Premonição: A Quarta Parede escrita por Állef Câmara Silva, Emmanuel Fernandes


Capítulo 3
Capítulo 3


Notas iniciais do capítulo

O andamento da investigação, a peça de teatro, as conversas do Christopher e da Alejandra. Tudo isso é mais, você só confere lendo abaixo.



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– Grace, você nos chamou? – diz Paul chegando a central.

– Rapazes, eu tenho boas notícias. – ela sorri – Consegui analisar as amostras que vocês me mandaram. A espuma que vocês me enviaram nada mais é do que uma solução aquosa de sulfato de alumínio e bicarbonato de sódio.

– Então, a boa notícia é que, o que encontramos foi espuma química? Como um extintor de incêndios pode causar um acidente? – pergunta Nicholas curioso.

– De maneira nenhuma, presumo... – diz Grace – mas não foi por causa disso que eu os chamei. As amostras do pó negro que me enviaram eram, com certeza, pólvora. – Paul e Nicholas olham entre si e voltam a olhar para Grace. Ela revira os olhos e faz uma cara ruim. – Deu afirmativo para bomba, mas pelo fragmento que vocês nos mandaram não deu para identificar nada. Ele está muito gasto e queimado. Idiotas... – ela sussurra o final.

– O que foi?

Grace ignora a pergunta de Nicholas e começa a falar consigo. Ela parecia nervosa e sussurrava algo sobre terroristas.

– É claro! Eu ia falar sobre o tecido que vocês encontraram. Eu tentei coletar dele alguma amostra de sangue, pele, cabelo... – ela dizia listando todos itens na ponta dos dedos – Tudo o que vocês podem imaginar, mas não encontrei nada. – Grace dá uma pausa para respirar. Ela falava às pressas, nocauteando os dois policiais com tantas palavras. – Venham comigo rapazes... Vamos para o meu escritório!

Grace caminha por entre os outros policiais que estavam no escritório e eles abrem caminho, observando-a atentamente. Grace DuBois era a chefe forense e responsável pelo laboratório criminalista. Ela era uma mulher ruiva, de olhos verdes e um rosto torto. Ela poucas vezes sorria e um dos seus hobbies era atormentar os rapazes. Primeiramente ela ser a superior e, depois, por ser uma mulher.

Grace entra no seu escritório, onde há um enorme telão e uma mesa cheia de teclas. Ela se aproxima do telão e passando a mão sobre a mesa, a tela se acende. Grace digita algumas coisas em seu teclado e aparece a faixada de uma loja em uma das ruas mais antigas de Paris: Rua Saint-Jacques.

– Como eu pude deixar passar essa peça? – Grace dá um zoom na tela e vai se aproximando aos poucos de uma loja da rua – Eu sabia que já tinha visto o emblema desse pedaço de tecido em algum lugar. Vocês se lembram de outro incidente que aconteceu na mesma noite do teatro?

– Claro. Está em todos os jornais até hoje... – diz Paul, esperando Grace faz suas mágicas no computador. Ela estava redefinindo a imagem, para deixa-la mais nítida.

– Bom, como peguei também o caso, posso dizer que não foi uma fatalidade comum. Quais são as possibilidades de alguém morrer igual ao rapaz?

– Eu não sei... Acho que poucas. – diz Nicholas.

– As chances são mínimas. É de um a 3141592653589793238.

Nicholas e Paul ainda se impressionavam com os cálculos mentais da moça, mesmo a conhecendo a uns bons cinco anos.

– Eu revi as filmagens e vi quando uma garota que estava sentada em um café gritou para um rapaz que estava sentado com ela e ele desviou. Ela sabia o que ia acontecer. Ela não podia ver o ônibus de onde ela estava sentada.

– Você está a culpando?

– Não. Só acho que o garoto que ela o salvou é um filho da puta sortudo. – ela ri – Ele quase morreu duas vezes. E vocês? Acreditam no sobrenatural? Que tudo tem uma hora de nascer ou morrer?

