Cartas Para Quinn escrita por lovemyway


Capítulo 28
Capítulo 28 — Barreiras


Notas iniciais do capítulo

E ELA RETORNA DOS MORTOS!!!!! ~inserir aqui gritos de aleluia~

EU SEIII. Não fiquem com raiva de mim! A inspiração desapareceu por completo, e quanto mais eu tentava escrever, mais me afundava no tanto de coisa que tinha pra fazer no cotidiano, mais exausta ficava, e mais minha mente se recusava a colaborar. Obviamente, como estou em semana de provas, a inspiração resolveu aparecer pra zoar com a minha cara, e FINALMENTE eu consegui escrever o capítulo. Vou me ferrar na prova, mas pelo menos terei postado ashsauhauhsuahsauhau

Peço sinceras desculpas por ter levado tanto tempo para postar :(. O capítulo é grande justamente pra compensar um pouco essa demora :p.


Espero que gostem!!
Boa leitura :)



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Quinn encarou a tela do computador, a expectativa fazendo com que seu coração batesse cada vez mais rápido e mais forte. Suas mãos tremiam ligeiramente, e ela sabia que deveria apertar o botão para iniciar a ligação, mas ela não conseguia. Ela não conseguia. Ela sabia que Rachel estava online — ela podia ver o círculo verde ao lado do seu nome —, porém, o nervosismo estava falando mais alto. A mulher passara tanto tempo esperando por esse momento, e agora que ele havia chegado, ela não sabia o que fazer, como se comportar, o que falar. Era como se sua mente estivesse em branco. Sua boca estava seca, e ela se sentia uma bagunça.

 

Ela não queria ser uma bagunça. Não na frente de Rachel. Não na frente de alguém com quem ela se importava tanto.

 

Você precisa se acalmar, ela pensou, respirando fundo algumas vezes. A verdade era que Quinn sentia como se ela fosse uma bagunça. Sua vida, sua história, seu passado. Todas as pequenas ou grandes coisas que a haviam transformado em quem ela era... Não foi um caminho fácil, saudável, feliz. Não é como se Rachel não soubesse disso, ou como se ela estivesse escondendo alguma coisa, mas existia uma grande diferença entre ver e saber. Rachel sabia os fardos que Quinn carregava nos ombros, sabia do tamanho do buraco que existia em seu coração, sabia o quanto a mulher lutava contra os demônios do seu passado. Entretanto, ela nunca tinha visto. Ela nunca vira o desespero nos olhos de Quinn. Nunca vira a dor estampada em seu rosto, ou as lágrimas caindo de seus olhos, ou seu corpo todo tremendo enquanto ela se abraçava, tentando se manter inteira, tentando se manter sã.

 

Às vezes, Quinn ainda sentia como se estivesse batalhando para manter sua mente intacta. Como se um sopro do passado pudesse derrubá-la. Por isso, ela tentava se esconder diante de camadas de barreiras que a impediam de se abrir, de se sentir vulnerável. E, de alguma forma, Rachel derrubara cada uma delas. A garota se infiltrara em sua mente, em seu coração, de uma forma que ninguém mais fizera. Não parecia justo o quanto uma única pessoa poderia significar tanto. Não parecia certo que uma única pessoa pudesse ter tanta influência sobre ela. Mas, mesmo assim, ela sentia que era certo, que era bom. Tão confuso, Quinn pensou, soltando um pequeno suspiro. Ainda havia uma pequena parte dela que queria se proteger, que queria se manter intacta, que queria impedir que Quinn quebrasse o último obstáculo que a impedia de ficar completamente exposta para outra pessoa.

 

Entretanto, Quinn não tinha mais forças para se esconder. Antes tinha sido tão simples. Quando seus pais morreram, perder-se dentro de si mesma se tornara sua especialidade. Ela mantinha seus sentimentos trancados, a expressão de indiferença perfeitamente ajustada em seu rosto. Era fácil sorrir, porque seus sorrisos não tinham significado; era fácil se manter inteira, porque ela tinha alguém que precisava botar acima dela mesma, acima de suas necessidades. Durante toda a sua vida, ela teve uma válvula de escape. Uma desculpa que a permitiu se afundar cada vez mais naquela escuridão que ela carregava dentro de si.

