Novamente A Seleção escrita por Letícia Miyashiro


Capítulo 3
America Singer


Notas iniciais do capítulo

Sei que é chatinho isso aqui, mas sei lá, caros leitores fantasmas, seria muuuuito bom vocês postarem sua opinião nos reviews

Bem, agradeço novamente às meninas que comentaram, favoritaram e pá! Fico feliz que estejam gostando!



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As últimas semanas se resumiram apenas em visitas constantes de oficiais do governo e pessoas da equipe de produção do concurso.

Eles repassaram regras, medidas de segurança, avaliaram a veracidade de minha ficha centenas de vezes, tiraram medidas para as novas roupas que eu iria usar no palácio, me recomendaram remédios, deram-me avisos toscos e questionaram a minha virgindade. Essa última foi a que mais me incomodou.

Não que eu fosse uma santa, mas era obrigada a respeitar as leis, e de acordo com a lei illéana, eu só poderia perder minha virgindade após o casamento. E até agora não interessei em me casar com ninguém, nem mesmo com o príncipe. Apesar disso poder ser levemente questionável aos olhos de terceiros.

O estranho foi como os oficiais do governo reagiram ao saber que minha mãe era America Singer. Não que fosse raro esse tipo de reação das pessoas, já que ela era famosa, mas eles simplesmente ficavam descrentes com esse fato e chamavam minha mãe para conversas particulares muito suspeitas. Eu tentava perguntar o motivo disso tudo, mas minha mãe fingia que não me escutava.

E o pior de tudo foi os olhares fulminantes que tive que aguentar todas as vezes que saía em público. Principalmente de Hella e Isla, que me olhavam como se eu fosse alguém abaixo de Oito. Por me deixarem furar a fila no dia da inscrição, elas se sentiam roubadas, injustiçadas. E era engraçado como eu sentia exatamente a mesma coisa, só que em outros aspectos.

Helen agora era bipolar, tripolar, ou melhor, polipolar. As vezes ficava animada por mim e as vezes se contorcia de angústia pelo o que eu lhe desabafei. Suas mudanças de humor eram irritantemente constantes. Outrora alegria, inveja, medo, saudade antecipada...minha amiga sempre fora alterada, mas agora batia recordes. Estava totalmente pirada.

Minhas tias me parabenizaram. Todas elas. May, irmã da minha mãe, ficou realmente contente e emocionada. E Kamber e Celia, irmãs de meu pai, estavam muito empolgadas. Mas não foi essa a reação que recebi de alguns de meus primos. Principalmente de Jennifer, filha da tia Kamber com um Dois. Ela sempre fora esnobe, provavelmente puxara essa característica do pai. Por isso sempre evitava contato com ela.

Vovó insistira em organizar uma festa. E minha mãe acabou cedendo. E agora eu estava lá, no meio de toda a minha família. Aguentando o falatório de minhas primas. Elas me cercavam e falavam tão rápido que chegava a ser até engraçado. Mas acabei conseguindo me desligar do que elas falavam. Suas vozes se tornaram apenas um som de fundo para meus pensamentos agitados. Concentrei-me na torta que comia na hora, e agradeci a Deus pelo fato de Helen apenas me encarar em silêncio. Isso era sinal de que ela tinha algo realmente decente para falar.

Minha avó Magda passou por nós e comentou:

– Parece que A Seleção está no sangue da família.

E Helen concordou. E eu não entendi direito. Mas uma ideia vaga e absurda apareceu de repente em minha mente. Era inacreditável.

Minha mãe ouviu e lançou um olhar repreensivo á vovó, que ignorou completamente.

Papai aproveitou a festa para dar a grande notícia que esquecera de contar a nós no dia em que fui selecionada, devido aos acontecimentos caóticos na noite. Ele se aposentara, e eu fiquei chateada por conta disso. Muitas vezes agarrara a expectativa de estar ligeiramente mais próxima do meu pai quando estivesse no castelo. Aquilo realmente me desanimou, mas pouco depois de minhas primas dispersarem e mamãe começar a tocar para entreter a família, papai me chamou num canto e nós conversamos. Obviamente, se ele soubesse que seria escolhida, teria permanecido. Mas essa decisão foi tomada algumas semanas antes.

