30 motivos para odiar Benjamin Lacerda escrita por Huntress


Capítulo 18
02 de julho (sexta-feira) – 18º Defeito


Notas iniciais do capítulo

Olá ♥

Eu sei, não deveria ter feito todo mundo esperar, mas eu gosto muito desse capítulo (não sei exatamente o porquê) e quis revisar para deixá-lo ajeitado. Deu para perceber eu posso ter exagerado e ele acabou ficando meio grandinho, né? Bom, espero que isso não impeça ninguém de ler.

Gente, a história teve seis novos favoritamentos e nós passamos dos 100 reviews! Sério, vocês são demais. Só queria agradecer a cada um que parou sua vida de leitor aficionado de fanfics para deixar um comentário aqui! Obrigada ♥

Um agradecimento especial a MayPotter, Mia, Eduarda Rocha, Giulianna Valadares, Menina Estrela, Lulis, NKIDDO, Vina, karolayne, QUEEN, Coffee, Tatá Ribeiro, Lory Olivert, Frigo e lerdapqsiim pelos reviews ♥

E um agradecimento especial para a NKIDDO que, além de me deixar um review maravilhoso, ainda conseguiu me dar outro presente: uma recomendação ♥ Garota, não pode fazer isso com meu coração, não. Já achei seu comentário uma verdadeira inspiração... Como lidar então com uma recomendação sua? Lembro quando ainda sonhava em ter uma, agora já temos oito! Amei mesmo ♥

Sem mais enrolação, boa leitura ♥

PS: Leiam as notas finais, por favor.



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02 de julho (sexta-feira) – 18º Defeito

A minha cabeça já estava doendo antes mesmo de eu abrir os olhos, mesmo achando isso ser impossível – e olha que o ambiente ao meu redor estava escuro, não podendo culpar a luz. Espreguicei-me na cama, e cocei os olhos, tentando abri-los, mas todo meu corpo lutava contra isso. Estiquei então meus braços e soltei um longo suspiro, que logo foi interrompido quando esbarrei em algo.

E esse algo tinha cabelo, rosto e um braço na minha cintura.

Com a surpresa, abri os olhos rapidamente, lutando contra a tontura momentânea, e tentando entender onde eu estava. Minha testa parecia pulsar pelo esforço de enxergar algo naquele lugar. Olhei então rapidamente embaixo do cobertor e pude perceber que estava usando roupa (algo reconfortante), mas não era a minha fantasia. Assustada e já entrando em pânico, tirei a mão de quem quer que fosse aquela pessoa e me levantei da cama.

Tropeçando e tentando lidar com a tontura que me atingiu, apoiei-me na cama e contei minha respiração, visando melhorar a dor latejante em minha cabeça. Pude perceber então que uma pequena fresta de luz provinha do corredor, já que a porta estava apenas encostada. Sentindo então que conseguiria lidar com a dor, olhei ao redor.

 Havia uma cama grande perdida em um quarto repleto de coisas que me pareciam familiar. Tinha uma estante cheia de livros espalhados e outra preenchida por CDs, uma mesa repleta de cadernos e papéis amassados. Acima disso, na parede, havia uma televisão e, no canto, um quadro magnético com fotos presas por ímãs. A maior e posicionada no centro era de um time de futebol. Arregalando então os olhos ao perceber de onde conhecia aquilo, olhei para a pessoa na cama.

Benjamin.

A parte em mim feliz por ser ele a estar ali foi sucumbida pela outra que não entendia o que eu estava fazendo com meu vizinho. Afastei-me involuntariamente e tropecei em algo volumoso que estava no chão, caindo sobre o criado-mudo e levando à queda dele e do abajur velho de meu vizinho, o que criou o maior estrondo. Coloquei-me de pé, apesar das dores agora pelo corpo, e olhei novamente para a cama, onde um Benjamin completamente assustado estava sentado na cama, seu peito subindo e descendo pela respiração acelerada.  

Ele estava com o cabelo no mesmo estado que via todo dia, comprovando que ele não penteava – o que eu já sabia. Seu rosto estava amassado do jeito que sempre fica quando acorda e ele logo passou a mão sobre os lábios, limpando o que escorria pelo canto da boca. Permiti que um sorriso aparecesse em meu rosto ao perceber que Benjamin baba enquanto dorme – e ao acordar também. Sim, Annabeth estaria orgulhosa, especialmente porque não é mentira.

