Dreams escrita por nywphadora, nywphadora


Capítulo 2
Vermelho é a Cor Mais Fria




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/675380/chapter/2

Os passos dos dois cientistas eram os mais cuidadosos possíveis. A noite estava silenciosa e eles apenas ouviam alguns gritos e gargalhadas distantes. Porém, ao menor sinal de vida, os zumbis viriam rapidamente até ali e eles precisariam matar para sobreviver.

Matar era a parte que Kermillian mais odiava. Só a fazia sentir mais culpada pelo que aconteceu e ela não conseguiria parar de pensar sobre isso por dias.

A cidade estava completamente apagada e eles não conseguiam ver nada. A energia já tinha acabado há muito tempo em boa parte do país. Apenas algumas propriedades de sorte ainda tinham alguma eletricidade. Não foi fácil para Kermillian e Thomas acharem um lugar com os requisitos mínimos para iniciar uma pesquisa científica, mas eles conseguiram.

Um barulho de lata de alumínio rolando no chão foi ouvido. Kermillian parou imediatamente, assustada, ficando atenta ao menor sinal de movimento por perto.

— O que foi isso? — sussurrou para Thomas. — Você ouviu?

Ele engoliu em seco, estava apavorado com aquela situação.

— Fui eu — disse, tranquilizando-a. — Desculpa, só chutei uma lata sem querer, deve ser de refrigerante.

A cientista assentiu, continuando a andar.

— Tudo bem. Só não faça de novo.

Kermillian andava com uma lanterna, iluminando apenas o necessário para que eles não tropeçassem e chamassem ainda mais atenção. Depois de alguns meses vivendo em uma Nova York sem vida humana e sem luz, ela aprendeu a localização exata dos lugares aonde precisava ir de vez em quando.

Eles estavam perto. Ela sabia por tinha acabado de iluminar uma placa de pare manchada de sangue exatamente no “A”. Tinha passado por ali tantas vezes.

— Vamos, por aqui.

Ela o empurrou levemente para o lado e eles atravessaram um portão destruído, entrando em um estacionamento. Apenas mais alguns passos e eles estariam dentro do supermercado.

Porém, antes que eles pudessem alcançar a porta de entrada, a lanterna de Kermillian iluminou uma horda de zumbis se aproximando. Eles andavam mais rápido do que o normal e gemiam muito alto. Logo os outros ouviriam e chegariam também.

— Droga, droga, droga! — praguejou ela. — E agora, Thomas? Não quero atirar para não chamar mais atenção.

O seu colega de trabalho colocou a mão na cintura e tirou dali uma faca de cozinha afiada.

— Prefere cortar?

Ela fez uma expressão enojada.

— Não — repudiou a ideia. — Vai acabar com o meu apetite. Não vai ter jeito. Vamos precisar ser rápidos. Preparado?

Thomas assentiu, tirando do outro lado da cintura uma arma. Kermillian fez o mesmo.

Os dois miraram nos zumbis e atiraram, atingindo apenas um. Thomas errara.

— Tem uns dez zumbis aqui — gritou ela. — Preciso que você acerte ou não vamos jantar hoje!

Os zumbis estavam cada vez mais próximos. Eles atiraram novamente e mais dois caíram no chão. Dispararam mais uma vez e então mais um foi morto. Repetiram o gesto de novo e atingiram um zumbi, mas não o mataram. Thomas, assustado, deu vários tiros seguidos e matou um zumbi. Tentou atirar de novo, mas não conseguiu. As balas tinham acabado.

— Ficou louco? — ralhou a cientista. — Você acabou com a arma.

Ele assentiu e puxou Kermillian com ele. Estava levando-a para dentro do supermercado. Eles já tinham conseguido matar metade dos zumbis que estavam no caminho. Correram com a própria vida e finalmente entraram no mercado.

Thomas imediatamente puxou uma prateleira que estava quase vazia e posicionou em frente à porta de entrada do local. Os zumbis já batiam as mãos sujas e nojentas nos vidros do mercado e não demoraria muito para que eles se quebrassem.

— Rápido, pegue o que você quer — apressou ele.

Kermillian correu pelos vários corredores, segurando uma mochila aberta. Lá dentro, ela jogou todo o tipo de comida que conseguiu ver com a lanterna. A cientista pegou alguns pães que ainda não tinham apodrecido, um suco de caixinha que estava no refrigerador, um biscoito, que ela não se importou em ver qual era e álcool.

