Rise Again escrita por Fanie_Writer


Capítulo 6
Capítulo 6


Notas iniciais do capítulo

Olá meus amores!
Desculpem a demora... Mas aqui está mais um capítulo dessa trama cheia de mistérios e emoções. Alguns mistérios mais simples, outros mais complexos... mas garanto que todos sempre terão muitas emoções por trás.
Gostaria de mais uma vez agradecer à linda Angel pela recomendação maravilhosa que deixou aqui e por estar sempre acompanhando minhas postagens!!! Obrigada loba!!!
Agora, vamos à história...
Boa leitura, e nos vemos nas notas finais!



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Com o sangue se acumulando a cada segundo mais em minha cabeça, ficava cada vez mais difícil de focar na direção do inimigo iminente.

Me balancei para todos os lados, puxando e quase quebrando a perna que estava presa pela corda que me sustentava, enquanto a outra pendulava, como um peso morto. Sentia meu rosto queimar da fricção da pele contra o solo quando fui arrastado para dentro da floresta com a corda em meus pés.

Mas mesmo assim, fiquei alerta, esperando pelo próximo movimento de meu inimigo.

Ao invés de bombas, tiros, flechas ou míseras zarabatanas, a floresta ecoou o som de risadas.

- Olha, olha mamãe! Deu certo!

A cabeleira saltitante de Prim foi a primeira a aparecer, seu sorriso com um buraco bem na linha de frente. Fin veio logo em seguida, arrastando uma miniatura de arco e flechas rudimentares, que, mesmo seguindo padrões reduzidos, eram grandes demais para ele.

- Sim querida. Deu certo! Vá lá e pegue seu prêmio.

Katniss apareceu das sombras das árvores logo em seguida, carregando seu arco e flechas e com uma mochila no ombro.

- Pelo visto você andou praticando suas técnicas de armar armadilhas.

- E pelo visto você deixou de praticar suas técnicas de identificar armadilhas. – ela rebateu, pegando minha faca que estava caída no chão.

Antes que eu pudesse dizer mais alguma coisa, senti um baque nas omoplatas que me fez perder o ar.

Minha visão escureceu por um longo segundo, mas quando eu pisquei, estava no paraíso.

- Você está bem? – Katniss segurava meu rosto com uma mão e me olhava preocupada. Depois de sua crise emocional depois do jantar em sua casa, aquilo era o mais próximo que estivemos.

Melhor, só se eu morresse nesse exato momento. – pensei.

- Não. – arfei.

- Eu falei pra você não cortar Fin!

- Mas a mamãe disse...

- Deixa de ser bobo, não tá vendo o que você fez?!

- Chega os dois! – Katniss desviou sua atenção de mim para apartar a discussão dos irmãos – Prim, retire a corda dos pés do Gale. Fin, me dê sua garrafa d’água.

As crianças fizeram o que ela pediu, enquanto Katniss me ajudava a sentar. Depois de tomar com dificuldade um gole de água da garrafa pequena de Fin – que sorriu de orelha a orelha quando eu a devolvi e disse obrigado soldado -, consegui recuperar o fôlego.

- Foi para isso que você queria me encontrar? Para me usar de isca?!

- Não. Mas confessa, até que foi divertido, não foi?!

- Não.

Katniss riu de um jeito solto. E isso me assustou inicialmente.

Há quanto tempo eu não ouvia o som dessa risada? Desse jeito livre?

Mas então novamente senti aquelas emoções contidas lutando com chutes e pontapés dentro de mim, querendo escapar.

- Venha, vamos para a casa no lago.

Ela se levantou e ajudou os filhos a levantarem, batendo suas mãos na altura dos joelhos dos pequenos para limpar a poeira do chão da floresta. Me estiquei para alcançar o bolo de cartas, que ficou caído entre um monte de folhas e pedras.

Como se estivessem correndo por cômodos de casa, as crianças começaram a correr à frente, ziguezagueando entre as árvores. Fin tropeçando de vez em quando sobre o arco.