Ele então virou o rosto para onde eu estava, como se lembrasse de algo, mas não consegui ver sua expressão. Olhei para baixo rapidamente, como se para conferir que eu estava mesmo vestida, e logo vi que usava uma camiseta de Benjamin, que tinha a estampa do Smeagol segurando o anel e dizendo “my precious”. Por baixo, estava com uma bermuda branca e velha que reconheci por ser parte do uniforme do seu time. Quando voltei a encarar meu vizinho, ele fez o mesmo.

Nem Benjamin nem eu nos mexemos. Meu coração pulava como um louco ao mesmo tempo em que alguém parecia estar martelando minha cabeça. Tentando lembrar de qualquer coisa que me desse uma pista do que estava acontecendo, acabei sentindo minha cabeça latejar mais uma vez e fui obrigada a me apoiar na parede. Antes que pudesse piscar, Benjamin já estava parado à minha frente, com a preocupação estampada na cara.

Meu vizinho se aproximou e eu acabei me assustando quando ele tocou em meu braço e, com o choque, fui para trás e bati com a cabeça na parede, o que só piorou minha dor. Ainda fazendo uma careta e acariciando a área machucada, olhei para meu vizinho e pude ver seu rosto bem mais próximo, com aquele sorriso aparecendo em seus lábios. Tentando novamente, segurou em meus pulsos e fez um arrepio partir daquela área e percorrer meu corpo. Antes que pudesse falar algo, Benjamin me ergueu nos braços, carregando-me até a cama e me deitando lá.

— Eu vou buscar seu café da manhã.

Benjamin quase sussurrou isso e abriu a porta, permitindo-me ver que ele vestia apenas a bermuda azul que usava como pijama. Deixou a claridade entrar por um momento até fechar a porta novamente, sem nem esperar uma resposta. Enquanto escutava seus passos cada vez mais distantes no corredor, aguardei enquanto meu coração desacelerava e meu cérebro parecia não desistir de tentar recuperar as memórias perdidas. 

Enterrei meu rosto no travesseiro, tentando liberar minha cabeça de todos os pensamentos, que só pioravam tudo. Minha mente imaginava mil tipos diferentes de rumos que a noite podia ter tomado e por qual motivo eu estaria ali, o que só contribuía para a dor de cabeça constante parecer estar sendo aderida por todo meu corpo.

Pouco tempo depois, Benjamin voltou com alguns pães de queijo, um remédio para enxaqueca e uma xícara de café adoçado que, quando provei, estava com a quantidade exata de açúcar para o meu gosto. Deixou uma fresta maior aberta para o quarto ficar melhor iluminado e eu pudesse comer. Assim que deixou o prato, olhei para a comida e ergui o rosto.

— Não foi você que fez né? – indaguei e ele riu, sentando ao meu lado.

— Você sabe que não – respondeu em um tom de voz baixo e eu assenti. – Minha mãe assou alguns. Por algum motivo, ela nem me deixou chegar perto do forno.

— Renata fez bem então – eu disse e ele sorriu.

— Tina agradeceu pela torta – contou e eu sorri em resposta, começando a comer em seguida, como se aquilo fosse me fazer ignorá-lo ali. Meu interior ainda lidava com o fato de ter acordado na mesma cama que Benjamin e não lembrar do que havia acontecido para que a noite acabasse assim. Com tudo o que andou acontecendo e do que sinto por ele, a situação se agravava.

— Onde está minha fantasia? – perguntei depois de um tempo, enquanto terminava de engolir.

— No banheiro – ele disse, apontando para a porta que levava ao corredor, já que era para lá que ficava o cômodo. – Completamente encharcada – completou e eu franzi o cenho.

— O quê? Por quê? – questionei-o.

— Porque uma garota chamada Lívia decidiu tomar banho de roupa – falou, casualmente, e eu virei para encará-lo. Meu vizinho exibia um sorriso brincalhão. – E ainda arrastou seu amigo Benjamin junto quando ele foi tirá-la de lá.

Eu ri.

— Você está mentindo – afirmei.

— Você não se lembra disso? – perguntou, erguendo uma sobrancelha.

— Para falar a verdade... – comecei. – Eu não lembro de nada.