— Pronto, vamos! — gritou ela, indo em direção a porta dos fundos. — Precisamos sair daqui.

Ele correu até ela e ouviu um vidro de quebrar. Olhou naquela direção e viu que alguns zumbis já se esgueiravam para dentro. Eles eram muitos!

— Hoje não era um bom dia para fazer compras — murmurou, empurrando a porta de ferro.

Kermillian passou primeiro e Thomas foi atrás. Eles correram o mais rápido que conseguiram, sabendo que os zumbis não eram muito rápidos. Com a ajuda da lanterna de Kermillian, logo estavam salvos e indo em direção à atual casa deles. Assim que perceberam estarem seguros, eles pararam para recuperar o fôlego. Os dois tinham suas respirações ofegantes e lutavam pelo ar.

— Ker, prometa-me uma coisa — pediu ele.

Ela esperou o resto do pedido.

— Nunca mais vamos sair à noite.

A cientista assentiu, mesmo que ele não pudesse vê-la, e voltou a andar. Eles foram assim, lado a lado, sem dizer uma palavra, por longos minutos. Nenhum dos dois contou quanto tempo levou para chegarem no abrigo, mas quando chegaram, sentiram que uma eternidade tinha se passado.

Kermillian empurrou a porta de entrada com o antebraço e adentrou no enorme corredor destruído, sendo seguida por Thomas. Eles não moravam realmente em uma casa. E sim, em um dos únicos hospitais de Nova York que ainda tinha energia.

Eles andaram pelo enorme corredor, não se importando em desviar dos cacos de vidro no chão. As janelas das salas estavam quebradas e, no primeiro andar, apenas algumas luzes funcionavam e, mesmo assim, piscavam o tempo todo. Os dois caminharam até o final do corredor e encontraram uma porta de ferro. Thomas digitou uma senha de quatro dígitos e a porta foi destrancada. Kermillian abriu e desceu as escadas, tendo Thomas em seu encalço. Assim que a porta bateu, ela se trancou novamente.

Quando chegaram ao subsolo, Kermillian puxou para baixo uma alavanca e acendeu todas as luzes do andar. Aquele pavimento era o mais seguro do prédio. Era o andar das pesquisas. Tinha apenas algumas poucas salas e muita refrigeração e aquecimento, quando necessário. Ali eles tinham geladeiras e todos os equipamentos de um laboratório.

Os dois caminharam mais um pouco e entraram em uma sala com carpete cinzento no chão. Deveria ser a sala de um algum diretor ou supervisor do local. Alguém que, agora, era um zumbi. Eles se sentaram no chão quente para comer. Kermillian encostou sua cabeça na parede, tentando se acalmar. Um apocalipse zumbi era enlouquecedor.

Thomas abriu a mochila e pegou um dos pães, dando uma mordida brusca. Kermillian decidiu fazer o mesmo, pois tinha acabado de perceber que estava com muita fome. Abriu a caixa de suco e tomou um gole, oferecendo-a para Thomas em seguida. Ele aceitou e tomou um gole também.

— Para que o álcool?

Ela não entendeu logo, mas depois lembrou-se que tinha pegado.

— Para a pesquisa — explicou, como se fosse óbvio. — Já usei todo o que tinha aqui. Um laboratório não é um laboratório sem álcool.

O colega de pesquisa riu.

— Isso não vai chegar a lugar nenhum e você sabe disso…

O humor de Kermillian sumiu imediatamente.

— Eu preciso tentar.

Thomas levantou-se subitamente.

— Por quê? Apenas vamos tentar sobreviver, não aguento mais te ver falhando todos os dias, Ker!

A cientista se levantou também, ficando muito próxima do rosto dele. Queria socá-lo por sugerir que ela desistisse.

— Eu vou continuar tentando até o meu último suspiro — disse, de forma dura. — A culpa disso tudo é minha e se tem uma chance de salvar a humanidade, eu vou agarrá-la. Agora me dê licença, doutor Mullins.

Kermillian passou pelo colega, esbarrando nele com o ombro propositalmente e então saiu da sala.

— Como quiser, doutora Crawford.