- Passei o dia ensinando eles a montar essa armadilha. E passamos praticamente a semana inteira na floresta.

Digeri cada uma de suas palavras enquanto caminhávamos lado a lado. Eu sabia o que ela pretendia com aquilo tudo, mas eu queria ouvir de seus lábios.

- Por quê? – perguntei.

- Você sabe por que. – ela rebateu como se tivesse lido minha mente – Pelo mesmo motivo que nossos pais nos ensinaram a caçar.

Mesmo sem ela ter falado diretamente, eu sabia que isso tinha alguma coisa a ver com a maneira com que ela reagiu ao ler minhas cartas para Peeta.

Bati minha mão livre em minha camisa, onde a poeira da floresta se acumulou com mais intensidade, e desviei meu olhar para cima.

O céu parecia ter sido pintado por um artista, que tentava encontrar as nuances perfeitas de laranja e roxo, misturando as cores até que retratasse com fidelidade o entardecer daquele dia de outono.

Desviei meus olhos do céu e olhei para as crianças, que corriam muitos metros à nossa frente. Suas silhuetas pequenas sumiam ágeis na floresta, reaparecendo segundos depois conforme eles corriam, brincavam e exploravam a floresta.

- Eles não são muito pequenos para isso? – quebrei o breve silêncio entre nós.

Katniss respirou fundo e sua unha tentou arranhar, num movimento nervoso, a madeira na ponta de seu arco.

- Fin ainda não assimila muita coisa... Mas um dia ele vai. E Prim é muito boa. Quero dizer, com essa coisa toda de caça. E isso é meio estranho... – ela deixou escapar a última frase num sibilo.

Olhei para Katniss e seus olhos acinzentados pareciam perdidos em uma árvore a poucos metros. Mas eu sabia que seu foco não era a árvore, mas alguma memória do passado. Tão rápida como foi, ela voltou ao tempo presente e encontrou meu olhar.

– Acho que quanto antes eles aprenderem, melhor vai ser para eles. Não sei o que pode acontecer comigo amanhã ou depois, então é bom eu passar tudo o que sei para meus filhos enquanto posso.

Não gostei do que ouvi. Senti novamente como se estivesse lendo Peeta admitindo que estava morrendo. Mas, nesse caso, era muito pior, porque as palavras não saltavam de um pedaço de papel, mas da boca de Katniss.

Eu queria dizer a ela que estaria sempre ao seu lado, convencê-la do quanto ela estava errada em dizer aquelas coisas, me enfurecer com ela por agir de maneira tão contrária à toda a força que possuía... brigar com ela como nos velhos tempos. Ao invés disso, apenas respirei fundo, contendo tudo dentro de mim de novo.

- Não acha que eles estão muito longe? – mudei de assunto, voltando a sondar a localização das crianças, que haviam sumido de novo entre as árvores.

Katniss enrugou a testa e então sorriu. Não consegui entender ao certo que reação foi essa.

- Não se preocupe... Uma semana aqui e esses dois já decoraram o caminho do lago até nossa casa com mais facilidade do que fizeram com o caminho para a escola. Daqui a pouco um dos dois aparece chorando de alguma traquinagem do outro, ou assustados por algum esquilo, coelho ou veado.

Como se tivessem nos ouvido, logo as duas cabecinhas reapareceram na paisagem. O vento frio impulsionando os dois em nossa direção, mas eles não choravam ou pareciam assustados com algo.

Ao contrário, Prim e Fin – que vinha mais atrás, retardado pelo peso do arco – correram na direção de Katniss. Cada um segurava uma flor silvestre.

Com um sorriso lindo que há anos eu não via, Katniss se colocou em cócoras e os dois colocaram as flores em cada uma de suas orelhas.

- Pra você mamãe. – Fin disse.

Prim deu um beijo no ombro da mãe, salpicando mais outro na bochecha.

- Você é linda! – disse com sua voz fina.

Katniss abraçou os dois e então eles voltaram a correr livres pela floresta, dessa vez gritando um com o outro em uma aposta animada de quem chegaria primeiro à casa do lago.

