Cisne Negro escrita por Atena


Capítulo 2
O início do fim


Notas iniciais do capítulo

Primeiro capítulo oficial ♥ espero que gostem!



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Bella

 4 de setembro

 

O vento soou por entre as enormes coníferas, fazendo seus galhos se moverem tranquilamente. Era noite, e a luz da Lua infiltrava-se entre a copa das árvores até iluminar suavemente o chão, deixando-me ver o que acontecia sob meus pés.

Nada.

Nem sequer um movimento ou som.

De onde eu estava, quase no topo de um dos abetos da floresta, eu podia enxergar tudo o que as outras árvores não cobriam. Longe da linha das árvores, as luzes da pequena cidade aglomeravam-se, como vagalumes. Se me se concentrasse, poderia ouvir os carros andando pela interestadual, as eventuais buzinas e freadas, bem como os sons habituais de uma floresta – o pulo de algum coelho, o bater de asas de um pássaro...

Meus olhos varreram novamente o espaço abaixo de mim. Eu estava empoleirada a quatro metros do chão, escondida entre as agulhas da árvore que me abrigava, observando. A quinze metros dali os limites da floresta me olhavam, zombeteiros. Seria fácil. Aparentemente, o caminho estava seguro.

O vento novamente fez os galhos tremerem, levando-me a me agarrar com mais força ao tronco onde estava encostada. Levaria apenas 32 segundos para descer da árvore, e depois, 22 segundos para atravessar aqueles quinze metros. Se eu descesse agora, poderia ziguezaguear entre os troncos, aumentando meu tempo de corrida para 25 segundos, mas me ajudaria a despistá-lo, caso estivesse enganada...

Uma parte da minha mente continuou formando planos e calculando segundos enquanto outra se concentrava em ouvir qualquer som que denunciasse meu perseguidor e, quando esta parte concluiu que estava seguro, meu corpo agilmente me conduziu pelos galhos, contorcendo-se para encontrar as partes mais firmes, até que meus pés pousaram silenciosamente no chão úmido da floresta.

Imediatamente comecei a correr. A parte da minha mente que não estava ouvindo ao redor nem calculando opções passou a procurar pedaços no chão que me permitissem correr silenciosamente, e com habilidade fui costurando entre as árvores, até que os limites da floresta – meu destino – estivessem a apenas cinco metros.

E então, eu o ouvi.

Meus ouvidos diziam que ele estava a três metros de mim, a esquerda, correndo paralelamente a mim. Instintivamente me protegi atrás de um tronco, retirando a arma do coldre. Ouvi os passos pararem também, e contei 10 segundos antes de dar uma espiada fora de meu esconderijo.

Tudo foi muito rápido, cerca de três segundos, mas foi tempo suficiente para que eu pudesse enxergar um pedaço do braço de meu perseguidor, desprotegido, e atirar nele antes de voltar para a proteção do tronco.

O vento trouxe o som baixo de um gemido, e sorri, aproveitando seu momento de distração para correr a distância de duas árvores e me proteger atrás de um tronco novamente. Faltavam apenas 3 metros.

Os segundos passaram. Dois, três, quatro... Eu respirei fundo e arrisquei uma olhadela para trás. Por um segundo, vi o brilho dos seus olhos na escuridão e, sem pensar duas vezes, atirei mirando o tronco em que ele se escondia. Precisava de um tempo para colocar os pensamentos em ordem.

Passei a pensar. O que iria fazer? Precisava chegar até os limites da floresta, mas minha prioridade era eliminar meu perseguidor. Em silêncio e com cuidado, fiz a volta no tronco de árvore que me protegia e o procurei. Fiquei à espera, os pelos dos braços completamente arrepiados, e dois segundos se passaram antes de eu vê-lo novamente, ainda me procurando no meu local anterior. Ele voltou a se esconder, e fiquei ali, à espera. Dez segundos depois ele me procurou novamente e, em seguida, mais 7 segundos se passaram antes de ele repetir o ato.

Assim que ele se escondeu, corri novamente para a árvore seguinte, propositalmente pisando em um galho. Será que a estratégia que estava bolando funcionaria? Pelas minhas contas, ele agora estava a quatro árvores de distância.

Por um tempo tudo o que eu ouvi foi o som da brisa balançando os galhos acima de mim e o som de algum animal pequeno correndo ali perto. Silenciosamente tirei os tênis que estava usando, os ouvidos atentos. Segurei a respiração e ouvi seus passos encurtando a nossa distância. Calculei – rezando para que estivesse certa – que ele estivesse a uma árvore de distância, à esquerda.