 

E então, Rachel havia lhe mostrado a luz. Àquela altura, os olhos de Quinn já estavam cegos. Ela se sentia frequentemente sem esperança, sem fé, e seu coração se enchia cada vez mais de vazio e solidão. Isso foi a consumindo com o tempo. Tornando-a mais fechada, mais guardada, mais assustada. Ela não tinha mais esperanças em relação ao seu futuro, a sua vida, a ela mesma. Quinn vivia um dia após o outro porque ela precisava. Não havia nenhuma paixão pela vida, nenhuma paixão por estar viva, nenhuma vontade que a fazia querer continuar. Era como se ela estivesse ligada no modo automático. Como se ela simplesmente seguisse em frente, e todos os seus problemas se transformassem em uma bola de neve que só crescia e crescia.

 

Em um determinado ponto, as coisas saíram de controle. Entrar no exército foi uma escolha covarde, e ela sabia. Por que enfrentar seus sentimentos quando ela podia fugir? Por que lidar com anos de machucados não cicatrizados, quando ela podia botar um band-aid por cima, e fingir que estava curada? Para que enfrentar seus problemas, se ela podia ignorá-los? Ela nem percebeu que estava trilhando um caminho de autodestruição. Não percebeu que a cada vez que permitia que o medo falasse mais alto, então ela abria mão de uma parte de si mesma. E todas as vezes que ela abria mão de partes de si mesma, ela acabava machucando Sam, acabava se machucando. Não era intencional. Não era o que ela queria. Mas era a única coisa que ela sabia fazer.

 

Até Rachel.

 

Rachel não era nenhum príncipe em um cavalo branco. Ela não havia miraculosamente salvado Quinn de si mesma. Entretanto, ela deu algo a Quinn. Algo que ninguém mais havia conseguido dar. Algo que ela nunca teria encontrado por si mesma. Rachel lhe deu esperança.

 

De repente, a esperança estava ali. Foi como se ela irradiasse uma luz, um calor, que pouco a pouco foi se espalhando dentro de Quinn, e a permitiu ver. Ela conseguiu ver a luz, e ela soube que nunca mais poderia retornar a escuridão. Ela soube que nunca mais poderia deixar esse lado de si mesma vencer. Ela soube que precisava encontrar uma forma de lidar com o passado, que precisava encontrar um jeito de permitir que as feridas cicatrizassem.

 

Rachel foi o apoio que ela precisava para fazer isso. Rachel, que também havia sofrido. Rachel, que sabia o que era carregar a escuridão. Rachel, que não permitia que sua dor se tornasse parte de quem ela era. Talvez essa fosse a grande diferença entre Rachel e Quinn: enquanto Rachel sentia a dor, Quinn se tornava o seu próprio sofrimento. Ela se afogava em seus medos, em suas inseguranças, e permitia que eles ditassem seu modo de se comportar, de ver o mundo, de ser. Já Rachel, por outro lado, utilizava-se de todas as coisas negativas como um impulso. Seus medos a faziam seguir em frente (enquanto Quinn teria paralisado), suas dores a tornavam mais forte (Quinn sucumbia as dela), suas inseguranças aumentavam sua determinação (as de Quinn a destruíam por dentro, faziam-na se sentir pequena, insignificante).

 

Não mais, Quinn pensou. Ela havia prometido a si mesma que tentaria, que realmente tentaria. E ela estava tentando. Não era uma coisa rápida, que acontecia de uma hora para outra. Era um processo pelo qual ela vinha passando ao longo do tempo. Um processo doloroso e demorado, que ela sabia que precisava enfrentar se quisesse ficar inteira de novo.

 

E Quinn queria muito ficar inteira. Ela queria provar a si mesma que poderia deixar seus pais orgulhosos. Queria mostrar a Sam que ela podia se tornar a pessoa que ela sempre deveria ter sido. E ela também queria Rachel. Queria que a outra garota — tão bonita, tão corajosa — sentisse orgulho de quem ela estava se tornando. Ela queria merecê-la.

 

Foi esse pensamento que finalmente fez Quinn criar coragem. Ela ergueu a mão e apertou o botão para iniciar a chamada, um sorriso sincero se espalhando em seus lábios.

