Dossiê Bellatrix escrita por Ly Anne Black


Capítulo 4
Purgabit Sordes


Notas iniciais do capítulo

Capítulo dedicado à Larii Teefey, que inflou meu ego horrores essa semana ;)



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Narcissa cumpriu a promessa da sua última carta, de modo que logo após o almoço de páscoa Bella foi chamada para encontrar-se com a irmã no pátio de Hogwarts. A mais nova observou de longe a moça, que trajava um longo vestido azul marinho combinando à perfeição com o cabelo loiríssimo, quase branco, tão comprido que as pontas já tocavam a faixa da sua cintura. Das três irmãs, Cissa era a que tinha a beleza mais clássica, que lembrava as bonecas de porcelana francesas.

Olhos com orbes cristalinos mais claros que a cor da sua roupa a perscrutaram de cima a baixo. Bella só não esperava que fosse abraçada quando chegasse perto o bastante.

– Bella – Cissa sorriu – você faz tanta falta nos meus dias.

A aliança de ouro e esmeralda da loira brilhava em sua mão esquerda.

– Eu nunca mais estarei – disse fria – uma hora você acabará se acostumando.

Narcissa não deu importância para o comentário mal-criado, já não era novidade para ela o fato de Bella desaprovar seu marido. Isso só a lembrava do assunto que viera tratar com a irmã. Indicou o corredor pelo qual começaram a andar.

– Vejo que está se alimentando melhor agora. Da última vez que falei com Rodolphos ele confidenciou que lhe achou um tanto abatida, mas você parece saudável agora, ganhou peso.

– Cissa – Bella reclamou – não seja indelicada. Além do mais estou farta de todos muito preocupados com a minha saúde, quando nem meus próprios pais estão dando importância a isso. Nem a qualquer outra coisa, é lógico. – completou num tom óbvio.

– Você sabe como andam ocupados – não, Bella nem imaginava o que poderia deixar os pais tão ocupados desde que a tinham jogado em Hogwarts – exatamente por essa razão vim aqui hoje, sabe disso. O seu casamento... – ela repreendeu com os olhos a expressão impaciente da irmã – o seu casamento deve acontecer o mais breve possível. Talvez pareça um pouco cedo, mas as análises econômicas de papai indicam que esse é o momento mais propício para a união das famílias.

– Qual é mesmo a minha parcela de lucro nesse 'grande investimento'? Ah, espere um momento, eu só tenho a perder. – disse com azedume.

– Papai já está providenciando os documentos que lhe permitirão o matrimônio no estado de menor de idade. Vai passar à tutela de Rodolphos até completar dezessete anos, isso não será um problema.

Bella mal podia expressar o quanto aquilo soava absurdo para ela, então preferiu se calar. Quanto menos falasse, mais rápido sua irmã terminaria e iria embora.

– Ainda essa semana você deverá receber a visita da Sra. Hildes, a verificação do seu estado de saúde é uma condição para que o casamento aconteça.

Ela parou no meio do corredor, não esperava por aquilo.

– O que quer dizer?

– Bella, não seja imatura – a loira suspirou paciente – você sabe bem o que faz a Sra. Hildes, há décadas ela cuida das mulheres das famílias bruxas mais respeitáveis, e ela é a melhor em conferir o estado geral da noiva antes do casamento.

– “Conferir o estado geral”, você diz – Bella sibilou – Isso é ultrajante e tão arcaico. Qual será a próxima coisa, eu vou receber uma etiqueta? Eu serei embalada em uma caixa e enviada por correio coruja?

– Isso seria interessante de se ver – Narcissa disse, com um meio sorriso, voltando a andar e a levando consigo – Eu mesma fiz os exames com a Sra. Hildes. Você não deve se preocupar, basta usar o seu poder de persuasão para manter a velha calada, se houver algo que a família Lestrange não precisa saber.

– Você não sabe o que está dizendo. – a irmã falou baixo, quase para si mesma, uma vez que as palavras da primogênita não lhe tinham tranqüilizado.

– Ah, e não devo me esquecer, e agora, não é por nossos pais que falo, mas de irmã para irmã: o que você está pensando, Bella, se envolvendo com os negócios daquele… aquele, Você-Sabe-Quem?

