30 motivos para odiar Benjamin Lacerda escrita por Huntress


Capítulo 16
30 de junho (quarta-feira) – 16º Defeito


Notas iniciais do capítulo

Olá, pessoas, como vão?
Preparem-se, porque aqui vai um recado bem longo. Vamos dividir essas notas iniciais em duas partes: a com assunto bom e assunto ruim. Qual vocês escolhem?

Bom, eu vou começar com a ruim mesmo, me processem ahsuahsuahs

Para quem comentou há menos tempo, pôde ver que eu demorei mais que o normal para responder. Infelizmente, aconteceu um problema com meu notebook e ele não ligava. Como foi pro conserto, pensei que logo arrumaria, mas então descubro que o problema foi com o HD e afetou a memória. Não só o 30mpoBL está lá, como todos os meus outros projetos. Isso não só afetou meu ânimo, com o possível risco de perder tudo, mas eu ainda mantinha minha conta aqui logada nele e não lembrava a senha. Resultado: revirei tudo procurando onde tinha anotado.

"Huntress, quer dizer que você vai parar de postar?" Não, meus caros amigos. Felizmente, eu tinha um arquivo dessa história no meu e-mail, mas é a primeira versão e está sem quase nenhuma das mudanças que eu fiz. Exatamente por isso, talvez eu leve mais tempo para postar. Vou dar o meu melhor para não prejudicar vocês.

Agora, a parte boa:
A história teve QUATRO recomendações. QUATRO. Sério, vocês combinaram essa tentativa de acabar com meu coração ou foi pura coincidência? Eu vi só uma notificação de recomendação e já estava pulando de alegria... Imagina minha reação quando vi que tinha outras três! As pessoas vão achar que eu pedi para vocês recomendarem...

Mas quem quiser fazer que nem elas, fique à vontade! ahsuahsuahsuahs

Brincadeiras à parte, eu ganhei quatro incentivos para não deixar a história de lado enquanto não estou com o arquivo original e só tenho a agradecer ♥

— Tatá, minha vizinha de cidade, você já tinha me dado a honra de ganhar cada review maravilhoso que eu nem esperava algo mais perfeito. O que aconteceu foi um enorme sorriso surgir em meu rosto ao terminar de ler tudo. Obrigada mesmo ♥

— Giulianna Valadares, que conheceu a história lá pras 2h da manhã e me deu a chance de ganhar uma leitora especial e uma recomendação sensacional. Minha querida adepta do Team Daniel, quero te agradecer do fundo do coração ♥

— Agente Zero, com esse nome invejável, ainda me faz uma recomendação dessas e quer que eu não me torne uma fã? Sério, onde você estava antes de aparecer por aqui? Como você mesmo disse, foi uma recomendação pequena, mas significativa... E põe significativa nisso! Amei sua recomendação ♥

— Por último, mas não menos importante, N E S O. Não sei nem por onde começar a agradecer. É possível um ser humano se apaixonar por uma recomendação? Bom, normal não pode ser, mas foi o que aconteceu. Como explicar que meu sorriso aumentava a cada linha terminada? Para quem não está entendendo, ela listou 30 motivos para ler minha história! Tem como ser melhor? Com certeza não. AMEI ♥

Para terminar, quero agradecer a May Winsleston, Menina Estrela, Vina, N E S O, Coffee, Agente Zero, MayPotter, Karolayne, Tatá Ribeiro, Giulianna Valadares, QUEEN e Eduarda Rocha pelos reviews ♥

Depois disso tudo, só tenho a desejar uma boa leitura para quem leu até aqui.



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30 de junho (quarta-feira) – 16º Defeito

Vinícius voltou à escola hoje, Diário.

Assim que entrei no pátio e o vi conversando com Carol, apertei a alça de minha mochila para expressar meu nervosismo, já que ele não poderia transparecer em qualquer outro momento. Ter que encarar aquele momento foi uma das situações mais difíceis da minha vida, isso se não considerarmos as enrascadas em que meu melhor amigo me meteu.

