JARDIM BAGDÁ escrita por MARCELO BRETTON


Capítulo 22
Capítulo 22




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Seu estado de ânimo era de ansiedade pura. Quase não conseguiu inserir as pilhas, tendo que retirá-las algumas vezes com os polos invertidos. Só o fato de estar manipulando o falo de borracha já a deixava numa excitação de fazer dilatar as pupilas. Sentiu as suas partes umedeceram levemente. Já não ensopavam como antigamente. Tomou um susto quando ligou pela primeira vez por causa do movimento vibratório do objeto e quase o deixou cair. Parecia que o uso era simples. Aquilo ia dentro dela, e estando lá, cutucava suas entranhas fazendo aqueles tremeliques, enquanto ela controlava o ritmo da penetração. Janice tinha lhe dito que se não estivesse excitada o suficiente, ao invés de prazer aquilo lhe faria cócegas. No seu caso atual, ela estava no ponto de escalar um poste usando apenas as unhas.

 

A verdade é que manipulou o brinquedo novo se utilizando do instinto. Teve o cuidado de fechar as janelas e foi para o quarto, onde se deitou já despida na cama e com o consolo ligado e implorando para ser feito de escravo. Não viu necessidade de colocar uma pornochanchada no videocassete, nem folhear uma fotonovela erótica para ligar o motor da excitação, que naquela altura já estava dando super aquecimento. Sem perder tempo enfiou os dezoito centímetros de uma vez dentro de si e fechou os olhos, cujas pupilas subiram para o cérebro. Esqueceu as dores lombares da idade quando começou a se contorcer como uma víbora no cio em cima do colchão. A vontade de gemer era tanta que não suportou segurar aquilo tudo dentro da garganta. A boca ficou seca de tanto que arfava e puxava o ar em intervalos irregulares. Nem ligou para a bursite que vinha lhe atacando, e acelerou os movimentos do brinquedo parecendo que a mão se soltaria a qualquer momento do pulso. Era surreal a sensação de bem estar.

 

Com a parte lógica do cérebro desligada, ela alcançou o cume do monte. Com o hipotálamo jorrando citocina e a cachoeira de dopamina que banhava o seu cérebro, sentiu os espasmos em forma de pequenos choques. Aos poucos foi relaxando e adormeceu no colchão empapado de suor e fluidos vaginais, sem saber que uma pequena torcida organizada gritava ‘’Goool!’’ do lado de fora da sua casa, quase interditando a passagem do beco, quando ela deu o gemido final.

 

 

Apertaram-se as mãos e o gerente da funerária informou que era melhor conversarem no boteco da esquina, com maior privacidade, enquanto saboreavam um rim de boi assado na brasa com uma cerveja gelada. Jonas engoliu seco de repugnância, afinal lidavam com corpos, e vísceras talvez não fosse o aperitivo ideal para a ocasião. Deu de ombros e aboletaram-se em uma mesa mais reservada, com o cheiro dos órgãos bovinos sendo assados vindo da churrasqueira.

 

— O negócio é o seguinte, se você disser a alguém que fui eu que te contei, eu digo que é mentira, está certo?

— Já combinamos isso, pode ficar tranquilo - Respondeu, fazendo uma careta quando pousou na mesa o prato com o rim bovino fatiado. Ele preferiu pedir o cardápio.

— Então, a coisa toda é grande e envolve a reitoria de algumas faculdades de medicina, não só daqui, mas também de fora. Esses dois que você entregou na mão da tal mulher, teve como destino uma universidade local. Parecem que usam os cadáveres nas aulas, dissecam, extraem os órgãos, simulam cirurgias até restar muito pouca coisa do defunto. Depois incineram e ninguém pergunta mais nada, afinal são mortos não reclamados.

— E a grana que rola? - Perguntou, querendo saber o que ele tinha perdido e achava que podia recuperar, com o nariz tapado quando o garçom passou perto da mesa levando um prato fumegante de sarapatel de porco para uma mesa vizinha.

— Alta. Um corpo em bom estado vale quase um carro. E eles pagam em dinheiro vivo pelo que eu soube.

— Se eu soubesse, tinha negociado algo mais que uma trepada. Mas havia outras coisas envolvidas com aquela mulher. Um namorado ciumento me pagou uma grana razoável para armar pra cima dela. Mas acho que ainda posso conseguir grana e cama com aquela vadia.

