De qualquer forma, precisamos dela, precisamos nos aventurar lá para sobreviver — Johanna disse, nada feliz com o fato, mas não falamos mais nada, somente pegamos mais alguns itens, como facas para Finnick, além do tridente, e mais um estoque com vinte e cinco flechas, já que boa parte das minhas se foram com os macacos.

Quando estávamos prestes a sair, ouvimos um grito mudo de Wiress, e logo o canhão indicando sua morte, por Brutus, que estava atrás dela com uma espécie de espada, e antes que alguém pudesse matá-lo ou ele atacar mais um, minha flecha entrou em seu coração, deixando seu corpo cair na água junto ao de Wiress. Não tive tempo para sentir, pois Enobaria lançou um dardo venenoso que passou uivando por meu ouvido, e logo eu mirava nela, mas acertei somente sua canela, perfurando, mas ela saltou na água, desaparecendo, enquanto o ataque continuava, eram flechas, espadas, tridente, socos e pontapés, todos lutando, em busca da própria sobrevivência, mas eu senti que de algum modo todo mundo parecia me dar alguma cobertura, e isso me deixou furiosa.

— Não preciso de proteção! — exclamei, mirando em Cashmere, mas acabei acertando o braço de Gloss, o que foi minimamente satisfatório.

Só que a arena é um jogo de surpresas, e no momento em que estávamos saindo, a Cornucópia girou, e eu só senti meu corpo sendo arremessado para fora pela força, batendo em uma pedra, mas senti a mão da Johanna me segurar. Não foi suficiente. E eu caí na água, já inconsciente.

*

— Desgraçados, malditos, filhos de uma...

— Não fale essas palavras perto de mim — ordenei para Peeta, cobrindo meu rosto com minhas mãos, sentindo o sol das duas ou três da tarde no meu rosto, trazendo-me uma ânsia de vômito gigantesca. Era como se eu tomasse fôlego depois de um século sem respirar, mas nem por isso ousei me mover.

— Oh céus, você acordou! — exclamou, aparecendo em meu campo de visão, com um sorriso enorme. Seus olhos azuis brilhavam.

— E quero acabar com você por estar gritando — rebati, cobrindo a boca, realmente querendo vomitar, de tal modo que o empurrei, sentando-me na areia, tentando puxar ar pelo nariz, e soltar pela boca, quase sendo insuficiente, mas consegui, depois de fazer isso dez vezes. Nã deixei tão claro toda minha fragilidade, nunca fui disso, e não seria agora que eu seria. Apenas me sentei, abraçando minhas pernas, com o rosto entre os joelhos e os olhos fechados.

Peeta de maneira compreensiva vez carinho em minhas costas, sentando-se ao meu lado, só um pouco atrás, colocando seu rosto em meu ombro, acolhendo-me, mas a ele também.

— Peeta— chamei, em um sussurro, quase, abraçando ainda mais minhas pernas, mas não como eu gostaria por completo, só um pouco. — Ainda estou me sentindo enjoada. Vocês tem comida? — perguntei, me sentindo fraca, mas não passando essa imagem. Fiquei de forma ereta, cobrindo os olhos.

— Sim, tem um esquilo e peixe — Peeta disse, com o cenho franzido de pura preocupação, tentando me ler para me ajudar.

— Eu quero frutas, têm? — perguntei, suspirando, dando a indicar que me levantaria, mas ele não deixou, tocando meu ombro com cuidado. — Queria comer alguma fruta.

Mesmo em meio ao inferno, Peeta abriu um sorriso contagiante.

— Sim, várias, mas... se deu conta de que é o seu primeiro desejo? — disse, carinhosamente, divertido, e mesmo dadas circunstâncias, eu mesma desmanchei-me em um sorriso torto, bem pequeno, mas um sorriso, com as bochechas pegando fogo.

— Só quero frutas, Peeta, não comece, por favor — pedi, empurrando-o um pouco.

— Seu desejo — deu ênfase, com um sorriso presunçoso — é uma ordem, milady.

Ri, balançando a cabeça em negativa, sem acreditar no quanto ele mudou completamente meu humor em questão de segundos.