Para você poder entender as situações que entrei com meu vizinho, tenho que deixar claro que Benjamin nunca recusa uma aposta ou desafio. Infelizmente. Parece que dizer “eu duvido que você...” é igual a mexer com sua honra ou masculinidade, o que nunca vou entender, até porque algumas apostas foram muito bizarras e não provavam nada além do péssimo costume de Benjamin.

Começando pelo começo, algumas semanas antes de conhecê-lo, houve uma sequência de ligações para a polícia na minha rua porque alguém estava tocando a campainha de cada uma das casas e saindo correndo logo em seguida, deixando as pessoas que abriam a porta muito desconfortáveis. Depois que conheci Benjamin e contei sobre o incidente, ele caiu na risada e disse que seus amigos tinham ido dormir em casa e apostaram que ele não conseguiria tocar todas as campainhas em meia hora, mas ele conseguiu.

Um mês depois dessa conversa, recebi a ligação de uma Renata furiosa e, ao mesmo tempo, preocupada, porque o hospital ligou dizendo que seu filho quebrou o braço direito. Ela não poderia sair e, como o médico disse que ele estava bem, não interromperia sua reunião por isso, passando lá mais tarde. Claro que eu fiquei desesperada, então nem dei atenção à essa parte, saindo correndo em direção ao ponto de ônibus e entrando afobada no hospital.

Perguntei para a moça da recepção onde era o quarto e ela indicou, assustada com o meu estado de agitação. Segui para o segundo andar usando as escadas e entrei no quarto tão repentinamente que a enfermeira parada ao lado da cama – que depois descobri estar flertando com meu vizinho – tomou um susto. Apoiei-me na parede e respirei pesadamente, enquanto tentava pronunciar alguma palavra para Benjamin, que segurava uma risada.

— Ben... Benjamin... Eu... – comecei a falar, mas não aguentei, jogando-me na poltrona vazia. Meu coque estava uma bagunça e praticamente solto enquanto eu quase pingava suor no chão do quarto. – Só um segundo – pedi depois de um tempo, erguendo o dedo indicador. Ele dispensou a enfermeira e me convidou para sentar com ele. – Como você ganhou isso, Benjamin? – perguntei, apontando para o gesso.

— Isso? Não foi nada – comentou e eu franzi o cenho. – Lucas apostou que eu não conseguiria escalar minha casa pelo lado de fora e eu mostrei que ele estava errado – explicou, completamente descontraído. – Mas, quando cheguei na varanda do quarto dos meus pais, a grade estava enferrujada e soltou, então eu caí.

Levantei-me de supetão e encarei-o, furiosa. Meu vizinho ergueu uma sobrancelha e me acompanhou com o olhar enquanto eu ia em direção ao suporte móvel no qual colocavam bolsas com soro. Felizmente, naquele momento não estava com nenhuma, por isso foi mais fácil erguê-lo. O sorriso de Benjamin morreu e ele engoliu em seco, erguendo o braço sem gesso.

— Lívia... O que está fazendo? – perguntou devagar, temendo o que eu faria a seguir. E ele estava certo em ter medo.

— Eu vim até aqui, desesperada, achando que você tinha sofrido um acidente... – comecei, aproximando-me e adorando ver a cara de pânico de Benjamin. – E você me diz que se machucou por causa de uma merda de aposta?

— Lívia, não foi nada de mais e... – começou, mas parou ao ver que empunhei o suporte como uma arma. – O que vai fazer com isso?

— Eu vou quebrar o braço que sobrou para combinar com o outro! – gritei e me aproximei. Benjamin pegou rapidamente o travesseiro atrás de si e o ergueu, usando-o como um escudo contra mim.

— Enfermeira! – ele gritou e, pouco antes da morena entrar no quarto, eu já tinha colocado o suporte no lugar. Lancei-lhe um último olhar furioso e saí de lá, possessa. Acabou que só voltamos a nos falar quando ele começou a fazer drama dizendo que só não pularia da varanda para quebrar o braço esquerdo se eu o perdoasse.

Alguns meses depois disso, Valentina o desafiou a me jogar na piscina à meia-noite, na virada do ano. Nem preciso dizer que ele realmente fez, é só perguntar para a minha mãe o que ela sentiu ao ver seu melhor vestido, que tinha emprestado para a filha nas festividades, completamente encharcado. Nada feliz, Carla responderia.

