Watch Dogs: Ghosts of London escrita por BadWolf


Capítulo 18
Aliado Indesejável




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            Volker olhava para o céu. Não para admirar aquele dia bonito, de céu azul, com umas poucas nuvens brancas a adornar um pouco o horizonte, mas porque estava trabalhando. No céu, estava o drone de carga, que ele cuidadosamente controlava seus movimentos através de um controle remoto, cruzando quase que o dia todo a extensão daquela obra. Mais um grande arranha-céu em Londres. Como se a cidade já não tivesse o bastante. Seria uma infinidade de escritórios comerciais de luxo, o que era uma pena para uma cidade abarrotada de gente sem um teto para viver. Mas o capitalismo não parecia se importar com isso, muito menos os ditos governantes.

            Estava terminando de deixar uma carga de cimento em um dos andares do esqueleto do prédio quando ouviu a sineta tocar. Hora de almoçar. Já não era sem tempo. Seu estômago roncava.

            Sentou-se em um canto da obra. Trazia na mão um pote com comida. Era frango frito com batatas. Ainda que tivesse sido preparado por ele mesmo, Volker tinha consciência que mal dava para comparar com a comida que costumava levar, costumeiramente cozinhada por sua irmã Maddie, mas como ela não deixou o jantar pronto, ele teve que improvisar. Isso já estava acontecendo há uma semana. Não dava para reclamar. Seu tio estava internado e, desde então, sua irmã se desdobrava entre o emprego e o hospital, mal tendo tempo para fazer uma refeição decente que fosse. O mínimo que poderia fazer era ajuda-la, por isso sempre deixava um pouco na panela para que ela pudesse comer – ainda que não fosse sempre uma experiência agradável.

            -Como é difícil falar com você.

            Sobressaltou-se, ao ver Aiden. Estava sem boné, fato que lhe causou estranheza, e a barba ainda mais comprida. Mais um pouco e tamparia seu pescoço por completo.

            -Não posso atender celular enquanto estou trabalhando. Normas de segurança da obra. – explicou, dando mais uma garfada.

            -Imaginei. Espero não estar te atrapalhando, mas não havia como esperar mais. Preciso de ajuda do... Seu pessoal.

            -Tá falando sério? – estranhou o jovem, não conseguindo disfarçar sua surpresa.

            -Nem um pouco. Ainda que à distância, eu estou acompanhando o método que vocês têm empregado para derrotar a Albion. Até que não está tão ruim...

            -O que é um grande elogio, vindo de ninguém menos que Aiden Pearce...

            -Shh!! – pediu Aiden, o que imediatamente silenciou Volker. O rapaz chegou a olhar para os lados, para ver se alguém tinha escutado alguma coisa, mas por sorte não havia ninguém por perto.

            -Foi mal, cara. Esqueci que estão te procurando. Aliás, qual foi a parada lá na Albion? Você disse que não tinha mais saco para esse tipo de coisa. Não entendi foi nada quando vi a notícia. Pensei que fosse lá só para hackear, não para matar alguém.

            -Hunf, não matei aquele cara. Estava no local errado e na hora errada, e acabei pagando o pato por essa merda. Agora estão na minha cola. Nada disso teria acontecido, se não estivesse lá só para ajudar seu tio.

            -Aquele lá não é digno do seu esforço, já disse.

            Aiden rolou os olhos. Não estava afim dos rompantes de rebeldia adolescente de Volker, na verdade nunca estava afim deles. Mas como precisava da ajuda dele, e em especial do Deadsec, teria que fingir demência quanto a essa sua insistência em contraria-lo o tempo todo.

            -Hackear aquela lista só adiou a deportação do seu tio, mas ela ainda está no radar. Preciso acabar com esse departamento da Albion, pois as leis mais rigorosas a respeito de imigrantes estão vindo de lá, não do governo. Por acaso o Deadsec está trabalhando em algo nesse sentido?

            Volker parecia pensativo.

            -A Sabine estava pensando em uma forma de voltar a opinião pública contra esse departamento. Descobrir algum podre, jogar a merda no ventilador, deixar a mídia e a população revoltada quanto a eles... Sacou?

            -Sim. – respondeu Aiden. – Assim a Albion teria que se defender, respondendo às críticas com o fechamento desse departamento. Seria ótimo. O que vocês estão fazendo a respeito? Se eu puder ajudar...

            Volker pareceu subitamente animado.

            -Caralho, vai ser foda demais ter você trabalhando conosco!

            -Calminha aí, fedelho... Não pense que isso vai me fazer ser parte de Deadsec. Só vou ajudar vocês nisso porque nós temos um objetivo em comum, mas assim que eu fechar esse departamento, cada um vai para o seu lado e fim de papo. Fiquem aí bancando os heróis de filme, libertando a cidade dos vilões enquanto tomam cheesecake de morango. Não estou com idade para isso.

            -Cara, está para nascer alguém mais ranzinza do que você. Na moral, não sei como a minha irmã ficou afim de você...

            -Já que tocou no assunto... Como ela está? – perguntou Aiden, levemente tímido.

