A campainha tocou quando Heloísa estava no chuveiro. Era Vanessa. Miguel foi atender à porta.

— Oi, Miguel! – cumprimentou a moça com um belo sorriso e um beijo em sua bochecha, que o deixou meio encabulado, como de costume. Ele se esforçava, mas não conseguia se sentir à vontade, quando estava sozinho com a amiga da irmã. Ela era uma moça muito atraente e espontânea e ele não conseguia saber se ela sentia mesmo alguma coisa por ele ou se apenas gostava de brincar e flertar para vê-lo desconcertado com seus comentários maliciosos.

Ao contrário do que Miguel pensava, as intenções da moça eram completamente explícitas, mas o professor era o único que não conseguia enxergar isso. Vanessa ficava se perguntando como alguém tão inteligente poderia ser tão lerdo para interpretar os sinais enviados por uma mulher? Mas a vendedora não ligava para isso, porque aquele era justamente o charme de Miguel, o que o tornava tão encantador aos seus olhos.

— A Helô já está pronta? – perguntou a moça, assim que entrou na casa.

— Com certeza, não. Ela acabou de desligar o chuveiro. Sobe lá no quarto dela, que eu também vou vestir uma roupa.

— Para mim, está perfeito assim. Podia até tirar uma pecinha. – disse ela com uma piscadela e subindo as escadas em seguida, deixando o rapaz na sala com as bochechas ardendo e levemente coradas.

Após mais aquele comentário provocador, Miguel também correu para o andar de cima e foi para o quarto tratar de ficar mais apresentável.

Em menos de dez minutos ele já estava pronto, mas as moças, já era outra história. Heloísa não era vaidosa, por isso não costumava passar muito tempo diante do espelho; fazia isso apenas em ocasiões especiais como aquela. A única opção de Miguel naquele momento foi esperar pacientemente, por cerca de meia hora, até as duas finalmente surgirem no alto da escada.

Apesar da demora, ele teve que admitir que a espera tinha valido a pena.

Heloísa era uma mulher naturalmente bonita e chamava a atenção por onde passava sem fazer esforço algum, mas naquela noite ela estava ainda mais bela. Seus longos cabelos castanhos e levemente ondulados, que iam quase até sua cintura, estavam presos em um rabo de cavalo. Ela usava uma maquiagem que destacava seus belos olhos cor de âmbar, praticamente idênticos aos do irmão. Seus 68 quilos eram perfeitamente distribuídos por seus 1,70 e ela se vestia com simplicidade, com sua habitual calça jeans e uma blusinha lilás com detalhes brilhantes nas mangas. Apesar de não ser adepta dos saltos, naquela noite ela decidiu usá-los.

Miguel ficava muito feliz em ver a irmã ainda mais linda do que já era, embora fosse difícil não se incomodar com o bando de homens idiotas que ela acabava atraindo involuntariamente. Mas por sorte, a moça era muito mais safa nesses assuntos do que ele, e despachava rapidinho quem não fosse de seu agrado. Nessa questão não havia com o que se preocupar, porque ele sabia que quem quer que fosse o sortudo eleito para se tornar seu cunhado, ele seria alguém digno de Heloísa.

Vanessa não ficava atrás na beleza. Ela era um pouco mais baixa que Heloísa, pelo menos uns 10 centímetros, tinha os cabelos bem escuros e lisos, quase tão compridos quanto os da amiga, mas ela fazia questão de usá-los soltos, raramente amarrava. Também se vestia de modo casual. A diferença era que Vanessa adorava saltos altos e andava com eles para cima e para baixo o tempo todo.

Quando Miguel viu as duas no alto da escada, quase perdeu a fala, porque era muita beleza para pouco espaço.

— Olha, vocês demoraram, mas estão mesmo deslumbrantes! – elogiou ele, se esquecendo das preocupações por um momento e arrancando largos sorrisos das duas. Apesar de ser um pouco tímido com as mulheres, Miguel sabia ser galanteador e era um verdadeiro cavalheiro, daqueles que estão quase em extinção hoje em dia. Ele mesmo sentia que havia nascido na época errada, pelo menos uns 100 anos atrasado.

— Você também está um gato, meu irmão. Pena que não vai ficar com a gente na festa. – retribuiu o elogio, Heloísa.

— Infelizmente, eu tenho muitas coisas pra fazer. Agora vamos, porque quanto mais cedo vocês forem, mais cedo vocês voltam. – disse o professor, já mudando de assunto.

— Fica tranquilo, porque eu não vou deixar ela sozinha nenhum minuto. Pode confiar. – disse Vanessa enquanto descia as escadas. – Mas o Miguel tem razão. Vamos logo, Helô.

Em pouco tempo os três já estavam no carro seguindo rumo à festa, que seria realizada na própria casa da aniversariante. O lugar não ficava muito longe e eles só precisaram de 20 minutos para chegar.

Antes que Heloísa desembarcasse, Miguel aproveitou para lembrá-la de que assim que quisesse ir embora, era só telefonar, que ele viria na mesma hora.

— Pode deixar, Miguel. Agora vai pra casa e descansa.

— Quem dera eu pudesse descansar! Ainda tenho uma pilha de provas para terminar de corrigir até amanhã.

— Então boa “diversão” com suas provas. Tchau! – despediu-se ela, com um beijo em sua bochecha.

Miguel esperou as duas entrarem na casa, que já parecia estar lotada com muita gente conversando e ouvindo música, um pouco alta demais para seus ouvidos. Além do aguardado bolo de aniversário, também estava rolando um churrasco. O cheiro estava muito bom e a tentação de ficar foi grande, mas ele resistiu bravamente e foi embora, porque as provas o aguardavam.