No começo do ano, a mãe de Benjamin queria leva-lo para um encontro de mulheres que sua amiga estava organizando e ele me arrastou para lá consigo. Sem o que fazer, desafiei Benjamin a conseguir o telefone de cinco mulheres mais velhas. Menos de meia hora depois, ele estava de volta, mostrando os cinco papéis com os números.

Algumas semanas depois, tínhamos ido ao cinema e estávamos passeando no shopping quando Benjamin me desafiou a vestir uma cueca masculina na loja de departamento que fomos, e eu rebati dizendo que ele teria que usar um vestido.  O resultado? Fomos expulsos da loja e tivemos que pagar pelo vestido roxo e pela boxer vermelha, que estão no meu guarda-roupa até hoje. Fomos enxotados de uma sessão de cinema também após Benjamin jogar o conteúdo do balde de pipoca no casal que se beijava à nossa frente depois eu dizer que duvidava que ele fizesse com que parassem, já que estavam atrapalhando. Não satisfeito com minha incredulidade pelo o que fez, ainda jogou seu refrigerante em mim.

Deu para perceber que, além de nunca dizer não à uma aposta ou desafio, ele nunca perde também.   

Voltando ao dia de hoje, assim que cheguei na escola e vi ao longe Carol conversando com Vinícius, aquele peso em minha consciência dobrou de tamanho. Ele estava bronzeado e contava algo com tanta vivacidade que o sorriso bobo permaneceu no rosto de minha amiga por um bom tempo. Relacionei isso com todas as cenas que vieram à minha cabeça, desde a vermelhidão em seu rosto ao receber um elogio de Vinícius logo no começo da amizade até o brilho nos olhos ao ouvir o convite dele para irem juntos ao baile e logo a culpa de ter beijado o garoto que minha melhor amiga gostava me consumiu. Para piorar, ainda imaginei o quão chateada ficaria se Carol me contasse que beijou Benjamin. Eu ficaria arrasada e com raiva. Minha vontade foi ir lá e me jogar à sua frente, pedindo mil perdões.

Como eu podia ter sido tão cega?

Aproximei-me escondendo minha derrota interna e sorri de leve para os dois. Abracei primeiro Carol e fui depois em direção à Vinícius, que me segurou por um tempo bem mais longo do que o que eu queria, o que é engraçado, pois há algum tempo o que eu mais queria era revê-lo. Senti minha pele queimar, como se o olhar de Carol machucasse mais do que tudo, e não consegui olhar para ela. Vinícius se desculpou por ter sumido e não ter ligado, mas eu nem conseguia olhar para seu rosto, sabendo que Carol estava ali, ouvindo tudo.

— Posso falar com você? – perguntei para Carol assim que Vinícius deu uma pausa. Não estava prestando atenção em nada. Ela assentiu, surpresa, e acenou para Vinícius. Comecei a puxá-la enquanto meu cérebro trabalhava, mas, infelizmente, o sinal tocou, sinalizando o início do primeiro horário e tivemos que subir. Prometi que falaria com ela na saída.

Dito e feito, assim que a última aula acabou, depois que Vinícius já tinha ido embora, esperei Carol se aproximar. Tínhamos acabado de sair da quadra e ela estava colocando seus óculos novamente depois de ter detonado o time adversário na aula de Educação Física. Assim que chegou, puxei-a para um canto e a fiz ficar de frente a mim.

— Carol, por que não me contou? – perguntei em um suspiro triste, deixando a culpa dentro de mim aparecer. Ela franziu o cenho, mas pude ver certa agitação por trás das lentes dos óculos.

— Do que está falando? – indagou e eu respirei fundo antes de continuar.

— Eu vi o jeito que você olha para o Vinícius – admiti em voz baixa apesar de estarmos sozinhas ali. Ela arregalou os olhos, mas logo se recompôs.

— Você não está fazendo o menor sentido, Lívia – disse e ajeitou uma mecha de seu cabelo que estava solta do rabo de cavalo.