 

*



Quando tinha treze anos, Sam acidentalmente chamou o tio de “pai”. A família toda estava sentada na mesa da cozinha para tomar o café da manhã. Quinn observava o irmão com um sorriso no rosto enquanto ele colocava cereal em uma tigela, e o tio lia o jornal que sua tia trouxera quando viera da sala. Sam erguera a cabeça, e pedira para que o tio lhe passasse a garrafa de leite. Quando o homem havia lhe entregado a garrafa, Sam dissera “obrigado, pai”.

 

Foi um silêncio desconfortável depois disso. Quinn sabia que Christopher e Elena não se importariam de serem chamados de pai e mãe. Eles haviam dito várias vezes que a escolha era de Quinn e Sam, mas todas as vezes que disseram isso, eles haviam olhado diretamente para Quinn. Eles sabiam que, no final das contas, a escolha era dela. Sam seguiria seu exemplo (ele sempre seguia). Então, ela decidiu chamá-los apenas de tio e tia. Ela não sentia que era certo usar “pai” e “mãe”. Não quando ela se lembrava claramente dos próprios pais. Não quando todo dia ela sentia a saudade deles apertando no peito. Não quando ela sofria silenciosamente com o vazio que eles deixaram em sua vida.

 

Ela compreendia que Sam pudesse se sentir de outra forma. Ela compreendia que ele era mais novo que ela quando os pais morreram, e que os tios eram pessoas maravilhosas que faziam tudo por eles. Era natural que Sam se sentisse confortável perto deles, que os vissem como figuras paternas. Ela sabia que talvez ele até quisesse chamá-los de pais. Sabia, mas não conseguia aceitar. Sam deve ter visto o choque e a traição estampados no rosto da irmã quando ele usou a palavra, porque aquela foi a primeira e última vez. Eles nunca falaram sobre isso. Quinn se sentia grata. Era provavelmente uma conversa que ela não conseguiria ter.

 

Muitas coisas eram dolorosas demais para serem ditas. Quinn cresceu com algumas delas presas em sua garganta. Algumas que ela não ousava falar, e que ao invés de se transformarem em palavras, viravam lágrimas. Algumas que eram os gritos que ela soltava com a cabeça enterrada no travesseiro para que ninguém ouvisse. E algumas eram as que ela só ousava pensar durante a noite, deitada em sua cama, encarando o teto do seu quarto.

 

Quando seus pais faleceram, Quinn costumava desejar muitas coisas. Ela estava sempre pedindo por algo. Pedindo por sinais. Pedindo por provas de que, eventualmente, tudo ficaria bem. Às vezes, nos piores dias, ela pedia para que tudo não passasse de um pesadelo. Ela queria acordar e descobrir que seus pais estavam vivos, que estavam ao seu lado, e que ela não precisaria viver uma vida inteira sem o amor e o apoio incondicional deles, porque doía. Era uma dor emocional, mas ela também tinha sua parte física. Todas as vezes que ela se empolgava com alguma coisa e virava para o lado, procurando pelo pai, e não o encontrava; todas as vezes que algum garoto implicava com ela na escola, e ela procurava sua mãe por conselhos, mas ela não estava lá. Todas as vezes que eles deveriam estar ali, e não estavam, ela sentia. Como se fosse uma queimadura, só que em seu coração. Como se seu peito estivesse em chamas, e às vezes ela não conseguia respirar porque era forte demais, intenso demais, e ela não sabia como lidar com eles. Ela não sabia como suportar a dor.

 

Apesar de Quinn ter feito muitos pedidos, eles nunca se tornaram realidade. Nenhum dos seus desejos jamais se tornou. Então, com o tempo, ela aprendeu a parar de desejar. Ela simplesmente aceitou o que tinha. Contentou-se com os migalhas que a vida lhe deixara ter, e se reconstruiu em cima disso, esperando que fosse o suficiente. Esperando que, um dia, talvez as coisas melhorassem. À espera de que, um dia, ela fosse capaz de superar essa perda.

 

Só que ela nunca superou.



*

 

Com o tempo, Quinn foi aperfeiçoando suas barreiras. Ela não sabia ao certo quando havia começado a construí-las, mas aos quinze anos, ela já era experiente em afastar as pessoas e se trancar em seu próprio mundo.

