Ad Redemptio escrita por Glasya


Capítulo 7
Não Nos Deixe Cair em Tentação


Notas iniciais do capítulo

Atenção! Este capítulo possui teor sexual!



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— Ministro Frollo, encontramos a bruxa! — O Sol já havia se posto há bastante tempo quando recebeu a notícia.

 

— Ótimo. Dê-me a chave da cela dela, irei vê-la imediatamente.

 

— Ela não está presa, senhor.

 

— O que!? — Outra pontada de raiva lhe escapa entre os dentes, e precisou segurar firmemente as mãos em frente ao corpo para conter o impulso de agredir o capitão da guarda. — Posso saber o por quê, senhor capitão?

 

— Ela pediu santuário em Notre Dame, vossa excelência.

 

— É claro que pediu… — Frollo murmurou, revirando os olhos. Sempre pediam. — Eu assumo daqui. Está dispensado por hoje.

 

Frollo passou a mão nervosamente na cabeça, colocando para trás os fios de cabelo que insistiam em cair sobre seu rosto. Vestiu sua túnica, que a esta altura já estava seca, selou Bola de Neve¹ e seguiu para Notre Dame. Entrou na catedral com passos firmes e apressados, aproximando-se dos pedintes que circulavam o altar como moscas. 

 

— Onde está a cigana que chamam de "Madame Gothel"?

 

Os mendigos se entreolharam, confusos e assustados.

 

— Eu não irei repetir. Respondam, ou-

 

— Procurando por mim? — A voz da bruxa parecia possuir melodia mesmo quando não estava cantando.

 

De trás de uma pilastra ela surge, mantendo-se semi oculta pelas sombras da catedral. O ministro se aproximou, deixando os infelizes no altar, adentrando a escuridão onde Gothel o esperava. Ela recostou-se em uma parede e colocou os braços para trás; mesmo no escuro, sua presença provocou em Frollo os mesmos tremores que provocou às claras. Abriu a boca para falar, mas seus olhos involuntariamente correram o corpo da mulher, observando os quadris largos e a marca dos seios através do tecido de sua camisola branca². 

 

— Quanta falta de decência na casa do Senhor! — O juiz virou o rosto abruptamente. — Vista-se, mulher!

 

— Vou me vestir assim que minhas roupas secarem. — Ela apontou para o banco onde havia estendido seu vestido — Aquela tempestade não perdoou ninguém! Acredita que o vento quase levou minha cesta?  Tive que correr atrás dela pelas ruas, foi horrível… Sorte a minha que pessoas bondosas me ajudaram a reaver meus pertences antes que eles se espalhassem por aí!

 

— Eu não poderia estar menos interessado nas desventuras de uma cigana. — Cuspiu a última palavra com desprezo.

 

Pela visão periférica Frollo sabia que ela gesticulava amplamente, mas não se atrevia a olhar e correr o risco de sua mente divagar para pensamentos torpe envolvendo a bruxa seminua. 

 

— Vim levá-la sob custódia por bruxaria e sacrilégio.

 

— Hum? Vossa excelência poderia falar sem murmurar? Eu detesto murmúrios, não consigo entender nada!

 

— Como ousa me responder!? — A força da raiva o fez voltar seus olhos à Gothel. — Acaso sabe com quem está falando!?

 

— Mas é claro que sei. O senhor é o ministro da justiça… Juiz Claude Frollo.

 

De repente, seu nome pareceu muito mais bonito; ouví-lo saindo dos lábios da cigana fez um arrepio correr por sua espinha. Se perguntou que tipo de feitiço poderoso ela o havia lançado para atingí-lo dessa forma. Sentia borboletas em seu estômago e um rubor ameaçava subir novamente à sua face… Engoliu em seco. Precisava se manter firme.

 

— Vou relevar a insolência desta vez, mas fale mais alguma gracinha e adicionará desacato à sua lista de acusações.

 

— O que estou tentando entender, vossa excelência, é que acusações seriam essas.

 

Ela deu um passo à frente, em direção ao juiz. O instinto de Frollo quase o fez dar um passo para trás, mas se conteve. Não deixaria que a bruxa o intimidasse.

 

— Bruxaria e sacrilégio! — Sua voz saiu alguns tons mais altos do que planejou, mas servia bem ao intuito.

 

— Bruxaria? Ora meu senhor, aquela apresentação não foi nada além de um pouco de prestidigitação… 

 

Ela seguiu explicando sua técnica de engodo, mas tudo em que ele conseguia prestar atenção era na maneira fluida com a qual ela gesticulava, na textura suave de sua pele, nos cachos negros e volumosos que brilhavam mesmo sob tão pouca luz, no colo macio que sua camisola de seda revelava parcialmente e que desejava tanto pôr as mãos… 

 

— Basta! — Disse, tanto para si mesmo quanto para ela. — Além de bruxa, é uma enganadora, e está profanando a casa do Senhor com sua indecência! 

 

— Já disse que minhas roupas estão molhadas, ora essa! — A mulher levou as mãos à cintura, demarcando ainda mais a curva de seu quadril avantajado. — E além do mais, não se pode punir alguém por algo feito durante a Festa dos Tolos. Está na lei.

