O Grande Inverno da Rússia escrita por BadWolf


Capítulo 48
A Mão Estendida


Notas iniciais do capítulo

Olá,

O título do cap não diz nada, mas o que posso dizer é que este cap traz uma das mais fortes revelações de toda a fanfic, por isso preparem-se. Hora de ver o que aconteceu às teorias de vocês, com essa nova informação.


E sim, AQUELA personagem que deixou a todos preocupados está de volta...

Boa leitura!



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Malditos ratos!

De posso de uma rude lanterna, Alexander tentava evitar seus pés dos roedores e das baratas, mas parecia impossível. Certamente, o palpite de sua boa mãe estava certo, e de fato deveria haver alguma coisa obstruindo a água. Poderia ser um galho de árvore do rio, ou mesmo um animal morto.

Seria o menino que fugiu? Também era uma possibilidade, o que fez Alexander tomar seu revólver. Ele fora avisado que Georgi conseguiu roubar um dos revólveres da aula de tiro e que possivelmente estava armado. Sabendo da boa pontaria da maioria daqueles meninos, Alexander não tinha dúvidas de que precisava tomar cuidado, pois não estava lidando com crianças normais.

Finalmente, lá estava a entrada da cisterna, no fim do túnel. E como ele imaginara, havia mesmo algo obstruindo o curso da água, mas nem em seus piores pesadelos ele poderia imaginar o que era.

Um cadáver.

De costas, envolvido entre galhos e pedaços de madeira, estava uma pessoa, bastante ferida, e que certamente rolou pela correnteza. Seria Georgi? Alexander logo descartou a idéia, ao aproximar sua lanterna e notar que era um homem adulto.

—Ora, ora, mas o que temos aqui? – perguntou-se Alexander, desvirando o corpo.

Uma pancada na parte de trás de sua cabeça não lhe deixou saber o resto.

            Holmes abriu seus olhos.

            Um sacolejar doentio massacrava seu corpo ferido. Aos poucos, seu cérebro tentava despertar. Sim, um revólver... Um baque em seus tornozelos, e depois só água, e mais água... Ah, e um muro. Isso. Ele tinha desmaiado... Ele tinha desmaiado no...

            Um desespero tomou conta de si. Ele tentou se mexer, mas desistiu ao notar que estava sendo carregado. Sua cabeça estava recostada em ombros delicados. Um ligeiro aroma de rosas penetrava em seu nariz. Ainda tonto, ele só notava o chão, passando por seu ombro, e a respiração ofegante de seu salvador – ou melhor, algoz.

            -Estamos quase lá. – disse uma voz feminina, em inglês. Inglês britânico, ele observou, o que era quase um alívio de se ouvir, naquela terra de idioma tão estranho.

            Seria ela uma salvadora, ou uma carrasca? Holmes não saberia dizer, mas algo lhe dizia que era mais provável que fosse a primeira opção. Isso explicava o esforço da mulher em carregar um homem de sua estatura, e com tamanho cuidado.

            -Estamos quase lá. – ele ouviu outra vez.

            Essa voz... Me é familiar...

            A escuridão lhe cobriu a mente outra vez, lentamente. Ele ainda pôde ouvir um “fique comigo, por favor, estamos quase chegando”, mas isso não era argumento o bastante para seu corpo cansado, faminto e ferido. Logo a escuridão lhe envolveu, e Holmes se sentiu de volta ao aconchego de Baker Street outra vez. Estava sentado em sua poltrona, com Watson ao seu lado, Mrs. Hudson servindo chá e sua vizinha – melhor dizendo, o amor de sua vida – sentada na mesa, voltando seus olhos de tempos em tempos para sua pessoa enquanto dava atenção a um livro de poemas em francês.

            Aqueles eram bons tempos. Bons tempos, de fato.


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            Holmes voltou a si outra vez, dessa vez mais atento.

            Não havia mais alucinações de uma vida passada e distante a retirar sua atenção, mas a sensação de pânico de ter escolhido a hora errada para desmaiar e sucumbir às necessidades de seu corpo cansado. Sem dúvida, sua aposentadoria tinha vindo em boa hora, pois agora Holmes sabia, mais do que nunca, que era incapaz de manter-se acordado e alerta por mais que vinte e quatro horas. Esse era o preço da experiência de mais de quarenta anos dedicados à Criminologia.

            Ele pôde notar curativos em seus braços e dedos, delicadamente colocados nos arranhões que adquiriu em seu mergulho involuntário. Seu cabelo grisalho ainda estava molhado, mas não havia mais aquele cheiro de lodo, mas uma espécie de lavanda a perfuma-lo. Estava deitado sobre uma cama de solteiro, e a sua frente havia uma penteadeira. Havia um relógio cuco que precisava de reparo e uma lâmpada sem trocar.  Certamente, aquela era a casa de uma mulher solteira e sem filhos. Na estante, na parede ao lado, livros em francês e russo. Alguns eram de literatura e gramática em francês. Uma professora de francês, então, ele deduziu. Embora não fizesse a mínima idéia de onde diabos ele estava, Holmes sentia que o ambiente era acolhedor o bastante para fazer-lhe duvidar se estava realmente em perigo.

