Elena escrita por The Escapist


Capítulo 4
IV


Notas iniciais do capítulo

Olá! Já podem começar a dizer o que acharam né? rsrs, aguardo os comentários :D



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Elena detestava ter que faltar ao trabalho, mas quando se tratava da saúde de Davi, não tinha jeito. Poderia deixá-lo algumas horas na casa da vizinha ou de algum coleguinha da escola se ele estivesse saudável, mas nunca o deixaria sozinho estando doente, e se sua chefe não conseguisse entender isso, podia mandá-la embora. Depois de ligar para o escritório e avisar que não ia trabalhar — a recepção de Marta foi melhor do que esperava até, ela disse que não se preocupasse e desejou melhoras rápidas para o Davi (e ainda dizem que a monstra não tem coração), telefonou para o consultório do pediatra para tentar encontrar um horário disponível para Davi.

Desculpe, dona Elena, é que o dr. Ricardo viajou — a atendente explicou, com o melhor tom de desculpas possível.

— Como assim? E o que eu vou fazer? — Imaginou a moça dizendo para que ela levasse o filho à emergência de qualquer hospital se o caso fosse realmente grave ou esperasse o retorno do médico. No entanto, a vozinha simpática deu outra sugestão.

Tem o pediatra que está atendendo os pacientes do dr. Ricardo até ele voltar.

— Ele é bom?

— Sim, ele é ótimo. A senhora pode vir, tem um horário disponível agora às onze.

Num segundo, Elena pensou mil coisas. Pensou que era absurdo pagar um plano de saúde caríssimo para o filho e quando precisar do médico ele estar viajando; imaginou dr. Ricardo em alguma praia em Miami, pouco se importando com seus pacientes; imaginou se esse médico substituto era mesmo bom: como confiar a saúde de seu filho a um estranho? Mas não podia esperar até que as férias de Ricardo acabassem, Davi tinha passado a noite com febre e ela não sabia mais o que fazer, não podia ficar dando remédio ao garoto sem saber o que ele tinha.

— Tudo bem, pode marcar que a gente vai.

Depois de desligar o telefone, foi checar como Davi estava e arrumá-lo, porque já era quase dez e se chegasse um pouco mais cedo à clínica, poderia talvez conseguir ser atendida antes da hora marcada. Não pensava em tomar a frente de ninguém, mas quando se anda com uma criança doente a pessoa quer resolver as coisas o mais rápido possível.

A febre de Davi parecia ter baixado um pouco, mas ele ainda estava abatido, com os olhinhos cansados, o rosto pálido, não tinha conseguido comer direito e vomitou o pouco que comeu. Ele choramingou quando a mãe o chamou, e não gostou muito de tomar banho frio, mas era um menino obediente e fez tudo que ela mandou sem reclamar.

Às dez e vinte estava na recepção da clínica. Reparou que havia apenas uma mãe com uma criança na sala, e talvez nem fosse para o mesmo médico. Deixou Davi sentadinho numa cadeira e foi falar com a atendente, a mesma com quem falara ao telefone mais cedo.

— Tem mais alguém na frente? — perguntou enquanto a moça preenchia as guias de consulta. Sabia que era meio chato ficar insistindo, mas, enfim, às vezes a pessoa tem que ser chata mesmo.

— Ele está atendendo uma pessoa, e o próximo é o Davi.

— Ok, obrigada.

Retornou para perto do filho, aliviado por vê-lo mais animado. Talvez o banho tivesse feito bem. Davi estava brincando com o carrinho que trouxera de casa e logo começou a conversar com a menininha que também aguardava com a mãe na sala de espera. Enquanto as duas crianças se entendiam, a mãe da menina tentou também puxar conversa com Elena. Sempre se entediava nas salas de espera de médicos por causa dessas conversas sem sentido que surgiam. As pessoas às vezes achavam que só porque estavam dividindo o mesmo espaço e — talvez — o mesmo problema de saúde — tinham algo mais a compartilhar. Ou talvez fosse apenas uma questão de educação, dizia seu lado mais racional e menos ranzinza. Só porque você é uma ogra não significa que todo mundo seja.

— Você vai para o dr. Luís Filipe? — a mulher perguntou, e enquanto Elena ainda estava pensando no fato bizarro de o médico ter o mesmo nome que seu ex, que também era médico, e no quanto seria bizarro se fosse a mesma pessoa, e no fato de ela nunca ter perguntando a Luís Filipe qual era a especialidade dele, só sabia que ele trabalhava num hospital de grã-finos onde até para trabalhar a pessoa já tinha que ser rica, e talvez, só talvez, ela tivesse sido radical demais ao terminar com ele tão de repente, talvez, só talvez, devesse ter esperado um pouco mais, ela emendou: — Ah, ele é ótimo. Levei a Suzy pra uma consulta com ele semana passada, foi ótimo. Ele é maravilhoso. Excelente profissional. Dr. Ricardo recomendou, então é de confiança. Sem falar que é muito bonito.