— Você é que sabe, mas se eu fosse você deixava pra lá. Essa coisa quanto mais a gente cava, mais esqueletos encontra, se é que você me entende. Tem gente perigosa nisso aí.

— Talvez você tenha razão - Contemplou apenas para encerrar o assunto, e levantando-se para ir ao banheiro. No caminho, assustou-se com um prato de buchada de bode, com o estômago a lhe revolver as entranhas. A ideia era apenas urinar, mas tinha ficado nauseabundo, e aproveitou para colocar o almoço para fora. Nada que um chope e uma porção de azeitonas não resolvesse. Apenas pediria para trocar de mesa e ficar na calçada, longe daquele desfile macabro de iguarias exóticas demais para o seu apetite ‘’filé com fritas’’.

 

 

O que tinha em mãos se parecia mais com um ensaio de revista pornográfica do que com um registro de um evento da sociedade local. Os mais absurdos ângulos, e os mais tresloucados closes transbordando pelos cantos dos fotogramas. Peixoto ainda conseguia se surpreender com a sordidez daquela criatura. Arrependeu-se de não ter enviado uma câmera para filmar o show de sexo explícito dado por Patrícia. A mulher cavalgava como uma Amazona, e urrava como uma ambulância no meio do trânsito na hora do rush.

 

Tirou algumas notas do bolso e fez o pagamento pelo serviço sujo, enquanto recolhia aquele material nojento num envelope. Já tinha o suficiente para as suas pretensões. Se aquilo caísse em mãos erradas, ela seria frita no óleo quente por todas as redações do país. Na verdade, já estava encrencada com quem não deveria. Ele. Agora, com as máscaras no chão, deveria preparar o epílogo daquela farsa. Pegou a garrafa de bourbon que guardava para se servir apenas em ocasiões especiais, e despejou o líquido até a metade do copo. Com o calor da bebida a lhe queimar a garganta, lembrou do primeiro dia dela ali na redação. Era quase inacreditável que aquela moça de franjas pueris a cair-lhe pela testa, óculos cafonas, metida em calças bufantes e blusas que lhe cobriam os braços até os punhos, e uma timidez latente até nos gestos sempre comedidos, era a mesma que hoje trepava em público.

 

 

A menina não largava a mão dele por nada. Chegou a soltar a da avó e seguia caminhando ao seu lado. Sabia que deixaria o avô para trás sem saber quando o veria novamente. Pela primeira vez sentia orgulho genuíno de alguém com o mesmo sangue. Não que o amor por Conceição fosse menor, mas Balduíno a havia impressionado com o seu vasto vocabulário e a fleuma com a qual gesticulava para muitas vezes explicar algo de difícil compreensão que teria dito.

 

O ônibus para Sabugueiro já estava na plataforma, e ele não sabia muito bem como aquela despedida ocorreria. A menina era uma cópia melhorada de Patrícia, tanto no comportamento educado, quanto na perspicácia para pescar os detalhes do que ocorria ao seu redor. Era boa em solucionar quebra cabeças. Não permitiu que o momento se tornasse algo formal ou carregado de emoção para não deixar a alegria de Cidinha se esvair. Levou-a ao colo e lhe deu um longo abraço. Conceição abriu um sorriso de satisfação com a cena e nada disse antes de subir no ônibus, seguida pela neta. Pela janela, ela viu a figura do avô se distanciar. O seu braço permaneceu suspenso a lhe dar um adeus. Ao mesmo tempo em que estava feliz em tê-lo conhecido, algo dentro dela dizia que talvez nunca mais haveria outro encontro. Fechou os olhos para dissipar aquela sensação ruim e escolheu ficar com a lembrança da aspereza daquelas mãos grandes e cheias de calos, mas que lhe transmitiam um tipo de segurança que nunca imaginou precisar.

 

 

As últimas noites tinham sido incômodas. Não conseguia pregar o olho com a mente poluída por pensamentos ruins que invariavelmente rondavam em torno do seu filho. Aquela coisa que vivia atravessada no seu peito como um punhal, parecia ganhar vida quando estava angustiada, e a dor vinha como um aviso para que ela nunca esquecesse o que fez. Suas entranhas pareciam estar sendo repuxadas, enquanto lhe tiravam o chão. Não sabia quanto tempo mais poderia aguentar conviver com aquele desassossego. Ele sempre estava lá, representado por uma figura disforme apontando o dedo para ela, grunhindo algo incompreensível. Sabia que eram acusações, e também sabia que todas eram procedentes.