— Você sabe que estou – comentei, segurando sua mão. – Por que não me contou? Eu nunca sairia com ele se-

— Por que nunca me contou sobre o Benjamin também?

Num primeiro momento, eu apenas pisquei enquanto meu cérebro processava palavra por palavra do que saíra de sua boca. Ao perceber então o que ela havia dito e o jeito como me encarava, afastei-me e encarei-a. Fiquei boquiaberta por um momento, mas logo engoli em seco, tentando achar o que dizer, já que fui pega desprevenida. De qualquer forma, como ela sabia? Recompondo-me, afirmei:

— Não sei do que está falando. 

Carol riu e cruzou os braços.

— Lívia, você acha mesmo que me engana? – indagou-me. – A única pessoa que não percebe o quanto você gosta do seu vizinho é ele próprio, mas só porque é extremamente lerdo como você destaca toda vez. Eu sei que se der corda, você fala de como ele te irrita, de como ele é chato e de como você nunca o trocaria todo dia, a todo momento.

— Carol... – tentei pronunciar algo, mas eu nem sabia o que dizer. Apenas apertava meu braço como forma de descontar meu nervosismo em alguma coisa. Mordi fortemente o lábio enquanto encarava o chão.

— Sabe por que você não conta? Porque tem medo. Medo de eu contar para ele, medo da minha reação, medo de sua melhor amiga saber que você acha que não tem chance com ele. Certas coisas você gosta de guardar para si e eu entendo, porque também fiz isso.

— Eu... – comecei, mas ela ergueu uma mão, pedindo para que esperasse.

— Da mesma forma que você acredita que Benjamin está fora de seu alcance, eu acredito que Vinícius também esteja fora do meu, porque eu vejo como ele te olha. Conheço esse olhar porque o vejo toda vez que minha melhor amiga cabeça-dura menciona seu vizinho. E você reconheceu também, porque já viu em outras pessoas ou no espelho.

— Carol, eu sinto muito... – falei, sentindo meus olhos marejarem pelo nó em minha garganta. Carol riu, a voz embargada. – Desculpa não ter reparado antes! Ou contado. É só que... – ela sorriu e me abraçou.

— Você e o Benjamin se merecem, sabia? – indagou, brincando, e eu a encarei. -  Dois lerdos... – explicou no meu ouvido e eu sorri, dando-lhe um tapa de brincadeira.

Carol então disse que deveríamos nos sentar e nos explicar. Ficamos ali por um tempo, mas eu deixei que ela contasse sobre suas situações com Vinícius, enquanto eu continuava pedindo desculpa cada vez que ela mencionava o nome dele. Porém, isso só durou até ela não aguentar mais e me dar um tapa no braço dizendo que se eu pedisse desculpa de novo ela faria um colar com meus dentes. Foi o jeito que encontrou de me faze entender que já havia me perdoado.

Carol então teve que ir embora, voltando apenas para confirmar se eu iria mesmo na festa, ao que disse que sim. Reforcei que ela teria de achar uma fantasia e ela sorriu, dizendo que eu não havia escapado de explicar sobre o meu vizinho. Engoli em seco, considerando se eu estava pronta para falar sobre aquilo ou não, afinal, só esse diário sabe sobre tudo. Deixei aquilo pairando no ar. Pouco depois de Carol sair, minha mãe apareceu, pedindo desculpas pela demora e me deixando em casa rapidamente, voltando para seu trabalho enquanto eu ficava na calçada.

Olhei em direção ao sobrado ao lado do meu, suspirando e indagando por que aquela ponta de esperança ainda existia em meu peito, como se Benjamin fosse sair e dizer que tudo aquilo não passava de uma grande aposta e que ele logo voltaria a almoçar comigo, trazendo tudo ao normal. Revirei os olhos para minha ingenuidade e entrei, concentrando em algo que valia à pena: Minha fome. Preparei meu almoço, fazendo uma panela de arroz e assando algumas asas de frango, fritando batata frita para completar.

Apesar de meu estômago roncar de prazer, sentia a comida sem gosto e mastigava sem vontade nenhuma. Meu cérebro me martirizava por não ter percebido os sentimentos de minha melhor amiga e como Carol podia estar tão bem comigo, dando-me uma ótima lição de moral e ainda jogando na minha cara que sabia sobre meus sentimentos sobre Benjamin. Decidi então contar para ela amanhã sobre minha situação atual com meu vizinho, era o certo.