Atirei naquela direção e, aproveitando o curto espaço de tempo que me restava, corri, refazendo o meu caminho e tomando todo o cuidado para que meus passos fossem os mais silenciosos. Eu sabia que precisava ficar calma ou botaria tudo a perder, portanto tratei de acalmar minha mente.

Com um último passo silencioso parei na árvore em que meu perseguidor se escondia, e me abriguei no lado oposto ao que ele se encontrava.

Sorri. Tinha cerca de seis segundos até ele olhar novamente e, imaginando que ele olharia pelo lado esquerdo, levantei a arma e andei devagar pelo lado direito, até sentir minha arma tocar nas costas dele.

— Peguei você – murmurei.

Observei seu corpo ficar tenso, completamente congelado na minha mira.

E então ouvi uma ruidosa gargalhada.

— Caramba, Bella! Essa foi boa.

Eu dei um sorriso orgulhoso e guardei a arma de balas de borracha no coldre.

— Bom, você pelo menos chegou perto.

Meu pai sorriu orgulhoso antes de colocar o braço por cima dos meus ombros.

— É, está cada vez mais difícil vencer você. Agora vamos, o jantar já deve estar quase pronto.

 

— Espero que não estejam sujos – ouvimos minha mãe gritar da cozinha. – Se vocês sujarem minha casa de lama, vão passar a noite limpando.

Papai riu e tirou os sapatos.

— Sua mãe brava é mais assustadora que você com uma arma.

Eu não pude deixar de concordar. Minha mãe, Renée, era uma mulher baixinha com doces olhos caramelos amendoados. Ela vivia andando pela cozinha com um avental amarelo na cintura e um prato de cookies de chocolate com manteiga de amendoim quentinhos – minha sobremesa favorita. Eu jamais a vi levantar a voz para alguém ou se rebaixar a uma briga, mas sabia que ela conseguia ser assustadora quando queria.

Com este pensamento eu também tirei os sapatos e tratei de correr até o meu quarto, onde entrei de baixo do chuveiro quente. Minhas mãos estavam arranhadas por subir e descer de árvores e meus pés estavam com espinhos, mas não ligava – estava acostumada, afinal.

Meu pai era um homem muito superprotetor. Desde os cinco anos, antes mesmo de eu entrar na escola, ele já me ensinava os princípios básicos das técnicas de sobrevivência e proteção pessoal. Nos meus atuais 18 anos eu podia, no mínimo, nomear e reconhecer todas as plantas do planeta, bem como todos os tipos de armas e seus respectivos funcionamentos. Aos sete anos a mata era para mim tão aconchegante quanto minha própria casa, e aos oito eu já estava caçando com meu pai. Aos dez, minhas mãos eram tão letais quanto as armas que eu estava aprendendo a manusear, e aos onze eu já usava uma faca como ninguém.

Na verdade, olhando para trás agora, eu não podia lembrar um só dia de minha vida que não estivesse passando por um treinamento. Aos dois anos eu conseguia ler e escrever perfeitamente, e aos 4 anos já falava seis idiomas, incluindo alemão e hindi. Aprendi a mexer com as operações matemáticas básicas aos três anos, e a partir daí meu pai já passou a me ensinar geografia e biologia.

E eu jamais entendi o porquê.

Eu não me considerava uma criança prodígio, de jeito nenhum. Qualquer pessoa teria o meu QI se tivesse um pai como o meu. Eu não fazia a menor ideia do que era brincar com bonecas, e em todas as minhas fotos eu estava com um livro ou com um caderno em mãos. Havia esquecido a infância a fim de adquirir conhecimentos para a minha segurança – ou assim papai dizia.

Eu já tentei perguntar a ele diversas vezes o motivo para tanto treinamento, mas ele apenas me dizia que o mundo era perigoso demais para se estar despreparado. Até já me perguntei se ele havia perdido algum amigo ou parente ou algo parecido, mas não via como. Meu pai era um homem de poucos amigos, e não possuía irmãos. Exceto, talvez, por Michael, que era praticamente meu segundo pai. Mas mesmo ele estava seguro em sua casa, na capital de Washington. Então, após algum tempo, eu simplesmente me contentei com o jeito do meu pai e continuei com os treinos que, apesar de tudo, eu adorava.

Depois de lavar os cabelos pelo menos duas vezes e de esfregar meu corpo até sentir a pele formigar, me enrolei em uma toalha e me olhei no espelho. Meus olhos dourados reluziam, transparecendo a felicidade que estava sentindo.

