No Limiar dos Mundos escrita por Claen


Capítulo 13
O início




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— Pode contar tudinho, porque nós ainda temos a madrugada inteira pela frente. – pediu Heloísa, já não se aguentando mais de curiosidade. – E se vararmos a madrugada, também não tem problema, porque para todos os efeitos, eu estou de licença por sete dias, já o Miguel...

— Por mim, também não tem problema. As aulas acabam na semana que vem mesmo... – disse o professor, já tão interessado no assunto, que tinha até colocado o seu ganha pão em segundo plano. – Se eu não for, os alunos vão é ficar felizes.

— Se está tudo bem para vocês, então eu vou continuar. Já faz tanto tempo que eu não converso assim com alguém, que acho que até perdi um pouco do jeito. – disse Gaida, mais animado e até se mostrando ser uma pessoa bastante simpática e agradável. Devido a todos aqueles anos de reclusão, ele realmente não tinha com quem conversar e quando precisava fazer isso, na maioria das vezes era por mensagens ou pelo telefone, somente em raras oportunidades ficava cara a cara com alguém. Nesse quesito, a evolução da tecnologia foi bastante útil para ele.

Depois de confirmar que finalmente tinha conseguido ganhar a confiança dos vizinhos, Gaida prosseguiu com mais confiança.

— Vartaris já foi um lugar muito bonito e cheio de vida como o planeta Terra, e nosso povo vivia em paz, sem grandes ambições. Talvez por termos conseguido alcançar uma sociedade bastante igualitária, durante um longo período não tivemos muitos conflitos a serem resolvidos. Nossa cultura era bastante evoluída, mas evoluímos de uma maneira diferente da raça humana.

— Mas por que você disse que “já foi", que “era”? Não é mais? – interrompeu a moça.

— Infelizmente, não. E o mais triste disso tudo, é que nós mesmos fomos os responsáveis por sua derrocada e, hoje, eu nem sei se ainda tenho um mundo para o qual voltar. – disse o rapaz com pesar, deixando seus ouvintes também entristecidos. – Nossa rainha, Árya, que era a principal responsável pela prosperidade de Vartaris, lutava ao nosso lado quando aconteceu a explosão que me trouxe até aqui, por isso também não sei ao certo se ainda possuímos uma líder. Eu realmente não faço ideia do que aconteceu depois disso, porque nunca mais consegui me conectar com o meu mundo.

— E o que essa rainha de vocês tinha de tão especial? E por que vocês estavam lutando, se você acabou de dizer que seu povo era pacífico? – inquiriu Miguel.

— A Rainha Árya era a razão de tudo. Era a luz que nos guiava nos momentos de escuridão. Ela era a nossa soberana e sempre foi minha maior honra poder servi-la. Já a paz, infelizmente não é algo que dure para sempre e a história nos relembra que, de tempos em tempos, algo inesperado surge para perturbá-la...

— Você era tipo um guarda real, que trabalhava diretamente para ela? Então você também era alguém importante por lá! – concluiu Heloísa animadamente.

— Não, eu nunca fui um grande guerreiro. – respondeu ele, achando graça da dedução da moça. – Como eu disse, minhas habilidades não são de combate. Mas sim, eu trabalhava diretamente para ela e podemos dizer que eu tinha alguma influência por lá, mas nada comparado a de nossa rainha.

— Ela parece ser mesmo uma pessoa incrível! Mas fala um pouco mais de você, das pessoas. Quais sãos as tais habilidades especiais do seu povo? Todos conseguem fazer essas coisas, como você?

— Não exatamente. Todos os vartarianos nascem com uma única habilidade especial: a de absorver a energia existente na natureza. Nós não apenas habitamos Vartaris, na verdade, partilhamos de sua vida, e é graças a essa energia vital extra fornecida por ele, que envelhecemos mais lentamente do que vocês. É como se as pessoas e o planeta fossem um único ser vivo.

“Essa capacidade é inerente a todo o povo, mas alguns poucos privilegiados nascem com outras capacidades bem mais incomuns, e eu faço parte deste grupo seleto. No entanto, possuir estas outras habilidades, também nos faz responsáveis não apenas por nós mesmos ou por nossas famílias, mas por todo o povo.”

“Eu nasci com uma habilidade raríssima de conseguir abrir portais para outros lugares. Eu podia atravessá-los ou enviar outros através deles, mas não sabia ao certo para onde esses portais me levavam e também não sabia como controlar isso, então, muitas vezes, eu acabava colocando a mim e àqueles ao meu redor em perigo. Por isso, com apenas 7 anos, eu me separei da minha família e fui realizar um treinamento com a própria Rainha Árya, que era a única pessoa em Vartaris com uma habilidade parecida, mas não completamente igual a minha.”