*

Depois de dois dias se recuperando, e apenas mais três baixas, éramos quatorze agora, mesmo depois de mais um ataque que tinha tudo para dar errado, conseguimos sair todos vivos, e infelizmente os carreiristas também, mas com ferimentos significativos.

Beetee então nos chamou, perto do pôr-do-Sol.

— Eu tenho um plano — disse, sério, segurando um rolo enorme de fio bem fino na cor de cobre.

— Fala logo! — Johanna exclamou, irritada. Contive um olhar furioso para ela, pois nós conversamos um pouco, e descobri que na verdade ela é apenas uma pessoa sozinha; os Jogos lhes tiraram mais do que sua paz, tiraram toda sua família também, e todos os que amava em seu Distrito. Descobri isso depois que eu e Finnick fomos enganados por gaios tagarelas, e eu podia ouvir a voz de Gale, Prim e minha mãe, enquanto uma Annie gritava por Finnick, o que foi um divisor de águas em nossa relação, nos tornamos muito mais companheiros, o que está sendo agradável.

— Onde podemos encontrar segurança na selva? — Beetee perguntou, franzindo o cenho para nós, e ajeitou seus óculos no rosto.

— Em lugar algum, a selva é o inferno — Finnick respondeu, revirando os olhos, como se fosse óbvio.

— Exatamente! Mas quem está na praia? — continuou o moreno em sua teoria.

— Nós — dessa vez, Peeta quem respondeu, também com o cenho franzido de concentração, mas parecia estar um pouco mais localizado do que eu.

— Logo, por que eles não vem pra cá? —  perguntou. — Pois nós estamos aqui, armados, e preparados.

Daí ele começou a explicar seu plano, que é basicamente algo simples, criar uma trilha imperceptível com o arame, depois que envolvêssemos na árvore grande, que recebe raios sempre ao meio dia e meia noite. É uma grande oportunidade de eliminarmos com todos os carreiristas de uma só vez, mas uma coisa me enche de aflição: quem será o outro primeiro a morrer?

— Eu apoio — Johanna disse, convicta, mas pude enxergar um pesar em seus olhos. Finnick somente balançou a cabeça em concordância. Peeta disse que sim, e eu disse que concordava também, já que não tinha muitas outras coisas para escolher.

Finnick, Johanna  e Beetee foram comer um pouco do que Haymitch nos enviou, uma cesta farta de pães, doces, até mesmo frutas, vinte e quatro, o que me deixou confusa, assim como Peeta, mas os outros pareciam estar em uma dança e conversa sigilosa, articulando que aquilo é somente para racionarmos, e por causa da escassez de alimentos realmente saudáveis, e é verdade, mas eu não consigo acreditar nisso assim, simplesmente.

Não vivi somente na arena dos Jogos; já enfrentei a vida. E com anos de experiência como caçadora e provedora familiar desde os 12 anos, não posso confiar o bastante em Finnick, Beetee e Johanna, por mais que seja o que eu deseje poder contar com mais alguém, não é um luxo que posso me dar.

— Sei que você não é de muitas palavras, mas ultimamente você tem conseguido ultrapassar esse limite — Peeta falou, um pouco chateado, ficando do meu lado enquanto eu encho uma garrafa – que Finnick fez com seus talentos como um Quatro – com água, depois de ter encontrado um passarinho que dará em um ótimo prato para jantarmos.

— Me dê uma razão para conversar que eu converso — respondi, no mesmo tom de aborrecimento, sem olhá-lo.

— Katniss... — tentou negociar uma conversa.

— Peeta, eu não quero conversar. Saímos de um confronto há pouco tempo, e agora essa ideia louca do Beetee, acha mesmo que eu quero conversar? — perguntei em um tom baixo, assim como ele, virando para ele, sentindo minhas bochechas arderem. Seus olhos azuis são elétricos sob a luz do pôr-do-Sol, refletem toda a luz, mas ainda sim eu não voltei atrás.

O aborrecimento em seu rosto é nítido, assim como raiva, depois de uma paciência que ultrapassa qualquer limite.

— Acha que essa ideia não vai funcionar? — perguntou, suspirando bem fundo, parecendo ficar mais calmo, pegando as coisas que eu tinha em mãos.