O motivo é que ele realmente já estava ficando velho, e aquela vida já não era mais para ele. Foram mais de 20 anos servindo o rei diretamente, o cara que ele odiava. Compreendi totalmente seu desejo de abandonar o palácio.

– Consegui ficar no topo da hierarquia militar, minha aposentadoria me recompensará por cada dor que sofri dentro daquela jaula.

Eram ataques demais e agora seria milhares de vezes mais complicado manter a segurança no palácio. São mais 35 propriedades de Illéa para proteger, e também há a obrigação de garantir que todos os soldados se concentrem apenas na proteção da denominada "jaula"...em que eu seria lançada.


Quando a festa acabou e minha tia Kenna foi embora, Helen permaneceu para dormir em minha casa.

– Rose, tenho algo para te contar - sua voz saiu baixa, como se não quisesse que meus pais ouvissem.

Obviamente, entendi a deixa. Era algo particular.

– Mamãe, estamos cansadas por causa da festa, vamos dormir. Boa noite papai, Viola e Louis.

– Boa noite para vocês - ela respondeu. - Mas por favor, não falem muito alto e depois das onze apaguem as luzes - já disse que ela é muito esperta?

– Tudo bem, mãe - respondi, em um tom cansado.

Nós subimos e entramos no meu quarto, Helen segurava uma revista famosa adolescente. Ela a apertava com tanta força que os nós de seus dedos ficaram esbranquiçados.

Ela não falou, apenas fechou a porta, se jogou na minha poltrona e folheou a revista rapidamente, procurando uma página distinta. Ela parecia ansiosa, eu achava que era medo de minha reação. E estava certa. Porque aquilo foi realmente chocante para mim.

A matéria começava com uma grande foto da Rainha Kriss jovem, me assustei com a diferença de expressão. Nela, a jovem Kriss - como era retratada na matéria - estava sorrindo de forma meiga, quase tímida. Seus olhos eram azuis da mesma forma, cor de gelo. Mas em vez de serem frios como sua cor, eram adoráveis, alegres. Será que a realeza endureceu a rainha? Ou como ela disse no Jornal Oficial, apenas estava "jogando bem", para depois revelar-se uma total desprovida de emoção?

Mas na foto, ela estava tão inocente e verdadeira que presumi que a primeira hipótese é a mais provável. Senti pena da jovem Kriss. Talvez tivesse sido melhor para ela, se continuasse sendo apenas "a jovem", em vez de tornar-se "A Rainha".

– Pare de admirar a Vossa Majestade e comece a ler a matéria, por favor! - foi uma ordem irritadiça de Helen, que arrancou-me de meus devaneios. Comecei a ler.


A ÚLTIMA SELEÇÃO

Todas já percebemos que não se fala muito da última Seleção ocorrida. Isso também acontecera com a retrasada. Mas nós aqui da Illéa Teen conseguimos algumas informações para você que está interessada em saber de T-U-D-O sobre a Seleção em si e sua história nobre!

– A Última Vencedora -

Nossa atual Rainha, Kriss Ambers Schreave, já era uma das favoritas quando entrou, uma boa parte do país já sentia que seria ela a vencedora. Realmente, seu jeito refinado e inteligente não demorou para conseguir milhares de admiradores por todo país.

A jovem Kriss era sem dúvida adorável, tinha todos os requisitos para se tornar uma verdadeira Rainha. Era, aliás - como todas sabemos -, é deslumbrante. Parecia que já havia nascido para ser uma princesa.

Nascida numa família de Três. Foi criada bem o suficiente para saber como se portar bem no palácio. E em seus primeiros momentos como Rainha, ficou claro para quem a acompanhava que ela pegou o jeito depressa.