– Lord Voldemort. – Bella a corrigiu pronunciando o nome como se sentisse seu sabor. Cissa fez uma careta. – Ele é um bruxo fantástico e poderoso, ele está disposto a acabar com os sangue-ruins e trouxas que estão infestando nosso país. O Lord vai além das palavras, Cissa. Ele realmente faz alguma coisa.

– Certo! E eu não estou condenando isso! – completou – o que não justifica o seu envolvimento!

– Estou do lado dele e me orgulha ajudá-lo. O seu marido engomadinhoe o Rodolphos concordam, você devia nos ajudar!

– Por Merlin, minha irmã – Cissa a pegou pelos ombros, na sua última e mais direta tentativa de por algo de sano na cabeça da caçula – esse serviço não é para nós! Deixe que eles façam isso, eles podem se arriscar, mas se algo te acontecer…

– Nada vai me acontecer – Bella sorriu – eu sou forte, Cissa, eu sou boa nisso. O Lord gosta de mim. Eu vou ser a melhor comensal que ele jamais terá, você vai ver. Ele vai me fazer o seu braço direito em comando, e vai confiar mais em mim do que em qualquer outro.

– Ele não vai, minha irmã. Ele vai lhe usar, e ele lhe fará fazer coisas, e quando você recusar ele vai dispensar você, ou coisa pior… o que eu tenho ouvido dizer, Bella, esse homem é um louco!

– Nesse caso – ela não parara de sorrir, as imagens de Voldemort ainda muito lúcidas em sua memória – é melhor eu não recusar nada, não é?

–BD-

Era madrugada, o luar crescente perpassava seu rosto cada vez que a jovem, em sua caminhada cuidadosa, passava por um dos vários vitrais do segundo andar. O pesado livro advindo da sessão proibida da biblioteca pendia em uma de suas mãos, a página ainda marcada por um de seus dedos. A luz tênue da varinha empunhada pela outra mão iluminava apenas poucos passos a frente do seu caminho, mas ela já o fizera varias outras vezes e não considerava se perder.

Parou, então bem a frente da porta baixa, o galpão de ingredientes de poções da escola. Os monitores tinham acesso a ele, já que podiam praticar poções mais avançadas, desde que anotassem detalhadamente cada ingrediente dali retirado e dessem conta do que estivesse faltando no final do mês. Ela tinha esperanças de que a senha fosse a mesma, ou teria que arrombá-lo.

– Winggeweld – sussurrou.

– Não tão fácil, Black. – uma voz atrás de si a fez congelar o movimento.

Ela não demonstrou susto, apenas deixou o braço cair ao longo do corpo e virou-se para o monitor chefe do sétimo ano da Grifinória.

– Remus Lupin – sorriu debochada – eu estava contando com encontrar você.

– Se afaste do galpão, você não é mais monitora e não tem permissão para pegar ingredientes.

– Oh, como eu poderia me esquecer. Valeu a pena a cara de medo daquela Loren quando eu ia azará-la, eu não me arrependo.

– Você ia usar uma maldição imperdoável nela, Bellatrix. O Sirius me contou. Você sabe que isso é crime?

– Hum, espere, qual Sirius? Aquele que me jogou tão forte contra a parede que quebrou a minha cabeça? – ela foi do tom irônico ao cruel em segundos, estreitando os olhos negros – O seu amigo é tão criminoso quanto eu. Eu podia ter morrido. Ele vai acabar matando alguém qualquer dia desses.

– Cala a boca! – Remus num impulso ergue a varinha na direção dela – não o compare a você!

– Mesmo sangue... – ela riu – mesmas atitudes.

– Já chega. Você não pode andar pelos corredores à noite e muito arrombar o armário de ingredientes da escola. Eu vou lhe denunciar, é melhor você me acompanhar até o escritório no vice-diretor.

Bella deu uma risada cínica, ao constatar que aquele perdedor, de roupas esfarrapadas e expressão doente estava tentando lhe dar ordens. As faces de Remus coraram ao ver a Black tripudiando de si, mas ele permaneceu firme.