Nem um hematoma dessa vez, nem um tiro com balas de borracha. Antigamente eu saía dos treinos na floresta atrás da minha casa toda colorida por eles, e hoje não havia nenhum.

Meu pai era bastante relutante em utilizar as armas de borracha, apesar de elas não causarem nenhum ferimento grave, mas ele acreditava que era importante eu estar preparada ao máximo – até no quesito dor.

Besuntei o corpo com hidratante, vesti um pijama quentinho condizente ao frio que fazia lá fora, escondi bem meu amuleto debaixo das vestes e depois de calçar pantufas, me dirigi até a sala de jantar.

Minha mãe caminhava para lá e para cá, distraída, espalhando travessas cheias de comida pela mesa, seu avental amarelo impecavelmente limpo balançando conforme seus movimentos. Seus cabelos estavam presos em uma trança embutida presa com uma fita amarela e ela cheirava a cookies recém assados.

O cheirinho de frango assado encontrou meu olfato e eu caminhei mais rapidamente até a mesa. Minha mãe olhou para mim e sorriu, receptiva.

— Angela ligou.

Aquilo me fez sorrir. Angela e eu éramos amigas desde o primário.

— Jura? – perguntei. – Ela deixou recado?

— Não, querida. Apenas queria pedir ao seu pai para te buscar amanhã, alguma coisa sobre irem ao cinema.

Meu ânimo murchou. Meu pai jamais me deixaria ir a algum lugar sem ele ou sem uma dupla de guarda-costas – ou ambos.

— E ele não deixou, não é? - perguntei com desânimo enquanto me sentava.

— Na verdade, querida, eu ainda não contei a ele. Ele está em uma ligação no escritório.

Minha mãe botou meu prato na minha frente, e eu passei a comer, agora sem fome.

Não era do meu feitio reclamar dos treinamentos de meu pai. Nunca senti que perdia algo por causa deles, muito pelo o contrário: eu gostava. Claro, nunca tive coragem de contar para ninguém, nem mesmo para Angie - achariam que meu pai era louco. Mas eu gostava das aulas, gostava de orgulhar o meu pai, e gostava de me sentir forte e autossuficiente.

Mas as vezes era tão cansativo não ter uma vida normal. Minha rotina se resumia a treinos, academia e estudos, raramente podendo ver meus amigos fora de casa. As únicas oportunidades eram sempre acompanhadas de uma dupla de guarda-costas que sempre me seguiam à distância e discretamente: o que não diminuía meu desconforto.

A essa altura, era de se esperar que ele já fosse capaz de confiar na minha capacidade de me proteger.

Espetei um pedaço de batata frita com cebolas e pimentão com o garfo e mordi os cantinhos distraidamente.

— Isabella, não fique irritada com seu pai. Ele só quer o seu bem – minha mãe começou. – Ele é como qualquer outro pai.

Rolei os olhos.

— Sou a única da minha idade que leva tiros com balas de borracha para me acostumar com a dor - bufei.

— Tudo o que faço é por uma razão – meu pai disse atrás de mim.

Meus lábios se contorceram em um bico e eu corei, mas continuei comendo.

Enquanto minha mãe cheirava a cookies, meu pai, um típico italiano, cheirava a café. Ele tinha cabelos grisalhos e olhos castanhos, além do porte atlético atípico aos homens de sua idade. Vestido ainda com as roupas sujas do treino, ele segurava um copo de whisky vazio, os cubos de gelo ainda inteiros, e sua aparência era desajeitada - algo incomum ao meu pai.

Quando o olhei mais atentamente, fiquei surpresa ao notar que seus olhos, normalmente brilhantes, estavam cansados e com covas profundas sob os olhos. Parecia alguém que havia virado a noite acordado, e fiquei me perguntando o que poderia ter acontecido entre o treinamento e o jantar. O ar assustador que qualquer homem tão alto e forte quanto meu pai tinha sumiu, deixando em sua aparência a idade de alguém vinte anos mais velho. A transformação súbita foi aterrorizante.

— Pai? – perguntei. – O que houve?

Minha mãe levantou, murmurando algo sobre buscar uma bebida, e meu pai levantou os olhos, observando-me. Será que o magoei?, pensei. Mas logo percebi que não. Meu corpo estremeceu ao ler as emoções que transbordavam dos orbes castanhos de meu pai: preocupação, amor, conflito, angústia, e... seria medo?

— Pai? – tornei a chamar.

Minha mãe voltou rapidamente com o copo de whisky, mais um sinal de que algo estava errado. Papai não era de beber. Aparentemente ela estava mais preocupada do que deixava transparecer, pois ela virou sua cadeira diretamente para meu pai e segurou sua mão vazia.