Desviei meus olhos de Katniss e coloquei minhas mãos nos bolsos da calça. Me sentia como se estivesse de novo diante de sua porta, com o exército de Primroses me acusando de quão errado era eu estar ali com sua irmã.

- Acho que é melhor eu voltar. – eu disse de repente, estancando meus pés no chão.

Tirei a mão que segurava o bolo de cartas de dentro do bolso e estendi para Katniss.

- Me sinto um intruso nesse momento que é seu e de sua família. – confessei.

Seus olhos pousaram nas minhas mãos e então de novo para meu rosto. Com os dedos um pouco trêmulos, ela alcançou o pacote de cartas.

Não consegui decifrar sua expressão, mas os contornos de sua face variavam de uma carranca que parecia de dor, para um sorriso que parecia de alegria.

Um longo tempo se passou em que ela ficou em silêncio e eu virei meus pés na direção oposta à que seguíamos, pretendendo voltar para a pousada e me afundar em pensamentos e memórias. Talvez até me afundar um pouco na bebida, porque eu estava precisando abrir essa exceção nesta noite.

- Espere... – ela sussurrou. No silêncio ao nosso redor, o som saiu alto como o retumbar de meu coração em meus ouvidos – Fique. Eu também tenho algo pra você. Bem, na verdade, é algo que Peeta me pediu para te entregar.

Antes que eu pudesse perguntar ou dizer qualquer coisa, ela recomeçou a andar na direção do lago e eu tive que segui-la.

No meio do caminho Katniss parou e colocou uma flecha em posição, acertando segundos depois num tiro perfeito uma doninha em um ninho.

Por um segundo esqueci todas as minhas aflições do passado e do presente quando ela se virou para mim e sorriu antes de ir buscar sua caça, daquele jeito que ela só fazia quando éramos apenas dois adolescentes caçando escondidos na floresta para alimentar nossas famílias. Há anos, escolhas, sacrifícios e caminhos atrás.

Isso me desarmou um pouco, mas me fez me sentir ainda mais perdido. Se antes nossa relação se resumia a dois ex melhores amigos tentando se reaproximar após anos sem contato, o que todos esses gestos dela significavam agora?

A única certeza que eu tinha era que, ao lado de Katniss Everdeen, todas as minhas convicções levantadas como muralhas, eram derrubadas como um castelo de areia sob a força do mar. E o mais cruel – para meu coração – era que ela nem tinha noção desse poder que ela tinha sobre mim.

Como seus filhos quando me capturaram, ela voltou sorrindo e sacudindo a flecha com a doninha, sentindo-se vitoriosa com sua conquista.

- Com fome?

- Sempre! – respondi.

Quando alcançamos o lago, a lua já começava a despontar no horizonte, limando qualquer vestígio de cor alaranjada que restasse no céu.

As crianças já estavam à beira do lago, lançando pedras na água e rindo do quão longe conseguiam chegar.

- Quer que eu limpe isso? – ofereci.

- Ainda se lembra como faz?! – ela desafiou.

Tomei a doninha de sua mão e peguei minha faca de caça. Antes de me dar as costas ela revirou os olhos e sorriu.

E só então percebi que o mesmo sorriso em seu rosto estava refletido no meu. E, mesmo me concentrando enquanto limpava a ave, não consegui removê-lo de lá.

Minutos depois, Katniss voltou com uma panela e eu depositei a doninha já devidamente limpa. Ela entrou na casa para preparar o jantar e eu fiquei à porta olhando as crianças à beira do lago.

- Não é à toa que você é comandante da segurança nacional. – Katniss apareceu de repente ao meu lado, me pegando totalmente de surpresa e me oferecendo um pedaço do pão que ela beliscava.

Eu não sabia há quanto tempo eu estava em pé na porta vigiando Prim e Fin, apenas me lembrava de pensar a cada segundo o quanto eu invejava Peeta por ter aquele retrato do paraíso em sua vida após tanto sofrimento, enquanto que eu tinha o que?