            Finalmente, a dona da casa apareceu.

E era a última pessoa que ele imaginava ser resgatado.

            -Esther?! – Holmes quase saltou da cama.

            A mulher que fugira de sua vida, e que lhe fizera embarcar em uma viagem louca para os confins da Rússia estava bem ali, diante de si. Ela já estava próxima dos quarenta anos, sabia Holmes, mas seu semblante era praticamente o mesmo, se não fosse por algumas olheiras a envelhecer seu rosto. O cabelo loiro havia dado lugar a um tom negro quase azulado, provavelmente tingido, e ele estava para seu pasmo (e quase horror), bastante curto, em um corte moderno, na altura do ombro. Ninguém daria mais que trinta anos nela por conta desses detalhes.

            -Quieto. – ela disse, disfarçando rapidamente a súbita felicidade de vê-lo acordado. – E não me chame disso.

            -Tudo bem. – concordou Holmes, fazendo um gesto com a cabeça. Mas como devo chama-la, Miss...?

            -Dasha Pulovtz.

            -Realmente, Miss Pulovtz, eu não poderia imaginar que, todos estes meses, você estava aqui, dando aulas de Francês e deixando todos os seus amigos preocupados.

            Esther deu de ombros.

            -Alguém tinha que fazer alguma coisa, não é?

            -Bom, mas tinha que se arriscar de tal maneira? Ou acredita que aqui é livre para sair como bem entender, vendo tanta coisa comprometedora?

            -Não se exalte. – pediu Esther, friamente. – E eu sei bem o que estou fazendo, desde o momento em que me inscrevi para a vaga de professora de Frances. Era a única forma de conseguir investigar o paradeiro de meu filho mais a fundo.

            -Nosso filho. – corrigiu Holmes.

            -Oh, agora, você reconhece isto. Estou admirada. – respondeu, sarcasticamente.

            -Eu mudei, acredite em mim. Muita coisa aconteceu nesses últimos tempos, e inclusive eu... Eu reconheço meu total erro de julgamento. Não deveria ter sido tão frio a respeito do que houve com nosso filho.

            Esther deu de ombros.

            -Não espere que eu te abrace e te chame de “meu amor” depois de ouvir isso. Nosso casamento acabou, Holmes. Não há mais volta. Se você veio até a Rússia pensando que eu iria ficar “admirada” com seu “gesto de bravura” e voltar para você, saiba que não vou abandonar nada por você.

            -Esther, Esther... Digo, Dasha... – corrigiu-se Holmes, ao receber um olhar mortal da parte dela. – Não podemos brigar agora, pelo contrário. Trabalhamos muito melhor juntos, não há como negar isso. Devemos ajudar uns aos outros e...

            -Não. – respondeu Esther. – Você irá colher os louros disso depois, como já fez outras vezes.

            -Mas quem aqui está falando em colher os louros! – respondeu Holmes. – Ora, estamos falando de nosso filho!

            -Fale baixo. – pediu Esther. – Maldição, fale baixo. Tudo bem! – entregou-se, arrancando um sorriso de satisfação de Holmes. – Eu vou te mostrar tudo que consegui até agora, está bem? Vejamos se ainda está em forma.

            -Segui seu rastro em São Petersburgo e acabei aqui, em seu quarto. Não estou em forma o bastante?

            Esther sentiu um leve rubor esquentar seu rosto. Reencontrar Holmes depois de mais de cinco anos sem se ver tinha sido maravilhoso, embora ela não desejasse admitir. Em seu interior, ela sabia que ainda mantinha os mesmos sentimentos por ele, muito embora sua decepção dos últimos anos ainda não tivesse passado. Mas toda a atração física que Holmes despertava nela, mesmo com o passar dos anos, ainda estava lá.

            -Tudo bem, eu darei meu veredito depois. – ela disse, se agachando e removendo uma tábua do assoalho, de onde tirou uma caixa. Ao abri-la, revelou uma série de documentos.

            -Isso foi tudo que eu pude obter, ou mesmo copiar dos arquivos daqui. – ela disse, enquanto entregava papéis a Holmes. – Se visitou meu esconderijo em São Petersburgo, decerto encontrou Vlad e soube da Fazenda.

            -Sim.

            -Em meio à minha investigação sobre Jonathan, acabei descobrindo que... Adonai, eu só posso estar louca, mas há uma possibilidade de que...

            -Seu pai esteja vivo. – completou Holmes, causando espanto a Esther.

            -Co-como conseguiu deduzir isto?

            Holmes sorriu, orgulhoso.

            -Um acaso do destino. Aliás, sinto-me seduzido a assim acreditar. Eu fui socorrido por um homem na floresta chamado Abraham.

            Esther soltou um suspirou de felicidade, e lágrimas começaram a saltar de seus olhos.