– Vamos fazer um acordo. – ela parou um pouco de rir – Você finge que não me viu aqui e eu não te provoco a dor e a humilhação que mal posso esperar para causar.

– Eu não faço acordos com sonserinos. – Remus respondeu firme, trincando os dentes.

– Pena. Tarpetrius!

Remus não foi rápido o bastante para se desviar e o feitiço o atingiu em cheio, fazendo o rapaz rodar no ar até ficar de cabeça para baixo. Com mais um aceno da varinha de Bella ele se sentiu colado à parede, incapaz de gritar. Ela piscou um olho para o rapaz, em seguida verificou que de fato ninguém mudara a senha do galpão de ingredientes e entrou, juntando tudo o que precisava com cuidado, já que eram os menos usados e ficavam nas prateleiras mais altas.

Ao sair, lançou um feitiço de confusão no monitor, e a única coisa que de que Lupin se lembraria na manhã seguinte era que fora incompetente em seu trabalho e não pudera conter uma garota um ano mais jovem que ele. Conhecendo o senso de responsabilidade de Remus, Bella achou que aquilo seria para o maroto bastante perturbador.

Levou o pequeno caldeirão de cobre para o banheiro do seu dormitório, agradecendo a sorte de que aquela poção era de preparo rápido. Tomara cuidado para roubar do galpão mais ingredientes do que precisava, deixando confuso qualquer um que tentasse descobrir o que queria preparar.

Adicionou as raízes de bandinho e o sangue de farosutil, que era um caldo espesso de coloração azul brilhante, que ela usou apenas a metade da quantidade indicada na receita, julgando que era o suficiente. Cerca de quarenta minutos depois obtivera um liquido âmbar e transparente, facilmente confundido com uma bebida destilada, inclusive pelo cheiro alcoólico que desprendia. Derramou a poção no copo, o preenchendo quase até a borda, e deixou-o do lado da banheira.

A garota despiu-se das roupas, as colocando dobradas próximo ao grande espelho do banheiro. Ligou a torneira, e enquanto esperava a água morna encher a banheira, olhou o próprio reflexo demoradamente. Narcissa talvez tivesse razão ao dizer que parecia mais 'preenchida'. Seus quadris estavam sutilmente mais largos, assim como os seios cujos mamilos tinham uma nuance de rosa mais evidente. Seu cabelo estava mais comprido e brilhante, cascateando pelos ombros. Bella abaixou os olhos até a altura do próprio umbigo, então por um momento perdeu-se em pensamentos, até que o barulho da água a chamou para a realidade do banheiro frio do dormitório.

Imergiu na água morna, mergulhando por um momento, desfrutando da sensação de leveza e amparo. Quando voltou a superfície, suas mãos foram direto ao copo cheio da poção que ainda estava quente. A tocou nos lábios sentindo queimar, não pela temperatura, e sim porque era ácida e amarga e o cheiro já lhe dava fortes náuseas. “Vamos lá, de uma vez só”, disse para si mesma, virando a poção na garganta.

Ela não conseguiu beber tudo de uma vez, no entanto, e teve mais chances do que precisava de sentir a terrível ardência da mistura garganta abaixo.

Os efeitos começaram imediatamente. Primeiro a sua cabeça ficou leve, como se tivesse cheia de ar, e depois ela parou de sentir a banheira e a água em contato com a sua pele, parou se sentir que respirava.

Então veio a dor. Teve certeza de que sua carne estava sendo virada do avesso, sendo queimada e arrancada por garras de dentro para fora. Tentou gritar, mas sua boca se abriu e se inundou, e engasgou, engoliu, debateu-se para puxar o ar com toda a força novamente.

As mãos se agarravam as laterais da banheira que ela não sentia, os nós os dedos brancos, as veias saltando-se no seu pescoço, nas mãos, no rosto, em toda parte azulando a sua pele horrivelmente.


Ela sentiu que se dissolvia.

"Estou curada", pensou em meio a toda a agonia. Seus olhos se abriram para o escuro e para vultos. Ouviu ruídos e barulhos cem vezes amplificados, ouvia gotas, choro, vidro se partindo, uma sinfonia enlouquecedora que retumbava no fundo da sua cabeça.