Quem sabe não ganho mais alguém para odiar Mariana comigo?

Sem dever de casa ou interesse em ficar com a cabeça vazia, comecei então a fazer um dos doces que minha avó ensinara para mim, eu merecia. Peguei o livro de receitas da mãe de meu pai, que faleceu ano retrasado, e decidi fazer a torta de chocolate. Cozinhar é um dom que agradeço muito ter herdado. Se você visse o estrago que minha irmã, Raquel, é na cozinha e o quanto ela mente para os namorados dizendo que faz o jantar, quando na verdade compra pronto, você nem acreditaria.

Se você aguarda o dia que eu vá encontrá-la, desista, Diário. Raquel está na fase dos adolescentes que saíram de casa e a última coisa que quer é ver a garota com quem brigava pelo controle ou por ter pegado uma roupa sem permissão. Não que não fôssemos boas irmãs, mas os códigos em nossos cromossomos eram diferentes demais e não entendíamos como podíamos ser parentes e divergir tanto assim. Se sinto falta dela às vezes? Pode-se dizer que sim.

Depois de pegar os ingredientes e misturar seguindo a receita, colocando no forno em seguida, a torta ficou pronta e eu a deixei na geladeira. Joguei meu uniforme sujo de farinha no cesto de roupa suja, torcendo para que minha mãe ficasse tão feliz por ter torta que não ligasse para a sujeira. Subi para meu quarto e me troquei em seguida.

Decidi então procurar no celular por algumas lojas de fantasias para alugar, já que a festa seria amanhã. Fiquei olhando alguns modelos e mandei fotos dos melhores para Carol, como forma de mostrar que eu não ia fugir, e ela começou a fazer o mesmo. Determinada a não deixar para em cima da hora, achei o endereço de uma loja no centro e decidi passar lá à tarde. Tentando ignorar novamente toda a conversa com Carol, peguei um pedaço da torta rapidamente e já estava saindo quando o telefone tocou.

— Lívia? – reconheci a voz de Carla.

— Oi, mãe – cumprimentei-a.

— Preciso que me faça um favor – pediu. – Está ocupada?

— Eu ia comprar uma roupa para a festa – lembrei-a.

— Mas você já não comprou aquele vestido? Eu disse para você provar de novo, Lívia! 

— O da festa à fantasia, mãe – corrigi-a.

— Você vai com aquele garoto? - perguntou.

— Qual?

— Aquele que vai com você na festa do prefeito – explicou.

— Não, mãe, o Daniel não vai.

— Ele tem facebook? — Carla perguntou.

— Eu espero que não – disse baixo.

— O quê?

— Eu disse que acho que não, mãe – comentei.

— Mas eu não o conheço.

— Pois é, mãe, é a vida – respondi. – O que você quer que eu faça?

— Regue as flores do quintal, por favor – ela falou. – E me mostre esse Daniel depois.

Após revirar os olhos e desligar, fui para os fundos da casa e me aproximei do canteiro de minha mãe. Carla ficava assistindo esses programas sobre projetos para a casa e decidiu que teria um lugar para plantar flores. Claro que a responsabilidade caiu em mim, já que ela fica fora o dia inteiro, mas não custa nada ajudar e deixá-la pensar que o canteiro de rosas é só dela.

Benjamin já me deu um buquê uma vez. Foi no fim de dezembro, pouco depois do Natal, quando decidimos ir a um daqueles parques montados e que ficam apenas algumas semanas na cidade. Era mais afastado do centro devido ao tamanho da roda-gigante e não era muito grande, mas dava para o gasto.

A minha família foi mais cedo e Benjamin me fez jurar que não iria em nada sem ele. Não satisfeito, fez questão de demonstrar sua total falta de confiança e me fez conversar com ele o tempo todo apenas para ter certeza de que eu não estaria mentindo. Quando Benjamin já estava saindo de casa, avisei que estaria em frente às barraquinhas de comes e bebes e que o aguardaria ali. Depois de um bom tempo esperando, já ficando impaciente, alguém parou atrás de mim e colocou uma rosa vermelha no meu campo de visão.