Ah, claro, me lembrei o que eu tinha: um quarto especial em cada um dos alojamentos militares de Panem, cada cama ocupada por uma garota diferente a cada noite e um uniforme repleto de medalhas de honra.

Família?

Há anos não sabia o que era jantar com meus irmãos e minha mãe. Nossa matriarca sempre estava ocupada demais – ou se ocupando de propósito – nos hospitais dos Distritos. Nunca soube ao certo quando ela desenvolveu interesse por esse tipo de serviço já que ela nunca havia trabalhado na área antes, mas eu tinha quase certeza que era sua maneira de fugir do passado e ainda era uma maneira de não permitir que a mãe de Katniss se perdesse na loucura de sua filha mais nova morrer.

Sorri amarelo e enfiei um pedaço de pão na boca. Na falta de palavras exatas para responder, aquilo era o melhor que eu poderia fazer.

Afinal, o que eu responderia? Que alguém ali deveria se preocupar?! E que eu era a pessoa mais indicada para vigiar e cuidar de crianças?! Justo eu, que matei sua irmã?!

- O jantar está quase pronto... Depois de comermos, vamos voltar para casa e então a gente conversa.

Katniss fechou sua expressão, recolhendo o restante do pão e voltando para a pequena cozinha construída na casa. Ela havia odiado minha reação ao seu comentário tanto quanto eu odiei o que suas palavras significavam.

Aquelas mudanças de maré entre nós estavam acabando comigo. Não sabia por quanto tempo conseguiria remar contra essas ondas de sentimentos que o humor instável dela levantava em mim. Ou contra as ondas de ressentimentos que eu causava nela.

Bufei para mim mesmo e caminhei em direção ao lago para me juntar às crianças. Passei a próxima meia hora mostrando a eles como eu fazia para a pedra quicar várias vezes na superfície da água negra antes de afundar.

Como da última vez, eles me encheram de perguntas que eu, curiosamente, não me importei de responder.

- O jantar está pronto. – Katniss anunciou perto de nós. Olhei para trás e ela estava comodamente recostada em uma árvore.

Ou eu estava muito barulhento ou ela silenciosa demais.

O céu estava escuro, com pequenos pontos de luz das estrelas que se desvencilhavam das nuvens que o vento frio trazia. Mas mesmo assim, foi impossível não me lembrar de como Katniss estava linda na noite em que a vi, naquele mesmo lugar em que estava, se despindo sob a luz prateada da lua.

As crianças correram por nós direto para a casa. Os olhos cinzentos estavam fixos nos meus, como se tentassem perfurar minha alma como flechas mortais.

- O que foi?! – perguntei depois de um longo segundo, me sentindo meio constrangido com a maneira como ela me olhava. Isso porque, apesar da conexão, ela parecia estar me lendo mais do que me permitia lê-la.

- Você leva jeito.

- Com o quê?

- Arremesso de pedras.

Arqueei uma sobrancelha questionando, mas antes que eu dissesse mais alguma coisa, ela rolou os olhos.

- Como com o quê?! Com crianças. Você sempre foi bom com isso.

Coloquei as mãos nos bolsos e chutei uma pedra no caminho até Katniss.

- Pode ser... Mas eu gostaria que isso tivesse sido suficiente para mudar o que eu fiz.

Passei por ela, que me seguiu em silêncio até a casa.

Não falamos muito durante o jantar. Pelo menos não diretamente um ao outro. Geralmente respondíamos às perguntas das crianças sobre caça. Entre um comentário e outro, ela me pediu para lhe passar o sal também.

Apesar de seus cinco anos, Prim era muito empenhada em absorver tudo o que dizíamos a ela. Mesmo pequena, ela possuía a mesma ansiedade que eu via nos olhos de alguns soldados, que viam as várias fases do treinamento como uma oportunidade de crescer e não uma obrigação.

Fin, por sua vez, ainda era muito pequeno para entender a importância de tudo aquilo. Ele via como uma grande aventura na floresta e, por isso, a pressão maior sobrecaía sobre a menina.