Novamente tentou se agarrar às bordas da banheira, mas estas também se dissolveram.

Estava caindo rapidamente no vazio.

Bellatrix sentiu, com certo alívio, que estava perdendo a consciência.

–BD-


"Toujours Pur".


Havia um demônio a perseguindo.


"Sempre pura".


Suas mãos tinham marcas, cortes manchados de lama, e a lama vinha das suas veias, e ela sentia tanto nojo...


"Estou suja."

Eram muitos demônios, eram um milhão deles, pequenos, a cercavam, a seguravam, ela esticava a mão maculada e Ele lhe negava. "Eu tenho nojo de você, traidora". Seus joelhos cediam ao chão, era mais lama... espessa, dentro de si... e os pequenos demônios a rodeavam, o Lord sumia da frente dos seus olhos, e ela via mil copias de si mesma, a tomarem cada pedaço da sua pele e abrirem-na... para lembrá-la de que o que tinha dentro de si não era um sangue honroso... era lama, era sujeira, era condenação, decepção e imundice... ela pertencia aos demônios agora...

–BD-

– Ela está acordando! – a voz de Deisdre Parkinson tinha um quê esperançoso.

– Não, acho que ela está delirando – a outra garota loira, Catrim Turnemore, concluiu com interesse.


As duas colegas de quarto de Bellatrix ainda não tinham se recuperado bem do terror que fora acordar e achar a jovem semi-submersa numa banheira de água turva. Tinham com esforço tirado-a da água e depositado no chão sobre uma toalha. Tentaram algumas vezes o feitiço enervate sem sucesso, até que a sonserina começara a dar mostras de consciência com movimentos curtos e gemidos baixos.

– Devemos levá-la para Mme. Pomfrey – Turnemore concluiu, olhando o estado da Black – ela saberá o que fazer e o que aconteceu, não sabemos se Bellatrix foi azarada, ou se machucou, ou passou mal ou sabe-se lá o que.

– Não, Catrim, vamos esperar um pouco. Você sabe o quanto Black vai ficar furiosa conosco se a levarmos nesse estado para a enfermaria e chamar atenção de toda a escola.

– Bem, se ela morrer, ela vai chamar pelo menos o dobro da atenção, você não acha?!

Logo se tornou óbvio que a previsão de Deisdre não se confirmaria. Bellatrix acordou com um forte acesso de tosse, sentou-se com dificuldade em seguida curvando-se sobre o piso, onde cuspiu um pouco de sangue. Respirando rápido, virou-se para as colegas de quarto assustadas. Bella cobriu-se com a toalha, o corpo úmido arrepiando de frio.


– Black, nós...


– Saiam daqui. – ordenou entre arfadas de ar.

– Tem certeza? Você parece ter desmaiado na banheira, não acho que...

– Fora! – gritou, no que as meninas levantaram-se com rapidez. – E se disserem uma palavra que seja disso para qualquer pessoa, eu as colocarei em tantos problemas que vocês não se parecerão com seres humanos quando eu terminar.

Ambas conheciam os boatos que andavam rondando a Black e sua relação com atividades obscuras, e não queriam ser alvos de sua fúria; deixaram o banheiro em poucos segundos. A morena sentia cada um dos músculos vibrarem. Uma breve olhada na banheira e viu sem surpresa a água e sangue misturados. Bella ainda tinha todo o tronco dolorido, jamais sentira tamanha agonia com o efeito de uma poção, nem em qualquer outro momento de sua vida, para falar a verdade.

Deitou as costas novamente no chão frio e molhado, deixando a cabeça pender, esperando sua respiração normalizar e o seu coração voltar a bater normalmente. Próximo de si viu pequenos e brilhantes objetos espalhados pelo chão. Eram os cacos do copo que tinham guardado o seu licor de libertação.

Ela sorriu. Que viesse a Sra. Hildes, estava pronta.

–BD-

Cara irmã,

Papai enfim conseguiu os documentos que atestam a sua independência provisória, o que vai garantir que passe à tutela de Rodolphos após o matrimônio. Eu e tia Walburga estamos começando os planejamentos para a sua festa, vai ser a mais linda que já houve, as famílias mais importantes de bruxos estarão lá para ver você Rodolphos juntos. Tudo o que falta agora é a avaliação da Sra. Hildes e você será uma senhora casada em pouco tempo.