Ri sozinha por um momento e tomei mais um gole de café, ignorando aquela parte que não encarava isso como algo divertido. Quando olhei para Benjamin novamente, o sorriso já havia sumido de seu rosto e um semblante sério tomou conta de sua feição, enquanto ele parecia pensar. Estranhando um pouco, decidi evitar perguntar qualquer coisa, temendo que tivesse feito algo grave ontem.

— Absolutamente nada? – ergui a cabeça ao escutar sua pergunta, mas não consegui entender sua expressão. Assenti com a cabeça e Benjamin não falou mais nada.

— Agora posso fazer a pergunta que não quer calar? – questionei e ele respondeu que sim. – O que estou fazendo aqui?

— Carol ligou, contando da sua situação. Eu, como um bom amigo, encobri sua aventura dizendo para seus pais que você passaria a noite na minha casa porque estava tão cansada que dormiu aqui mesmo quando veio conversar ontem – explicou, conseguindo sorrir novamente.

Tentei de novo forçar minha memória, mas a dor impediu. Como eu podia ter me esquecido de tanta coisa?

— Achei que não fosse mais meu amigo – comentei, séria, e o sorriso de Benjamin diminuiu.

— E eu sinto muito por ter te feito pensar isso.

Virei o rosto para ele e sorri, recostando minha cabeça em seu ombro enquanto terminava de mastigar. Ele logo apoiou a dele na minha.

— Benjamin?

— Oi – respondeu assim que o chamei e se afastou para poder me olhar. 

— Por que você estava dormindo na mesma cama que eu?

Ele travou por um momento e eu senti sua postura mudar. Pelo canto do olho, vi que engoliu em seco, claramente envergonhado, enquanto os olhos percorriam o quarto e ele ponderava sua resposta. 

— Porque você pediu ontem – respondeu e eu enrijeci.

— Ah...

Foi só o que saiu da minha boca antes que eu enrubescesse. Não, Lívia. Por quê? Chamar Benjamin para isso? Por que não convidá-lo para um simples bate-papo? E ele ainda aceitar deitar na mesma cama que você?

Como se soubesse no que eu pensava, meu vizinho corou. Seu rosto ficou quase tão vermelho quanto o meu. Aquele formigamento que se iniciava na parte de trás da minha cabeça sinalizava que uma pontinha minha estava louca para saber se eu poderia ter feito algo que me comprometesse a ponto de constrangê-lo esse tanto. Outra parte temia descobrir que isso pudesse ter  realmente acontecido. 

Como se para salvar ambos desse momento embaraçoso, a porta foi aberta violentamente e eu fechei os olhos quando a luz do corredor clareou o quarto. Assim que me adaptei, pude ver um agitado garoto de cabelos loiros, que esbanjava um sorriso divertido e segurava uma xícara com os dizeres #1 Villain na mão esquerda.

— E aí, gente? – Daniel cumprimentou.

— Por que está gritando? – perguntei, fazendo uma careta, e os dois riram.

— Parabéns pela sua primeira ressaca, Lívia – ele disse, jogando-se na cama. – E que venham as próximas – bateu levemente sua xícara na minha, como se fizesse um brinde, e recebeu uma repreensão de Benjamin com o olhar. – Como foi a noitada?

Revirei os olhos.

— Você quer mesmo que eu piore minha dor de cabeça tentando responder? – rebati e ele sorriu.

— É que eu já me divirto com a Lívia normal – explicou. – Mas ri muito com a Lívia bêbada quando fui buscá-la ontem.

Engasguei com o café e comecei a tossir. Daniel se afastou, rindo, mostrando-se muito à vontade e estranhamente feliz, enquanto Benjamin batia em minhas costas para me ajudar.

— Você foi me buscar? – questionei e ele olhou para Benjamin, claramente não entendendo minha reação. – Então eu repito minha pergunta: o que estou fazendo aqui?

— Eu fui junto, te trouxe para cá e dormi aqui – Daniel esclareceu. – E pelo jeito você não lembra de nada – percebeu e eu confirmei com a cabeça. Para minha surpresa, seu sorriso aumentou e ele encarou Benjamin. – Oh, Lívia, como não pode se lembrar dos melhores momentos da festa?

— Por favor, diga que não falei nada constrangedor – pedi, temendo que tenha ficado sem papas na língua ontem e dito alguma coisa relacionada a Benjamin e meus sentimentos. Já não basta tê-lo chamado para deitar em sua cama comigo.

Daniel riu.

— Na festa, não – disse o loiro. – E mesmo se tivesse, todos estavam muito ocupados com o showzinho de Benjamin para se preocupar.