– Por essa pergunta agora?

– Rapazes... Eu só estou dialogando. Ajudaria se vocês entrassem no espirito. – Grace olha para a tela e olha para eles de novo. Ela ia demorar um pouco para deixar a imagem nítida. – Bem, vocês entendem de mitologia grega? Quero dizer, eu conheço uma boa história, se vocês quiserem ouvir... Eu posso conta-la a vocês.

Paul e Nicholas assentem com a cabeça.

***

Hellen está sozinha no quarto do hotel.

Após Charlie falar-lhe o assunto da carta, ele saiu sem dá satisfações para a garota. O telegrama era um homem de Nova Iorque que convidava Charlie para uma conversa informal. Ele tinha colocado o seu telefone e o endereço, caso ele fosse embora de Paris e quisesse, realmente, o visitar. Ele queria conversar com o garoto sobre o acidente no teatro.

O conteúdo era estranho. Mais estranho ainda, era o fato de a carta ter chegado logo após o acidente acontecer. Quando Charlie e Hellen voltaram para o hotel, lá estava ela. Ele sabia de algo, e Charlie precisava saber.

Hellen olhava pela janela, quando sentiu um vento frio causar-lhe calafrios. Ela olhou para as árvores na faixada do hotel, mas elas estavam imóveis.

É quando o vento entra no quarto e começa a passar sutilmente pelos pertences da jovem. Ela acompanhou o vento por onde ele passava até ela finalmente vê um pequeno bilhete sair debaixo da cama e pousar nos pés da jovem. Hellen vê o pequeno pedaço de papel e o pega. Era um ticket do teatro para a peça que eles iam assistir aquela noite.

Hellen sente um relampejo percorrer o seu corpo e corre até as suas malas. Dentro dela ela retira seu laptop e tenta rotear uma rede aberta. Ela abre um navegador da internet e procura a peça de teatro em um site de compartilhamentos de vídeos online.

Em poucos minutos o vídeo carrega e Hellen começa a assisti-lo.

***

– Vocês já ouviram falar das Moiras? – diz Grace se sentando na mesa para poder ver as expressões dos dois policiais.

Nicholas e Paul ficam calados.

– Está difícil. – diz ela com desgosto – As Moiras eram as três irmãs que determinavam o destino dos seres humanos e dos deuses. Elas eram responsáveis por fabricar, tecer e cortar o que seria o fio da vida de todos os indivíduos. – Grace enfia a mão em seu jaleco e puxa alguns fiapos de linha para mostrar aos policiais – Durante o trabalho, as moiras usam a Roda da Fortuna, que é uma espécie de tear que elas usavam para tecer os fios. As voltas da roda posicionavam o fio do indivíduo em sua parte mais privilegiada, quando a linha chegava ao topo, ou em sua parte menos desejável, quando ela estava no fundo. É assim que elas determinavam os períodos de boa ou má sorte de todos. – os olhos de Grace brilhavam, jamais falara tão bem de uma mulher – Elas pertenciam a primeira geração divina e assim como a mãe, elas eram domadoras de deusas e homens.

– E você acredita nisso? – pergunta Nicholas.

– Claro, você não? Toda história tem um fundo de verdade. Tudo o que você precisa é se atentar a lição. Em Ilíada, as Moiras representavam uma lei que pairava sobre os deuses e os homens, porque nem mesmo Zeus estava autorizado a transgredi-la. Faze-la, iria interferir na harmonia cósmica. – diz Grace, séria.

– O que isso quer dizer? – diz Nicholas.

– Os gregos são tão avançados quanto a Ciência. Vocês dois acreditam que eles já pensavam em átomos como uma partícula subatômica, capaz de compor a matéria?

Nicholas e Paul ficam mudos.