Escolherei junto a Rodolphos a sua aliança de casamento para que seja digna e de bom gosto.

Abraços, Cissa.

Bella jogou um feitiço na carta, que se destruiu em pequenos pedaços tamanha a sua insatisfação com o que Narcissa anunciava de modo tão animado. Pertencer a Rodolphos. Como poderia respirar depois de um acontecimento trágico como aquele? Ela era a única pessoa da família que achava abusivo ser vendida aos dezesseis anos?

Deveria, no entanto, ignorar sua repulsa contra aquela união, pressupondo-se que era muito oportuna para os seus planos. Uma nova coruja parou diante de si, a centímetros respeitosos do seu prato de comida vazio. Era Demetrius, a coruja macho do seu noivo, um raro exemplar das montanhas, resistente, porém de pouca personalidade.

Querida Trix, repasso um livro que lhe proporcionará incríveis viagens, se lido no momento certo. Seu noivo, R.L.


Ela catou no interior do envelope um exemplar de bolso da Enciclopédia de Serpentes, que dificilmente era um livro que proporcionaria alguma “viagem incríveis”. Não em relação ao seu conteúdo, Bella sabia bem.

As páginas marcadas com uma dobra no canto superior, como de costume, indicavam a hora do próximo encontro de comensais. Ela não se importou de ter que esperar até a noite, pois sua garganta e sua barriga ainda doíam com os efeitos da poção. Era sábado, logo, se recolheu no dormitório, deixando de se divertir com os comentários de que tinham achado o Monitor chefe da Grifinória azarado e totalmente desorientado no segundo andar aquela manhã.

No momento certo, Bella pegou a enciclopédia e fechou as cortinas da cama, as isolando para que suas curiosas colegas de quarto não pudessem se aproximar, se acordassem. Calçou as botas e vestiu a capa, encostando somente um dedo no livro, e lendo as primeiras linhas da página marcada.

Sentiu um forte puxão no umbigo, e então não estava mais sentada em sua cama e sim sendo tragada por uma força através de cenários difusos. Os pés tocaram o chão e o calor de algum fogo tocou seu rosto. Estava num aposento que se assemelhava a uma sala de inverno, com uma grande lareira acesa ao fundo e uma poltrona logo a sua frente. Era uma casa velha, a pintura descascava, o cheiro denso de mofo queimava suas narinas sensíveis.

Olhou ao redor, vendo uma figura próxima a única janela da sala. Esperava ver Rodolphos primeiro, mas quem a encarava era ninguém menos que Lord Voldemort.


– Milord – Bella se curvou de imediato, ou ainda, assim que percebeu que deveria – A que devo a honra de um encontro particular?


– Você certamente sabe usar as palavras para amaciar um homem, não sabe, minha garota. – disse o bruxo num tom suave. Bella sentiu-se enrubescer involuntariamente.

Era a primeira vez que via seu Mestre sob uma luz forte, e não debaixo de uma lua distante ou de um capuz que só a permitia entrever suas íris vermelhas. Voldemort tinha a pele branca, o cabelo negro, escuro como o pelo de um sinistro. Faces encovadas, um olhar tão penetrante que diante dele sentia-se totalmente despida. As mãos delas ficaram frias e os joelhos fracos.

– Sente-se – disse indicando a poltrona desgastada, como se adivinhasse que ela não podia confiar em suas pernas – Temos algo a conversar.

– Milord, eu... – a verdade é que como nunca acontecia, as palavras lhe fugiam diante da aparência sufocante Dele. Seus olhos estavam presos e seu coração explodiria, e tudo o que o homem fazia era olhá-la com uma profundidade invasora.

Bella tinha a sensação de que ele a desmancharia sob aquele olhar.

– Estou ciente do seu iminente casamento com Lestrange. Chegou o momento que deve definir suas prioridades, Bellatrix.

– A nossa causa é sempre a minha prioridade, Milord. – disse procurando impor segurança na voz.

