No Limiar dos Mundos escrita por Claen


Capítulo 7
Desencontro perigoso




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Ao contrário da casa da aniversariante, a do professor estava silenciosa e perfeita para dar continuidade ao trabalho, por isso, assim que chegou, o rapaz pegou a pilha de provas, um pacote de bolachas de água e sal (o que lhe deu uma certa depressão ao lembrar do churrasco) e um copo de suco e carregou tudo para a sala.

Sentou-se confortavelmente no sofá e repousou os pés na mesinha de centro. Somente depois de já estar devidamente instalado, é que ele respirou fundo, pegou sua inseparável caneta vermelha e, com as avaliações em seu colo, começou a correção. Os primeiros resultados não foram lá muito animadores, mas aos poucos foram melhorando.

— Mas como é que ele pode achar que Hitler era russo? – perguntou para si mesmo, inconformado e decepcionado ao pensar que talvez não estivesse sendo um bom professor, mas continuou esperançoso a correção. Entre ocasionais mordidas em bolachas e goladas de suco, ele observou que até que não estava tão ruim assim, já que em meio a grande maioria de notas B’s e uma quantidade considerável de C’s, às vezes surgia um A, o que o deixava um pouco mais feliz e comprovava que seu esforço não estava sendo totalmente em vão.

O tempo foi passando e por mais que Miguel quisesse continuar trabalhando, seu corpo não estava muito disposto a colaborar e o sono foi invadindo-o pouco a pouco, até tomar conta por completo. O professor acabou adormecendo no sofá, com as provas no colo e a caneta vermelha na mão.

O problema é que aquele não foi apenas um breve cochilo e Miguel caiu em um sono profundo, tão profundo que não permitiu que ele ouvisse as três ligações feitas pela irmã, entre às 23h e 23h15.

A festa estava muito boa, mas Heloísa precisava ir embora. Quando percebeu que já estava ficando tarde, resolveu ligar para o irmão. Ele não atendeu à primeira ligação e ela pensou que ele pudesse estar ocupado, talvez no banheiro, então esperou mais alguns minutos e ligou outra vez, mas ele também não atendeu. Esperou mais um pouco e ligou novamente. Também sem resposta. A moça começou a ficar preocupada, mas imaginou então, que ele pudesse apenas ter pegado no sono e decidiu que não o incomodaria mais e, apesar do trato que haviam feito, resolveu ir embora com Vanessa por conta própria.

Elas se despediram da anfitriã e saíram. O plano era chamar um carro de aplicativo, mas havia um ponto de ônibus praticamente em frente à casa, e como um deles estava chegando bem na hora que elas estavam saindo, elas decidiram correr para pegá-lo.

O coletivo estava quase vazio, assim como as ruas que já não tinham mais trânsito àquela hora da noite. O trajeto foi relativamente rápido e as duas desceram no ponto próximo à casa de Vanessa e foram caminhando e conversando até lá.

— Boa noite, Van. Até daqui a pouco. – despediu-se Heloísa achando graça, afinal, as duas se reencontrariam em apenas algumas horas na livraria.

— Boa noite, Helô. Vai com cuidado! – despediu-se também Vanessa, pouco antes de entrar em casa.

A noite estava bem mais agradável do que a manhã havia sido, então Heloísa não se incomodou de seguir andando para casa, que ficava a apenas cerca de 15 minutos de distância.

Não encontrou muitas pessoas pelo caminho e suas únicas companhias durante boa parte do trajeto foram apenas os sons de seus próprios passos. No entanto, a situação se transformou após ela passar em frente a uma praça, já na rua de casa.

Além dos sons emitidos pelo encontro de seus saltos com o chão, Heloísa também começou a escutar outros passos. Inicialmente, a moça achou que fosse apenas mais um pedestre a caminho de casa, mas os passos, que vinham de trás, pareciam estranhamente estar na mesma cadência que os dela. Nem mais lentos, nem mais apressados, exatamente iguais.

Ela não quis se virar para olhar e, apenas como um teste, decidiu se apressar um pouco mais. Os passos atrás dela também aceleraram e, ao perceber que aquilo não era apenas a sua imaginação fantasiando demais, começou a se preocupar.

Apesar do medo que crescia a cada segundo, ela decidiu finalmente se virar e encarar quem quer que a estivesse seguindo e o que ela viu, foi uma figura toda vestida de preto com um capuz na cabeça. Apesar de seu rosto estar escondido pelas sombras, aquela era nitidamente a silhueta de um homem grande.

O homem também parou de andar e passou a encará-la a uma distância nada confortável. Ela quis dizer alguma coisa, mas não conseguiu, e sua reação seguinte foi a de se virar novamente e seguir em frente.

Sem parar de andar, mas agora já quase correndo, ela abriu a bolsa e começou a tatear à procura do taser que costumava levar consigo para todos os lugares, mas estava escuro e ela nervosa demais. Suas mãos tremiam e ela não conseguiu encontrá-lo, enquanto o homem se aproximava ameaçadoramente. Apavorada, e já sem nenhuma dúvida de que ele a seguia, ela viu que era hora de correr de verdade.

Sua casa já não estava tão distante, mas assim que começou a correr, o homem de preto fez o mesmo, e em questão de segundos a alcançou e a agarrou pelo rabo de cavalo, fazendo com que ela caísse e derrubasse a bolsa, esparramando seus pertences pelo chão. Com os objetos espalhados, ela finalmente viu o taser, mas ele estava fora de seu alcance. O homem passou um dos braços em volta de sua cintura e conseguiu erguê-la sem muito esforço. Com a outra mão, tapou sua boca para que não gritasse.

Heloísa se debatia desesperadamente e tentava se livrar de seu agressor a todo custo, mas ele era forte demais para ela. Somente após muita resistência, foi que a moça conseguiu acertar uma cotovelada em seu estômago, deixando-o momentaneamente sem ar e fazendo com que ele a soltasse. Mas para seu azar, ela caiu de mal jeito e acabou torcendo o tornozelo. Tentou se levantar e correr, mas ele a agarrou novamente. Dessa vez ela gritou por socorro, mas ninguém a ouviu. Ou se ouviu, não teve coragem de ir ajudá-la.

                                                              ***

Nesse mesmo instante Miguel acordou sobressaltado. Tinha tido a impressão de ter ouvido a voz da irmã pedindo por ajuda, o que era impossível, já que ela estava há quase 400 metros de distância de casa, mas mesmo assim, Miguel ficou preocupado.

Sua preocupação aumentou ainda mais quando olhou para o relógio e viu que já era quase meia-noite. Pegou o celular e viu as três ligações perdidas e em seguida uma mensagem pedindo para que ele não se preocupasse, porque elas estavam saindo da festa e voltariam de ônibus.

— Ah, seu idiota! – xingou, irritado.

Miguel ficou furioso consigo mesmo por ter dormido e tinha certeza de que, por sua culpa, algo havia finalmente acontecido. De alguma forma ele sabia, seu coração estava disparado. Imediatamente ligou para a irmã, que não atendeu, porque estava realmente muito ocupada com coisas mais importantes, como tentar desesperadamente salvar a própria vida.


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