— Show? – indaguei, franzindo o cenho. – Como assim?

— Você não reparou no presentinho que Ben ganhou? – perguntou, apontando para área abaixo de seu próprio olho com o dedo, mas indicando o melhor amigo com o olhar. Virei-me então para Benjamin, que parecia disposto a matar Daniel. Abaixo do olho direito dele, um tom arroxeado aparecia, mesclado com pontos um tanto amarelados e escuros.

— Meu Deus, o que aconteceu? – perguntei, exasperada, já erguendo a mão e tocando aquela área, o que fez uma careta de dor surgir no rosto de meu vizinho. Daniel ria, claramente se divertindo.

— Acho que Ben quis improvisar uma fantasia e decidiu incorporar um lutador de UFC – brincou e caiu na risada sozinho. – Você tinha que ver, Lívia. Foi soco para tudo quanto é lado. Eu tive que entrar também, acredita?

— Mas por que vocês socaram alguém? – indaguei, ainda chocada.

— Não socamos alguém — Daniel falou. – Quer dizer, Benjamin socou aquele cara que estava perto de você e outros três apareceram para defender o amigo. Aí começou a pancadaria.

— Você bateu no Otávio? – perguntei para meu vizinho.

— Você conhece esse cara? – ele rebateu, indignado.

— Eu estava sentada com ele, não estava? Qual o problema de conversar com alguém numa festa?

— Você o conheceu na festa, Lívia! – exclamou. – Já parou para pensar nas intenções dele? Você aceitou bebidas daqueles caras.

— Eu peguei bebida também - comentei, tentando dizer que sabia o que estava fazendo. 

— Ah! – fingiu considerar. – E acha que esse seu comentário melhora alguma coisa?

— Vocês querem privacidade? – Daniel se intrometeu, apoiando o rosto nas mãos, como se aquilo o divertisse. Balançava as pernas, os olhos castanhos brilhando, como se estivesse assistindo o mais novo capítulo de sua série favorita.

— Cala a boca, Daniel – Benjamin disse. – Sério, Lívia, como você pôde?

— Como eu pude o quê? Tentar me divertir?

— Não – respondeu. – Esquecer que existe diferença entre diversão e imprudência.

Aquilo me pegou de jeito e eu torci o nariz para ele, que não desviava o olhar de mim. Era sempre assim. Quem desistia de encarar parecia ser considerado o perdedor na discussão. O que ele disse fazia sentido, mas nunca admitiria aquilo, especialmente depois de tudo que ele fez.

— Eu não pedi para você ir me buscar – falei, séria.

— Estava ocupada demais com o Otávio, né? – indagou, jogando todo o desprezo no nome.

— Ok, ok, acho que já brigaram o suficiente, certo? – Daniel disse, gesticulando. – Não precisamos de mais UFC.

— Bem lembrado – falei para Daniel, mas logo me voltei para meu vizinho. – Precisava fazer toda uma cena e bater no garoto?

— Você o está defendendo sem nem saber o que ele fez! – afirmou, incrédulo.

— Ei, parou! – Daniel interrompeu. – Caramba, vocês não passam um dia em paz?

Nem eu nem Benjamin desviamos o olhar.

— O que posso fazer? – indaguei, dando de ombros. – Muitas emoções envolvidas.

Especialmente as minhas.

— Bom... Vamos mudar de assunto – Daniel falou, tentando deixar o clima mais ameno, e eu decidi desviar logo o olhar. Não insistiria com Benjamin. – Contei que você fez uns comentários muito engraçados sobre nós dois?

— Não – respondi.

— E que nos elogiou?

— Não.

— E que nos explicou quem é Protótipo de Barbie?

Meu sangue gelou ao ouvir isso e eu arregalei os olhos. Senti minha face se aquecer e eu abaixei o rosto. Lembre-me de nunca mais beber, Diário. O que Benjamin estaria pensando de mim agora? Saber que não me dou bem com Mariana ele já sabe, mas isso?

— Então eu realmente não quero recuperar a memória desse período sombrio da minha vida – comentei.

Benjamin estava calado e apenas observava aquilo, parecendo pensar em muitas coisas ao mesmo tempo. Daniel, por outro lado, encarava aquela cena de forma divertida e não tirava o sorriso do rosto.

