Hastryn: Ascensão escrita por Dreamy Boy


Capítulo 39
O Ataque




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Katherine

Katherine se distanciou de Lothar antes do início do conflito e, juntamente com os guardas destinados a acompanhá-la em sua tarefa de encontrar as mulheres e crianças de Arroway, percorreu as ruas da cidade enquanto os invasores chegavam.

Do outro lado dos muros, estava Elliot Trannyth, seu grande amigo de infância. Temia pela vida do rapaz, mas nada poderia ser feito para protegê-lo. Elliot deveria sobreviver sozinho ao exército do norte, pois ela tinha a missão de salvar cidadãos inocentes do perigo da morte, impedindo que fossem alvos dos inimigos. Kath duvidava que Elliot houvesse se tornado um tirano assassino de pessoas indefesas, mas não confiava em seus soldados. Em muitas vezes, súditos desobedeciam a seus soberanos, principalmente quando se tratava de guerras. Ela jamais cometeria esse erro.

Em uma das casas pequenas, viu encolhida em um canto e abraçada à sua boneca de pano uma garotinha que deveria ter aproximadamente três anos, provavelmente perdida de seus parentes e consciente dos riscos que corria. Com lágrimas nos olhos, a mulher se aproximou e se ajoelhou à sua frente.

— Oi, meu doce... — Seu tom de voz procurava ser o máximo gentil e calmo possível. Katherine gostava muito de crianças e agradecia aos deuses pelos belos e amados filhos que ganhara. Aprendeu a lidar com pessoas pequenas através das experiências com Cedric e Daevon. — Sabe quem eu sou?

— Sim... A rainha.

— Sim, isso mesmo, e estou aqui para proteger você. — Kath delicadamente levou sua mão ao rosto da pequenina, secando suas bochechas avermelhadas. — Por que está aqui sozinha? Onde está sua família?

— O meu papai está lutando e a minha mamãe sumiu.

Era a mesma sensação de tortura que as gêmeas foram obrigadas a enfrentar nos dias em que Gregory Muirden batalhava nas arenas, sempre com a possibilidade de ser morto e deixá-las órfãs. A diferença é que Katherine e Evelyn eram mais velhas e mais preparadas para a dor da perda, ao contrário de alguém que tinha vindo ao mundo em poucos anos. 

— Acharemos sua mãe. — Foi tudo o que pôde prometer, ainda assim sabendo que esta poderia ter desaparecido para sempre, cruzando o caminho de alguém na hora errada.

Katherine a pegou no colo e caminhou até um de seus homens.

— Ele cuidará bem de você, eu prometo. — Virando-se para ele, proferiu uma ordem. — Quero que a conduza até o castelo e a entregue nas mãos de Charlotte, ninguém mais. Se ela permanece conosco durante à procura, poderá correr riscos de ser raptada no caminho. Portanto, é melhor que seja levada.

O soldado sacudiu a cabeça positivamente e, com cuidado, levou a menininha ao cavalo e juntos partiram até o palácio. Suspirando de alívio, Katherine continuou sua busca pelos habitantes perdidos.

Graças aos deuses, havia poucas pessoas fora dos abrigos, diminuindo os riscos de mortes daqueles que não se envolviam com a guerra. Entretanto, a mulher não descansaria enquanto não tivesse a certeza de que todos estavam a salvo e em seus devidos lugares. Percorreria a cidade quantas vezes fosse preciso para garantir isso.

Acharam uma jovem grávida que foi instruída sobre qual caminho deveria tomar até o castelo, evitando passar pelos campos de batalha. Como poderia entrar em parto, foi em companhia de mais um dos súditos, o que obrigou Kath a mudar de estratégia dali para frente. Poderia chegar um momento no qual ficaria completamente sozinha e não teria sobrado nenhum deles para acompanhá-la.

Parando para pensar, decidiu para onde iriam naquele momento.

— Devemos seguir para o outro lado da cidade. Algumas mulheres que trabalham no Rosa Indomável não saíram do estabelecimento ainda, continuando escondidas lá dentro. Evelyn foi uma destas, portanto, iremos buscá-las.

Conforme o grupo se locomovia, Kath ouviu o sussurrar de alguns soldados mais atrás. Não compreendeu totalmente o que fora dito, mas com certeza estavam se referindo a uma das gêmeas. Ouviu palavras como “prostituta” e “golpista”. Irritada, a rainha se virou.

— Disseram algo importante? — Seu tom de voz era extremamente sério, o que calou a todos. Sabia exatamente qual deles havia feito o insulto, mas estava disposta a ignorar o problema, desde que o assunto se encerrasse. Katherine não desrespeitava a ninguém, portanto, detestava quando faltavam com respeito a ela.  — Acredito que não devam perder tempo falando asneiras ou coisas desnecessárias em momentos como esse. Fiquem calados e me obedeçam!

