Uma noite dessas sonhei com uma quimera de dez cabeças, todas elas falando ao mesmo tempo. Implorei para que cada uma falasse por vez, mas não me deram ouvidos. Foi aí que treinei o meu ouvido para ouvir dez vezes mais.

Hoje me sinto um ser esponjoso capaz de traduzir a fala do vento, enquanto tento compreender uma cena muda na rua, ao mesmo tempo em que converso com alguém telepaticamente e, interpreto os biosinais para me antecipar ao próximo terremoto criativo.

Há fases em que preciso jorrar. Conto com os meus dedos para ejacular de mim as ideias que disputam espaço na minha cabeça e a fazem doer como pedra nos rins. Sou uma barragem que acumula e, de tempos em tempos, precisa abrir as comportas sob pena de rachar as paredes do cerebelo.

Sou parte de uma sina ou plano de alguém. Enquanto não descubro de quem, sigo escrevendo para espalhar um pouco dessa gosma perfumada chamada inspiração.

###

Pilotando canetas e teclados e devorando páginas há eras, como uma traça insaciável. Agora sobreveio o desejo de compartilhar meus pesadelos, delírios, e crises de abstinência em forma de contos surreais, poemas dantescos, novelas pragmáticas e romances escatológicos que já foram, ou estão em processo, ou ainda serão alimentados pela sua fome de querer mais das minhas vísceras literárias.