 

Honestamente, era um milagre que ela tinha Santana. A garota era tão cabeça dura e tão fechada quanto ela. Foi uma amizade que se desenvolveu rápido, e ao mesmo tempo, devagar. Elas se aproximaram e andavam muito juntas, mas até que uma confiasse completamente uma na outra, até que baixassem suas guardas e falassem sobre coisas que as incomodavam, que as machucavam… Isso durou uma eternidade.

 

Surpreendentemente, Santana quem dera o primeiro passo. Quinn nunca havia esperado que fosse a outra garota, principalmente porque Santana detestava que as pessoas vissem as suas fraquezas. Ela gostava de fingir que não tinha nenhuma — Quinn não escondia as suas, só fugia delas —, e não tolerava ninguém que tentasse provar o contrário.

 

Até o dia em que ela contou para a sua avó que era gay, e a mulher a expulsou de sua casa. Quinn nunca tinha visto Santana tão abalada. Ela a segurou em seus braços enquanto a garota chorava, e, sem que percebesse, Quinn começou a chorar também. Ela nunca havia notado o quanto ela guardava para si mesma. Nunca havia percebido o quanto a dor vinha se acumulando em seu peito, crescendo a cada ano até o ponto em que se tornara quase insuportável. Mas ela não contava para ninguém. E não botava para fora. Apenas escondia a dor cada vez mais fundo, tentando ignorar a sua presença.

 

Ver uma das pessoas mais fortes que ela conhecia desabando (e uma que lembrava muito a ela mesma), fez com que Quinn desabasse, também. Ela não gostava de admitir que precisava de alguém. Na verdade, ela detestava precisar de alguém, mas naquele momento, ela soube que não podia mais continuar daquele jeito. Ela soube que não podia mais carregar tudo sozinha. Então, ela começou a falar. Ela contou tudo a Santana: como seus pais haviam morrido, como ela recebera a notícia, como ela precisou cuidar de Sam, como ela sentia a falta deles todos os dias, como ela temia que talvez nunca mais fosse se sentir inteira novamente.

 

Em troca, Santana dividiu com ela seus próprios medos. O medo da rejeição, o medo de que sua orientação sexual fosse a única coisa que as pessoas vissem a seu respeito, o medo de não ser boa o suficiente, de não tentar o suficiente; o medo de não conseguir fazer nada de sua vida, o de não ter ninguém para aceitá-la do jeito que ela era.

 

Mas Quinn aceitava. Quinn aceitava tudo sobre Santana. E Santana aceitava tudo sobre ela. Elas se compreendiam. Elas se respeitavam. E, com o tempo, elas aprenderam a se amar. Santana lhe ensinou que tudo bem precisar de alguém, de vez em quando. Ela lhe mostrou que um dia, ela talvez fosse precisar de mais pessoas. Um dia, ela talvez deixasse suas barreiras caírem, e permitisse que mais alguém percorresse o caminho para o seu coração.

 

Um dia.

Talvez.



*



— Quinn — Rachel disse, e Quinn achou que fosse capaz de chorar.

 

Havia algo no modo que Rachel a olhava. Algo que ela tinha visto no rosto de poucas pessoas, e em um número menor ainda quando o olhar era direcionado a ela. Quinn não estava acostumada a ser aceita. Ela não estava acostumada a ter alguém que a olhasse com tanto carinho e admiração.

 

— Rachel… — ela tentou dizer mais alguma coisa, mas sua voz falhou e ela ficou em silêncio, apenas observando a garota, sentindo seu coração bater rápido demais no peito.

 

Rachel era ainda mais bonita do que ela havia imaginado. A foto não conseguira capturar a intensidade no rosto da jovem. Não conseguira mostrar o brilho que ela parecia carregar dentro de si. Era incapaz de reproduzir aquela coisa que era essencialmente Rachel, e no primeiro segundo que viu, no instante que notou aquele algo a mais, Quinn ficou sem ar. Ela sentiu vontade de esticar a mão e tocar a tela do computador. Imaginou-se tocando o rosto de Rachel. Imaginou a maciez de sua pele, e o calor que ela emanaria e que Quinn sentiria se espalhar pelas palmas de suas mãos. Quinn corou diante do pensamento. 

 

Recomponha-se, ela se repreendeu mentalmente, e respirou fundo.