“Todas as crianças consideradas ‘especiais’ eram levadas ao palácio para receberem o devido treinamento e se fortalecerem, com o intuito de, no futuro, usarem suas habilidades para ajudar as pessoas e proteger nosso mundo, e principalmente nossa rainha. Com o tempo, eu acabei descobrindo que era ainda mais especial do que eu imaginava, porque eu não tinha nascido com apenas duas habilidades especiais, mas com três. Além de ser capaz de abrir portais e de absorver a energia de Vartaris, como todo mundo, eu também conseguia repassar essa energia vital absorvida para outras pessoas, e dessa forma, curar ferimentos, como acabei de mostrar. Podemos dizer que eu sou um tipo de pessoa extremamente rara, mesmo em meu mundo.”

— Meu Deus! Mas isso é incrível! Que dom maravilhoso você tem, Gaida! – exclamou Heloísa.

— Sim, é realmente um dom magnífico e fico muito honrado de poder usá-lo para ajudar a salvar vidas, mas para tudo há um limite, e há coisas que são impossíveis de serem curadas, como a morte. Quando o destino final de uma pessoa já foi traçado, não há como mudá-lo. Ninguém consegue, nem mesmo a Rainha Árya.

— Mas se você é um tipo de pessoa extremamente rara, imagina a Rainha Árya. Deve ser uma criatura fora de série!

— Sim, ela é mesmo. Bem, meu treinamento durou vários anos e quando eu finalmente consegui aprender a controlar minhas habilidades, eu passei a fazer parte do grupo de conselheiros da rainha e fiz grandes amigos por lá, principalmente Bellator, Gennaios e Áxios. Eles eram da guarda real e muito poderosos. Eles sim, possuíam poder de ataque, e me ensinaram tudo o que eu sei sobre combate, embora eu não seja muito bom nisso...

— Não é bom nisso? – perguntou Heloísa, incrédula. – Se aquilo que eu vi ontem não é ser bom, eu não sei o que é!

— Eu agradeço o elogio, mas eu realmente só sei o básico para me defender. É que eu disfarço bem, mas estou todo dolorido. – disse Gaida, com uma gargalhada. – Eu não consigo usar minha habilidade de cura em mim mesmo, mas ainda assim, meu corpo vartariano se recupera bem mais rápido do que o dos humanos.

“Contudo, não ser um grande guerreiro nunca foi um problema, já que durante muitas eras, nós vivemos em paz e habilidades de combates não eram algo tão essencial. Mas isso mudou quando alguém surgiu apenas para trazer a desgraça para Vartaris...

— Espera aí, só uma pergunta, que agora eu fiquei curiosa. Parece que você já viveu muita coisa. Afinal, quantos anos você tem?

Gaida achou graça da intromissão, mas aquela com certeza era uma dúvida legítima.

— Sim, eu já vivi muita coisa... Como vocês já perceberam, eu sou bem mais velho do que aparento. Todos os vartarianos são. Apesar de aparentar ter uns 25 ou 26 dos anos terrestres, quando deixei Vartaris, eu tinha 45 anos. Então juntando o tempo que vivi lá e o que passei aqui, já tenho uns 100 anos. Acho que o apelido de “Velho Gaida” é até bem apropriado... – observou com um sorriso.

Ao ouvirem aquilo, os irmãos não conseguiram esconder o choque. Era nítido, que apesar da aparência jovial, seu modo de falar e de se portar, indicavam que ele era uma pessoa mais experiente do que eles, mais madura, uma pessoa de outra geração, mas não imaginaram que houvesse tanta diferença.

— Como eu disse, a energia que absorvemos do planeta, faz com que envelheçamos mais lentamente, mas essa foi justamente a causa da nossa ruína.

— Mas o que aconteceu com Vartaris, afinal de contas? Você tinha dito que não sabe se ainda tem um mundo para onde voltar. A situação estava tão ruim assim? – indagou o professor.

— Sinceramente, eu não sei dizer. – respondeu Gaida, tristemente. – Desde que...

Gaida começou a falar, mas se interrompeu de repente. Em uma fração de segundos, sua expressão, que um instante atrás demonstrava pesar, agora era repleta de seriedade e preocupação. Foi impossível para os irmãos não perceberem a mudança tão repentina do anfitrião.

— Tudo bem, Gaida? – perguntou Miguel.

— Ele está aqui. – respondeu o homem.

— Ele, quem? – inquiriu Heloísa, sem entender.

— A ruína de Vartaris.

Os irmãos ficaram em silêncio e sentiram um estranho calafrio. Não era “a sensação”, mas definitivamente era algo. Era como se sentissem a presença de alguém estranhamente conhecido. Mesmo sem saber ao certo o que aquilo significava, tinham certeza de que alguém denominado pela alcunha de “ruína de Vartaris”, não poderia ser em hipótese alguma alguém que eles gostariam de encontrar.


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