Um Reino de Monstros Vol. 1 escrita por Caliel Alves


Capítulo 8
Capítulo 2: A Cidade Subterrânea - Parte 2




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Pela manhã, Tell acordou bocejando. Index, que lhe servira de travesseiro, saltou no ar, pôs um dedo na boca e assoprou. Em instantes, ele estava com o formato ovular novamente. Após se levantar, procurou por Saragat, mas ele não estava lá.

Será que ele foi embora?

— Bom dia, flor do dia!

O garoto se virou, e lá estava Saragat, vestido a rigor, com capa e tudo. O jovem meneou a cabeça. Index voou em volta do conjurador, que o espantava como se fosse uma mosca.

— Você não tem outro modelito, não?

— A capa me deixa mais elegante e a noite ela serve como lençol.

Plaft! Com um tapa, Saragat colocou Index para longe. Tell se pôs a rir.

Eles nunca param de brigar.

Uma mulher veio até eles e os convidou a tomar café da manhã junto com os outros. Eles atravessaram o acampamento e chegaram até a uma mesa longa de carvalho.

Na ponta, estava Clapeyron. Dumas sentava a sua direita, pareciam ser bastante íntimos.

Todos conversavam quando Tell e Saragat chegaram. Clapeyron levantou-se com uma taça de hidromel na mão direita. Como foi de súbito, ambos tiveram um mal-estar.

— Um brinde, aos nossos mais novos companheiros: Tell e Saragat.

— Não se esqueçam de mim, eu também ajudei.

Index voou por toda a mesa orgulhoso de ser o centro das atenções.

— No que você ajudou, sua bola de carne inútil?

Antes que Index fosse arremessado novamente, Tell o colocou em seus braços.

Os homens e mulheres à mesa gargalharam. Index não parecia um monstro, não fora criado com esse intuito, mas não deixava de causar estranhamento.

— Não precisava ter feito o brinde, senhor Clapeyron, cumprimos o nosso dever.

— Sabem quem são estes que sentam conosco, Tell de Lisliboux? Aqueles a quem você devolveu a humanidade.

Todos eles prestaram uma reverência, Tell respondeu timidamente.

Depois, uma imagem voltou à sua cabeça, na batalha, quando a magia de purificação fora usada, alguns corpos não tinham voltado à forma humana, isso o deixou triste.

A vitória não compensava a ausência de seu avô. Clapeyron percebeu tudo isso.

— Tell, eu garanto que ficará tudo bem. Mas acho que tudo isso deva tê-lo deixado confuso, não é mesmo? Então eu vou explicar tudo.

Clapeyron se pôs a narrar com todos os olhos e ouvidos voltados para si. Há dez anos, o mago Zarastu, que o mundo julgava desaparecido desde a morte do Mago Dourado, reapareceu para a surpresa geral como um conjurador de monstros.

Diferente das habilidades desse lendário guerreiro nos tempos de outrora, ele não apenas controlava e invocava os monstros, mas podia criá-los, pois, na última guerra, eles entraram em extinção. Ao custo de muitas vidas, descobriu-se que os humanos que viviam sendo raptados há cerca de vinte anos, eram transformados em monstros através de um método ignorado.

Com o início da Segunda Grande Guerra, Taala deixou os campos de batalha e passou a atuar como o melhor estrategista dos rebeldes.

Taala passou a trabalhar numa maneira de derrotar os monstros sem perder os seres humanos transformados, assim reaveria a humanidade das vítimas.

— Mas ele tinha que manter a minha segurança, não é?

— Sim, foi por isso que o Monstronomicom demorou tanto tempo para ser usado. Ele é o nosso trunfo.

— Então, agora eu devo repassá-lo para vocês?

Tell pegou o livro, mas as mãos de Clapeyron o rejeitaram.

— Por que não? Meu avô me fez vir até aqui...