– Eu não o duvido, minha cara – o Lord dobrou os lábios finos num sorriso compassivo – E não tenho o mínimo interesse em intervir nas suas escolhas maritais. – Bella quis dizer que Rodolphos estava longe de ser uma escolha sua, mas não ousou interrompê-lo. – Só devo avisá-la de que talvez algo do seu interesse vá de encontro aos planos da sua união com o rapaz.

– Não compreendo, Milord.

– Tenho um convite a lhe fazer. – ele revelou, mas a expressão em seu rosto deixava claro que qualquer recusa ao seu “convite” não seria encarada de forma positiva – o de me acompanhar em uma viagem.

– Milord sabe que eu o acompanho para onde desejar. – disse com suavidade, mas ela sabia que não podia conter a energia em seu olhar, direcionada para ele.

– Será uma viagem diferente, Bellatrix – Voldemort se aproximou da jovem, lhe olhando com tanta atenção que poderia estar tentando ler sua mente – dessa vez vai mais longe do que jamais esteve. Verá coisas que jamais sonhou em presenciar.

– E porque está me dando essa oportunidade, senhor?

– Porque acredito que você pode ser a minha melhor escolha – ele chegou tão perto que os lábios frios estavam colados ao ouvido de Bella – Eu tenho confiança que não me decepcionará.

Um choque forte tomou conta do corpo de Bella, um que ardeu cada nervo do seu corpo, algo muito além do que um sussurro poderia provocar. Seu corpo escolheu aquele momento para lhe trair, e uma dor penetrante pinicou em sua barriga, a fazendo arfar e se curvar, segurando um grito.

Voldemort observou-a com uma expressão peculiar de surpresa.

– Você está doente, Black?

Ela forçou a se mesma a ficar reta novamente.

– Não, Milord. - disse com os olhos cheios de água, os dentes trancados e evitando respirar fundo.

– Doente você não me tem qualquer serventia. - o olhar de frio desinteresse que ele lhe lançou foi o suficiente para deixá-la em pânico. Ela negou rapidamente com a cabeça.

– Não é nada, realmente. Eu não vou-não vou lhe decepcionar.

Ele estreitou seus olhos vermelhos e céticos para ela. - Melhor que não decepcione, garota.

Ele acenou para o livro que ela ainda segurava.


O puxão, os vultos, o impacto. Estava de volta ao seu dormitório, e ainda sentia dor. Curvada sobre o próprio corpo, contendo gemidos, Bella desejou que algo sobre aquela poção não tivesse dado terrivelmente errado.


–BD-

– Desculpe, acho que não entendi. – disse Mme. Pomfrey educadamente.

– Eu quero um antídoto, sua velha surda – impacientou-se – tenho razões para acreditar que fui envenenada.

– Se você estivesse envenenada, minha querida, a última coisa que estaria fazendo vir aqui em minha enfermaria para me chamar de velha surda – disse a senhora com uma ironia disfarçada de paciência.

– Vai ver foi um bruxo incompetente. Apenas arranje o meu antídoto e eu sumo daqui. – exigiu, odiando estar ali, tendo que passar por cima do seu orgulho. Tudo que sabia é que não podia agüentar aquela dor insistente, desagradável e sempre presente bem abaixo do seu umbigo, que não passava desde o sábado. Ela podia suportar Crucciatus com certa dignidade, mas aquilo já estava lhe deixando insana.

– Eu teria que examiná-la, ver se de fato foi envenenada, que tipo de poção foi usada, e aind...

– Não precisa! – Bellatrix deu um passo em direção a bruxa, que recuou instintivamente – tudo o que precisa é pegar um maldito benzoar e enfiar minha goela abaixo! A curandeira particular dos Black me examinará com muito mais competência, quanto a isso não deve se preocupar.

Mme. Pomfrey se sentiu pessoalmente ofendida com o comentário.

– Fora da minha enfermaria! Volte quando estiver doente o suficiente para não me faltar com o respeito e ai pensarei se gastarei ou não um benzoar com você, garotinha! Fora, ou chamo o diretor!

Bella bufou. O diretor de Hogwarts, aquele inútil Dippet, jamais expulsaria uma puro-sangue de lugar algum, ainda mais quando seu pai fazia generosas contribuições anuais para a conta da escola. Naquele momento Regulus entrou na enfermaria, salvando a enfermeira de qualquer que fosse a reação que a sonserina teria.