O restante do trajeto foi feito em silêncio, para seu alívio. Não seria obrigada a matar alguém para mostrar seu nível de impaciência com estes e sua autoridade perante os membros de classes inferiores que se sentiam no direito de expor o que quisessem. As atitudes da rainha se assemelhavam às de Lothar, mas eram necessárias em algumas horas.

Apesar da raiva súbita que sentiu, voltou a ficar calma em poucos minutos depois. Permanecer nervosa somente a atrapalharia em suas tarefas, pois estas tinham de ser terminadas para poder retornar aos filhos e finalmente ficar em segurança ao lado deles até o fim do conflito.

O grupo parou em frente à grande casa rosa.

— Subirei sozinha. Fiquem esperando por mim próximos a essas escadas, pois retornarei com as mulheres. É provável que seja nossa última parada, mas ainda não sabemos se existem outros cidadãos precisando de ajuda.

Respirando fundo, Kath subiu os degraus cuidadosamente, com medo de acidentalmente tropeçar em um deles. Tinha lembranças ruins daquela moradia, onde as irmãs foram torturadas pela cruel Mafalda, que hoje se encontrava no Mundo das Sombras ao lado de todos os seres ruins que outrora viveram em Hastryn. A execução da mulher ainda a atormentava em seus pesadelos, mas Kath teria feito exatamente o mesmo se fosse naqueles dias. Ninguém tinha o direito de machucar a única parenta que lhe restara.

A porta estava aberta, como se alguém tivesse entrado ou saído dali em pouco tempo. Estranhando esse acontecido, Kath a empurrou e adentrou a residência.

As luzes estavam apagadas e todos os cômodos estavam em silêncio, como se as habitantes dali já tivessem se retirado e caminhado para o palácio, mas o grupo viera da direção do palácio e não as viu. Portanto, poderiam ter ido para outro local. Que local seria esse?

“Não é possível... Onde foram parar? Duvido que tenham a coragem de ir à guerra para enfrentar os homens. Não é do feitio dessas mulheres se intrometerem em assuntos masculinos. Estariam escondidas em outros locais da cidade?”

Insistente, a rainha continuou a busca por todos os cômodos. O grande salão estava vazio, os escritórios do primeiro piso também. Subiu as escadas de dentro, caminhando até os corredores dos quartos utilizados para atender os clientes.

Olhando um por um, se frustrava cada vez mais ao não encontrar ninguém. Decidiu ir até o quarto de Evelyn, o maior de todos os outros, já que era a administradora do bordel. Antes de girar a maçaneta, fechou os olhos e pediu aos deuses para que houvesse alguém no interior daquele aposento que fosse capaz de tirar suas dúvidas sobre a localização dos demais.

Estava tudo escuro, com cortinas inteiramente fechadas. Acendendo a luz, Katherine encontrou uma dúzia de mulheres de diferentes idades ajoelhadas e deitadas sobre o chão, apavoradas com a possibilidade de algum sulista ter invadido a casa e estar disposto a assassinar uma por uma.

— Katherine! — Uma de suas antigas companheiras de trabalho a reconheceu, indo abraçá-la. — Ela veio nos salvar! Façamos uma reverência à nossa rainha!

As outras prostitutas fizeram o gesto, deixando Kath um pouco constrangida. Percebendo a reação da rainha, levantaram-se e um sorriso esperançoso apareceu em seus rostos.

— Por que não se dirigiram ao castelo como o ordenado?

A primeira jovem respondeu.

— Tivemos medo de sermos caçadas ou atacadas pelas cidades, pois ninguém nos respeita ou nos vê como seres humanos. Além disso, pensávamos que não seríamos aceitas nos abrigos e que os outros nos olhariam com desprezo.

— O que pensam a respeito de vocês não interessa! — Katherine falou tão alto que assustou a si mesma. — Pensei que já trabalhassem aqui por tempo suficiente para entenderem isso. São seres humanos como qualquer um, mesmo que sejam poucos a reconhecer essa verdade.

— É tão difícil lidar com isso...

— Eu sei. Afinal, já fui uma de vocês. — Somente então olhou ao redor, prestando mais atenção em todas as que estavam presentes. Ficou surpresa ao descobrir que Evelyn não estava entre elas, voltando a ficar preocupada. — Onde está minha irmã?

— Evelyn saiu acompanhada de Thomas. — Um jovem guerreiro que ainda aprendia a arte da esgrima e provavelmente tinha fugido da batalha. Evelyn estava se apaixonando verdadeiramente pelo rapaz, e Katherine rezava para que o sentimento fosse mútuo. — Acreditamos que talvez estivessem indo para o castelo, já que não existe outro lugar que possam se esconder.