— Infelizmente, ninguém além de um mago pode usar o livro, Tell. E nenhum de nós é usuário de magia. De acordo com o seu avô, apenas um Lisliboux ou um mago de grande poder pode usar o livro. Ele pensou em tudo, principalmente na segurança do livro.

Saragat ficou um tanto feliz de saber que aquele livro não era responsabilidade dele. E como se não tivesse nada a ver com a conversa, comeu o desjejum, não via uma mesa farta há muito tempo.

A conversa entrou numa pausa, o estômago de todos doía. E em poucos minutos, nada mais restava à mesa.

Após terminarem, Tell, Saragat e Dumas foram convidados a entrar no alojamento de Clapeyron. O garoto ainda tinha muitas perguntas a fazer, e nem todas mereciam plateia.

Depois de acomodados, Saragat analisou o ambiente. Havia escassa mobília e um quadro com uma foto já amarelada com três pessoas nela. Embora mais jovens, lá estavam Clapeyron e Dumas.

Mas quem é esse outro?

— Curioso para saber quem eles são não é, Tell? Esse sou eu, Dumas aqui... E...

— Jacs, o melhor espadachim, além de mim, é claro.

— Não foi o que os resultados de graduação mostraram, Dumas.

De acordo Clapeyron, o seu filho Dumas tinha um grande talento, mas o seu filho mais velho Jacs, esse era o que poderia ser considerado um gênio, daqueles que só nascem um em cada geração.

— Então, você é só o segundo melhor?

— O pior dos nossos espadachins, Saragat, comparado a você, ainda é o melhor.

— Ei, espere, ele é seu sobrinho, mas ele o chama de mestre!

Index tinha lançado uma boa pergunta. Saragat cruzou os braços esperando uma resposta. Clapeyron apenas sorriu de modo paternalista.

— Dumas, na verdade, é o meu sobrinho. Os seus pais morreram quando ele era mais jovem, e eu cuidei dele como se fosse o seu pai. Ele é que se recusa a me chamar de pai, não é, filho?

Clapeyron espremia as bochechas de Dumas como se ele fosse um bebê. Com um tapa, o seu sobrinho afastou a sua mão e saiu do aposento.

— Desculpem-no, ele não gosta de falar dos pais.

— E porque não?

— Seus pais sofreram nas mãos dos monstros por não aceitarem passar o controle da cidade para a Horda. Havia um acordo de paz entre nós e os monstros que, não foi cumprido. O barão e a baronesa foram depostos por Nipi, alguém que Dumas realmente odeia, e temo que ele não permita a sua purificação. Todos os dias ele treina, acreditando que derrotará o mapinguari.

Tell acreditava que o comportamento de uma pessoa tinha muito mais a ver com os seus sentimentos do que propriamente de suas escolhas. Dumas retinha mágoa em seu coração e isso o fazia duro consigo mesmo.

Dumas, a ira destrói a razão.

Se houvesse oportunidade, ele diria isso, mas tinha certeza de que não seria ouvido.

Index voou pelo lugar e se empoleirou nos ombros de Tell. O garoto expirou o ar, estava um tanto quente, diferente da noite em que quase congelou.

— Gostaria de um pouco de café?

— Ah, sim.

— Gostaria de perguntar uma coisa, senhor Clapeyron.

— Me chame apenas de Clapeyron.

— Tudo bem. Então, conheceu os meus pais?

— Oh! Sim, eles eram formidáveis no campo de batalha, lutando com uma sincronia muito difícil para um casal. Vê-los lutando era como ver um show, as magias, os golpes e as armas pareciam mais uma dança do que uma luta. Inclusive, o seu pai Taran se parecia muito com Taala, era muito divertido. Mas, já você, se parece mais com a sua mãe Crala, tem a mesma sensibilidade dela. Eu os vi ainda numa batalha, hoje eles estão desaparecidos em combate, o que não significa mortos em combate...

Não há como negar que você é filho deles, Tell. Essa pele negra, esses cabelos crespos, esses lábios grossos, assim como o seu avô e seu pai, sim, um grande Lisliboux.