 

Alguns meses antes, Kermillian se encontrava em uma entrevista coletiva com repórteres e jornalistas de, praticamente, todos os países. A descoberta que ela tinha feito era digna de toda a atenção do mundo. E era exatamente o que ela tinha. Literalmente. A entrevista estava sendo transmitida em centenas de televisões e milhares de vias online.

Os jornalistas quase se estapeavam para fazer as perguntas. Provavelmente era a melhor chance que eles teriam de se destacar em seus empregos. Kermillian realmente queria atender a todos, mas infelizmente o tempo não colaborava. Desde sua descoberta histórica, ela tinha a agenda lotada todos os dias.

Assim que a entrevista foi iniciada, todos os jornalistas ergueram as mãos, pedindo por uma chance. Kermillian apontou para um homem baixo e gordo, que estava sentado na última fileira.

— Ah, hã… — Ele parecia surpreso por ter sido escolhido. — Doutora Crawford, você teria uma previsão de quando a cura do câncer estaria disponível para o público?

Ela sorriu, agradecida por ele falar sua língua.

— Na verdade, não é uma cura e sim uma vacina — esclareceu, deixando-o levemente envergonhado com o erro. — E, respondendo a sua pergunta, a vacina, neste momento, está sendo distribuída para toda a população.

 

Dois meses depois, a cientista que antes era aclamada pelo público agora caía em desgraça completa. Todos queriam matá-la, inclusive os presidentes dos países mais importantes. A culpa a corroía por dentro e ela não parava de revisar sua pesquisa, procurando seu erro. Ele estava ali. O tempo todo. Como ela não percebera?

Foi apenas um mundo que acabou, não só a sua vida, mas a vida de milhões de pessoas que tinham sido medicadas. Quase toda a população mundial já tinha sido vacinada. Foi um trabalho muito rápido, visto que o câncer era uma doença muito preocupante que precisava ser combatida na maior velocidade possível. E isso foi a ruína.

Se a divulgação da vacina não tivesse sido tão rápida, talvez eles tivessem conseguido salvar a humanidade.

Naquele momento, Kermillian estava sentada em uma sala secreta da CIA, na presença do presidente dos Estados Unidos.

— Você tem ideia do que fez, doutora Crawford?

Ela assentiu.

— Olha, eu só não mando te matar imediatamente pois eu quero que você procure uma cura para isso.

Ela assentiu novamente, de cabeça baixa.

— As minhas filhas estão virando mortas-vivas! — berrou. — A minha esposa tomou a vacina. Eu tomei a vacina!

Kermillian estremeceu com os gritos.

— Todos tomaram as vacinas — disse. — Eu não sei como ainda acredito que você não fez isso de propósito, visto que você e esse seu parceirozinho foram os únicos que não tomaram.

— E agora, senhor?

Ele estava irado.

— Agora eu vou deixar o melhor hospital de Nova York nas melhores condições que eu puder, completamente lacrado e com mantimentos no subsolo — explicou. — Quando todos ficarmos loucos, inclusive eu, quero você trabalhando dia e noite para nos trazer de volta. Entendeu?

Ela não respondeu.

— Entendeu? — gritou.

— Sim, senhor — respondeu, gritando.

O presidente andava em círculos pela sala, com as mãos na cabeça.

— Eu vou virar um zumbi — gemeu, lamentando-se. — O mundo vai realmente entrar em um apocalipse zumbi.

Kermillian abaixou a cabeça novamente.

— Eu… Eu trancafiei algumas das pessoas mais importantes do mundo para que elas não matem e nem morram nesse inferno que a Terra vai virar — contou. — Consegui localizar vinte pessoas no planeta que não tomaram a vacina. Vinte pessoas!

— Entendi, senhor.

— Elas estão presas em locais com mantimentos para um ano — disse. — Eu não sei se elas vão sobreviver. Mas, se sobreviverem, você tem um ano para achar a cura e para tornar o planeta seguro novamente.

 

E ela tinha tentado. Por longos meses, depois que a maioria da população de Nova York virou zumbi, ela se escondera no hospital e procurara pela cura dia e noite. Sonhava todos os dias em recuperar o planeta e tinha vontade de se matar toda vez que segurava uma arma. Mas resistiu a esses impulsos. Ela era a única que poderia salvar o mundo.

Porém, depois de muitas tentativas, ela desistira. Não estava mais procurando uma cura.