Numa análise das coberturas da Seleção, percebemos que a atenção do até então Príncipe Maxon estava completamente voltada para uma participante em particular - falaremos dela mais tarde - e Kriss foi inicialmente deixada de lado.

Mas ao decorrer do concurso, podemos perceber que fora criado um laço muito forte entre Kriss e Príncipe Maxon.

[...]


– Pula para essa parte! - Helen virou a página depressa, de modo impaciente, e apontou para uma outra parte da matéria.

Do lado, uma pequena foto emoldurada de...mim?! Não, não era eu realmente. Era uma mulher muito parecida comigo, as únicas diferenças eram os olhos grandes e azuis e sua expressão mais séria, clássica e ousada. Era uma linda adolescente. Minha boca se escancarou.

– A Elite -

America Singer

Não consegui acreditar no que li. Minha mãe fez parte da Seleção? Agora tudo faz sentido. A reação do rei, a desconfiança do príncipe, o comentário da vovó, o fato de a família real ser um assunto desconfortável na casa, o olhar do meu pai para com o rei.

Por que eles não me contaram isso antes? Se ao menos ela tivesse sido uma das primeiras a sair...mas ela ainda permaneceu até A Elite! Será que o príncipe ainda mexia com o coração dela? Não, impossível, ela parece amar o papai. O papai. America e Aspen se conheceram no palácio?

São tantas perguntas, pretendia ter a resposta de todas elas ainda hoje. Mas por ora, apenas resolvi ler o resto da matéria.

A favorita do príncipe. É como podemos chamá-la. Ficou claro que desde o início do concurso, ela simplesmente roubou o príncipe das outras, provocando inveja em todas as outras participantes e eliminando parte de suas chances de mostrarem o que tem de bom para o príncipe, provavelmente fazendo-o expulsá-las sem sequer conhecê-las.
Talvez seja por esses motivos que a jovem era a menos querida dos cidadãos de Illéa.

Sua participação foi polêmica. Ainda mais depois de apresentar um projeto desnecessário de eliminação das castas.

[...]

Contudo, no final, o príncipe acabou preferindo a jovem Kriss. E estranhamente, esse fato não pareceu gerar nenhuma reação de tristeza em America. Mas o fato real da eliminação da jovem não foi divulgado. E todas as vezes que o nome da garota foi tocado, o até então príncipe Maxon, fez questão de repreender os entrevistadores e repórteres.

Mas toda a população aderiu a versão de que Maxon simplesmente se apaixonou por Kriss de forma tão incondicional que foi capaz de deixar de lado sua paixonite por America, que, como podíamos ver, ao decorrer do concurso, foi tornando-se menos ela mesma, a natural e encantadora America Singer, e foi se tornando uma dama superficial, a Senhorita America Singer.

Hoje ela ainda não deixou de dar notícias. Se tornou uma musicista famosa. Encantando a todos com sua bela voz. E casou-se com um soldado do palácio...o que nos faz desconfiar de que há outra versão sobre o fim do encanto pelo príncipe Maxon. Mas isso deixamos com a imaginação de vocês, garotas.

Fiquei surpresa com o modo que retrataram minha mãe. Dama superficial? Não consigo imaginá-la sendo alguém superficial. Sempre fora tão boa, caridosa e simpática com os outros. Mesmo com os fãs de castas mais baixas.

Deveriam ter retratado Kriss como uma dama superficial, por parece que foi isso que ela se tornou.

E fiquei mais surpresa ainda com a audácia dela. A eliminação das castas? Mesmo eu sei que isso seria uma loucura. Iria bagunçar toda a hierarquia civil Illéana. Caótico, pelo menos nos primeiros anos. As chances de darem certo eram mínimas. E certamente, despertaria a fúria de pessoas de castas superiores. Deve ter sido por isso que ela foi se tornando mais refinada e menos ela mesma. Não queria abandonar a competição.