– Bella, ainda bem que está aqui, lhe procurei por todo o andar. O Prof. Dippet pediu para avisar que a Sra. Hildes a espera no salão de visitas.

– Até que enfim uma curandeira competente nesse castelo – zombou encarando Pomfrey, e saindo em seguida da enfermaria. Regulus achou graça da expressão da curandeira, mas Bella não deixou que ele lhe acompanhasse.

Preferiu chegar sozinha ao local indicado, no primeiro andar, e ter a desagradável visão da velha encurvada que marcara sua infância, sempre nos momentos de doença e por vezes, morte, como a de sua avó materna Irma Black quando tinha somente seis anos.

A Sra. Hildes deveria ter mais de cem anos, de modo que a pele do seu rosto parecia derreter-se e não havia parte alguma dela que não possuísse manchas escuras. Mancou apoiada numa bengala de cedro até Bellatrix, capturando uma mecha do seu cabelo com as mãos enrugadas.

– A garotinha Black parece que anda nervosa. – disse observando os fios – Vamos ver o que anda mexendo com a dessa criança.

Bella gostaria de avisar que já era quase uma adulta, mas diante da Sra. Hildes calar-se era sempre a melhor opção. A velha a trouxe para a luz da janela e puxou a varinha desgastada.

– Tire esses panos escuros, eu não posso ver com eles ai em cima.

Bella tirou o uniforme com desgosto, ficando apenas com as roupas de baixo. Sabia que todas as herdeiras de famílias bruxas nobres passavam por aquilo, mas não tornava o processo menos humilhante.

A velha começou a passar a varinha pelo seu corpo, obtendo luzes de varias cores e, a cada uma, dava um grunhido ou ruído de entonação diferente. Ao passá-la novamente do seu pescoço ao começo das coxas, conseguiu um tom vinho na ponta da varinha para o qual a sua reação foi um silêncio longo e pensativo.

A velha contorceu o rosto numa estranha careta rugosa.

– Como anda a saúde, menininha?

– Ótima. – Bella disse sem titubear. Quanto antes saísse dali mais rápido a sensação de nó na garganta se desfaria.

– Dores, enjôos, falta de apetite...

– O quê? - uma sensação de alarme soou no fundo de sua cabeça. Como era possível..?

– Você não pode se envenenar e esperar sair ilesa disso, você sabe - disse a velha num tom sombrio - e minha querida, se você quer ouvir da minha experiência, há maneiras melhores de resolver o seu problema do que tirando a própria vida.

Ela se surpreendeu, não esperava por aquilo.

– Eu não… eu não estava tentando me matar. - a mera ideia lhe causava repulsa.

– Você não estava… - por um momento a velha mulher piscou, então seu rosto se abriu em compreensão, um sorriso banguela e esperto iluminando seu rosto - não. Não a si mesma, obviamente.

Bellatrix viu-se obrigada a puxar a varinha, e agilmente ela realizou um feitiço da memória na curandeira. Nunca tinha feito um desses antes, mas tinha um dom natural Feitiços, e sempre podia confiar na sua capacidade de realizar encantamentos complexos sobre os quais sabia apenas a teoria.

Quando os olhos cobertos de rugas ficaram perdidos o vazio, a sonserina usou uma voz calma e segura parar enunciar tudo de que a curandeira se lembraria:

– Minha saúde e integridade estão perfeitas. Você me examinou e não achou nada de errado, e eu estou apta para o meu casamento.

(Continua...)


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Notas finais do capítulo

¹ Purgabit Sordes é o nome da poção que a Bella fez. Latim para “purgar as impurezas”. 

Eu gostaria muito de ler em seus comentários o que vocês acharam das “providências” da Bella nesse capítulo, e o que vocês acham que vai acontecer/esperam que aconteça a partir de agora. E também o que acharam da aparição do Voldemort. Pra onde será que ele quer viajar com a Bella? 

Como eu atrasei a att desse cap, vou tentar adiantar o do próximo, e postar dois caps ao longo da semana que vem.
Próximo cap tem Regulus!