— Se quiser saber minha opinião, eu adorei – falou o loiro. – Até coloquei como contato do celular.

Por um segundo, pude vê-lo encarar disfarçadamente Benjamin pelo canto do olho. Meu coração pulou e eu franzi o cenho, tentando lembrar se, por um acaso, eu teria mostrado as mensagens de Mariana. Mas Benjamin já estaria tirando satisfações e, provavelmente, teria terminado com a Barbie. Era o que eu esperava, pelo menos.

Para disfarçar, peguei a xícara de café e tomei um gole.

— Legal.

Assim que dei minha resposta, Daniel olhou para Benjamin de novo e, dessa vez, eu olhei junto. Infelizmente, os dois logo disfarçaram. Analisei-os, variando entre olhar para meu vizinho e o loiro, tentando entender o que estava acontecendo ali.

— Mas não precisava, era só uma brincadeira – complementei.

Daniel não insistiu mais e mudou de assunto, começando a conversar com meu vizinho e a provocá-lo sobre o soco. Eu me deitei, sentindo minha cabeça melhorar a cada minuto que passava, o que já criava uma pontinha de esperança em mim que acreditava ser capaz de lembrar de tudo.

Benjamin saiu depois de um tempo para avisar minha mãe que eu iria almoçar ali e me deixou sozinha com Daniel. Achei que ele ia soltar um comentário ou uma pergunta, e eu já estava prestes a fazer algumas, mas ele se pôs de pé e disse que ia buscar um remédio para ajudar com a ressaca. 

Apesar de eu já ter tomado um.

Mesmo estranhando aquilo, não perguntei nada e esperei que retornassem. Até dar a hora de almoçarmos, ficamos no quarto de Benjamin mesmo, apesar de toda bagunça – e do colchão no qual eu havia tropeçado, que ocupava boa parte do chão.

Já na hora de comer, sentei-me ao lado de Tina e na diagonal de Renata, que estava na ponta extrema, em frente ao seu marido, que ocupava a outra. Benjamin estava à minha frente e ao lado de Daniel. Serviram macarrão com almôndega ao molho de tomate e estava muito bom, exceto que os dois a minha frente comiam que nem canibais, colocando uma quantidade enorme de massa na boca e sujavam o rosto todo com o molho que respingava. Isso afetava meu apetite.

— Por acaso vocês já ouviram falar de uma coisa chamada guardanapo? – perguntei de forma sarcástica e os dois pararam para me encarar, revirando os olhos quase ao mesmo tempo. Sorri e todos os outros na mesa acompanharam. Renata estendeu um guardanapo para cada e eles pegaram de má vontade.

— Então, Lívia, está tudo combinado? – Marcos, o pai de Benjamin, perguntou. Eu franzi o cenho.

— O que está combinado? – indaguei e voltei a comer. O Sr. e a Sra. Lacerda se entreolharam e encaram o filho, que já tinha uma careta de descontentamento no rosto.

— Benjamin, não convidou a Lívia? – o pai dele perguntou e eu ergui o olhar de meu prato ao ouvir meu nome de novo. Senti um aperto em meu peito ao pensar que aquela situação da reunião de amigos de Benjamin se repetiria. Meu vizinho terminou de mastigar e respondeu em seguida.

— Não tive tempo essa semana – respondeu sem tirar os olhos de mim para que eu entendesse o que ele quis dizer.

Benjamin não teve tempo porque não estávamos nos falando, obviamente.

— Ah, não, Benjamin! – Renata exclamou. – Precisávamos avisar com antecedência. E se Carla não deixar? 

— A Carla vai deixar, mãe – meu vizinho reforçou. – Mesmo a gente pedindo em cima da hora – completou.

— Deixar o quê? – indaguei.

— Nós vamos depois de amanhã para uma casa de praia que alugamos e passaremos uns cinco dias lá – Renata contou. – E eu pedi para Benjamin te convidar já tem uma semana! – adicionou, encarando o filho com um olhar de desaprovação.

— Eu queria ir... – Tina deixou escapar ao meu lado.

— Mas já combinamos que você vai ficar com suas primas, Valentina – seu pai comentou e ela bufou. – Além do mais, o que você faria no meio de tanto adolescente?

Engasguei com o macarrão.  

— Que adolescentes? – perguntei assim que me recuperei.

— Benjamin chamou um grupo de amigos da escola. Eles vêm domingo, depois do almoço, e vamos todos juntos.