– Como os gregos sabiam que Zeus não poderiam mudar o destino sem inferir na harmonia? Vocês estudaram filosofia. Em uma escola de ensino médio, filosofia grega é o básico. – diz Grace – Por favor, não me desapontem seus idiotas.

– Atrás de um homem tem sempre uma grande, não! Uma mulher poderosa! – Grace ri – O que nos diz a posteriori? – Grace dá um tempo para os rapazes responderem, mas eles ficam calados. Sabiam exatamente que ela mesma queria responder. – Não? Certo! Posteriori é um conhecimento ou uma evidência que só pode ser adquirida por meio da experiência.

Grace parece contente e começa a sussurra consigo mesma, algumas coisas. Nicholas olha para os lados e percebe que a moça estava sozinha em sua sala. Ela não assistentes. Pudesse ser porque ela tão inteligente quanto gostaria aparentar, ou pudesse ser porque ela adora se destacar entre os homens. O último assistente que a jovem doutora teve a processou, mas nunca ganhou a causa. Ela não contratou um advogado de defesa, e nem precisava. A sua repertoria era impecável e pode, facilmente, convencer o juiz do contrário.

Paul olha para a tela do computador e percebe que a imagem ia clareando o que parecia ser uma tomada com uma cor próxima a bege.

– O que eu quero dizer é – ela dá uma pausa para fazer mãos de jazz – e se, alguém ou algo tentou desafiar o poder das três parcas? Eles iam modificar o universo. Não só a vida deles, como a vida de todo mundo. Nunca viram Doctor Who, não? – ela virou os olhos – De alguma forma, as Moiras teriam que tomar providencias para consertar os cacos soltos. Láquesis teria que mudar sutilmente o destino de um por um para se sentir no controle de novo, e Átropos teria que esperar para agir. Nunca se sabe o que se pode esperar de deuses. – Grace bufou e revirou os olhos – A conversa está desinteressante para vocês? Claro que não... – ela ri debochada.

– É... Grace... – diz Paul.

– Sim? – ela olha para ele com um sorriso ameaçador. Ela havia a interrompido enquanto ria de forma maquiavélica.

– A imagem... – ele tosse.

Grace se vira para foto e consegue ver a imagem nítida de um logotipo com o desenho de um porco e um boi acima de dois garfos cruzados.

– Rapazes... Aqui está! – ela volta a digitar algumas coisas no teclado – Quando tomei conhecimento do caso da morte de um dos garotos do voo 180, eu disse que precisava ver com os meus próprios olhos. Foi quando eu reparei que, antes do ônibus passar eu vi um furgão branco com a logo do seu tecido, Paul. É... – Grace mostra uma foto digitalizada no computador do tecido aos rapazes e compara com a imagem do furgão – As imagens se batem. O que me dizem?

– Obrigado? – diz Nicholas, arrastado.

– Não, não! Não é isso. O seu bandido pode trabalhar em qualquer um dos açougues Zulawski Frigo. Eu acompanharia vocês na missão, me parece muito divertido, mas... – Grace muda a expressão consideravelmente – Problemas de garota! – ela dá uma piscadela e se volta para o telão, admirando seu trabalho.

– Grace! – diz Paul.

– Oi? – ela se vira.

– Obrigado! – Paul bate continência para a mulher com um sorriso no rosto e ela apenas revira os olhos.

***

Um bruxo estava em cena. Vestia-se de preto e usava uma capa longa. Não tinha adornos ou chapéus pontudos, apenas uma varinha que ele erguia no ar. A ponta do graveto brilhava e quando ele mexia os braços na velocidade certa, parecia que ele estava escrevendo no ar com o objeto.

É quando ele bate a varinha contra o ar e do seu lado aparece um homem oculto por sua capa levantada. Ele solta a capa e deixa-a pendendo, revelando o seu rosto e dentes pontudos. Era um vampiro. Ele olha para o bruxo, incrédulo pelo convite.