 

— Oi — ela fez uma tentativa tímida de recomeçar, e o sorriso inevitavelmente voltou ao seu rosto.

 

Rachel soltou uma risada suave, e Quinn sentiu como se seu coração tivesse parado por alguns segundos, antes de voltar a bater muito forte.

 

— É estranho, não é? — a jovem perguntou, inclinando-se ligeiramente para frente.

 

— Um pouco — Quinn admitiu, sem graça. — Na verdade, eu não sei muito bem o que dizer. Parece tão…

 

— Surreal? — Rachel completou, sorrindo. — Eu sei. Tenho pensado nisso há tanto tempo, e agora que finalmente está acontecendo… — ela deu de ombros. — Quer dizer, eu sei que é meio bobo, mas eu acho que estava assustada.

 

— Com o que?

 

— Não tenho certeza. É só que já dissemos tanta coisa uma a outra, que eu fiquei com medo que…

 

— Que quando estivéssemos frente a frente, você não saberia se conseguiria dizer as mesmas coisas? — completou Quinn, num tom de voz leve.

 

Rachel confirmou com um aceno de cabeça. Ela mordeu os lábios, como se estivesse prestes a falar mais alguma coisa, mas se conteve. Quinn esperou pacientemente, dando o espaço que Rachel precisava para reorganizar seus pensamentos. Por fim, a jovem soltou um pequeno suspiro, e olhou novamente daquele jeito para Quinn. Foi impossível para ela não sorrir.

 

— Você realmente me entende, não é? Você só… Você só entende.

 

— Isso é bom, não é? — Quinn perguntou, incerta. Então ela apontou para Rachel, depois para si mesma, indicando as duas — Isso é bom?

 

— Bom? — a garota indagou, franzindo o cenho. — Quinn, eu… Você sabe a minha história, você sabe tudo o que eu passei, você sabe o quanto eu tive dificuldades para encontrar alguém que se importasse comigo. E quando eu encontrei… — ela respirou fundo, seus olhos fixos nos de Quinn —, foi por causa de você. Isso — Rachel apontou para as duas — não é bom, isso é… Isso é incrível. Você é incrível. E eu só…

 

Rachel balançou a cabeça, sem conseguir continuar.

 

— Eu nunca quis muitas coisas na minha vida — Quinn começou, medindo as palavras, com medo de dizer mais do que deveria, ou de não dizer o suficiente. Ela passou a mão pelo rosto, frustrada, sem saber direito como se expressar. — Depois que eu perdi meus pais, tudo o que eu queria era que a dor passasse. Mas então eu cresci, acostumei-me a ela, e a dor acabou se tornando uma espécie de lembrança de que um dia eu os tive, de que um dia eles estiveram lá por mim. Foi quando eu parei de desejar que a dor fosse embora. Acho que foi quando eu parei de desejar por qualquer coisa.

 

— Quinn... — Rachel suspirou, mas a mulher mais velha negou com a cabeça, um pedido silencioso para que não fosse interrompida. Rachel fechou a boca e permaneceu em silêncio, prestando atenção.

 

— Eu nunca quis muitas coisas na minha vida — ela repetiu, e um pequeno sorriso surgiu em seus lábios. — Mas acho que isso mudou, porque agora eu quero algo. Eu quero você.

 

Rachel abriu um sorriso enorme, e Quinn soube que havia dito a coisa certa. Ela se recostou contra a cadeira, admirando o rosto da garota a sua frente, tentando reter em sua mente cada detalhe. A maneira como os olhos dela brilhavam, ou como o sorriso parecia dizer mais do que muitas palavras, ou como ela parecia irradiar felicidade. Felicidade. E Quinn sabia que era por causa dela. Ela havia feito Rachel feliz.

 

Quinn só percebeu que as lágrimas estavam caindo pelo seu rosto quando sentiu seu gosto em seus lábios. Salgado e doce ao mesmo tempo. Talvez porque ela também estava feliz. Ela sentia um calor em seu peito, uma sensação de segurança e conforto que ela raramente experienciava. Uma sensação que a fazia se sentir completa. E para alguém tão quebrada quanto Quinn, se sentir completa era como se sentir viva, realmente viva. Sem peso, sem dores, sem medos. Livre.

 

— Eu preciso de você — Quinn confessou num sussurro.