Ergui a sobrancelha e assenti, como se considerasse. Internamente, porém, já gritava com todas as forças que não ia nem amarrada. Se antes estava até pensando em ir, queria ver me convencerem depois dessa nova informação.

— Então deixa para uma próxima – comentei, dando de ombros.

— Por quê?

Foi Benjamin quem perguntou.

— Porque... – porque não quero conviver cinco dias com sua namorada e com um bando de gente com quem não converso. — Porque eu sou sua única amiga fora da escola que vai. Não conheço muito bem seus amigos, exceto Daniel.

O loiro piscou para mim.

— Por enquanto, né? – Tina disse e eu virei-me para repreendê-la com o olhar. Ela tampou a boca, mas já tinha dito o suficiente para todos na mesa me encararem, surpresos.

— Como assim? – Daniel perguntou para a irmã de Benjamin, que me olhou e logo balançou negativamente a cabeça para o garoto. Daniel ficou um tempo calado, trabalhando algo em sua mente.

— Lívia... O que exatamente você foi fazer segunda-feira lá na escola?

Pronto. Ele havia feito a pergunta que eu menos queria ouvir.

— Lívia foi na escola de vocês? – Renata perguntou e os dois assentiram antes de se virarem para mim e aguardarem silenciosamente uma resposta. Respirei fundo e expliquei.

— Minha mãe está olhando escolas para mim porque quer me tirar da que estou – comecei. – Quando me buscou na segunda-feira, ela decidiu fazer uma surpresa e me levou para conhecer a escola de Benjamin.

Daniel abriu um enorme sorriso que alcançava seus olhos. Benjamin, por outro lado, engoliu em seco enquanto encarava o nada, perdido em pensamentos.

— E o que achou da escola, Lívia? – Marcos perguntou.

— Tirando a tonelada de lírios na secretaria, o resto é ótimo – falei, dando de ombros e causando risadas de todos na mesa, exceto em Daniel, que me encarava com o cenho franzido.

— O que você tem contra os lírios? – ele perguntou.

— Lívia é alérgica a eles – Benjamin respondeu por mim.

— Ah, sim – Daniel disse. – Mas se os lírios forem as únicas coisas que estão te impedindo de estudar com a gente, eu e o Ben invadimos e jogamos todos fora, não é? – indagou para o amigo, cutucando-o.

Benjamin deu um sorriso que me pareceu forçado, ou ele apenas estava com a boca cheia de almôndegas. Eu ri para o loiro, ignorando a reação de meu vizinho. Não é só por causa deles, era o que queria responder. Imagina ter que ver Mariana e Benjamin juntos todo dia e ser obrigada a aturá-la lá também? Estremeci. Minha mãe não me levou para ver nenhuma outra escola então estava fazendo pesquisas na internet por conta própria. Qualquer outra estava valendo.

Depois de almoçarmos, Renata e Marcos foram levar Tina para a casa dos tios. Despedi-me com um abraço antes de ela sair, os olhos demonstrando sua tristeza e acompanhando um biquinho. Assim que o carro sumiu de meu campo de visão, voltei para dentro e me juntei a Daniel e Benjamin, que já começavam uma partida no videogame.

— Ah, Lívia, a gente conheceu sua amiga ontem – Daniel comentou depois de um tempo. – Carol, certo? – indagou e eu assenti. – Ela pareceu legal.

— Não esqueça que o Vinícius estava lá também, Daniel – Benjamin reforçou, não deixando de exagerar no escárnio ao mencionar o nome do garoto, mas conseguindo permanecer com o rosto sério. O loiro espiou o amigo pelo canto do olho, tentando disfarçar. Eu, por outro lado, encarei-o abertamente.

— Algum problema com isso?

— Não – ele respondeu, os olhos ainda na televisão. – Fora o fato de ele ter deixado isso tudo acontecer.

Eu ri, sem humor.

— Você realmente vai jogar a culpa nele? – indaguei e Benjamin teve a cara de pau de dar de ombros. – Só ele é culpado?

— Claro que não, a maior parte é culpa sua mesmo – ele afirmou. – Só estou comentando – disse, cínico.

— Pois não precisava comentar algo assim – reforcei. – Vinícius é um cavalheiro.

Benjamin riu, balançando a cabeça.

— Cavalheiro ao ponto de acompanhar uma garota em uma festa, mas não de impedi-la de fazer besteira – comentou sem nem desviar a atenção da partida, o oposto do que Daniel fazia.  