– Por que me chamaste? Tu não me odiaste?

– Caro amigo, eu o convidei apenas para um pequeno desafio. Conheço a sua fama por essas bandas e confesso que fiquei surpreso. – o bruxo ergue a mão para cumprimentar o vampiro, mas é ignorado.

– Do que se tratas tal desafio? Tu não podes vê que estou mui ocupado?

Um fantasma caminha por entre os rapazes, mas eles pareciam não repara-lo. Ele estava invisível aos olhos de todos. Ele ouvia atentamente as palavras dos dois.

O bruxo convidou o vampiro a se juntar a ele a uma pequena vingança contra os aldeões do vilarejo. Os seus poderes estavam crescendo incessantemente cada dia que passava, porque os dias de maldade estavam próximos – o Halloween se aproximava. Ele queria realizar a vingança durante o dia da festa de graças por uma colheita bem sucedida e só terminaria a desgraça no Dia das Bruxas, quando ele executaria o golpe de misericórdia.

É então, quando o fantasma aparece e interrompe a conversa.

– O que vocês estão pensando em fazer? Eu topo. – ele ri maquiavelicamente – Jamais aguente tal gente. Quando vivo fui acaso de afano e fui executado. Minha família passavas fome e eu, necessitado, não pude negar-lhes comida.

Os dois o observaram e assentiram com a cabeça. Eles ainda tinham que criar um plano para causar o tumulto.

Quando o dia do festival chegou tudo ocorria às mil maravilhas. Faixas estavam amarradas entre as casas que ficavam ao redor da praça principal da cidade e postes já estavam começando a iluminar o interior do pequeno vilarejo. Todos os aldeões vestiam as suas melhores roupas e sorriam entre as conversas e gargalhadas altas.

Foi quando a música começou com seus pandeiros e acordeões.

Todos levantaram as mãos e gritaram um “hey”. Então, começou-se a dança. Todos pisavam na ponta dos pés girando em círculos e deixando a poeira subir. Foi quando um acompanhou o outro e, em uma fila, todos começaram a andar em espiral. Parecia uma legitima comemoração campestre. Todos gritaram novamente “hey” e ficaram entre as gargalhadas e a agitação. Um casal de idosos bridaram as suas canecas cheias de cevadas, deixando-as entornar, e deram um rápido beijo. Não havia malicia em seus rostos, apenas alegria e risos contagiantes.

O bruxo, o vampiro e o fantasma assistiam a festa por entre as árvores que ficavam ao norte da praça. Estava à noite e a iluminação baixa os ocultava por entre os troncos. Eles observavam com desgosto para aquele pequeno grupo de pessoas.

É quando o bruxo resolve colocar o plano em prática: ele lança um feitiço contra um poste que estoura a sua lamparina. Mas, por conta da música alta e a agitação, ninguém viu quando as faíscas entraram em contato com as faixas e com as mesas onde estavam os pratos preparados com os bons frutos da colheita.

Aos poucos, o fogo começou a se alastrar e todos os aldeões entram em pânico, correndo para dentro de suas casas para pegar baldes e recipientes para conter o incêndio. Então, um a um, todos são ceifados pelas chamas. As casas tinham as paredes de pedra e os telhados de palha e, como as faixas estavam amarradas por entre as frestas delas, o fogo se espalhou fácil por toda a vila.

Telhados caiam de surpresa soterrando famílias e queimando-as vivas. Um homem desavisado, às pressas, correu até a praça e foi decapitado por uma faixa baixa que estava esticada. Casas desmoronavam. Pessoas eram pegas pelas chamas, alimentadas pelo ódio do bruxo, e caiam no chão sem vida, pisoteadas sem vida.