— Charlie? O que está acontecendo?

Ele suspirou.

— Eu nem sei como falar isso para vocês.

— É algo sobre a ligação? – minha mãe insistiu. – Está todo mundo bem?

— Não, Renée. Não está. Jessica...

Eu congelei. Jessica era filha do tio Mike, minha prima de consideração. Por mais que morássemos em cidades distantes, éramos mais grudadas que irmãs. Era a única que sabia da minha vida, e a única que entendia, porque era a única que passava pelo mesmo. Se algo houvesse acontecido...

— O que aconteceu? Ela se acidentou? Pai!

— Ela saiu com o Matt, e... ah, Bella, ela foi estuprada. Assassinaram o Mike, Renée.

A cozinha foi tomada pelo silêncio. O garfo que eu nem lembrava de estar segurando caiu com um baque surdo sobre meu prato e eu olhei para meu pai, confusa.

— Estuprada? Mas como?

Tio Mike era tão maluco com essas questões de segurança quanto meu pai, de modo que era raro ele sair de casa sem a proteção de um segurança. Como...?

E então eu lembrei da segunda parte.

— Meu tio morreu?

Os dois me olharam, surpresos, como se apenas naquele instante houvessem se lembrado de mim. Vi os olhos de minha mãe se arregalarem e, como se ela tivesse saído de um transe, ela correu até meu lado, derrubando sua cadeira com o movimento súbito. Antes mesmo de me puxar para o seu colo ela já estava chorando.

E eu já não entendia mais nada.

Minha mãe me apertava em seu colo como se eu tivesse dois anos outra vez; meu pai me olhava com cara de enterro; e meu tio, um cara normal, um simples advogado, havia sido assassinado. O que estava acontecendo?

Mamãe passou a murmurar coisas ininteligíveis, e meu pai se levantou para nos abraçar. Fiquei assustada com a ideia de ver meu pai chorando também, mas ele nunca chorava, e felizmente não chorou dessa vez. Eu não fazia ideia do que fazer caso ele perdesse o controle também.

— Charlie – minha mãe chorava. – Charlie! Minha filha...

Naquele ponto eu já estava começando a me perguntar se ela estava histérica ou com uma crise de pânico, e o fato de meu pai não fazer nada apenas me deixava mais assustada. Tentei sair do seu colo, a fim de acalma-la, mas ela me segurava com força.

Eu estava tão confusa. Meu pai não fazia nada, nem explicava nada. Minha mente sempre foi excelente em ligar os pontos e entender as coisas, mas naquele momento tudo estava embaralhado. Algo me dizia que minha mãe estava com medo por mim, mas não fazia sentido. Minha prima que havia sido estuprada. Meu tio que havia sido assassinado.

Aliás, como assim? Meu tio era apenas um advogado especializado em causas trabalhistas. Será que ele havia se envolvido com alguma pessoa perigosa? Talvez contraído alguma dívida? Não, meu pai o ajudaria nisso. Então...

Finalmente, depois do que me pareceram horas, minha mãe se acalmou o suficiente para que meu pai pudesse pegá-la no colo e leva-la até o quarto deles. Eu fiquei sentada na cadeira, confusa, ainda tentando ligar os pontos.

Meu cérebro sempre hiperativo, no entanto, ativou o modo alerta. Senti um arrepio cruzar minha espinha e passei a andar pela casa, trancando tudo. Lá fora, o muro de três metros cheio de sentinelas me olhava com um ar confortador, e os enormes portões guardados por quatro seguranças pareciam iluminados aos meus olhos.

Mesmo assim, ativei as trancas reforçadas das portas e janelas e, depois de ativar o sistema de alarme, passei para o andar de cima. Só depois de olhar pela quarta vez se as grades do banheiro do meu quarto continuavam soldadas que parei e, finalmente, me perguntei o que estava acontecendo comigo.

— Bella? – ouvi meu pai chamar da porta do meu quarto. – Podemos conversar?

Olhei para as grades novamente antes de trancar bem a janela. Saí do banheiro e, por segurança, tranquei a porta também.

— Claro – respondi. Meu tom transbordava a tranquilidade que eu não tinha.

— Filha – ele começou com um suspiro –, eu sei que tudo está muito confuso, e a partir de agora vai ser ainda pior, mas eu preciso que confie em mim.

Franzi as sobrancelhas.

— Claro, pai. Vai me contar o que está havendo?

Ele mordeu o lábio inferior – um gesto bem incomum, pois ele raramente parecia inseguro.