— E você acha o quê? Acha que se ele não estivesse lá teria mudado alguma coisa?

— Não – falou. – Acho que se eu estivesse lá teria mudado alguma coisa. Tudo isso não teria acontecido. Se tivesse me chamado...

— O quê? Ia tentar estragar essa festa também? – rebati, fazendo referência à invasão do meu encontro. Benjamin trincou o maxilar, mas não desviou a atenção do jogo.

— Você ainda teima em lembrar disso – disse durante um suspiro, como se aquilo o entediasse.

— Na verdade, teimo, sim – comentei. – E não te chamei porque você vem se saindo um completo idiota esses dias.

— Diz a garota que jogou água e ovo na cabeça da minha namorada. Devia estar tentando fazer um bolo – falou baixo, mas eu ainda pude ouvir. Coloquei-me de pé, já pronta para começar a gritar com Benjamin.

— Ei, ei, ei! Controlem seus hormônios, por favor. Caramba! – Daniel berrou. – Que merda! Vocês mal voltam a se falar e já retornam com as malditas brigas!

Bufei. Benjamin não expressou nada.

— Não vou à droga de viagem nenhuma – notifiquei e deixei a sala, sentindo meu sangue ferver de raiva. Cerrei os punhos enquanto avançava até a porta.

— Lívia, espera! – foi Daniel quem me chamou, pouco antes de aparecer em meu campo de visão. – Por favor, não vá para casa ainda.

— Por que não? Não é como se eu fosse bem-vinda aqui – eu disse, alto o suficiente para meu vizinho escutar.

— Olha, Ben está estressado, ok? Você não sabe o que a noite de ontem fez com ele – explicou, a voz agora quase em um sussurro.

— Ele está assim por causa de um soco? – perguntei, irritada, não escondendo meu escárnio.

— Digamos que não tenha sido só um – comentou baixo.

Franzi o cenho.

— Como assim?

Daniel abriu a boca para falar, mas parou ao desviar o olhar para algo atrás de mim. Poucos segundos depois, escutei passos e me virei naquela direção, vendo Benjamin passar reto e ir até a geladeira, retirando meu tupperware e o abrindo. Colocou alguns pratos na mesa e logo se serviu. Antes que me desse conta, Daniel já se afastara e estava indo comer.

— Caramba! – Daniel soltou depois de engolir um pedaço. – Me lembre de parabenizar sua mãe por essa torta.

— Não foi ela que fez – meu vizinho disse, seco, e apontou com os olhos para mim, que colocava um pedaço do meu doce em um prato raso.

— Lívia... – Daniel chamou. – Como você ainda está solteira?

Gargalhei e Daniel sorriu. Benjamin nem levantou o olhar do prato.

— Talvez eu esteja esperando o garoto certo – falei, em um tom de brincadeira, sentando-me em seguida sem parar de encarar meu prato.

Ou talvez eu esteja esperando o garoto certo perceber que ele é o garoto certo.

Daniel então se colocou de pé, limpou as mãos na bermuda e estendeu uma delas para mim. Franzi o cenho e pude ver meu vizinho espiar.

— Prazer – apertei sua mão, entrando na brincadeira. – Garoto Certo.

Gargalhei de novo e Daniel riu junto. Pude ver Benjamin bufar e balançar negativamente a cabeça, mas acabou por não comentar nada. Começamos então a comer e mergulhamos em um silêncio que durou por um bom tempo.

— Lívia, viaje com a gente.

Ergui os olhos para o dono da voz. Daniel fez o mesmo.

— Não – respondi, seca.

— Por favor – Benjamin pediu.

Desviei o olhar para Daniel. Ele deu um sorrisinho encorajador. Suspirei.

— Não sei se merece minha presença lá – comentei.

— O que quer que eu faça?

— Eu quero um pedido de desculpas – avisei, cruzando os braços. – Um bem bonito.

Benjamin revirou os olhos, um sorriso quase aparecendo no canto de sua boca, e se virou para Daniel, que já sorria. Meu vizinho então ficou de pé, deu a volta na mesa e parou ao meu lado. Virei-me para ele, que estendeu suas mãos e segurou as minhas, fazendo um formigamento agradável surgir ali. Em seguida, ajoelhou-se e olhou-me nos olhos, as orbes verdes me fazendo prender o ar quase que inconscientemente. Senti então seus polegares passarem delicadamente por meus dedos, o que pareceu criar uma corrente elétrica que percorria meu corpo incansavelmente.

