Horrenda beleza

– Você tá linda!

A moça, de pele morena como chocolate, sorriu, em um misto de agradecimento e prazer.

Antes de virar-se para deixar o local, jogou os cabelos lisos, pela química, para trás, deixando amostra seu decote vulgar.

Seus colegas de trabalho, e nada mais do que meros colegas, não disfarçavam olhares de reprovação e curiosidade.

Afinal, por que havia de vir trabalhar com roupas tão curtas? Estaria ela apaixonada por alguém de lá?

Ela gostava muito de si própria para amar outra pessoa.

Fora do prédio onde trabalhava, o vento, esvoaçando seus cabelos negros, fê-la sentir-se ainda mais bonita e dona de si.

Não evitava olhar, com ar de superioridade e um sorriso zombeteiro, os casais que por ela passavam.

Para que um outro alguém, quando se está bem só?

Não, ela não precisava de nenhum homem para cantar sua beleza, poetizar sua voz, acariciar suas perfeições.

Independente. Essa era a melhor palavra que a descrevia.

A vitrine de uma loja refletiu-a, e ela não pôde ignorar-se. Notou o batom vermelho levemente borrado.

Quantas pessoas teriam visto aquilo? Quantos homens deixara de seduzir por causa daquela imperfeição?

Contornou os lábios com um dos dedos, apagando o resquício de seu descuido e vergonha.

Tanta insegurança disfarçada entre sensações ocas de importância e poder.

Talvez ela não fosse tão independente assim.