Os aldeões corriam pelas suas vidas para dentro da floresta e não voltavam mais. Os passos e os gritos se cessavam lentamente. Dentre os aldeões que escapavam, estava Helena e Charles, um casal apaixonado que veio das terras do ocidente em busca de uma nova vida no pequeno vilarejo. Eles estavam com as mãos dadas e corriam por entre a grama baixa, desviando dos galhos e cipós.

Foi quando eles se encontraram em um campo aberto. Lá estavam dois homens os quais eles nunca tinham visto. Eles olharam para o casal e um deles diz:

– Vocês estão bem?

Os jovens confirmam.

É quando uma mulher aparece correndo por entre a relva e aparece do outro lado e todos a encaram. Ela estava com a saia rasgada e suja de lama, suor escorria dos seus olhos assim como lagrimas. Ela havia visto uma criança morrer na sua frente após cair em um buraco fundo no meio da floresta, mas não pode o ajudar. Estava com medo.

Foi quando um homem surgiu por trás dela com um machado. Era o lenhador.

O lenhado estava molhado de suor por entre os braços e abaixo do pescoço e o machado pendia em sua mão abaixado. Ele não estava ali para ataca-los, estava tão assustado quanto eles. Os dois homens que já estava ali no campo anteriormente, então, diz:

– Estão todos bem?

É quando eles ouvem um estrondo.

– Oh meu Deus, o que foi isso?

– Eu não sei, mas me parece que o som veio daquela direção – Charles aponto para a direção de onde eles acabavam de vir.

– O vilarejo! Estamos condenados!

– Não! Vamos ficar calmos... Temos que pensar direito. Alguma coisa causou aquele acidente e não sabemos o que e nem como.

Todos o ouvem, mas depois começa uma discussão inútil. Eles queriam ser ouvidos, mas muito poucos queriam eles ouvir. Estavam a reclamar de como aquilo os atingiu de surpresa e comentou a maneira como eles saíram do vilarejo às pressas para se manterem vivos. Charles começou a ficar cansado, entrou na floresta e voltou com algo em mãos.

Então, ele arremessou contra o chão violentamente e pequenos estalos foram ouvidos.

Todos pararam e o olharam.

– Bom, como eu disse: precisamos nos acalmar. – Charles olha para Helena – Que tal nos apresentarmos? Poderia nos ajudar a nos aproximarmos.

Uma pequena algazarra se instaura. Todos confirmavam e Charles jogou outras daquelas frutinhas no chão.

– Que tal, começar pelos que estavam aqui mais tempo. – ele olha para os dois homens que eles encontraram primeiramente – Você! Venha aqui por gentileza.

– Eu?

Charles confirmou com a cabeça e desceu da pedra, para dar lugar a um dos homens que não tardou-se muito para subir na pedra. Ele olhou para todos e com confiança, falou. Falou como se ele fizesse aquilo com frequência.

– Eu sou Pablo Henrique. Eu e meu amigo fazemos a segurança de um pequeno pasto nas proximidades em uma fazenda pequena. Somos os encarregados de alimentar as ovelhas e cuidar para que elas vão para o pasto e voltem em paz. Eu não se já vos disse, mas uma vez, enfrentamos um enorme urso. – Pablo explicou sobre o episódio e todos estavam interessados em saber da sequência.

Por fim, ele desceu da pedra e deu a vez para o seu amigo.

– Sou Nico. Eu não vou me estender em minha história, pois Pablo já o fez. Quando vimos o incêndio começar, saímos da festa. Já sabíamos o que ia acontecer e preferir não ficar para vê. Conseguimos trazer conosco algumas pessoas, mas elas estavam sendo raptadas pelas árvores durante o trajeto. Foi muito estranho. – Charles estavam tremendo e Helena dá pequenas tapinhas nas costas – Quando finalmente saímos da floresta, nos instalamos aqui. Fim. O resto vocês já sabem.