Peguei a flor e me virei para encarar Benjamin, que me observava com um sorriso genuíno enquanto eu variava o olhar entre ele e a flor. Meu vizinho usava uma blusa preta de manga longa e jeans claros. O cabelo escuro e bagunçado atrapalhava a visão de seus olhos devido a sua cabeça estar levemente inclinada para frente para poder me olhar direito.

— Sério, Benjamin? Uma flor?

Ele franziu o cenho.

— E qual o problema?

— O problema é que é uma rosa — comentei. – Sabe quão clichê isso é? Nem para ser um buquê! – provoquei-o e deu certo. Benjamin tinha um sorriso brincalhão equilibrado com uma expressão de incredulidade.

— Fique aqui – mandou e me deu as costas.

— Onde está indo? – perguntei um tom mais alto. Ele se voltou e sorriu.

— Estou indo buscar seu buquê.

Aquela parte romântica em mim se derreteu e eu ri. Fiquei balançando o pé enquanto aguardava. Depois de um tempo, reconheci meu vizinho se aproximando com algo escondido atrás de si. Senti meu coração pular de ansiedade e ele riu da minha expressão. Quando se aproximou, mostrou o que trazia.

Era um buquê. De algodão doce.

Naquele momento, não era só a parte romântica em mim que estava derretida.

— Antes que tente não aceitar, quero dizer que não foi barato acabar com a paciência da mulher da barraca e você vai comer tudo nem que tenha cárie – Benjamin disse e logo pegou um pedaço.

Eu abri a boca para rebater, mas a Lívia sarcástica estava ocupada demais admirando aquela imensidão branca com vários palitos presos com um laço vermelho. Apenas sorri para Benjamin, tentando deixar claro como aquilo foi simplesmente perfeito.

— Só não te abraço porque meu buquê vai grudar em você – respondi depois de um tempo. Meu vizinho sorriu e nós logo começamos a andar pelo parque enquanto eu ia comendo aos poucos.

— Então... – Benjamin chamou. – Melhor que um buquê de rosas?

Eu me virei para ele. Sorri em seguida.

— Muito melhor que um buquê de rosas.

Quando terminei de regar as flores, entrei em casa ainda lembrando desse dia. Quantas vezes Benjamin já sacrificou algo apenas para me fazer sorrir? Como eu queria que isso continuasse a acontecer. Sorri e juntei minhas coisas, pegando mais um pedaço de torta e saindo de casa, tentando conciliar a parte de mim que lembrava de Benjamin e a parte que ficava pensando em Carol.

Isso até ver Benjamin e Mariana se beijando.

Na frente da minha casa.

Lembrete: Usar a mangueira no jardim frontal caso a saliva de algum deles tenha caído.

O choque inicial foi inevitável e eu travei no lugar, sentindo a torta ganhar um sabor novo e sem graça em minha boca. Aquele aperto em meu peito que misturava raiva, incredulidade e ciúmes surgiu ao ver os dois sentados e trocando aqueles perdigotos no meu gramado. Respirando fundo e ignorando aquela parte bondosa de mim, segui até o temporizador do irrigador automático e regulei para a próxima sequência de jatos acontecesse dali dois minutos. Satisfeita, logo me recompus e passei direto, empinando o nariz para os dois e seguindo para o ponto de ônibus.

Ao entrar no automóvel e pagar o cobrador, sentei-me no fundo, apertando fortemente na pilastra e tentando conter minha vontade de parar no caminho e comprar uma arma para planejar a morte daqueles dois. Iria feliz para a cadeia. Só não faço pelo meu amor aos integrantes da família Lacerda (exceto o filho mais velho), porque o dono da loja de armas nunca venderia uma para mim e porque esperava que aquele banho que levariam já os castigasse.