— Não, eu acho que isso vai dar completamente certo, por isso digo que o melhor é nós sairmos agora — falei, baixo, disfarçando, enquanto íamos de volta para a praia, mas de olho nas árvores, para não sofrermos mais nenhum ataque, seja de outros tributos como de algum bestante, ainda mais depois que eu quase tive um aborto espontâneo depois de um ataque, onde até os meus ouvidos sangraram, mas Haymitch conseguiu um bom patrocínio, enviando-me remédios. Ou eu e o bebê estaríamos no Doze em um caixão de madeira qualquer.

— Entendo seu ponto de vista, é o mesmo que o meu, mas acho que se sairmos agora, agora, não é vantajoso, pois entraremos na selva, onde os outros tributos estão, e se você se esqueceu, perdeu muito sangue ontem, precisa evitar esse tipo de coisa. Olhe esse corte em seu braço — sinalizou um rasgado de uns cinco centímetros próximo ao meu ombro, coberto com algumas folhas medicinais, onde eu só precisava pressionar contra o machucado, mas não é tão eficiente quanto os remédios da Capital.

— Você sabe que eu consigo me defender sozinha, não sabe? Arco e flecha é um instrumento para distância, vou ficar bem. Minha preocupação... — Sentei-me ao seu lado em uma duna de areia, próximos da água, mas nem tanto, com um metro de distância. — É você.

Ele suspirou, balançando a cabeça, fechando os olhos.

— Tem que parar de pensar em mim, droga, eu já te disse — falou. — Katniss, precisa entender que ninguém precisa de mim. Se eu morrer, e você viver, não haverá quem sinta a minha falta, você sabe disso, morou comigo tempo suficiente para enxergar a quantidade de pessoas que ligam para mim. Agora, se você morrer, e eu viver, não há uma razão que me faça ficar vivo, isso sem contar que sua família precisa de você, seus amigos. O bebê precisa de você. Precisa entender que a morte será a melhor coisa que acontecer comigo se você ficar bem, e voltar para a sua família.

As palavras nunca foram minha especialidade, no entanto, agora se tornou mais ainda, porque não há o que eu possa fazer para discordar. Apenas Haymitch se importa com a vida de Peeta e um punhado de amigos, entre os quais a minha própria irmã e eu estávamos inclusas. Chorariam, mas então voltariam as suas vidas normalmente, mas há uma pessoa que nunca terá consolo suficiente se Peeta morrer, e sofrerá um dano irreparável: eu.

— Eu preciso, Peeta. Eu preciso de você — falei, segurando sua mão, com força, sentindo o pavor tomar conta dos meus batimentos cardíacos de forma intensa, fazendo até meus olhos lacrimejarem, sinalizando o choro que tomaria conta de mim. — Minha vida nunca mais vai ser a mesma sem você.

É difícil para eu abrir meu coração, contar meus sentimentos, ainda mais em rede nacional, mas eu não pensei em mais nada além do meu Garoto do Pão, com olhos azuis inconfundíveis, e um cabelo loiro que me lembra o primeiro dente-de-leão da primavera, junto de seu sorriso.

Minha vida nunca mais será a mesma sem ele, e não há nada que possa fazer isso mudar.

Antes que eu pensasse em mais alguma coisa, ele me beijou, do seu jeito que me fazia querer sorrir. Entreguei-me ao seu gesto de carinho, segurando suas mãos, que tocavam meu rosto, fazendo carinho, com uma gentileza que somente ele é capaz de causar em mim.

Todo meu corpo reagiu, arrepiando-se, e em minha barriga pude sentir o tremor estranho que o bebê faz de vez em quando, mas dessa vez eu nem dei ouvidos, apenas me preocupei no quanto eu podia fazer Peeta sentir o que eu sinto por ele, da cabeça aos pés.

Meu coração batia bem forte, minhas pernas teriam falhado se estivéssemos de pé. Quis, assim como na noite da nossa primeira vez, depois de nos casarmos em segredo na prefeitura do Distrito, continuar, continuar, continuar... até não haver mais como sentirmos mais, até ser o verdadeiro limite.