Quando terminamos, Katniss pediu que eles juntassem suas coisas enquanto eu e ela limpássemos tudo para irmos embora. Embora a casa estivesse mais bem equipada do que eu me lembrava, ainda não era confiável passar a noite naquele lugar com duas crianças e sem as devidas precauções de segurança.

Voltamos para a Vila dos Vencedores em passos apressados porque a cada hora o clima ficava mais frio e o ar mais pesado, indicando que em breve teríamos uma tempestade.

O silêncio só não era mais perturbador por causa da presença das crianças, que nos fazia rir de suas brincadeiras no caminho ou responder a uma de suas infindáveis perguntas.

Ajudei Katniss a guardar o restante dos alimentos na cozinha e as armas em um esconderijo secreto que ela mantinha atrás do fogão, para manter seus filhos longe das facas e flechas. Enquanto isso, os pequenos tinham subido para tomar banho.

Era inegável que Katniss e Peeta haviam feito um ótimo trabalho na educação dos filhos, mas me surpreendi também em como aquelas crianças eram mais independentes do que quaisquer outras na mesma faixa etária.

Contudo, mesmo sendo tão espertos, ainda eram crianças e pediram para que a mãe as colocasse na cama e contasse uma história.

- Me espera no escritório? – ela sussurrou para mim quando meu olhar caiu, involuntariamente, na porta dos fundos, procurando por uma fuga de mais um momento tão íntimo e familiar.

As crianças a puxavam impacientes, cada uma agarrada a uma mão e eu apenas meneei a cabeça assegurando que esperaria para ter a nossa conversa, embora estivesse difícil de encontrar a voz em minha garganta.

Caminhei pela casa, andando pelos cômodos do primeiro andar e sendo inundado por memórias que aquele lugar me trazia. Com certeza, essa seria mais uma noite insone.

O escritório era um cômodo escuro, apesar da mobília sóbria. Na parede atrás da mesa havia uma réplica reduzida do arco que Beetee havia projetado para Katniss durante a Grande Revolta.

Antes que eu pudesse entender o significado da presença daquele arco no ambiente, meus olhos caíram sobre outro quadro. Na parede à minha direita, havia mais uma pintura de Peeta.

Essa era ainda mais realista que o quadro que adornava a parede da sala. No retrato, Katniss estava com o olhar baixo e uma mão sobre seu ventre robusto pela gravidez. Ainda havia a imagem de uma menina de cabelos escuros e curiosos olhos azuis com sua mãozinha miúda sobre a barriga de Katniss.

Me aproximei do quadro e, além dos detalhes das pinceladas, era possível perceber os padrões avermelhados e disformes da pele exposta de Katniss no retrato. Cada linha tracejada pelas chamas em sua pele, uma eterna lembrança do preço pago para fazer tudo o que ela fez.

- Ele era realmente bom, não?! – a voz firme, mas sussurrante soou logo atrás de mim.

Antes de eu me virar, um cheiro fresco como que de amêndoas ou castanhas inundou meu nariz. Era o mesmo cheiro que eu sentia quando caçava na floresta em época de chuva... Era o cheiro da pele de Katniss após o banho, tal qual habitava minhas memórias.

Respirei fundo, tragando mais de seu aroma e me virei para encará-la.

- Peeta era muito atento aos detalhes.

- Atento demais para meu gosto. – ela fez uma careta para o quadro e puxou para mais perto a gola da blusa que já tampava seu pescoço, num gesto involuntário e nervoso.

Após um longo segundo de silêncio, ela caminhou até a mesa e abriu uma gaveta.

- Toda vez que ele se enfiava nesse escritório, demorava horas para sair. Quando saía, ou ia para a padaria, ou para a sua casa. - Diante da expressão de dúvida que fiz ela acrescentou. – Dois vencedores dos Jogos, duas casas, lembra-se?

Ela colocou sobre a mesa uma caixa de madeira com um envelope em cima.