Estava procurando uma forma de combate.

Ainda não contara isso para Thomas, mas em breve ele analisaria os dados e perceberia o que ela estava tentando criar.

Foi justamente isso que aconteceu na manhã seguinte. Normalmente, Kermillian acordava antes de Thomas e então ela podia trabalhar em paz no laboratório. Porém, naquele dia, Thomas levantou-se antes e, depois de tomar café da manhã, foi até o laboratório para ver como a pesquisa estava andando.

Caminhou até a bancada que Kermillian deixara os dados da pesquisa e folheou os papéis com certa curiosidade. De início, não viu nada demais, apenas análises necessárias para qualquer simples trabalho. No entanto, a medida que passava as páginas, ele achava cada vez mais elementos que criariam um ser monstruoso.

Quando estava se aprofundando na leitura, foi surpreendido ao ver Kermillian de pé na porta do laboratório.

— O que é isso, Ker? — perguntou, assustado. — O que você está pesquisando?

Ela se aproximou dele, lentamente.

— Thomas… — começou. — Eu ia te contar, mas quando tudo estivesse pronto.

Ele ficou surpreso.

— Ah, você ia me contar quando estivesse tudo pronto? — perguntou, incrédulo. — Quando eu não pudesse fazer mais nada para te impedir, não é?

Thomas foi até ela e balançou-a pelos ombros.

— Ker, o que você está criando? — gritou. — O quê?

— Vampiros! — gritou também, só querendo que ele parasse de berrar.

O colega de laboratório a soltou imediatamente, afastando-se como se, de repente, estivesse com medo dela.

— Você está… — Não conseguia terminar a frase. — Você está… Criando… Você está criando vam-vampiros?

Kermillian revirou os olhos e respirou fundo.

— Não, não são exatamente vampiros.

— Como assim? Exatamente vampiros? O que são?

Ela suspirou.

— Eu pretendo usar essa substância que estou estudando para fazer modificações biológicas nos zumbis — explicou. — Se isso funcionar, os zumbis vão voltar a pensar, a enxergar e vão voltar a ter corpo humano perfeito. Não só isso. Eles vão ter mais velocidade e vão substituir a sede de carne humana pela sede de sangue.

— Ah, claro! — Ele riu. — É muito sensato melhorar as capacidades do inimigo.

— Não, mas nós faremos com que eles fiquem do nosso lado — disse. — Vamos começar com poucos vampiros e quando soubermos como controlá-los, poderemos ter um exército e tornar a Terra segura de novo.

Thomas ainda estava muito assustado.

— Eu… eu acho que não.

— Por favor, confie em mim.

 

Ele confiou. Depois de alguns dias de conversa e planejamento, Thomas confiou na ideia de Kermillian.

Os trabalharam juntos na criação da fórmula que mudaria a biologia dos mortos-vivos. De vez em quando, Thomas ainda ficava um pouco receoso, mas esses momentos eram raros.

Depois de duas semanas, eles finalmente conseguiram concluir a substância vampiresca. Kermillian já tinha feito quase a metade da pesquisa e por isso, Thomas apenas ajudou-a com alguns testes e revisou o trabalho algumas vezes para que não houvessem mais erros. Ela tinha muito medo de piorar ainda mais a situação deles, cometendo uma falha.

Para os testes, eles capturaram zumbis quase completamente mortos e aplicavam a substância em seu corpo. Precisavam se proteger para não entrar em contato com nenhum fluído do ser e se contaminarem também. Mas eles conseguiram. Os testes foram todos bem sucedidos. Assim que a substância entrava no organismo dos zumbis, eles tinham uma mudança de cor e uma regeneração da pele quase imediata. Porém, eles não recuperavam o cérebro pois já estavam muito fracos.

Era hora de um teste completo. Eles precisavam pegar um zumbi recém transformado e forte para ver se a substância funcionaria por completo. Mas como? Era muito perigoso.

Depois de alguns dias pensando e observando um zumbi específico, que vivia em um dos prédios próximos, eles decidiram que tentariam atirar nas pernas do zumbi e assim impediriam que ele fizesse grande coisa contra eles. Era um plano semi perfeito. Não dava para ter certeza de nada ainda…

No dia seguinte à decisão final, eles saíram bem cedo, no horário que eles sabiam que o zumbi saía para comer. Suas armas estavam preparadas e à mão e o sol batia forte em seus rostos. Nenhum vento passava por ali. Deveria ser verão, mas Kermillian já tinha perdido a noção do tempo.

