O cara da sala ao lado escrita por choosefeelpeace


Capítulo 4
Capítulo 3




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Dor de cabeça e tontura. Levo uma das mãos à minha testa enquanto tento voltar ao presente e me lembrar onde estou. Certo. Estou no estúdio do "Louco do bar" e ele continua dormindo. Admiro suas costas livres do edredom, me cobrindo ainda mais e tentando pensar no que fazer depois de tudo.

Eu não tenho um plano e nunca imaginei que acabaria na cama de alguém tão rápido. Minha cabeça tenta me culpar, mas sei que não tem nada errado nisso. Estou solteira e, até onde percebi, ele também. Ambos podemos usar nosso corpo como preferirmos. E apesar do que possa parecer não foi uma vingança. Não mesmo! Eu me senti realmente bem com ele e não lembro qual foi a última vez que me senti assim.

Ainda assim, tem um erro, aqui. Eu menti e menti muito. Tudo bem, eu posso fugir das reuniões fraternais que Rachel e Peter fizerem e não vê-lo nunca mais, mas não posso ficar sustentando essa mentira por muito tempo. Mentir não é minha especialidade, então vou acabar me atropelando com isso, se continuar fingindo. Por outro lado, não conheço esse cara tanto assim. Ele foi gentil e carinhoso comigo, mas ainda seria igual se eu dissesse que menti para ele? Estamos sozinhos, não vou arriscar isso.

Eu preciso ir embora. É isso! Preciso escapar daqui antes que ele me veja. Antes que eu precise seguir com isso. Coloco meus pés para fora da cama e me arrasto, lentamente, recolhendo minha roupa e me vestindo. Pego meus saltos e caminho até a porta quando me lembro que esqueci algo por aqui — a foto que ele me deu. Volto, devagar e revisto o lugar com os olhos. Nada. Acho algumas das fotos que ele tirou, no chão e outras sobre a cômoda, mas a minha... Está embaixo do braço dele!

Resolvo tapar meus olhos e espiar entre os dedos enquanto puxo devagar. Ele se mexe um pouco e eu estremeço, mas continua dormindo. Deu certo! Dou mais uma olhada para aquele rosto que me prende tanta atenção e suspiro antes de ir.

Uma pontada de culpa e tristeza percorrem meu corpo. Eu nunca mais irei vê-lo e se o vir, terei muito à explicar. Nada vai ser igual ao que foi. É uma pena, mas também é o melhor. Se eu tivesse dito a verdade, provavelmente eu decidisse passar mais algumas horas aqui e talvez ele quisesse mais horas, mais dias, mais semanas em uma relação ou coisa parecida. E eu estou pronta para isso? Não.

Quando me metia em algum problema, era bem fácil ligar para Jonathan. Ele sempre tinha a resposta perfeita e cuidava de tudo, mas agora, estou por minha conta, tendo que entender que eu me meti nisso e tenho que sair. Posso até contar para as minhas amigas, mas sei que me repreenderiam e não consigo lidar com isso. Não hoje. Preciso colocar minha cabeça no lugar.
Calço meus sapatos dentro do elevador e saio rápido do prédio, dando uma checada na rua. É claro que não sei onde estou e andar à pé não parece uma opção, então espero um táxi e entro, assim que vejo um, pedindo para me levar para um hostel. Olho minhas economias na carteira e sei que isso acabaria em poucos dias em um hotel comum, dessa cidade, mas eu sou apenas uma e preciso de um lugar simples para ficar. Para quem morava em uma garagem, um hostel é um quarto cinco estrelas. 

