Burned escrita por Shalashaska


Capítulo 1
Ao cárcere


Notas iniciais do capítulo

Agradeço todas as palavras de incentivo que me fizeram (e me fazem!) continuar escrevendo. Boa leitura!



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As rochas negras despontavam no mar, denunciando que logo o navio encontraria o pequeno cais privado da família real. Necessitava tanto talento quanto familiaridade com aquelas águas para atracar o navio em um local cheio de pedras, ainda mais com a névoa que cobria o horizonte naquele final de tarde. A maré era alta e já havia chovido antes, de modo que naquele momento Hans apenas admirava os relâmpagos que ainda cortavam as nuvens e sentia o cheiro da umidade e do sal na madeira. Piscou devagar, seu rosto impassível enquanto tirava o cigarro da boca para dar uma baforada longa.

A fumaça logo se juntou ao nevoeiro.

Foi neste instante que o capitão parou ao seu lado, tentando encontrar o que Hans tanto observava à frente. Ambos tinham idades relativamente próximas e já se conheciam há anos, então ele sabia dizer quando o ruivo estava pensando em coisas a mais do que a paisagem cinza e preta a sua frente. Era algo que talvez não revelasse, então o capitão apenas murmurou algo para quebrar o silêncio:

— Não sei como conseguiu acender o cigarro com essa umidade toda, vossa Alteza.

Hans apenas deu de ombros, o braço relaxado ao lado do corpo. A ponta do cigarro brilhava como se tivesse acabado de ser acesa, ou então o príncipe teria dado uma profunda tragada. O capitão não tinha como saber e, na realidade, não sabia que ele fumava e até estranhou tal hábito.

Há quase cinco anos, os dois velejavam pelas águas ao redor das Ilhas do Sul nos meses quentes. A marinha real era forte, organizada e cautelosa no oceano ao redor do país, sendo de extremo valor para o rei. Talvez tenha sido por isso que o príncipe entrou para a divisão em tenra idade, e tenha se empenhado tanto até alcançar a posição notável de Almirante. Havia quem pensasse que o fato do rapaz ser o príncipe acelerasse as coisas, mas o capitão Malthe Pedersen testemunhara seus esforços. Hans mantinha uma boa relação com seus subordinados, ainda que não estivesse sempre presente, pois tinha ainda deveres reais. Não perdia a compostura ao beber ou pouco bebia. Não se interessava em qualquer substância capaz de alterar os sentidos. Não arrumava confusão com mulheres ou homens. O mais novo Westergaard era disciplinado e até mesmo solícito, e foi por isso que chocou tanto quando o rapaz voltou de Arendelle com uma séria acusação de tentativa de regicídio e tomada de poder.

Agora, quatro anos após sua sentença e o cumprimento de suas penas, ainda parecia difícil crer em tamanha atrocidade, tamanha frieza. No entanto, lá estava Hans: o rosto vazio e trajando vestes de qualidade, muito diferentes do uniforme requintado de sua posição na marinha e bem distintas das roupas simples que vestia no porto de onde vinham. Malthe acreditava que ele aprendeu a fumar com o povo simples da área rural onde foi mandado. Era uma boa suposição. E Malthe queria ainda acreditar que os dois eram amigos. 

Tentou confortá-lo:

— Logo estará em casa.

— Eu sei. — Respondeu, levando de novo o cigarro à boca. Tragou de leve e logo soprou fumaça. — Mas preferia ter vindo por dentro das rotas à cavalo ou em uma carruagem qualquer.

Malthe franziu a testa.

— A viagem levaria dias, meses até. Vossa Alteza estava muito longe do palácio.

Eu sei. — O tom dele foi resoluto, como uma âncora cujas correntes arrebentaram após ser solta na água. Malthe considerava o assunto morto e a conversa terminantemente encerrada, mas Hans educadamente lhe lançou mais algumas palavras: — Voltará ao porto principal depois de sair do palácio, Capitão Pedersen? 

— Somente daqui a duas semanas. Existem artigos do palácio que serão transportados para o palacete de verão de sua família, Vossa Alteza. Portanto, uma equipe fará um inventário e a alocação destes artigos de maneira segura no navio. O transporte durará estas duas semanas, se os ventos forem favoráveis.

— Entendo. Parece uma viagem adorável.

— Irá se juntar a nós?

Hans riu fraco, depois encarou diretamente o capitão Pedersen pela primeira vez durante a conversa.

— Eu temo que minha pena não tenha acabado.

— Mas, Vossa Alteza…

— Ser o filho de meu pai é uma sentença para a vida inteira, capitão. — Ele jogou o cigarro no chão e pisou na ponta para apagá-lo. — Vou juntar meus pertences. Estamos quase atracando.

O Capitão Pedersen observou o príncipe voltar-se para a popa do navio, onde estava sua cabine no deque inferior. Deu um suspiro longo, infeliz por não ter muito o que fazer pelo outro, e então se virou para o cenário que Hans tanto encarava. O cais era a parte mais afastada do palácio real, mas justamente era um ponto onde se podia perfeitamente enxergar o dorso do palácio, construído com as brilhantes pedras negras que somente existiam nas Ilhas do Sul. As muralhas eram baixas e longas, um tanto sinuosas: a jóia do rei, uma fortaleza e símbolo da imponência da realeza do país. Entre o nevoeiro e iluminado de tempos em tempos por raios, o palácio mais parecia uma serpente marinha.

Se Malthe perguntasse à Hans, este diria que uma serpente marinha ou qualquer monstro vindo do oceano era preferível à realidade, pois tais criaturas poderiam ser mortas e seus corpos logo desapareceriam no sal do mar. O belo palácio esculpido em pedra era, na verdade, uma prisão.


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Notas finais do capítulo

Se você gosta do Hans, respira HAHAHA
E se puder, deixe um comentário ♥ Fará essa autora cansada muito feliz.



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