— Não estão! — Kath arregalou os olhos, temendo pela vida de sua irmã. — Venham comigo! Pequem tudo o que for necessário e desçam. Estarei esperando lá fora!

Em pânico, a rainha desceu os degraus de forma extremamente rápida. Quando deixou a residência e foi até seu cavalo, os homens repararam seu estado nervoso e se aproximaram, apreensivos.

— Sua Majestade, o que aconteceu? — Um deles perguntou.

Kath o ignorou, pois as meretrizes começaram a descer em fileiras, para que não empurrassem umas às outras. Observou a cena com atenção, até que estivessem em segurança ali em baixo.

— Vocês irão até o palácio e pedirão auxílio. Caso neguem esse direito, irei pessoalmente até lá para castigar os que se oporem à minha ordem. — A rainha respirou fundo, encarando os guardas que ainda teriam muito trabalho pela frente. — Temos algo a fazer agora.

O grupo de soldados se afastou das mulheres, permitindo que fizessem sua caminhada em direção ao castelo. Liderando a busca por Evelyn, Katherine passou por ruas em que não havia ido antes, à procura da jovem desaparecida.

Não obteve sucesso.

Foi quando um berro ensurdecedor veio dos céus e os interrompeu.

Curiosos, todos se viraram para trás e olharam para cima, tentando descobrir a fonte do barulho. Katherine teve um péssimo pressentimento, apavorada com o que viria a seguir.

Outro berro.

Duas criaturas gigantes e aladas atravessavam a cidade ligeiramente. Uma seguiu diretamente até o campo de batalha, ficando distante da outra, que viu o grupo e decidiu vir a seu encontro.

Desesperados, os cavaleiros e a rainha mandaram os cavalos andarem mais rápido para conseguir fugir da serpe que os perseguia, mas era impossível. A fera tinha uma velocidade impressionante e parou de frente para eles.

Os olhos da serpe encontraram os de Katherine, fazendo a jovem se arrepiar. Eram completamente vermelhos, semelhantes aos rubis brilhantes localizados nas minas subterrâneas da cidade. Ficou paralisada diante daquela visão, precisando ser puxada por um dos guardas para continuar a fuga.

A comitiva tentava loucamente escapar da visão da serpe, mesmo sabendo que seu faro era o suficiente para rastreá-los novamente. Conforme os membros corriam para diferentes lados, Katherine refletia sobre o que causara aquilo.

“Lothar fez uma viagem demorada às Montanhas Assombradas, locais que servem de habitat para demônios como esses. Teve a ideia de criá-los para o caso de precisar usá-los em algum momento e não revelou nada a ninguém, pois não queria que descobrissem seu segredo. Desde sempre, sabia que a guerra se iniciaria. Desgraçado!”

A fera faminta cuspia fogo para todos os lados, atingindo os homens que foram ficando para trás. Saciou sua fome ao se alimentar de seus corpos e dos cavalos que os pertenciam. Katherine se horrorizou com aquela cena, temendo que fosse a próxima presa.

O fogo se espalhava pela cidade, destruindo as casas que faziam parte daquelas ruas. Pela bondade dos deuses, não havia nenhum morador nas partes de dentro, pois ninguém gritou. Um problema a menos para ser resolvido.

Os guardas se dispersaram e Katherine ficou sozinha, acompanhada apenas do animal que lhe foi reservado para montaria. Fora abandonada por seus servos que se diziam extremamente fiéis e juraram batalhar para proteger os monarcas de sua nação. Agora, precisaria lutar sozinha para sobreviver.

Não tinha espadas e nem bestas para conter o ataque da réptil. A única solução seria despistar o animal e conseguir voltar para o castelo, onde se encontravam mais guardas e uma maior quantidade de armas que poderiam ser utilizadas.

Para sobreviver, Katherine precisou abandonar a tarefa de encontrar Evelyn. Teve uma sensação horrível por dentro, temendo que a irmã fosse atacada por uma daquelas criaturas, mas precisava sobreviver para que pudesse salvá-la. Motivada a escapar, prosseguiu pelo único caminho possível, com a enorme serpe voando logo atrás.

Até o momento em que foi alcançada.

A serpe atacou o último cavalo restante, obrigando-a a saltar de sua montaria e corresse caso quisesse escapar com vida. Entretanto, a única direção possível consistia em um beco vazio e sem saída. Para qualquer um dos lados, havia chamas espalhadas pelas ruas. 

Quando terminou de devorar a carne do bicho, o animal caminhou até a rainha com os dentes prontos para mais um ataque. Nesse momento, Katherine Wildshade fechou os olhos, aceitando a morte que lhe foi destinada.


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Notas finais do capítulo

Posso PROMETER que qualquer morte que acontecer nesse final terá um significado. Não será sem motivo.



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