 

Porém, naquela noite ele falou com clareza pela primeira vez, e sem lhe apontar o dedo. Sua voz estava calma e as suas formas ficaram mais nítidas. Era um jovem de beleza indiscutível, de olhos sagazes, que falava devagar para que nada fosse perdido. Saboreava cada sílaba como passasse instruções. Sim, eram instruções, e a primeira delas pedia que ela se levantasse da cama imediatamente e fosse até ele. Mas ela não sabia onde ele estava. Ele insistia que ela sabia, inclusive que já estivera lá. Agda, se levantou e pôs um vestido negro, cobrindo a cabeça com um véu da mesma cor. Pegou uma vela, que acendeu ainda em casa e saiu às duas e meia da madrugada em direção ao cemitério. Tinha que cumprir o desejo do seu filho, e a vela seria apenas uma das tarefas. Pela primeira vez sentiu que ele estava disposto a perdoá-la, e ela não perderia aquela chance por nada nesse mundo. Conhecia uma passagem através dos pés de cacau que dava numa parte caída do muro do cemitério. Não adiantava seguir para o portão principal por já estar fechado naquele horário. A vela iluminava o caminho e aquecia o seu coração, que já não sentia mais a presença da adaga que por tanto tempo a dilacerou.

 

 

De certo havia um interesse. Foi quando o flagrava sustentando o olhar para ela por mais tempo que o normal. Até onde sabia, ele arrastava as duas asas para Vilma, que o desprezava como uma roupa velha desbotada. Resolveu baixar a guarda quando a amiga lhe deu o sinal verde para que ela cedesse aos encantos do mestre de capoeira. Só alertou para que não lhe fizesse muitas confidências para que o seu nome não caísse na boca do povo. Se Janice conseguisse controlar a língua do Mestre Tuta, o resto seria fácil.

 

Já tinha embalado os abadás encomendados pelo professor quando ele chegou, em tempo de se servir de uma xícara de café recém passado.

 

— Jane, você é costureira de mão cheia. Nunca vi peças tão bem feitas! - Elogiou, virando um dos abadás pelo avesso, como se tivesse conhecimento do ofício, apenas para ficar mais um pouco e tomar mais café.

— Obrigado Tuta. Você sempre foi um cavalheiro, mas modéstia a parte, sou boa em qualquer coisa que faço - Disse, tentando encontrar no rosto do homem alguma expressão que o fizesse lembrar dos tempos em que foi mulher da vida.

— Disso eu sei muito bem.. quer dizer, não me entenda mal, mas você disse a maior das verdades. Você faz bem seja lá o que for - Explicou, tentando fugir do passado sem sucesso.

— Não se preocupe, eu não tenho vergonha do que fui, nem do que sou. O tempo passa e a gente se adapta. E não esqueça que você foi meu cliente na atividade passada e segue sendo na minha atual profissão - Relembrou, esperando que ele ficasse envergonhado. Mas ele lhe abriu um sorriso.

— Foi isso que eu quis dizer. Boa em tudo! - Afirmou, colocando a peça de roupa de volta na sacola e se aproximando dela, que trazia a garrafa inteira do líquido fumegante..

 

Beijou-a de surpresa, meio desajeitado, com medo de ser repelido como Vilma costumava fazer. Ao contrário do que imaginou, ela o trouxe para perto e deixaram as emoções aflorarem. Apesar de estar aposentada da safadeza há muito tempo, Janice não tinha perdido o rebolado. Levou-o para o seu quarto e jogou Tuta na cama. Aquilo não se desaprendia, era o mesmo que andar de bicicleta. Seria a sua primeira trepada depois de tanto tempo. O mesmo acontecia com Tuta, que nem lembrava a última vez que tinha tido uma ereção. Seria o céu de ambos, caso as costas do professor de capoeira não tivesse aterrissado sobre várias agulhas de costura que estavam enfiadas na beira do colchão para serem usadas por Janice. Os minutos seguintes não foram de satisfação sexual. Foram de desinfecção das vinte e cinco doloridas espetadas.


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