A atendente chamou Davi e a mamãe de Davi — Elena já tinha se acostumado a ser a mamãe de Davi sempre que estava com ele; Elena chamou o garoto e pegou na mão dele, foram em direção ao consultório, ainda com o blábláblá da mulher na sua cabeça.

Pelo menos a surpresa não foi tão grande quando ele abriu a porta com aquele sorriso devastador. Aliás, não foi grande para Elena, porque Luís ficou da cor do jaleco e engoliu em seco três vezes para tentar recuperar a voz que tinha se perdido no meio do nome de Davi. Ele deixou a porta aberta para que mãe e filho entrassem na sala, depois a fechou e ficou alguns segundos parado, como se em dúvida se voltava para a mesa ou corria para o banheiro para jogar água fria na cara.

— Desculpe, eu não sabia — Elena começou. — Nem perguntei o nome do médico... desculpa. Não sabia... você disse que trabalhava naquele hospital de ricos — ela estava torcendo a orelha do coelho de pelúcia de Davi com força.

Luís retomou o domínio de seu cérebro e se sentou na cadeira do outro lado da mesa.

— Talvez fosse melhor a gente ir embora — Elena foi dizendo e já foi se levantando.

— Não, Elena. Por favor. — Ele indicou a cadeira para que ela voltasse a se sentar. — Eu trabalho, sim, naquele hospital de ricos, e aqui também, comecei faz umas três semanas.

Elena se detestou por pensar, enquanto o filho estava doente, que Luís Filipe ficava ainda mais sexy usando aquele jaleco.

— Então você deve ser o Davi — ele falou, dirigindo-se ao garoto, que acenou. — E o que você tem? — O médico continuou falando com o paciente e Elena esperou um pouco que Davi respondesse alguma coisa, mas como sempre acontecia diante de pessoas desconhecidas, o menino se encolheu e apenas balançou a cabeça de um lado para o outro, depois começou a chupar o dedo.

— Ei, sem chupar o dedo — Elena pediu, puxando delicadamente o braço de Davi. — Ele teve febre, não dormiu, comeu pouco e vomitou esse pouco.

— Ok, vou examiná-lo ali. — Apontou para a maca no canto da sala; se levantou e chamou Davi para acompanhá-lo; ele tinha um jeito muito amável com o garoto, Elena não pôde deixar de notar a maneira afetuosa como ele falava, como tentava incluir Davi na conversa ainda que dirigisse as perguntas à mãe. No final do exame, o médico voltou para sua cadeira e Davi se sentou do lado da mãe.

— Então, o que ele tem?

— Uma virose — Luís respondeu tranquilamente, mas o revirar de olhos de Elena não passou despercebido. — Algum problema?

— Uma virose. Tem certeza? — Luís franziu o cenho, não sabia se Elena estava duvidando de seu diagnóstico porque era cética por natureza ou se era uma questão pessoal. De qualquer forma, não era uma situação muito confortável e ele ficou dividido entre responder com diplomacia como faria com uma paciente normal, ou questionar Elena sobre aquele comportamento infantil, afinal, foi ela quem terminou.

— Tenho, sim — optou pela diplomacia e ainda sorriu enquanto pegava o bloco de receituário. — Vou passar um remédio pra náusea, caso ele volte a vomitar, e algo pra febre. — Elena coçou a cabeça e balançou o pé, já não tinha dado antitérmico ao filho e não tinha resolvido o problema? — O resto você sabe, repouso, bastante água, comida leve. Se por acaso ele sentir alguma coisa a mais, você pode me ligar.

Elena não conseguiu ficar indiferente quando ele entregou a receita, encarando-a. Não podiam simplesmente fingir que nada tinha acontecido entre eles; tinha admirado o autocontrole de Luís, conduzindo a consulta com tanto profissionalismo, mas até ele bombeou naquele momento e deixou rolar um clima.

— Obrigada.

Eles continuaram se encarando e foi só o fungado de Davi que desfez aquela ligação. Elena se levantou e chamou o filho.

— Davi, agradeça o dr. Luís.

— Obrigado, doutor.

Luís se levantou e deu a volta na mesa, se ajoelhou para ficar da altura de Davi e estendeu a mão para ele.

— Disponha — disse apertando a mão do garoto. Depois acompanhou mãe e filho até a porta.

Elena deu dois passos em direção à saída, então parou. Era ridículo, mas não conseguiu se segurar, uma parte de si gritava para que jogasse na cara dele que ela estava certa ao terminar tudo. Se virou novamente para Luís, que ainda estava na porta.

— Muito bonita a moça que estava você — disse, usando mais a expressão facial do que as palavras para transmitir a mensagem.

— Hm, sim, ela é mesmo muito bonita — Luís respondeu com a tranquilidade de quem comenta sobre o azul do céu. Pôde ver Elena franzir o cenho e tentar disfarçar uma careta; então ela voltou a lhe dar as costas, mas antes que ela se afastasse totalmente, ele a chamou de volta: — Elena? Era minha irmã. A garota comigo na foto é minha irmã.


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