 

— Tudo bem — Rachel lhe garantiu, ainda sorrindo. — Eu também preciso de você. Acho que ainda vou precisar por um bom tempo.

 

— Eu gosto de como isso soa.

 

— Eu também — a garota admitiu. — E gosto de como chegamos até aqui. Eu estava bem nervosa quando enviei a primeira carta — ela comentou, pensativa. — Eu estava com tanto medo do que você iria dizer, do que iria pensar. Honestamente, eu acho que se você não fosse quem você é…

 

Rachel baixou os olhos, e Quinn pode ver que ela estava se contendo para não chorar. Mais do que nunca, ela sentiu vontade de confortar a garota. Trazê-la para os seus braços, e sussurrar em seu ouvido que ficaria tudo bem. Quinn queria protegê-la, queria que ela nunca precisasse se sentir desse jeito de novo.

 

— Eu acho que teria sido demais para suportar — a garota acrescentou num sussurro.

 

Quinn sentiu um nó na garganta. Ela passou os braços ao redor do próprio corpo, a sensação de impotência se tornando mais forte a cada segundo. Ela detestava que Rachel tivesse passado por tanta coisa ruim. Detestava que ela tivesse sofrido tanto. A jovem era uma pessoa espetacular, tinha um coração de ouro. Como as pessoas não conseguiam enxergar isso? Quinn pigarreou, e respirou fundo algumas vezes para manter suas emoções sob controle.

 

— Eu entendo. Eu… Eu não estava em um lugar muito bom, também. Era como se… Como se o mundo tivesse perdido o significado. Eu ficava me perguntando “O que estou fazendo aqui?”, ou “Por que ainda estou tentando?”. Algumas vezes, eu acordava de manhã e… — ela suspirou. — Eu não queria levantar. Não tinha força, não tinha vontade. Eu sabia que precisava, sabia que era o esperado de mim. Só que…

 

— Só que às vezes você cansa de fazer o que é esperado de você — Rachel completou, e havia uma expressão de entendimento em seu rosto. — Então você fazia o que precisava fazer, você continuava com a sua rotina, mas por dentro estava gritando por ajuda, implorando para que alguém percebesse, para que alguém escutasse, se importasse.

 

Quinn concordou com um aceno de cabeça. Elas não disseram nada por alguns momentos, assimilando tudo o que havia sido dito. Apesar do conteúdo pesado da conversa, Quinn se sentia extremamente mais leve. Ela sempre se sentia mais leve quando mandava uma carta a Rachel. Sempre se sentia mais leve quando podia dividir o fardo que carregava nas costas com mais alguém.

 

— Você faz eu me sentir melhor — ela nem ao menos percebera que as palavras haviam saído de sua boca. Rachel ergueu a cabeça, e seus olhares se encontraram. — Você faz com que eu sinta que eu posso superar tudo isso, que eu posso…

 

— Seguir em frente — a garota sorriu. — E você pode. Nós podemos. Eu acredito nisso.

 

— Eu acredito em você.

 

— Ok, agora a gente está começando a parecer um daqueles casais de filmes românticos super melosos — Rachel riu. — Não que eu ache ruim, mas agora vai ser difícil pegar no pé de Kitty por agir desse jeito quando ela está perto da Marley. Eu vou perder toda a minha credibilidade — ela bufou, fingindo irritação. — E a culpa é toda sua, senhorita Fabray.

 

— É o charme dos Fabray — retrucou Quinn, sorrindo sugestivamente. — Nós somos irresistíveis.

 

Rachel fez uma expressão de indignação.

 

— Isso não é charme, é bruxaria!

 

— Hum… Talvez. Ou talvez esse charme só faça as pessoas revelarem o que elas realmente querem — ela abriu um sorriso maior ainda ao ver Rachel revirar os olhos.  

 

— Você sabe o que eu realmente quero, senhorita Fabray? — Rachel disse, sorrindo.

 

— O que seria, senhorita Berry? — Quinn indagou, divertida.

 

— Poder te abraçar. Forte. E por um longo tempo.

 

— Só abraçar? — a loira perguntou, arqueando a sobrancelha.

 

— Talvez não — Rachel retrucou, provocante. Quinn sentiu seu rosto esquentar, e a garota soltou uma pequena risada. — Não comece o que não pode terminar, senhorita Fabray.