— Lívia, aqui estou eu, implorando para que me desculpe – começou. – Porque a única coisa que quero é minha melhor amiga de volta.

Eu sorri. A única coisa que quero é meu melhor amigo de volta também – mas sem a namorada como brinde.

— Está perdoado, Benjamin.

Daniel bateu palmas e gritou de onde estava, fazendo-me revirar os olhos. Quando encarei Benjamin novamente, ele, sem desviar o olhar do meu, encostou levemente os lábios na minha mão antes de soltar ambas e voltar para seu lugar. As borboletas em meu estômago pareceram dar uma festa e eu desviei meu rosto para o prato, não querendo que nenhum deles me visse vermelha como um tomate.

— Então você vai viajar mesmo com a gente, Lívia? É certeza? – o loiro perguntou.

— Isso só minha mãe pode responder – eu disse e, antes que conseguisse falar outra coisa, pude vê-los se entreolharem pouco antes de se levantarem rapidamente e correrem em direção à porta.

Rindo, segui-os e encontrei ambos batendo na porta de minha casa. Parei na metade do caminho de pedra do meu jardim e observei dali enquanto os dois esperavam a porta ser aberta. Quando minha mãe apareceu, sorriu para os dois, não sem enviar um olhar cheio de significado para Daniel (sim, ela o encontrou no maldito facebook e, infelizmente, o reconheceu). Eles começaram a conversar com minha mãe, que ria e ficava séria cada vez que completavam uma frase.

— Nós te imploramos, Carla – Daniel falou e Benjamin se ajoelhou, enquanto o amigo imitava o gesto. Minha mãe sorriu e seu olhar se cruzou com o meu por um momento. Apesar de estar bem com Benjamin, a ideia de viajar com ele e Mariana não me era agradável. Comecei a balançar negativamente a cabeça e a fazer o gesto de “não” com os indicadores.

— Claro que ela vai! – Carla exclamou, ignorando meus pedidos e me mandando um olhar reprovador. Bati a mão na testa e vi os garotos se abraçarem, comemorando. – Agora, com licença, que eu tenho uma casa para terminar de limpar – completou. – E, Lívia, hoje você dorme aqui, viu?

Assim que fechou a porta, segui com os meninos de volta para a casa de Benjamin, onde terminamos de comer. Ficamos conversando e, quando meu vizinho foi levar seu prato para a pia, Daniel aproveitou a deixa e me chamou.

— Olha que legal, Lívia! – começou, trabalhando seu dom de ator. – Você vai passar cinco dias coladinha com sua melhor amiga, a Mari! – comemorou, esbanjando ironia e eu ri de mentira.

— Repita isso mais uma vez e eu arranco seus testículos com esse garfo – falei, apontando-o ameaçadoramente em sua direção. Daniel então ergueu os braços, fingindo uma rendição, mas logo caiu na risada e eu o acompanhei. Benjamin, ao nos ver, perguntou o que estava acontecendo, mas o loiro e eu apenas trocamos um olhar significativo, sem explicar nada para meu vizinho.

Passamos a tarde jogando videogame até eu decidir ir para casa com a desculpa de arrumar minha mala. Minha mãe veio perguntar por que eu não queria ir e eu disse que não era nada de mais, afirmando que viajaria sim. Depois que ela saiu do meu quarto, peguei meu diário e sentei-me na cama, onde estou até agora. Minha mão está doendo de tanto escrever já que tive que escrever o dia de ontem e de hoje, até porque quinta-feira eu estava com muito álcool na cabeça para conseguir segurar um mísero lápis.

Lívia.

18º Defeito: Benjamin baba enquanto dorme 
— e ao acordar também.


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Notas finais do capítulo

Só eu fico louca por um diário do Benjamin quando acontece umas coisas assim?

Então, é o seguinte: o próximo capítulo é o tão esperado baile (sim, podem soltar foguetes Kkkkkkkk) e ficou com quase oito mil palavras! Pois é, para verem como eu caprichei! Por isso, preciso que me digam se querem que eu divida em dois ou mande ver assim mesmo. Quem não quiser escrever muito, é só colocar "sim, eu quero que você divida" ou "Não, manda tudo que eu leio".

Até o próximo ♥