Todos se entreolharam, exceto Pablo. Ele já sabia do temperamento do amigo e forma ríspida como ele falava. Helena soltou a mão de Charles e subiu na pedra com dificuldade, o seu vestido fazia com que ela perdesse toda a flexibilidade e boa parte dos movimentos por ser muito apertado. Quando conseguiu, começou a falar:

– Olá a todos, o meu nome é Helena. Charles e eu não somos daqui. Nós morávamos em um vilarejo maior e que fica onze dias para o oeste. Queríamos nos casar, mas era um relacionamento do qual vossos pais não aprovariam. Então deixamos nossas terras e ficamos aqui em uma pequena estalagem. A senhora Margot nos permitiu morar com ela por todos esses tempos, porque não tinha ajuda e poucos visitantes vinham ao vilarejo para passar uma noite. Estava eu no festival levando uma torta quando vi uma lamparina estourar e pequenas brasas se espalharem pelo céu. Eu tentei impedir. Eu chamei ajuda e quando trouxemos água, o caos já tinha sido instaurado. Quando vimos que não tinha mais solução, fugimos assim como os outros para dentro da floresta... – Helena chorou e saltou da pedra nos braços do marido, que solto-a onde estava anteriormente.

Então, a outra mulher começou a subir em cima da pedra e recebeu ajuda do lenhador, o agradecendo em sequência.

– O meu nome é Alessandra. Eu leciono as garotas mais novas do nosso vilarejo a arte lírica. Eu toco harpa quase todas as minhas e, hoje, não foi diferente. Eu estava na festa como todos aqui e quando voltei para casa, percebi que havia me esquecido algo e resolvi volta para comemoração. Lá estava a confusão, pessoas correram para cima de mim e eu segui o fluxo e entrei na primeira janela que vi. Depois comecei por entre as chamas a procura de almas ainda vivas e encontrei um garoto chorando pela mão que estava caída por entre palha. Eu o levei comigo para a floresta e fugimos. Foi tudo tão rápido... Eu não vi quando ele soltou as minhas mãos, só senti quando seu corpo pendeu e me puxou para lado. Quando percebi, ele tinha caído em um buraco e não se movia. Foi terrível. Ainda sinto a culpa do seu sangue derramado. Eu não pude intervir nem ajuda-lo. Eu sou um monstro! – Alessandra sai da pedra com a ajuda do lenhador que, por sua vez, se levantou na pedra.

– Meu nome é Christian. Eu sou um lenhador local e também um carpinteiro. Não tenho família desde que eu me lembre. Sempre morei com uma idosa que acolhei e mora em uma casa na floresta, quando ainda era um bebe. – ele bufou – Estava eu na festa, o fogo começou, eu tentei ajudar apaga-lo, não conseguimos, fugimos e, agora, cá estou.

O homem desceu da pedra e todos por fim, acalmaram os ânimos. Nico e Pablo convidou-os a vir passar algum tempo com eles até que tudo voltasse a ser como era antes. Christian iria na festa, caso uma árvore resolvesse se mexer. Era o único com uma arma branca. O pequeno grupo se aproximou da floresta e adentraram na mata densa e escura. Era noite e nenhum deles tinha uma lamparina ou tocha.

Eles teriam que se guiar pela luz das estrelas e da lua.

O que eles não sabiam era que alguém os vigiava. Uma pequena sombra perto dali os olhava aquele tempo todo, quando eles entraram na mata. Ela entrou no lado oposto e desapareceu instantaneamente.

***

Alejandra estava em uma sala com as paredes de vidro. Ela estava se alongando na barra, quando reparou um pequeno tumulto em um dos cantos da sala.

Ela ignorou-o e se soltou da barra.

– E 1. E 2. E 3. – ela tentou esticar a sua perna no ar e coloca-la o mais alto possível, mas não o conseguiu. Precisava de concentração e os cochichos das garotas mais jovens estavam a incomodando.

Então, ela cedeu-se a curiosidade e foi ver o que estava acontecendo.

