No Limiar dos Mundos escrita por Claen


Capítulo 4
Será coisa da minha cabeça?




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Miguel estava com a primeira aula livre e ele poderia até ter chegado um pouco mais tarde, mas preferiu ir no horário de sempre e aproveitar o tempo extra para organizar as provas que aplicaria naquele dia. O semestre estava acabando e os alunos não viam a hora da chegada do aguardado recesso escolar, mas primeiro, eles teriam que enfrentar a temida prova de História.

Miguel era um professor muito querido pelos alunos, embora eles não dispensassem o mesmo carinho pela disciplina lecionada por ele. Ultimamente o jovem professor andava se sentindo esgotado e desejava a chegada do recesso tanto, ou mais, que os alunos, pois não era uma tarefa nada fácil atrair sua atenção e fazer com que eles se interessassem pelo assunto. Era difícil, mas ele amava a profissão e ver os alunos tirarem notas boas era a sua maior recompensa.

Heloísa também possuía um diploma que lhe permitia ensinar, mas ela decidiu seguir por um caminho diferente do irmão. Ela era formada em Letras, mas durante o estágio, concluiu que não possuía a paciência nem a dedicação necessárias para dar aulas e conseguiu um emprego como vendedora, dessa forma, mesmo não lecionando literatura, ela ainda estava “literalmente” cercada de seus tão amados livros. Os dois amavam histórias, mas formas diferentes de histórias.

Quando o sinal tocou, Miguel se dirigiu para a sala do primeiro ano do ensino médio e mal entrou e já foi recepcionado por alunos que perguntavam a respeito de quando seria a recuperação.

— Não vamos ter recuperação, porque eu tenho certeza de que todo mundo vai mandar muito bem e na semana que vem todos nós estaremos descansando em casa. – respondeu ele com uma piscadela e um sorriso maroto, que fez com que a maioria das alunas se derretessem pelo professor bonitão.

Miguel era um dos professores mais jovens da escola, tinha apenas 26 anos e não havia como negar que era bonito, por isso chamava a atenção das adolescentes. Ele era alto, tinha quase 1,90 e fazia uma bela figura. Não era adepto de academias, mas se cuidava e gostava de correr. Tinha os cabelos castanhos e lisos, não muito curtos, mas quando estava trabalhando sempre os penteava para o lado e usava gel para fixar. Os olhos, que na maioria do tempo de aula, ficavam atrás das lentes dos óculos de leitura de armação discreta, tinham um belo tom de âmbar. Ele costumava se vestir de maneira bastante simples, sempre de calças jeans e camisetas. Como naquele dia estava um pouco frio, também vestia uma jaqueta de couro marrom, já bem surrada.

— Agora guardem todo o material. Só quero ver lápis, borracha e caneta em cima da carteira. Hoje só podem consultar ao cérebro. Espero que vocês tenham trazido os de vocês. – disse ele com um sorriso gaiato. – Boa sorte!

Ao terem seu último fio de esperança cortado, os alunos aos poucos foram se ajeitando e se silenciando para começar a prova.

Ao vê-los compenetrados na tarefa, Miguel voltou para sua mesa e poucos minutos depois, mesmo sem querer, se desconectou completamente do que acontecia ao seu redor. A inquietação continuava e ele não conseguia deixar de imaginar o que estava para acontecer naquele dia. Para sua sorte, os alunos não perceberam a completa abstração do professor, ou então não teriam desperdiçado aquele momento perfeito para colar.

Quarenta minutos da aula já haviam se passado quando Miguel foi chamado de volta à realidade por um dos alunos que trazia a prova finalizada.

— Professor. – chamou ele. Sem obter resposta, insistiu. – Professor Miguel?

— Ahn? – respondeu finalmente, quase que como se despertasse de um sonho. – O que foi, Thiago?

— Eu terminei a prova. Tá aqui. – disse o adolescente entregando a folha. Era o primeiro a terminar.

— Ah, obrigado. – agradeceu o professor, pegando a prova.

— O senhor vai corrigir agora?

— Não. Vou levar e trago corrigida na próxima aula.

— Tudo bem. – respondeu o rapazinho, um pouco desapontado.

Ainda faltavam dez minutos para o término da aula e dentro desse tempo, os demais também foram entregando seus testes. Quando o sinal tocou, Miguel seguiu para a próxima sala, onde também aplicou uma prova, mas desta vez se manteve bem mais atento aos alunos, que também finalizaram o teste sem problemas. O intervalo finalmente chegou e ele não quis ficar na sala dos professores, preferiu fazer seu lanche ao ar livre.

O dia ainda estava nublado, mas não chovia mais. O chão começava a secar e ele foi para o pátio externo da escola, que naquele dia não estava atraindo a atenção dos alunos, que preferiram permanecer no pátio interno.

Completamente sozinho, Miguel foi até o banco de concreto que ficava em frente do portão principal da escola, há cerca de vinte metros de distância dele. O banco ainda estava um pouco úmido, então o professor resolveu usar a sacola plástica, que envolvia o sanduíche que ele havia trazido para lanchar, como uma proteção contra a água. Ele retirou o lanche de dentro dela e a esticou sobre o banco, sentando-se sobre ela em seguida, sem perigo de sair com a calça toda molhada.

O portão da escola era feito de grades, assim como todo o entorno do lugar, por isso era possível ver toda a movimentação na rua. Geralmente, Miguel gostava de passar seus intervalos observando o ir e vir apressado de todos, porém, desde o momento em que havia acordado, ele sabia que aquele não seria um dia como outro qualquer e, assim que se sentou e deu a primeira mordida em seu sanduíche, olhou para a rua e notou algo diferente, ou melhor, alguém diferente.

Bem em frente à escola, na calçada do outro lado da rua, Miguel viu um homem parado. Ele estava encostado na parede, usando um dos pés como escora. As mãos se escondiam dentro dos bolsos do blusão de moletom preto com capuz. Ele mantinha a cabeça meio abaixada, fazendo com que o capuz encobrisse boa parte de seu rosto. Miguel só conseguiu ver a ponta de seu nariz, sua boca e seu queixo, mas mesmo sem poder ver seus olhos, o rapaz tinha certeza de que o homem olhava para ele.

Passaram-se quase cinco minutos e o homem não se moveu. Talvez fosse apenas a imaginação de Miguel, mas aquilo era muito estranho. Ele deu mais algumas mordidas no lanche, só que estava incomodado demais para conseguir continuar, então se levantou e seguiu em direção ao portão, mas no mesmo instante em que ele se levantou, o homem finalmente se mexeu e começou a andar. Miguel correu para não o perder de vista, mas quando chegou ao portão, ele já estava virando à esquina.

Talvez não fosse nada e o homem sequer o estivesse observando. Talvez apenas estivesse esperando por alguém. Não havia como ter certeza, mas Miguel tinha acabado de encontrar mais um motivo para aumentar a sua inquietação. Poucos minutos depois, o sinal tocou e ele precisou voltar para dentro. Ele ainda tinha mais cinco aulas para dar naquele dia que parecia que iria ser bastante longo.


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