— Pombinhos, vem comer alguma coisa! — Johanna interrompeu, mantendo distância, sobre uma rocha, com a cesta em seu colo.

— Assim que tivermos a oportunidade de nos separar, a gente sai e foge — Peeta sussurrou, olhando dentro dos meus olhos, passando uma mão pelos meus cabelos, depois de evitar que caísse no meu rosto, tornando aquele momento completamente memorável. O Sol estava em seus últimos suspiros neste dia, mesmo que vá voltar amanhã.

— Tudo bem, fechado.

Depois de o que pareceu um minuto, ele pegou uma ostra, como quem não quer nada, e abriu, mas não dei muita atenção.

— Ah! —  exclamou, arqueando um pouco as sobrancelhas, com um sorriso surpreso. — Para você.

E me entregou, com um sorriso jovial, brincalhão, mas sincero. Olhei para a pérola acinzentada que me dera, colocando na palma da minha mão, com carinho. Este pequeno gesto fez meu coração acelerar, e um sorriso surgir do meu rosto, um sorriso muito difícil de ser visto, completo de toda a gratidão do mundo dentro do meu coração.

— Muito obrigada, Peeta — agradeci, colocando uma mecha de cabelo atrás da orelha, um pouco sem graça por nunca sentir esses momentos vindo, e vi que ele ficou da mesma forma, mas feliz que eu tenha gostado.

Sorriu, torto, trazendo-me para seu colo, como noiva, e eu deixei minha cabeça em seu ombro, com uma mão em seu peito, sentindo as batidas de seu coração, e passei a outra mão por suas costas. Fechei meus olhos, acreditando que amanhã seria um novo dia, e traria outras preocupações, mas temos que viver o agora, pois hoje se chama presente por alguma razão. O amanhã é só uma grande surpresa.

E independente do que venha trazer, boas ou más notícias, tudo vai mudar. Sinto que será para sempre.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

E foi isso, galera! Aí, sério, por mais que eu não peça comentários, os do capítulo anterior foram essenciais para eu ter vontade de vir aqui postar com mais ânimo! OBRIGADA MAIS UMA VEZ PELO TEMPO QUE USARAM PARA DEIXAREM UM COMENTÁRIO! *sorrisão, muito, muito, muito feliz* Vocês são muito importantes!
Ah, galera, estou tentando manter a Katniss dos livros ainda presente aqui, e acho que aqui ela parece estar um pouco mais quebrantada, afinal, está grávida. O que acham sobre isso? Acham que ela pode ficar mais séria, insensível, ou um pouco mais suave? No próximo será o finalzinho da arena + ela no Distrito 13 sem o Peeta, e também já mostrará o parto, acredito eu, não estou absolutamente certa, pois me dei férias desde o dia 09/12, aí agora sim eu posso ficar nisso nos períodos que não estou aprendendo algo sobre o Enem! Estou MUITO ansiosa! ♥ OH! e também quero saber de vocês: como acham que está o andamento das coisas? Fiquei feliz demais por saber que gostaram na narração do último capítulo, e gostaria de saber também o que acham desse, que eu acho que ficou bem mais picotado, já que tem coisas que realmente não podiam faltar, enquanto outras mereciam ao menos serem citadas... ficou confuso em algum momento? Só isso que eu quero saber, porque eu não confio muito em mim para revisar o que eu mesma escrevo, pois acabo pulando muitas coisas!
E foi isso, pessoal! Obrigada por estarem acreditando nisso, espero não decepcioná-los! Até o dia 17, se Deus quiser! Tenham todos uma excelente semana, com muitas alegriassssss!
Ps.: quem puder, poderia me ajudar preenchendo este pequeno formulário? https://docs.google.com/forms/d/e/1FAIpQLSfQVjgLmaaOyfHy2JMWa0CN81DdIesbYLDhXFfmQ9C0Tc2dMw/viewform é para eu criar um blog, e só estou fazendo algumas enquetes para ter mais interação com o pessoal, mas de todos os jeitos, peço desculpas por quem não gosta muito deste tipo de coisa!



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "À Meia-Noite" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.