Se esconderam atrás de alguns escombros e esperaram. Esperaram por quase vinte minutos, mas então finalmente o zumbi apareceu, vindo da lateral do prédio, mastigando qualquer coisa que eles não queriam nem imaginar. Ele estavam com grande parte de seu corpo ensanguentado, mas ainda não tinha marcas de decomposição. Era realmente recém zumbificado.

— No “já” a gente levanta, atirando, okay? — perguntou Thomas.

Ela assentiu, querendo fazer logo.

— Ker — chamou.

A cientista olhou para ele.

— Tome cuidado.

Kermillian assentiu novamente.

— Um…

Pegou as duas armas na cintura.

— Dois…

Apontou para frente e mirou no zumbi, que andava desgovernadamente pelo meio da rua deserta.

— Três e…

Respirou fundo, preparando-se.

— Já! — gritou e levantou-se.

Kermillian se levantou no mesmo momento e começou a atirar, assim como Thomas. Rapidamente, eles atingiram as duas pernas do zumbi e ele caiu no chão, gemendo. Por sorte, nenhum outro tinha aparecido, mas eles teriam de ser rápidos.

Thomas tirou dos bolsos duas luvas de borracha e colocou, Kermillian fez o mesmo. Correram até o zumbi e chutaram-no algumas vezes, para ter certeza de que ele ainda não podia se movimentar muito. Thomas segurou as duas pernas dele e Kermillian segurou-o pelos ombros. Não estavam muito longe do hospital, mas teriam que tomar cuidado, pois estavam vulneráveis.

— Vai, vai! — gritou a cientista.

Thomas começou a andar para trás, olhando de vez em quando e levando o corpo com a ajuda de Kermillian. Depois de alguns poucos minutos, eles finalmente conseguiram entrar no hospital e descer as escadas até o laboratório, aonde era seguro.

Deixaram o zumbi em uma sala totalmente vazia e isolada, apenas com uma cadeira e uma corda. Assim que largaram o corpo no chão, lutaram para normalizar suas respirações.

— Conseguimos.

O zumbi gemia um pouco e se debatia. Deveria estar sentindo muita dor. Ele tinha alguns machucados abertos, mas o sangue não escorria mais. Sua pele era pálida e ele já tinha um cheiro de morto. Era insuportável.

— Ainda não — disse Kermillian. — Vou pegar a seringa. Amarre-o bem forte e ao menor sinal de problema…

— Eu atiro — completou. — Pode deixar.

Ela sorriu e saiu da sala para buscar a seringa com a substância. Alguns segundos depois, ela estava de volta, segurando a seringa. O zumbi já estava amarrado e parecia estar inconsciente. Ótimo. Dessa forma seria ainda mais seguro para eles. Kermillian precisou prender a respiração para não vomitar ao se aproximar do zumbi. Ainda estava com suas luvas amarelas de borracha, então não teve problemas.

Fincou a seringa e injetou o líquido transparente no organismo do zumbi. Ele estremeceu e gemeu levemente, mas logo depois desmaiou de novo.

Após alguns minutos, a sua pele já tinha ganhado mais cor e os machucados estavam quase completamente cicatrizados. Sua aparência estava voltando a ser humana. Depois de alguns minutos esperando que ele acordasse, Kermillian percebeu que, na verdade, ele era muito bonito. Uma pena uma pessoa como ele se tornar um zumbi. Era tudo culpa dela.

Porém, depois de duas horas, ele se tornou pálido de novo. Sua pele estava nova em folha, porém sem nenhum vida. Seus machucados cicatrizaram completamente e só faltava ver se ele tinha recuperado a consciência. Kermillian não tinha sido da sala nem por um instante. Ficara ali, suportando o cheiro e observando cada reação que o ser tinha. Não achava que pudesse chamá-lo de zumbi agora.

Nesse momento, o homem abriu os olhos lentamente e começou a tossir. Ele se debatia contra a cadeira, estava desesperado para sair dali. Kermillian se levantou e foi até ele, sem as luvas, imaginando que já fosse seguro tocá-lo. Então, tocou seus braços levemente e ele olhou para ela com uma expressão terrível de pavor.