            -Como acha? Na fossa, né! Precisava ver como ela chegou em casa. Chorando, te xingando de todas as formas... Cheguei a ter raiva de você, pensando que você tinha traído minha irmã ou coisa pior, mas ela me disse que terminou tudo contigo porque você era um criminoso foragido da polícia... Cara, que mancada, hein! Por que não contou para ela sobre o seu passado logo?

            -Porque ela terminaria comigo de qualquer forma.

—Se assistisse mais filmes, saberia que essa história de esconder passado sempre acaba em merda. Uma hora a verdade vem à tona e o mocinho se lasca. Ou anti-herói, no seu caso.

—Maddie é muito correta para entender o que eu faço. Mas isso é conversa para outro momento. Agora, preciso saber o que vocês do Deadsec estão planejando.

            -Nem acredito que vou ser o nerd da cadeira de ninguém menos que a Raposa!

            Aiden tomou-se de confusão.

            -Não entendi, nerd do quê?

            -Sabe, aquele cara que fica direto no computador, hackeando e dando suporte para o fortão mal-encarado que enfrenta os bandidos, igual nos filmes de ação? Todo filme tem isso, cara! Em que mundo você vive?

            Porra, onde diabos eu estou me metendo...

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            Aiden sabia onde ficava o afamado esconderijo do Deadsec. Era no pub The Earl's Fortune, nos arredores dos jardins da Praça do Parlamento, mas nunca chegou a entrar lá pessoalmente. Havia combinado com Volker que estaria no pub depois de seu expediente, que encerraria às sete da noite. Era quase oito quando Volker finalmente apareceu. Já sem o seu uniforme da construção civil, com os cabelos que mais pareciam despenteados do que arrumados, mas que Aiden sabia que era a moda estranha daquela juventude. Vestia uma jaqueta jeans surrada e camiseta de banda de rock cujo nome o justiceiro nunca ouviu falar.

            -Vejo que já deu início aos trabalhos. – comentou, ao ver uma pint pela metade na mesa de Aiden. O vigilante deu de ombros.

            -Tem uma pontualidade de merda para um britânico. Agora, vamos.

            Os dois se levantaram, caminhando até os fundos do pub. Foram até um lugar semelhante a um depósito de bebidas e caixas. Volker digitou uma senha, e a porta se abriu. Desceram as escadas de uma espécie de túnel. Ainda havia as antigas catracas, o que deixou evidente que era algum tipo de estação de metrô abandonada. Boa sacada.

            -Mas que porra é essa? – Aiden surpreendeu-se, ao ver que o tal lugar estava simplesmente abarrotado de gente. Todos pareciam conversar, mas assim que o hacker apareceu, calaram-se. Olhavam para Aiden com notório interesse, quase admiração. A maioria era gente jovem e deslocada.

            -Foi mal, cara. Eu contei para alguns colegas do Deadsec que você estaria aqui, mas parece que a parada viralizou. Acho que estão todos do Dedsec aqui, loucos para conhecer o grande e temível Aiden Pearce. Mais um pouco e te pedirão um autógrafo. Só não fala para eles que você comeu a minha irmã, combinado?

            Aiden suspirou, diante de todos aqueles olhares curiosos. Se sentia pior que uma atração de circo. Não sabia que carregava essa áurea de celebridade do mundo hacker diante daquela garotada toda. Só conseguia imaginar quão exageradas foram suas histórias, especialmente tudo que fez em Chicago. Era bom ser temido por gente perversa, mas ao mesmo tempo, não se imaginava transformado em uma espécie de lenda, no sentido positivo, para quem quer que seja. Não depois de ter feito tanta merda na vida. No fundo, sentia-se indigno de todos aqueles olhares de admiração.

            -Só me leve até o líder de vocês. – pediu, tentando disfarçar o incômodo.

            -Er... Nós não temos um líder. – respondeu uma moça de cabelo vermelho, quase trêmula de emoção. Aiden retrucou com a cabeça.

            -Toda equipe tem líder, sim. Quem é que dita as ordens aqui? – ele perguntou, mas todos pareciam se entreolhar, incertos. Parecia não haver um consenso. Que porra de anarquia seria essa? Pois até os anarquistas têm um líder! Mais um pouco e se sentiria diante de uma comunidade hippie, não um grupo de hackers.

            O som de umas palmas escassas chamou-lhe a atenção, o que fez Aiden se virar. Uma mulher de roupas e cabelo exótico era quem estava a bater-lhe palmas. Havia sarcasmo em seu sorriso.

            -E eis que o grande Aiden Pearce desce de seu pedestal de glória para se comunicar conosco, meros mortais, indignos de sua presença... A que devo a sua visita, Raposa?

            -Então, você é a líder do Deadsec de Londres.

            -O Deadsec não tem líder. – respondeu Sabine.

            -Corta esse seu papo de quinta, garota. Mas se não quer assumir sua liderança, que se foda. Estou aqui para negociarmos uma cooperação.

            Sabine arqueou a sobrancelha, interessada.

            -Vai cobrar? Me disseram que você cobra caro por seus serviços.

            -Dessa vez, vai ser na faixa. Meus interesses, por hora, estão alinhados aos de vocês. Será que podemos conversar?