Depois de algumas ruas, o taxista pára em um lugar comum e eu logo entro. Um senhor careca com uma barriguinha saliente vem me atender e me oferece um quarto com outras três garotas, mas logo encontra um quarto vazio e eu decido ficar com o mesmo. Don Pancho, o recepcionista, sobe comigo um lance de escada e me mostra o meu novo lugar. Dessa vez, eu tenho uma janela grande, mas dormirei em uma beliche, com um guarda-roupa de frente para mim. As paredes são brancas e cintilantes, muito limpas e claras, que dão a ilusão do ambiente ser maior. É perfeito para mim. Pancho explica que tem uma cozinha compartilhada e isso me deixa animada, porque seria difícil comer em restaurantes o tempo todo. Dou uma gorjeta e ele me deixa sozinha na minha nova casa, ou pelo menos até o apartamento ficar pronto. Sento na cama, tentando absorver minha manhã e decido tomar um banho, o que não foi nada esperto, porque não tinha outra roupa em mãos. Ainda rindo da minha esperteza sem tamanho, liguei para Rach que se propôs à trazer minha mala. A campainha toca pouco tempo depois e não deu tempo sequer de meu cabelo secar. Ela é mesmo a melhor amiga do mundo todo.

 

— Posso saber porque você está morando em uma garagem, outra vez? — Colocou as mãos na cintura, me encarando. Ela sabe que alguma coisa deu errada para mim.

— Privacidade! Para vocês e para mim. — Fechei a porta e apontei para que ela se sentasse na cama.

— Nós estávamos felizes em ter você lá. Pete tinha acabado de ir buscar sua mala no Paul. — Suspirou ao sentar. Seu cabelo preso em coque deixava seu rosto ainda mais sério.

— Eu sinto muito. Prometo que vou passar o dia com vocês e Lola, hoje, só preciso me vestir direito. — Arrisquei um sorriso e me virei para a mala, procurando algo confortável para passar o dia com uma criança e um casal.

— Aconteceu alguma coisa, Anna? Alguma coisa que você não está me contando? — Ela trocou o peso das pernas e apoiou o cotovelo no joelho. — Passou a noite com alguém?

— Sim. — Engoli em seco e fui ao banheiro, me trocar. — Mas foi bom, não deu nada errado! 

— Ah, por isso quer privacidade! — Riu. — Como era o nome dele?

— Não lembro mais... — Voltei para o quarto, vestindo uma camisa de manga comprida preta por baixo de um macacão jeans. — Vamos?

 

Ryan. Eu não esqueceria aquele nome... Mas era hora de começar à fazer isso.

 

•••

 

Depois do dia calmo com Rachel, me livrando da culpa e da ressaca, a Segunda-feira estava pulando nas minhas costas e eu precisava fazer algo útil por mim mesma — tomar café da manhã. Desci aqueles 16 degraus com toda a preguiça do mundo. Pancho comia uma maçã verde, ali na recepção mesmo e me ofereceu, mas recusei.

 

— Bom dia, Pancho, onde fica a cozinha? — Caminhei até sua mesa e peguei um dos jornais à mostra.

— No fim do corredor, é só seguir o cheiro... — Ele fez uma pausa e eu comecei à andar. — Menina, não quero ser intrometido, mas o que você está procurando nesse jornal? Uma pensão mais barata? Móveis? Trabalho?

— Na verdade um trabalho... Eu sempre sonhei em morar por aqui e conseguir um emprego bom, na área que eu gosto, sabe? — Sorri e me sentei em um banco de madeira.

— Qual é a sua área? — Perguntou.

— Eu fiz Comunicação Social e um curso de Jornalismo em New Jersey... — Mordisquei o lábio e voltei à olhar para o jornal.

— Do tipo... Trabalhar para uma revista? — Ele estava muito curioso, desconfiei que ele soubesse de algo bom.

— É o meu sonho! Sempre quis mesmo trabalhar em uma revista. Espera... O que você sabe, Pancho? — Franzi o cenho e ele puxou o jornal da minha mão, circulando, em vermelho, um anúncio.

 

Revista GlamA maior de NY
Contrata: secretária e profissional voltada para a área de publicidade, atuando na parte de editora-chefe.
Envie seu currículo e seja parte dessa oportunidade única!
555-0055

 

Eu o abracei e dei pulinhos, rindo. Não que eu estivesse iludida — sim, eu estava, mas uma oportunidade dessas caindo na minha mão, tão rápido, era o sinal de que eu daria certo por aqui. Subi correndo, atropelando os degraus à minha frente. Precisava cuidar daquela chance o mais rápido possível. Meu cabelo molhado se debatia nas minhas bochechas e eu lutava com ele.