— Aonde eu estou? — perguntou com a voz normal de um humano. — Quem é você? O que está acontecendo comigo?

A cientista se afastou aos poucos, boquiaberta. Tinha dado certo. Tinha funcionado, ela tinha trazido um zumbi de volta. Depois de meses de estudos e tentativas ela finalmente tinha conseguido trazer um zumbi de volta à vida! Ela começou a rir histericamente e a pular pela sala inteira.

— Thomas! — gritou, contente. — Thomas, venha até aqui! Rápido!

Em poucos segundos, o colega de laboratório apareceu, preocupado. Kermillian apenas apontou para o ex-zumbi e Thomas soube. Tinha funcionado. Ele correu até ela e abraçou-a.

— Alguém me responda! — gritou o ex-zumbi. — Aonde eu estou? Quem são vocês? O que está acontecendo?

Kermillian parou sua felicidade imediatamente.

— Certo — disse a cientista. — Vamos responder todas as suas perguntas. Mas primeiro eu preciso saber de uma coisa. Qual o seu nome?

Ele hesitou um pouco.

— Meu… meu nome? — A cientista confirmou. — Meu nome é… Chad Legg.

Depois disso, Kermillian explicou tudo detalhadamente para Chad. Explicou em que situação eles estavam, o que tinha acontecido e o que ela estava planejando fazer. Como ela previra, em poucas horas ele sentiu necessidade de sangue e então ela permitiu que ele sugasse um pouco dela. Doeu como ela nunca imaginou que pudesse, mas precisava suportar. Depois disso, explicou a ele o motivo de ter sempre sede de sangue e ele contou a ela sobre sua vida antes de tomar a vacina.

— Então você concorda? — perguntou Thomas. — Concorda em trabalhar com a gente para transformar todos os zumbis em mais de você.

Chad hesitou.

— Nós queremos apenas acabar com os zumbis para tornar o mundo seguro para as poucas pessoas que não se vacinaram. Compreende, não?

Ele assentiu.

— Eu concordo.

Assim, Kermillian contou-o como ele faria o contágio dos outros vampiros com a substância do vampirismo. Chad concordou rapidamente e eles decidiram começar no dia seguinte.

 

Após um mês, eles já tinham conseguido transformar metade de Nova York em vampiros. Já tinham um bom exército e todos eles tinham sido instruídos a morder qualquer zumbi que eles encontrassem.

Com o tempo, Kermillian se aproximou cada vez mais de Chad. Ele era muito engraçado e tinha as melhores histórias. Além de estarem trabalhando juntos, eles tinham muito em comum. Ela se divertia muito quando estava com ele.

Kermillian, Chad e Thomas tinham criado um novo sistema que separaria humanos e vampiros. Já que, com o passar do tempo, alguns humanos saudáveis chegaram na cidade, procurando por refúgio. A regra era simples: Um vampiro poderia pedir para se alimentar de alguém e não poderia se alimentar sem o consentimento do humano. Caso nessa alimentação ele matasse ou machucasse o humano, seria morto.

A maioria dos vampiros estava seguindo as leis sem maiores problemas, enquanto Kermillian e Thomas planejavam a ida dos vampiros para outras cidadas para acabar com o problema lá. Porém, como um sistema de governo tem sempre uma falha, alguns vampiros rebeldes começaram a surgir. Dois humanos foram mortos e depois mais três. A população humana não era tão grande, então a redução foi brutal.

Esses vampiros foram caçados e apenas um foi capturado e morto. Os outros conseguiram fugir.

Alguns meses se passaram sem mais baixas, porém um dia o corpo de um humano foi encontrado completamente drenado. Kermillian precisava acabar com aquilo rapidamente, ou não estaria conseguindo criar uma comunidade segura para os humanos. Há essa altura, Thomas, Kermillian e Chad mantinham uma sala reservada no laboratório para guardar papéis dessa nova organização. Eles também tinham criado um sistema de “cadastramento” para os recém transformados em zumbis.

Assim que foi até a sala para analisar o perfil de alguns vampiros suspeitos, porém, antes que ficasse à vista, ouviu uma conversa no telefone. Era Thomas. Ele falava baixo, porém ainda era audível.

— Não! — disse, com veemência. — Vocês não podem mais matar assim.