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            Uma tela brilhante se abriu, revelando o que Aiden reconheceu como sendo uma IA. E pelo jeito, bastante avançada. Não esperava que o Deadsec estivesse tão bem equipado assim.

            -Bagley, mostre para Aiden Pearce um resumo do plano que arquitetamos até agora para dissolver o Departamento de Prevenção de Crimes por Imigrantes. – ordenou Sabine. E ela diz que não é a líder de ninguém, pensou Aiden. Claramente era ela quem decidia tudo, quem dava as ordens, quem direcionava o pessoal. Mas o famoso senso de fraternidade impedia que alguém assumisse qualquer protagonismo aqui. Queriam se sentir, literalmente, como na Távola Redonda. Mas toda Távola Redonda tinha seu Rei Arthur, que nesse caso, usava uma franja picotada e salto agulha.

—Primeiramente, saudações Aiden Pearce! Er... Como prefere que eu te chame? Aiden Pearce? A Raposa? Ou Addie está bom para você?

            -Addie? Como é que... Porra, quer saber? É melhor nem saber como diabos você descobriu isso. – comentou Aiden. – Me chame do que quiser.

            -Está bem, “Do Que Quiser”. Você é quem manda. Bom, o Departamento de Prevenção de Crimes por Imigrantes é, como seu nome já prenuncia, um jeito educado de mandar gente pobre e que não possui sangue britânico para trás das grades, sob justificativa de “grave risco à segurança”. Uma verdadeira fábrica de mandatos de prisão baseados em nada mais que achismo. Muitas prisões se baseiam em histórico policial e, pasmem, escolar, leitura corporal e gesticular, diagnósticos médicos, perfil de consumidor, comportamento em redes sociais... Enfim, nada concreto que justifique prisões, e em especial, o que acontece nos ditos Centros de Detenção da Albion, que construiu alguns especialmente para imigrantes. Pois até os bandidos ingleses não merecem se juntar à gentalha estrangeira, pelo visto.

            -Ótimo resumo, mas e quanto ao plano? Algo de concreto?

            Foi Sabine quem respondeu. – Bagley, reproduz o relatório.

            -Nosso pessoal descobriu que as reproduções de tortura são filmadas. Parece que há alguém muito sádico no Departamento que acha mais excitante ver gente perdendo o dente do que um canal de pornografia e está gravando algumas delas, sem o conhecimento da Albion. As melhores torturas estão especialmente guardadas em um cofre, no Residencial Thompson, em Candem. É lá que mora o nosso pervertido, ou melhor dizendo, Howard Hamilton, chefe da segurança. Nem mesmo a Albion sabe que ele mantém esse conteúdo gravado.

            -Já saquei qual é o plano de vocês. Pegar essas gravações e jogar a merda no ventilador. Assim, a Albion será obrigada a fechar o seu departamento fascista e rever suas próprias políticas.

            -Acertou em cheio, “Do Que Quiser”.

            Aiden bufou. – Essa AI está de sacanagem comigo, só pode. Me chama de Aiden, tá bom?

            -Já sabemos onde é o lugar. – respondeu Sabine, e uma imagem se revelou em um mapa.

            -Se já sabiam exatamente o que fazer, então por que não fizeram nada ainda?

            -Falta de pessoal. Como pode ver, Londres é enorme e nossa equipe está se desdobrando em várias tarefas. Priorizamos as mais importantes. Se quiser, faz as honras da casa. Vai lá e pega as imagens. A gente seleciona as mais chocantes e manda para a mídia inteira do Reino Unido. Preparado?

            -Sempre. – respondeu Aiden.

            -Se quiser, pode deixar um canal aberto para que eu me comunique com você, Aiden. Posso ser muito útil em coisas que você sequer imagina. Não subestime o poder de uma inteligência artificial com humor britânico. Posso dominar o mundo em quinze minutos, mas também posso te fazer rir um pouco enquanto você troca tiros com gente perigosa. Se não sobreviver, pelo menos encontrarão seu cadáver com um belo sorriso no rosto. – respondeu Bagley.

            -Não costumo trabalhar em equipe, muito menos com a assessoria de uma IA. Mas vou pensar no seu caso, Bagley.

            -E me desculpe pela piadinha do Addie. Alguns apelidos de infância são realmente traumatizantes. Uma pena que nos anos 70 a terapia era pouco conhecida.

            Essa IA parece que nasceu para me irritar, pensou Aiden. Tinha que ressuscitar seu apelido de escola em um momento tão inapropriado? E pior, agora todos sabiam o que diabos significava Addie.

            -Por que não cala a porra da boca, Bagley? – pediu Aiden.

            -Porque eu não tenho boca, Aiden. Sou só um conjunto de códigos com uma voz excepcionalmente atraente. Mas prometo que serei mais discreto da próxima vez. – prometeu Bagley, sem muita credibilidade.


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Notas finais do capítulo

Deixando registrado aqui que eu senti muita falta do Bagley debochado na DLC do Aiden.
Dava para ter feito uma boa troca entre eles kkkkkk
Espero que tenham gostado dessa breve interação rs



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