Era uma garota mais jovem, no centro, quem estava dando as boas notícias. Ela estava com uma carta nas mãos e lia para todas as outras que estavam ao seu redor, tentando alongar seus pescoços para ler também o conteúdo da carta.

– Eu, Grand Stromae, a convoco para se encontrar comigo em meu estúdio. Você é uma das pessoas mais brilhantes que fez a audição para o Badalar Noturno. – as garotas ao redor da garota da carta deram gritinhos histéricos – Jamais vi tanta flexibilidade e leveza. Digo não como amigo, mas como especialista, que você é o que procuramos para a nossa academia. Parabéns! – todas as garotas começaram a dá pequenos pulinhos e se abraçar.

Alejandra resolveu se afastar.

Ela estava desnorteada.

Estava naquela pequena escola a quase oito anos e nunca tivera uma oportunidade de ouro. Ela era uma excelente bailarina, uma das melhores para a sua idade. Mas, ela se sentiu vencida por uma garota que era muito mais nova. Stacy era muito bonita e tinha os seios bem maiores do que o de Alejandra. Rapidamente, ela se sentiu inferior.

Tudo o que Alejandra pode fazer foi ir até o seu armário, abrir a porta com a combinação da tranca e tirar um pequeno cantil.

Ela deu um demorado gole e sentiu a sua garganta queimar. Era álcool.

***

Charlie chegou no quarto e viu que a namorada estava deitada sobre a cama com o seu notebook. Ela estava digitando algumas coisas quando Charlie se aproximou e deu um pequeno beijo no rosto moreno da jovem.

– Como você está? Ficou cansada de ficar aqui sozinha?

– Não. – ela riu – Na verdade, eu fiquei bem ocupada. Eu dei continuidade a peça aqui mesmo. Eu achei esse bilhete e pensei “E por que não? Eu posso vê-la pela internet”. Você precisa saber o que acontece na história. Eu me senti fazendo parte dela. Imagine só.

– Antes. – ele dá uma pausa – Eu preciso me explicar. Dizer a você a minha falta.

– Não precisa Charlie, eu confio em você. Sabe disso. – ela sorri.

– Eu fui usar o telefone. Tentei ligar ao William, mas sempre que o tentava dava na caixa postal. Foi quando eu fui para um net café e procurei conferir se o número de telefone batia com o endereço e... Deu erro.

– E então? O que faremos? Vamos mesmo ao encontro desse estranho?

– Eu não sei, poderia ser arriscado. – ele dá uma pausa – Só que mais arriscado ainda seria esperar que algum de nós começasse a morrer. Não posso deixar isso acontecer.

***

Christopher estava em sua caminhada matinal, quando passou próximo a um café e viu uma alma conhecida. Ele tira os fones de ouvido e diminui o ritmo dos trotes até parar. Atravessando a rua, ele se aproximou da mesa e colocou a mão na cadeira para chamar a atenção da moça que olhava para o cardápio.

– Posso me sentar aqui?

– Oh, você! – disse a bailarina, assustada.

Christopher se sentou na cadeira e desabotoou os dois únicos botões da sua blusa de ginastica para conseguir respirar. Então, ele estendeu a mão e disse:

– Prazer, meu nome é Christopher!

– Alejandra. – ela o cumprimenta.

– Coincidência nos encontrarmos novamente depois de tudo o que aconteceu. – ele puxa a sua cadeira e se aproxima ainda mais da mesa e da moça, que estava do outro lado da mesa com seu livro.

– É... – ela volta a ler o cardápio.

Christopher olha para os lados e fica um pouco incomodado. O lugar estava um pouco cheio. Quase todas as mesas do lado de fora do pequeno comercio estavam ocupadas por casais, com exceção da mesa de Alejandra.

– Desculpe-me, mas eu estou a interrompendo...

Alejandra abaixa o cardápio.