— Vou. Mas amanhã. Por ora, quero te perguntar uma coisa. – Eu assenti. – Lembra daquele pendrive de que te falei há dois anos?

— É claro que sim, pai.

Um dia depois de eu completar dezesseis anos meu pai havia me chamado até seu escritório. Eu raramente tinha permissão para entrar lá, e toda vez a opulência do local me surpreendia.

Naquele dia meu pai estava sentado atrás de sua mesa, sua perna direita envolta em ataduras e curativos. Mesmo se eu não tivesse a memória perfeita, ainda assim seria incapaz de esquecer daquela ocasião.

Quando lhe perguntei o que havia acontecido, ele apenas respondeu que havia pedido para Serafim, o médico da nossa família, implantar um minúsculo pendrive sob a pele da sua coxa direita.

Foi aí que eu finalmente concluí que ele não batia bem da cabeça. Todos nós possuíamos rastreadores implantados perto do polegar, mas um pendrive? Quando ele explicou que aquilo era para minha segurança, e que a peça seria minha quando eu precisasse, só confirmou minhas suspeitas, e passei a imaginar como teria acesso àquele objeto. A ideia me assustava até hoje.

Agora, parado em minha porta, meu pai me olhava com profundo medo.

— O que aconteceu com o seu tio não foi por acaso - explicou.

— Ele estava devendo dinheiro para alguém?

— Não, Bella. Olha, não consigo te explicar isso hoje. Sua mãe não está bem. Mas, por favor, faça suas malas. Vamos sair daqui amanhã cedo.

— O quê?

— Faça o que estou mandando, Isabella. E apenas coisas importantes. Vou cuidar de sua mãe.

— Mas, pai!

Mas ele já havia ido.

— Argh! - grunhi.

Eu fiquei olhando para a porta, incrédula. Minha vida nunca foi normal, mas se possível estava ainda pior. Fiquei me perguntando se deveria mandar alguma mensagem para a Angela, a fim de avisar sobre meu desaparecimento, mas meu pai jamais aprovaria.

Enquanto pensava fui até o guarda-roupa e peguei a mochila que meu pai havia me dado no mesmo dia do pendrive. Os maços de dinheiro e as armas dentro dela me olharam, me avisando que eu estava perdendo algo importante, mas ignorei. Coloquei o notebook e o carregador sobre as notas e preenchi os espaços vazios com munição. Essa era a definição de “importante” para meu pai, e não o decepcionaria. No bolso sobressalente, sobre uma pequena carteira de documentos, coloquei algumas peças de roupa com tecidos resistentes e meus itens de higiene.

Depois disso procurei entre as pilhas de roupa do closet uma calça de moletom, botas de couro impermeáveis e uma blusa simples, além de um casaco leve e discreto e deixei tudo separado para vestir assim que acordasse.

Peguei uma faca de caça debaixo do colchão, meu celular e o carregador, e guardei tudo sobre a pilha de coisas na mochila já cheia. Por fim, respirei fundo.

Meu pai estava fugindo de alguma coisa, era óbvio. A reação de minha mãe, o terror que ela parecia estar sentindo, junto com a viagem do dia seguinte comprovavam isso. Mas do quê?

Fui até o criado-mudo e abri a primeira gaveta. Se eu estivesse certa, seria melhor estar bem preparada, portanto peguei a arma e a escondi embaixo do travesseiro.

Estava ansiosa demais para dormir, mas de qualquer forma me escovei e deitei, me cobrindo com a colcha de retalhos que minha avó há anos havia costurado para mim.

Fiquei fitando o teto por alguns minutos, pensando em diversas coisas ao mesmo tempo, os ouvidos atentos a qualquer ruído estranho, e antes que percebesse, o sono tomou conta do meu corpo.

Em meus sonhos, sonhei que corria por uma selva tropical e abafada, completamente diferente do clima ameno do Oregon.

Ao meu redor, macacos pulavam agitados dos seus galhos devido ao movimento, e eu podia ouvir animais menores fugirem para as suas tocas.

— Vamos, Bella – alguém gritou próximo a mim. – Mais rápido!

Olhei as costas largas do homem a minha frente e coloquei mais força nas minhas pernas até alcança-lo. 

Ele olhou pra mim e meu coração errou uma batida quando ele sorriu, determinado, seus olhos de um verde tão profundo quanto esmeraldas brilhando com tenacidade.


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Notas finais do capítulo

E ai, gostaram de conhecer um pouco da Bella e da familia dela? O que vocês acham que vem por aí?



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