Mas quase não pude acreditar que ela fora a favorita do príncipe. Realmente, deve ter sido uma tortura ver o meu rosto, tão parecido com o dela - agora consigo acreditar nisso, após ver a foto da matéria, mas continuamos tendo nossas diferenças -, e certamente Maxon conversou com Aaron sobre sua favorita, por isso ele deve ter me reconhecido vagamente.

De repente, me senti aliviada. Maxon não iria querer minha presença ali. Iria tentar influenciar minha eliminação. Eu não sou a mais bonita das selecionadas, nem a mais refinada. E se era tudo uma questão de imagem, eu não duraria muito tempo no castelo.

Percebi que estava encarando o nada, e Helen estava me encarando, esperando reação. Mas senti que estava sem expressão. Virei meu rosto para ela, que ergueu a mão para levantar meu queixo caído, fechando minha boca.

Foi um impulso, pulei da cama e abri a porta num estrondo, crendo que meus pais ainda estavam acordados. Desci a escada escorregando pelo corrimão, do jeito que minha mãe abomina. Corri até a sala de televisão, e lá estavam eles, prestando atenção num filme qualquer. A família toda menos eu. E a família toda, ao me ouvirem chegar, levaram seu olhar a mim.

– America Singer, na Elite da última Seleção - minha voz saiu ligeiramente tremida, sem expressão. Como se fosse apenas um comentário aparatado*.

Meus pais precisaram de um tempo para absorver o que eu falei. Mas percebi que nos últimos instantes que se seguiram, eles apenas estavam chocados demais para falar.

– Por que não me disse? - tentei esconder a mágoa em minha voz, porque ela não fazia sentido, realmente, não precisava me contar dessa parte de sua vida. Mas pelo menos agora que eu havia entrado na Seleção...ela poderia ter tentado falar comigo. Não sei por quê, mas dói ter sido obrigada a descobrir isso por meio de uma revista.

– Não achei que precisasse - ela respondeu, a voz estava seca. Afirmava meus pensamentos, como se pudesse lê-los.

– Realmente, não precisava. Mas você nunca pensou que isso talvez fosse algo que eu gostaria de saber? Ainda mais tendo entrado na mesma situação que você?

Minha mãe não respondeu, seus olhos fixos em minha direção, apesar de eu saber que não olhava para mim. Meu pai se irritou.

– E você, Rosalie?! - ele nunca me chamava pelo nome, isso queria dizer que ele estava realmente irritado. - Não pensou que esse fato poderia ainda doer em sua mãe? Ainda mais ela tendo estado na Elite, como descreveu?

Foi a minha vez de ficar calada, claramente constrangida.

Viola e Louis simplesmente saíram da sala. Creio que Louis teve que obrigar minha irmã, sempre tão curiosa.

Os instantes que se passaram mergulhados no silêncio foram suficientes para meu pai se acalmar.

– Por favor Rose, vá descansar agora, foi um dia realmente muito cheio. Amanhã, prometemos que conversaremos sobre isso com você - ele abraçou e beijou a testa de minha mãe, que fechou os olhos.

– É uma promessa. Por favor, não se esqueçam...

– Não há como se esquecer disso - minha mãe me interrompeu.

Helen me esperava no quarto, já preparada para dormir.

– Você quer conversar? - perguntou, delicadamente.

– Hoje não, Helen, e não com você, por ora - tentei não soar ofensiva. Não deu certo, mas uma das qualidades de minha amiga é compreender quando as coisas vão mal.

Ela apenas se calou e virou-se para adormecer. Não havia como eu saber, mas sinto que permaneceu acordada por mais um bom tempo, apesar de fingir bastante bem.

Eu tampouco consegui fingir. Apanhei a revista para ler o resto da matéria. Mas acabei apenas lendo e relendo apenas a parte que falava sobre minha mãe, até o sono me vencer.


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Notas finais do capítulo

*referência a Harry Potter :3

E aí, curtiram?