 

— Não se preocupe — Quinn garantiu —, eu não tenho a menor intenção de fazer isso. Não gosto de deixar coisas incompletas.

 

— Bom saber — Rachel riu, e Quinn a acompanhou. — Mas falando sério, Quinn, eu quero mesmo ver você. Pessoalmente.

 

— Você vai — a outra prometeu. — Você vai, Rach.

 

— Que bom — a jovem disse suavemente —, porque talvez eu realmente queira mais que um abraço.

 

Mas dessa vez não havia nenhuma provocação em sua voz. Nenhuma malícia. Era uma confissão. Uma que ela provavelmente estava com medo de fazer. Mais um dos motivos pelos quais Quinn admirava tanto a garota. Rachel era única, especial. Ela não permitia que o medo a impedisse de fazer ou dizer o que ela queria, como ela se sentia. Naquele momento, Quinn também se sentiu corajosa.

 

— O que você quiser, Rach.

 

— Se for o que você quer, também — ela disse, insegura.

 

— É como eu disse — Quinn sorriu, tranquilizando-a. — Eu quero você — Rachel retribuiu o sorriso, visivelmente mais relaxada. — Você significa muito para mim, Rachel. Provavelmente muito mais do que eu conseguiria expressar em palavras. Mas talvez, quando tivermos a chance, eu possa mostrar. Eu quero que você saiba. Eu preciso que você saiba.

 

Havia uma urgência na voz de Quinn, uma súplica, como se ela estivesse implorando para que Rachel acreditasse nela. Como se ela quisesse que Rachel compreendesse o quanto era importante. E Rachel compreendia.

 

— Eu sei, Quinn. Eu sei.

 

Quinn suspirou, sentindo uma onda de alívio invadir seu corpo. Ela olhou para o relógio no canto da tela do computador, e fez uma careta. Rachel mordeu os lábios.

 

— Você precisa ir.

 

Quinn concordou com um aceno de cabeça, parecendo chateada.

 

— Tudo bem, você tinha avisado que precisava ser breve. Além disso — ela sorriu novamente —, eu pude ver você. Isso é mais do que o suficiente.

 

— Gostaria que tivéssemos mais tempo.

 

— Na próxima vez — Rachel afirmou com segurança. Quinn percebeu que era uma promessa. Uma perspectiva. Ela sentiu um calor em seu peito, e percebeu que ela queria muito uma próxima vez, e queria o mais rápido possível.



— Até logo, então — ela disse, por fim, sem conseguir esconder a tristeza em seu rosto. Rachel deu uma risadinha silenciosa, e só então Quinn percebeu que estava fazendo bico. Ela se sentiu meio boba, mas Rachel não parecia se importar. Isso fez com que Quinn abrisse um largo sorriso.

 

— Até logo, Quinn.

 

Mesmo após ter desligado o computador, o sorriso permaneceu no rosto de Quinn. Ela tinha imaginado diversas vezes como sua conversa com Rachel seria, mas nenhum dos cenários tinha se comparado com a realidade. Ela queria mais. Queria mais da outra garota, queria mais daquele sorriso, daqueles olhos, da facilidade com que elas falavam uma com a outra.

 

Pela primeira vez em sua vida, Quinn não se incomodou de ser sentir vulnerável. Não quando ela estava com Rachel. Ao lado da jovem, ela se sentia mais forte. Ao lado dela, ela sentia que tinha forças para enfrentar os obstáculos. Ao lado dela, Quinn sentia que podia descobrir uma maneira de ser feliz.

 

Quinn não estava acostumada a querer  coisas, e, principalmente, ela não estava acostumada a ter seus desejos realizados. Ainda assim, Rachel havia aparecido, como se fosse a resposta para as suas preces. No seu pior momento, quando ela estava olhando para baixo do alto de um precipício, ela havia suplicado silenciosamente por ajuda. E então, Rachel havia aparecido. Quinn sempre teve medo de precisar das pessoas, porque as pessoas eram falhas, elas decepcionavam. Mas querendo ou não, ela sabia que precisava de Rachel. Ela precisava de compreensão, segurança, esperança.

 

Ela precisava aprender a dar passos para frente.

E, finalmente, ela sentia que podia.


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Notas finais do capítulo

Até o próximo! :D