 

— E o café, menina? — Pancho gritou do andar debaixo.

— Não vai dar tempo! — Gritei, antes de fechar a porta do quarto.

 

Revirei minha mala e achei uma calça social com um terninho, ambos brancos e coloquei uma camisa regata preta por baixo. Afinal, isso seria uma entrevista de emprego e não um episódio de Grey's Anatomy. Minhas mãos tremem e eu tento ignorar, para não me sentir pior.

Enquanto caminho rumo à revista, meus pensamentos não me deixam em paz. E se esse emprego não der certo? E se minhas qualificações forem muito baixas para essa proposta? Meus passos começam à ficar lentos e a auto desistir da entrevista, mas eu tento me reanimar. Nada é tão rápido. Rachel chegou aqui e conseguiu um emprego em uma cafeteria, mesmo ela nunca tendo feito algo assim. E foi feliz. Verdadeiramente feliz... 

E eu preciso de qualquer trabalho que me deixe cansada o suficiente para não sair e reencontrar o Louco do bar.

Finalmente cheguei à revista. O interior do piso térreo é decorado em vidro e metal, dando uma visão futurista e o logo grande em uma das paredes, traz o nome Glam em neon pink, o que deixa todo o andar da mesma cor. Aposto que as entrevistas e festas são feitas aqui embaixo. Sorrio, encantada, como se tivesse entrado no castelo da Barbie e depois de falar com a recepcionista, subo para o terceiro andar, onde estão contratando ambos os cargos. Aqui, o branco predomina nas paredes onde não há vidro transparente, mas alguns detalhes contém o mesmo rosa, lá debaixo, mas discreto. Sento e aguardo, agarrando uma pasta de documentos e certificados que preparei ainda em New Jersey, até que uma loira gentil chamou meu nome.
Entrei em uma sala com outra loira, um pouco mais velha, esperando por mim.

 

— Anna Pierce, certo? 

— Isso mesmo.

— Diane Warren. É um prazer. — Estendeu a mão para mim.

— O prazer é meu, Senhora Warren. — Apertei sua mão e coloquei meu currículo na mesa, em seguida.

— Anna, eu tenho uma boa e má notícia para você. — Dizia, ao analisar meu currículo. — A boa é que suas qualificações são ótimas, melhores até do que alguns membros, mas o cargo maior já foi ocupado.

— Oh... — Suspirei e limpei a garganta, disfarçando um sorriso. — Tudo bem, obrigada pelo seu tempo.

— Mas ainda sobrou o cargo de secretária, minha, aliás e aqui damos a oportunidade das pessoas crescerem, quem sabe daqui um tempo você alcance o cargo que pretende? Sei que é difícil, mas fique conosco, Anna. 

— É sério? — Ri, nervosa. — Não existe cargo pequeno, apenas cargo sem uma pessoa disposta. Vai ser um prazer, Senhora Warren!

 

Rapidamente arrumamos os papéis da contratação e eu assinei depressa. Ela logo me disse que tínhamos uma reunião para a pauta dessa quinzena da revista e isso viria em bom momento, porque ela me apresentaria à todos de uma vez só. Se eu estou nervosa? Claro que sim. Totalmente. Com certeza. Socorro!

 

•••

 

Depois de uma breve explicação sobre o meu cargo, fomos pra reunião. A mesa tinha oito lugares e tirando nós duas, mais quatro lugares estavam preenchidos, por duas mulheres e dois homens. O mais jovem sorriu para mim e estendeu a mão, me dando as boas vindas. O mesmo aconteceu com uma garota do cabelo platinado e olhos verdes, a mesma que eu vi mais cedo. Alex e Jennifer, o nome deles.