- Todas as vezes que ele saía, eu vinha aqui tentar descobrir o motivo de sua reclusão. Nunca consegui. Pelo menos não até que ele quis que eu descobrisse.

Katniss empurrou gentilmente a caixa para a frente, na minha direção. Caminhei até a mesa e peguei o envelope.

Ao contrário do que eu esperava, estava endereçado para ela.

- Tem certeza de que...

- Leia.

Abri o envelope e reconheci a caligrafia trabalhada de Peeta. Após ler os três primeiros parágrafos, eu abaixei o papel e olhei para Katniss.

- Sei que deve ser difícil para você, mas continue lendo. Ele queria que você lesse isso.

Katniss querida,

Se você está lendo essas palavras, então significa que alguma coisa aconteceu comigo. E só de pensar nisso, meu coração já se parte de dor e saudade.

Viver ao seu lado todos esses anos, te amar e ter filhos com você foi muito mais do que um cara como eu poderia pedir ou sonhar. E você, mais do que ninguém, sabe como é difícil sonhar após ser mandado duas vezes para os Jogos Vorazes.

Mas, de certa forma, eu fui feliz. Apesar das sombras que ameaçavam eclipsar o amor que eu sinto por você, no fundo, bem no fundo de minhas angústias, eu sempre soube que a única coisa real era você. E é por te amar tanto que eu te escrevo essas palavras. É por te amar que te faço esse último pedido.

Peço que me perdoe por todas as vezes que fiquei ausente, recluso, mantendo segredos de você. Imagino que, a essa altura, você já saiba parte do motivo e que ele esteja nesse exato momento ao seu lado.

Confesso que fiquei surpreso e um pouco ofendido quando recebi a primeira carta de Gale, mas com o tempo fui aceitando sua preocupação. Com o tempo fui aceitando seus motivos.

Com o tempo, fui descobrindo coisas importantes que vão fazer toda a diferença na vida de vocês.

Deixo para você todas as cartas que ele me enviou. Assim que se sentir pronta, leia. Isso vai ser bom para vocês dois, vai ser um bom pontapé para a longa conversa que vocês precisam ter sobre tudo o que aconteceu no passado.

Deixo também uma caixa com coisas para o Gale. Você certamente não vai entender nada, mas ele sempre foi bom em decifrar enigmas – afinal, ele entendia o maior enigma de todos, que era você.

 Certamente ele vai conseguir finalizar o que eu comecei. Mas, se possível, peça para que ele mantenha tudo como está: em segredo.

E se há um último pedido que eu posso fazer, que seja esse: não se esqueça de mim, não permita que nossos filhos esqueçam de mim e não se esqueça do quanto amei vocês.

Se há um último conselho que eu possa dar, que seja o mesmo que Haymitch sempre nos deu: Fiquem vivos.

Com todo meu amor,

Peeta.

Fiquei um longo segundo olhando para a folha de papel. Abaixei a carta e desviei meus olhos para a caixa.

- Ele estava certo... Seja lá o que for que ele quisesse dizer com essas coisas que estão aí, só você vai ser capaz de decifrar. Acredite, porque eu já tentei.

Puxei a caixa para mais perto e o som sobre a madeira da mesa foi alto por causa do silêncio que perdurava no cômodo.

A tampa possuía uns entalhes florais simples e o verniz parecia velho e desgastado, como se a caixa tivesse ficado guardada por muito tempo. O rangido do fecho confirmou isso.

Dentro, haviam alguns mapas rasgados, uma chave, um tipo de identificador biométrico portátil e a ponta de uma flecha.

Peguei item por item, dispensando um longo tempo para analisar a cada um. Katniss permaneceu em um silêncio tão profundo, que perecia que ela segurava até a respiração, talvez com medo de que pudesse atrapalhar meu raciocínio e, embora eu não estivesse atento a ela, sentia seus olhos constantes em cada movimento meu.

- Pode ir dormir... Prometo fechar tudo quando eu sair.

- Como se eu fosse conseguir dormir de qualquer maneira. – ela rebateu, puxando o ar com força para os pulmões pela primeira vez em minutos.