A cientista prendeu a respiração.

— Está ficando muito descarado e a Kermillian já está começando a desconfiar de vocês.

Thomas se moveu na sala e Kermillian teve medo de ser descoberta, mas logo ele parou novamente.

— Eu sei que é difícil para vocês, não quero que parem — disse em tom alto e claro.

Não quer que parem?

— Olha só, façam um ataque amanhã ao meio-dia, quase nenhum vampiro está na rua por causa da luz do sol — instruiu. — O plano da Kermillian está dando certo demais. Eu preciso acabar com isso o quanto antes.

Ele riu.

— Sim, já estou vendo que elá está ficando desmotivada. Em breve, teremos sucesso no nosso trabalho.

Era suficiente. Kermillian estava sendo enganada por mais de um ano por um colega que ela acreditava fazer tudo por ela. Tateou a mesa atrás dela e pegou uma faca. Não sabia mais do que Thomas era capaz. Respirou fundo e contou até três.

Em uma fração de segundos, ela saiu de trás do balcão e, em um tapa, derrubou o telefone de Thomas no chão. Ele a olhava com uma expressão assustada e surpresa.

— O que foi isso, Ker?

— Não me chama de Ker — repreendeu ela, irritada. — Eu é que pergunto. O que foi isso, Thomas? Está tramando contra mim?

Ele olhou para todos os cantos da sala, procurando um forma de fugir. Mas, por fim, desistiu e resolveu que era hora de acabar com aquilo.

— Você sempre esteve à minha frente em tudo que nós fizemos — jogou para cima dela, se aproximando com uma expressão assustadoramente louca. — Ganhou todos os prêmios, todos os elogios e as atenções sempre foram todas para você.

— Thomas…

— Até quando nós dois trabalhamos juntos naquela vacina os olhares foram todos para você.

Kermillian entreabriu os lábios e arregalou os olhos.

— Você… Você alterou a fórmula.

Ele franziu o cenho.

— O quê?

— Você alterou a fórmula da vacina e você fez isso com o mundo — gritou. — Não tinha nada de errado com a minha pesquisa. Por quê? Por que fez isso?

Thomas ficou em silêncio por um tempo. E então, subitamente, pulou para cima dela e começou a esganá-la. A cientista não estava conseguindo respirar, seus olhos passavam puro terror.

— Eu aproveitei que todos apenas se importavam com você e alterei a fórmula — confessou. — Ninguém nunca nem pensou que pudesse ter sido seu assistente, não é, doutora Crawford?

O tom da pele de Kermillian ganhava um tom arroxeado desesperador. Seus membros estavam ficando sem forças e ela sentia que ia desmaiar. Porém, sabia que, se dormisse, não acordaria mais.

Quando tudo parecia perdido, a porta se abriu em um rompante e revelou Chad, segurando uma arma na mão. Ao ver a situação que a cientista se encontrava, o vampiro rapidamente ergueu sua arma e apontou para a cabeça de Thomas.

— O que está acontecendo? — perguntou ele. — Thomas, eu vou te dar uma última chance de largar a Kermillian. Vai! — gritou. — Larga ela!

Porém, quanto mais tempo o vampiro demorava para atirar, mais irresistível o sono se tornava para Kermillian. Então, ela gemeu qualquer coisa para que ele fizesse logo o que precisava ser feito.

Sem que ninguém esperasse, um som muito alto tomou conta da sala e quase estourou os tímpanos de todos. Quando Kermillian se deu conta, Thomas estava caído no chão com uma poça de sangue ao seu lado.

Rapidamente, Chad foi até Kermillian e a abraçou.

— Raquel! — Uma voz chamou ao longe.

Chad se afastou dela e olhou-a no fundo de seus olhos.

— Promete que não vai me esquecer?

— Raquel, acorda! — Da onde vinha aquela voz?

Sentiu que o mundo estava começando a ficar embaçado e Chad começou a sumir aos poucos.

— Prometo — gritou ela.

Então se viu sentando em sua cama, com sua melhor amiga, sentada ao seu lado, olhando-a como se fosse louca.

— Promete o quê? — riu.

Raquel colocou as mãos na testa e olhou para o seu corpo de pijama. Tinha sido tudo um sonho?

— Nada… Eu acho que… Tive um sonho muito, mas muito doido.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Dreams" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.