 

— Onde estão os outros dois? Eu preciso começar! — A Senhora Warren olhou em volta, com os lábios pressionados, descontente.

— Hanna faltou. Está com alguma virose ou coisa parecida, Diane. — Alex respondeu, fazendo careta. — O outro, eu não sei.

— Se é assim, vamos começar. Vocês sabem que numa revista todo o tempo é cronometrado... — Apoiou uma mão na mesa, depois de colocar seu óculos de grau. — Quero que todos deem as boas vindas à Anna Pierce, a minha mais nova e espero que competente, secretária. — Sorriu e as palmas acenderam a sala. Eu corei, mas agradeci cada um. — Ela sabe lidar em muitas áreas da publicidade, então se precisarem da minha garota, eu posso emprestar, vai ser como um estágio para ela.

— Vou explorar bastante e tirar folga mais vezes, durante a semana. — Alex piscou e se espreguiçou na cadeira. A sala riu e Diane estreitou os olhos para ele, fingindo estar irritada.

— Aqui o trabalho é literalmente em grupo, o tempo todo. Vai ser ótimo ter mais uma ajudinha! — Jennifer disse, sorrindo.

— Obrigada. Vai ser um prazer ajudar no que eu puder. É minha primeira vez em um lugar tão grande!

 

Todos trataram de me acalmar e logo a lousa grande e branca começava à ser preenchida. Eu, como boa secretária tomo nota de todas as ideias e copio tudo com rapidez. Certo, parece que estou bem ágil apesar do nervosismo, ponto para mim. Uma das principais matérias da próxima edição era sobre a reforma da loja da Victoria Secrets em New York. As fotos seriam de suma importância, para que o jornalista descrevesse tudo com riqueza de detalhes. Mulheres prezam isso e precisam saber o que encontrar lá, Diane ressaltou.

 

— Onde está o fotógrafo? Eu preciso discutir o mesmo com ele. Ninguém avisou que tinha reunião, hoje? — Ela parecia irritada, agora, mas a irritação foi suportável quando Jennifer interrompeu.

— Eu avisei! Ele estava preso no trânsito. Conseguiu cobrir Ryan Reynolds no aeroporto. Eu posso repassar tudo quando ele chegar. Pode me emprestar suas anotações mais tarde, Anna? — A garota tinha tudo sob controle. Preciso aprender com ela.

— Claro... — Acenei com a cabeça, ainda anotando os últimos tópicos.

 

Barulho de passos ecoavam pelo corredor e pela força, era um homem apressado. O fotógrafo, eu acho. A porta da sala estremeceu e alguém entrou, mas eu não olhei. Não até identificar a voz.

 

— Desculpem a demora, mas deu tudo certo. Ele ainda parou para uma entrevista de rodapé. — Sua voz estava alta e acelerada, seu peito se apertava debaixo de uma camisa preta parcialmente coberta por uma jaqueta marrom. — Regina?

 

Meu peito parou e meu olhar cresceu. Eu só sei olhar para aquele homem, ainda mais bonito que há dois dias que parece não ter esquecido nenhum instante da nossa noite. Não sei o que dizer e nem é momento para isso. Se soubessem como fui mentirosa, certamente seria despedida logo no primeiro dia. Por sorte, Diane pareceu atravessar nossa conversa.

 

— Bom dia, Ryan, fico feliz com essa notícia, mas acho que você cometeu um erro ou se confundiu. Essa é Anna. Anna Pierce, minha nova secretária. E esse é o nosso fotógrafo oficial, Ryan Wentz.

— Anna? Bem... É um prazer. — Seu maxilar estava preso e seus olhos pareciam ainda mais escuros quando estendeu a mão e eu devolvi o aperto de mãos.

 

Ryan se sentou na cadeira à minha frente e me encarou pelo resto da reunião, mesmo quando era a sua vez de falar. 

Raiva? Frustração? Eu não sei o que aqueles olhos querem refletir, mas eu sei que vou ter muito à explicar daqui para frente...


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