Me acomodei na cadeira à frente da mesa e deixei os pedaços de mapa de lado, pegando novamente a chave.

- Não é de nenhuma fechadura dessa casa. Mas não acho que seja de algum tipo de banco ou cofre externo também.

Ela sussurrou, com uma nota de frustração. Comecei a me questionar quanto tempo ela deve ter passado com essas coisas.

- Agora entendo porque você passou a última semana com as crianças na floresta. Nunca foi apenas para ensiná-los a caçar, não foi?!

- Bingo. – ela disse tentando soar com humor, mas estava concentrada demais para isso – Tentei em todos os lugares que ele costumava ir, que não eram muitos, já que ele odiava ficar na floresta. Imaginei que o mapa pudesse ser de lá, mas não é.

Deixei a chave de lado, alinhada na mesa junto com os pedaços do mapa, e peguei a ponta de flecha.

Me encostei no espaldar da cadeira e fiquei girando a flecha nos meus dedos. Eu quase podia ouvir o som das engrenagens girando em minha cabeça.

- De quando é aquele quadro? – apontei com o queixo para a réplica do arco Mockingjay.

Katniss não virou a cabeça para olhar.

- Não sei exatamente, já que sempre odiei entrar aqui. – imediatamente me lembrei da nossa conversa na casa do lago, há quinze anos, quando ela me contou da visita de Snow... quando ela me deu uma esperança passageira - Mas há quase um ano, quando entrei depois de mais um sumiço de Peeta, essa coisa estava aí.

Clic. Uma das peças se encaixou no instante que a ponta de flecha parou de girar em meus dedos.

Peguei a chave de cima da mesa e me levantei para ir até o quadro.

Primeiro fiquei olhando atentamente, varrendo cada centímetro com meus olhos treinados, em busca de alguma falha que indicasse um dispositivo de abertura secreto.

Quando não encontrei, entreguei a chave e a flecha para Katniss – que agora estava em pé ao meu lado, dificultando meu raciocínio com aquele aroma de amêndoas e pinheiro – enquanto vasculhava com os dedos o vidro que protegia o arco.

Deslizei meus dedos sobre a parte da frente da moldura branca, logo indo para a parte de trás. Quando senti um botão no canto inferior esquerdo, apertei.

A tela de vidro se mexeu para o lado e uma porta de ferro com um fecho se revelou diante de nossos olhos. Não precisava ser muito inteligente para saber que a chave abriria o cofre oculto sem grandes dificuldades.

Estendi minha mão para Katniss, que prontamente depositou a chave. Ela era de um material pesado, acreditava ser de ferro, e sua cor era artificialmente alterada para o dourado.

Lentamente encaixei a chave na fechadura e girei. Ao ouvir o clique, senti uma certa ansiedade.

- O que acha que pode ser? – Katniss sussurrou perto de mim.

- Tenho um palpite... Mas desejo que a sorte esteja a nosso favor.


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Notas finais do capítulo

Caramba... termina um mistério e começa outro!!! 0_o
O que será que o Peeta deixou escondido? Por que tantas cartas e tantas pistas? E essa conversa que Gale e Katniss precisam ter... aiai... eu também estou aflita!!!
Ainda tem muuuuuita emoção pela frente e muita coisa que vai fazer vocês ficarem com o coração na garganta, da mesma forma que o meu ficou quando eu escrevi certos fatos que estão para acontecer.... Sim, ainda vai acontecer muuuuuita coisa...
E no meio disso tudo, de toda a ação e mistério que vai surgir, Gale e Katniss ainda vão ter que lidar com essa avalanche de sentimentos que cada segundo de convivência vai despertar neles...
E aí, ansiosos pela continuação? Então comentem!
Semana que vem eu posto o capítulo 7 com o desenrolar desse mistério deixado por Peeta. E adianto: não é porque ele está morto que ele não terá participação nessa fic hein!
Mais uma vez, deixo um abraço grande, apertado e especial para Angel por todo seu carinho e apoio!!! *--*



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