Ao chegar na loja de fantasias, fui atendida por uma mulher negra de cabelos longos e cacheados chamada Amanda, que me mostrou os vestidos que para ela eram os mais bonitos. Eu queria alguma fantasia que estivesse relacionada às minhas histórias em quadrinhos, como a do Robin feminina ou Mulher-gato, mas Amanda insistiu tanto que eu provei a de Chapeuzinho Vermelho, que ela disse ter ficado muito mais bonita do que as outras. Desisti de insistir e aceitei seu conselho, concordando em ir de conto de fadas.

O sol já estava se pondo quando voltei para casa com um embrulho embaixo do braço. Quando cheguei em meu gramado, conferi antes se não havia ninguém e suspirei, aliviada, ao ver que estava vazio. Avancei pelo caminho de pedra, reduzindo a velocidade ao bater o olho no sobrado vizinho e ver que a porta da casa de Benjamin estava aberta. Uma música baixa tocava, além de várias risadas estarem saindo de lá dentro. Era óbvio o que estava acontecendo.

Nem precisei sentir maior curiosidade ou questionar minha dedução porque, por qualquer que seja a ideia do destino, um carro cinza esportivo parou ali e pude ver Daniel ao volante. Reconheci Lucas e Matheus saindo do veículo, além de mais algumas garotas e um menino, e logo Benjamin e sua namorada apareceram na porta para recepcioná-los, ele com abraços e cumprimentos e ela com pulos e gritinhos. Quando percebi que estava parada ali como um poste, tentei fazer meus pés voltarem a se mover enquanto ignorava aquela pontada de tristeza, mas fui impedida ao sentir um olhar sobre mim e perceber que partia de Daniel.

Por favor, não venha aqui. Por favor, não venha aqui.

Ignorando minhas súplicas silenciosas, Daniel se aproximou e me abraçou.

— Como vai, meu par? – ele perguntou, sorrindo, e esboçou de leve suas covinhas. Eu ri fraco, claramente sem cabeça para aquilo. – O que está carregando aí? – perguntou, apontando para o pacote.

— A fantasia que aluguei para uma festa que vou – expliquei e rapidamente olhei para a porta da casa de meu vizinho, onde um garoto de cabelos pretos e olhos verdes intensos recostava, apoiado no batente. Rapidamente, ele desviou o olhar para o chão.

— Nenhuma fantasia vai superar a de coelhinha que você usou ano passado – Daniel comentou, sorrindo de novo,, e eu não pude deixar de acompanha-lo. Os olhos calmos demonstravam um interesse verdadeiro.

— Vai se juntar à nós? – indagou, apontando com a cabeça para a casa de Benjamin. Sorri um tanto ácida e respirei fundo, enfrentando aquele desconforto interno.

— Eu não fui convidada, Daniel.

Falei isso fingindo não ligar, dando de ombros em seguida. Por fora, eu parecia realmente desinteressada, mas por dentro estava contando quanto tempo levaria para chegar até a loja de armas e quanto tempo de liberdade teria depois de fazer a chacina que planejava. A cara de Daniel ao ouvir minha resposta se fechou, fazendo as covinhas desaparecerem. Ele não conseguiu conter o “Oh” que saiu de sua boca.

— Se quiser... – começou, mas o interrompi.

— Eu agradeço, mas não precisa – disse. – Certas pessoas não me querem lá – comentei, olhando diretamente para Benjamin, que desviou o olhar assim que viu que eu o encarava novamente. – E uma dessas certas pessoas está te esperando. Pode ir.

Daniel assentiu, o olhar um tanto triste.

— Boa festa – desejou-me antes de colocar uma das mãos nos bolsos e acenar com a outra.

Virou-se e eu logo segui para a minha porta, agradecendo mentalmente. Mordi meu lábio, lidando com aquela raiva que ocupava o vazio em meu peito. Estava quase entrando quando ouvi a frase que me permitiria dormir melhor à noite.

— Você é um idiota, Benjamin – Daniel disse e logo em seguida ouvi a batida da porta ao lado.

Pelo menos eu ainda tinha Daniel para me defender.

Lívia.

16º Defeito: Benjamin nunca nega uma aposta
— e nunca perde também.


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Notas finais do capítulo

Daniel, o herói ♥
Daqui dois capítulos temos a festa do prefeito. Preparem os corações.
Até o próximo ♥