– Não! Não, fique. Por favor. – ela aponta para algumas opções do menu que ela tinha deixado sobre a mesa – Eu só estou procurando algo para beber e estou um pouco indecisa.

– Dia difícil?

– É tão evidente assim?

Christopher esboça um sorriso e coloca uma mão na mesa.

– Se quiser se desabafar...

Alejandra fica calada e volta desvia o olhar.

– Quer a minha opinião? – ela levanta a cabeça e olha para Christopher – Eu acho melhor você tomar um cappuccino de chocolate com bastante creme e marshmallows. Ele sempre me ajudar a pensar melhor e cura a ressaca. – Christopher sorri – Peça em um copo com tampa, se você não vê o que está tomando, não senti culpa.

Alejandra sorriu.

– Você tem um sorriso bonito... – Christopher deixou escapar.

– O que? – a bailarina sentiu-se esquentar. Estava ficando corada.

– Eu disse que você tem o sorriso mais bonito que eu já vi.

Um garçom se aproxima da mesa dos jovens e pergunta-os qual era o pedido deles. Sem demora, eles pedem o cappuccino como recomendação de Christopher e eles começam um papo sobre o cotidiano. Alejandra estava à espera de conseguir um papel importante em sua peça, mas o perdeu para uma garota mais jovem que havia dormido com o diretor. Christopher a ouvir atentamente e sentiu o odor forte do álcool sair dos lábios da jovem, ela parecia estar muito mal.

Já Christopher estava treinando como de costume. Era dezembro, e as lutas oficiais haviam acabado para ele. Estava de férias em Paris e ficava a maior parte do seu tempo na academia. Era muito melhor do que se sentir a sós em seu pequeno apartamento imundo.

– Aquela noite, quando eu saí do teatro, eu não pensei que o garoto estivesse falando a sério. Eu apenas queria vê até onde a história desenrolava.

– Então... Você queria vê uma briga? – Alejandra ri.

– Pode-se dizer que sim. – Christopher rir junto.

– Eu saí do teatro, porque eu não gostei muito da peça. Digamos que quando aquele garoto levantou a voz, eu tive uma oportunidade de sair.

O casal conversava na mesa quando um senhor mais velho se sentou em uma banqueta próximo a porta da cafeteria e começou a tocar um acordeão. Era uma música calma e Christopher vê uma moça batendo os pés no chão. Então, ele tem uma ideia.

– Vamos dançar?

– Aqui?

– Por que não? – Christopher se levantou da cadeira e estendeu a mão – É só pensar que você está se apresentando para todas essas pessoas. Apenas... Feche os olhos.

Alejandra fechou os olhos e se levantou com a ajuda de Christopher, ele a conduziu até um espaço mais aberto onde não havia mesas e colocou a mão dela em seu ombro enquanto segurava a outra com sua mão direita. Então, ele colocou a mão em sua cintura e tentou rodá-la. Alejandra se desiquilibrou, mas conseguiu se segurar firme nos ombros grandes do rapaz.

– Agora pode abrir os olhos. – Alejandra abre os olhos e fica corada.

Os dois continuaram a dançar e o velho, percebendo, tocou ainda mais com gosto.

Todos que estavam sentados conversando, vendo a cena, começaram a dançar acompanhando a música. A noite tinha tudo para ser perfeita e Alejandra não tinha horas para voltar para casa. Depois do que aconteceu e encher a cara, ela ficou por algum tempo naquele pequeno estabelecimento pensativa.

Agora, ela dançava. Estava nos braços de um rapaz que ela pensou estar gostando.

Tudo estaria certo, se não fosse por um homem que os observava pelo retrovisor de um furgão branco. Ele estava com uma expressão séria. Então, ele deu a partida no veiculo e foi embora. Ele tinha outros planos para o dia seguinte.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado e, no mínimo, deixem algum comentário. Se você gosta história, não deixe de falar. É importante sabermos que você nos acompanha e nos impulsa a continuar. ;-)



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