            -Como ele era? – ela perguntou, quase em sussurro.

            -Um homem de cerca de setenta anos. Loiro, creio eu, apesar dos cabelos grisalhos. Judeu. Os olhos verdes, com uma altura próxima a minha, e quando ele sorri aparece duas covinhas, tal como as que estão aparecendo em seu rosto agora.

            Para total surpresa de Holmes, Esther agarrou-lhe imediatamente pelo pescoço. Holmes sentiu que o abraço dela não era, entretanto, um abraço de amor, mas um abraço de desespero. Pela forma como respirava, sem dúvida ela estava chorando.

            -Não fique assim, Esther... – Holmes lhe afagava as costas.

            -Meu pai está vivo... Meu pai... Não posso acreditar... O que achou dele?

            -Do velho Abraham Katz? Bom, creio que ganhei um ótimo sogro.

            -Onde ele está?

            Holmes suspirou forte. – Eu não sei. A última vez que o vi, ele me salvou de ser baleado por um menino. Parecia ser um menino em fuga...

            -Só pode ser Georgi! Oh, Adonai! Onde ele está? Ele está bem?

            Homes estranhou o desespero súbito de Esther, mas preferiu não comentar sobre isso. Ainda.

            -Não sei, Esther. Foi ele quem me empurrou contra a correnteza.

            -Ele?! Céus, Georgi, o que você fez... Ele é realmente capaz de tudo para encontrar o irmão...

            -Irmão? Pensei que todos que vivessem aqui fossem órfãos.

            -E são, inclusive Georgi. Mas ele diz que tem um irmão, chamado Grigori.

            -Espere, Grigori?! Não pode ser... – disse Holmes, aparentemente embasbacado.

Esther pareceu surpresa. – O que foi?

—Eu estou acompanhando um menino chamado Grigori, que também tem um irmão desaparecido chamado Georgi. Duvido que seja apenas coincidência.

—Espere... Então você o conhece? Você conhece o irmão de Georgi?

            -Ao que parece, sim. Mas por quê?

            Esther empalideceu-se.

            -Como você o conheceu? E-E-Esse Grigori? Co-como ele é?

            Holmes estranhou a natureza da pergunta.

            -Ora Esther, foi em uma dessas eventualidades da vida.

            -Detalhes, Holmes. – exigiu Esther.

            -Tudo bem. – Holmes cruzou os braços. – Foi em Sussex. Não sei se sabe, mas eu me aposentei e estou vivendo lá agora. Esse menino tinha atraído para si algumas encrencas, e eu o ajudei. Cheguei a leva-lo para Londres comigo.

            -Você, cuidando de um menino? Essa eu pagaria para ver...

            -Acredite, eu me saí bem em tal tarefa. Mas enfim, nesta mesma visita a Londres eu soube que você estava sem dar notícias havia seis meses. Decidi, então, ir para São Petersburgo atrás de notícias suas. Como Grigori passou um tempo nas ruas, eu o considerei um dos meus aliados, para fazer o mesmo papel dos Irregulares.

            -“Um dos seus aliados”. Ora, mas quem mais você chamou?

            Ao lembrar-se de Irene Adler, Holmes sentiu um súbito aperto na garganta, mas disfarçou.

            -Bom, um outro qualquer. – mentiu. – Mas não entendo o porquê desse seu interesse pelas crianças. Pensei que sua prioridade aqui na Rússia fosse o nosso filho.

            -Claro que sim. Jonathan está no topo de minhas prioridades.

            Após alguns segundos em silêncio, Holmes decidiu deixar uma observação.

            -Você ainda o chama de Jonathan...

            -É o nome de nosso filho, caso não se lembre.

            -Óbvio que me lembro, mas creio que sua investigação não andou tão bem assim, pois eu duvido muito que o menino ainda tenha esse nome atualmente.

            Esther ficou em silêncio, até deixar escapar um sorriso.

            -Me parece, Detetive Consultor, que a sua investigação é que não andou tão bem assim.

            Holmes estranhou a resposta de Esther.

            -Não entendo. O que quer dizer com isso, afinal?   

Esther suspirou fortemente.

—A razão para eu ainda chamar o nosso filho de Jonathan é que... Eu o encontrei, mas eu não sei quem ele é. Qual deles ele é.

            Foi neste momento que Holmes percebeu a verdade.

            -Grigori e Georgi.


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Notas finais do capítulo

É, eu sei que vocês esperavam um pouco mais de "sangue" nesse reencontro, ou pelo menos palavras mais duras ou até mesmo uns bons palavrões, mas não se preocupem porque ainda tem muita chance para essa D.R. acontecer.

E as teorias de vocês, como ficaram com essa nova revelação? Ainda dá para aproveitar alguma coisa? Alguém acertou?

No próximo cap: o último trecho do Diário da Esther. Finalmente saberemos como Esther chegou à esta conclusão - e o quê ainda faz ali, se já conseguiu desvendar o mistério.

Até sábado, e deixem reviews!



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