Tell vagueou o olhar e o voltou para o chão. Saragat lançou um olhar congelante para Clapeyron que se calou.

O garoto voltou a sorrir, afinal de contas, o velho espadachim tinha razão. Seu avô poderia estar vivo com os seus pais em algum lugar. Perder alguém é sempre doloroso, mas a possibilidade de encontrá-lo já é motivo suficiente para estampar um sorriso.

— Até agora, me pergunto como essa cidade foi entregue se aqui há os melhores espadachins do mundo! Estamos em Flande, gente. Aqui eles vivem “do aço, pelo aço”.

— Sim, este é o lema da Guarda dos Cavaleiros Flandinos. Do aço, pelo aço! É assim que se diz. Houve uma traição. Os humanos que vocês viram na superfície não passam de fantoches. Mas não os culpo, o medo inverte as coisas. Entretanto, há alguém que não escapará da minha justiça, ele se chama: Gumercindo.

Gumercindo, o “horrível vilão”.

Saragat só não riu porque a situação já era trágica demais.

Gumercindo não era nenhum cavaleiro, era um burguês mal-intencionado que desejava tomar o Baronato de Flande há muito tempo. Não tendo prestígio nem força militar para isso, fez um pacto com a Horda. Ele enfraqueceria as defesas internas, e em troca, a Horda o faria Barão de Flande, mesmo sem ter nenhum poder político, de fato.

Isso era imperdoável por vários motivos, o povo vivia agora acorrentado ao medo. Como um déspota ele controlava a cidade de Flande com mãos de ferro, e todos que o desobedeciam iam parar na prisão da cidade, e sabe-se lá que tipo de coisa ocorria lá!

Saragat refletiu sobre quem eram os verdadeiros monstros da situação, a Horda ou os humanos que entregaram os seus semelhantes para os monstros? Era como perguntar quem veio primeiro, o ovo ou a galinha?

— Tell, você é o portador deste livro e da esperança de todos nós.

— Ele já entendeu, coroa...

Clapeyron lançou um olhar mortal para Saragat que, logo calou a boca.

— Tell, disse ontem à noite que o seu treinamento nas artes mágicas está incompleto. Não sabemos magia, mas Taala me disse que tem um grande potencial para às armas.

— Bem, acredito que o meu avô supervalorizou as minhas habilidades.

Plaft, Clapeyron bateu no ombro de Tell.

— Ora, não diga isso. Se eu pude ensinar até mesmo o meu irmão mais velho, a não ser que você esteja duvidando de minhas capacidades pedagógicas...

O garoto alisava o ombro que havia levado o tapa, doía e estava vermelho.

— Não, de maneira nenhuma.

— Então, a partir de agora, começaremos o seu treinamento em armas. Não é à toa que eu sou chamado de o melhor mestre de armas de Flande.

— Atualmente você deve ser o único mestre de armas.

Numa rápida investida, o sabre de Clapeyron estava abaixo do queixo de Saragat, pressionando a sua garganta.

— Até que não estou tão velho assim, não é, conjurador?

— Eu já entendi, agora abaixe isso, eu posso me machucar.

Tell percebeu que aquele movimento tinha sido o mesmo que Dumas havia usado para derrotar as caveiras no beco.

— Agora vamos repassar a descrição dos monstros que você viu lutando contra o seu avô.

— Bem, na casa do meu avô havia um bradador com um piercing no nariz e um cabelo estranho, só havia cabelo no topo da cabeça, como se fosse uma crista de galo, sabe? O outro, vejamos, era um gorjala, um gigante escuro, ele usava uma saia quadriculada vermelha e azul. O último era um lobisomem e se chamava Sirius.

— Não me lembro dos outros dois, mas, Sirius é um dos Generais Atrozes, os mais fortes entre os membros da Horda. Seu treinamento tem que começar já! Eu e Dumas vamos ajudá-lo, só preciso saber para aonde ele foi?


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