 

— Quanta petulância! Uma bruxa que acha que entende de leis! — Frollo deu um passo em direção à ela, erguendo um dedo ossudo em direção à seu rosto. — Pois EU sou a lei! E sei que é uma forasteira sem documentos que vaga pela cidade lendo mãos e vendo o futuro!

 

— Como ministro o senhor é um ótimo fofoqueiro, hein? 

 

Viu um riso de escárnio se formando nos lábios de Gothel, e aquilo o enfureceu ainda mais. Estava prestes a dar-lhe voz de prisão por desacato³, mas de repente a Jezebel⁴ mudou drasticamente sua atitude; Frollo observou estupefato enquanto a mulher o abraçou, comprimindo seu corpo contra o dele.

 

— Oh, vossa excelência! — Sua voz tomou um tom choroso. — Se eu fosse uma bruxa, usaria meus poderes em benefício próprio ao invés de ler fortunas em troca de moedas para ter o que comer! Oh, pobre de mim! Uma bruxa certamente já teria roupas secas à esta altura!! Tenha piedade desta pobre alma desafortunada!

 

O cheiro de cravo e rosas vermelhas inundou suas narinas, e não pôde conter o impulso de aproximar o rosto dos cabelos dela para melhor sentir a fragrância. Seus braços envolveram a mulher como que movidos por vontade própria, enquanto os fios negros lhe faziam cócegas no nariz. Só se deu conta do que estava fazendo quando sentiu a pressão das coxas dela contra sua virilha. Segurou-a firmemente pelos ombros e a afastou abruptamente.

 

— Recomponha-se, mulher! — Pensamentos impuros começaram a invadir sua mente, e já estava ofegante. 

 

Distanciamento era o que precisava, mas Gothel não parecia concordar. Ela deslizou os dedos sobre os braços de Frollo, e de repente suas mãos já não eram mais tão firmes. O juiz tentou dar um passo para trás, mas suas costas encontraram uma pilastra. Estava encurralado entre a súcubo e o concreto, e seu coração não parava de palpitar; ela deu outro passo à frente, colando novamente seus corpos um no outro.

 

Sentiu uma das mãos da mulher correr por sua nuca, e pôde jurar que suas pernas cederiam naquele momento. Os lábios vermelhos se aproximaram dos seus e os e cobriram novamente, trazendo de volta o rubor que havia queimado seu ser durante a Festa dos Tolos. A língua dela encontrou a sua, fazendo-o fechar os olhos para saborear o momento. Havia cedido ao feitiço da bruxa, afinal.

 

Passou as mãos pela cintura dela, descendo até seus quadris, puxando-a em sua direção pela base da coluna. E então desceu um pouco mais e acariciou, massageou e apertou as nádegas amplas e macias das quais não conseguia retirar os olhos mais cedo. No fundo de sua alma sabia que queria aquilo, o que só tornava tudo ainda mais pecaminoso.

 

***

 

Desde que o juiz pisou naquela igreja, Gothel sabia que que ele estava no papo. Já se aproximou devorando-a com os olhos, e suas tentativas de fingir que não eram no mínimo risíveis. Enquanto ela falava, ele se perdia, calado, a mente claramente muito longe dali… Ou melhor dizendo, muito mais perto. Ele não havia vindo até ali para discutir, ele sequer tinha o que argumentar. Ela via a força de vontade do juiz cedendo conforme suas tentativas de impor sua autoridade falhavam. Ele não poderia prendê-la enquanto estivesse no santuário, e qualquer tentativa de "cerco" falharia agora que ela tinha aliados entre os ciganos para lhe trazer o que precisasse.

 

Ele a olhava com fúria, mas também com algo a mais. Gothel conhecia muito bem aquele olhar. Sabia o que ele queria, e era exatamente o que ele teria. Se jogou nos braços dele, encenando um choro convincente e digno de pena. 

 

"Pobre homem de carne fraca…" — Gothel sorriu, enfiando o rosto na túnica de Frollo.

 

— Recomponha-se, mulher! — Ele a afastou subitamente, mas não foi nada convincente; o corpo inclinado para frente, os olhos que encaravam sua boca com frequência, a respiração em ritmo acelerado, as mãos que tremiam e apertavam seus ombros como se quisessem mais agarrá-la do que de fato afastá-la… Uma vitória fácil.

 

Deslizou uma mão pelo braço do juiz até seu rosto, acariciou-lhe o pescoço e enfiou os dedos entre seu cabelo. Sentiu as mãos ossudas do homem deslizarem por suas costas enquanto o puxava para um beijo longo e intenso.

 

O beijo do ministro era desajeitado e tímido, quase como o de um garoto inexperiente, e ele claramente não sabia o que fazer com as mãos; ele apenas a apertava e puxava descontroladamente para si, quase como uma súplica, fazendo Gothel se perguntar se ele ainda era virgem. A julgar pela vida que levava e pelo seu histórico com mulheres, ela não duvidava de que a resposta fosse positiva… Ou talvez apenas fizesse tanto tempo que não fazia diferença.

 

Com a mão livre, Gothel alcançou a virilha de Frollo e mesmo por cima das várias camadas de tecido, pôde sentir sua rigidez pulsante. Sorriu maliciosamente ao ver que o homem tinha bem menos a compensar do que ela havia presumido.* Os movimentos de sua mão eram rápidos e precisos, enquanto sua língua percorria o caminho do pescoço do juiz até o lóbulo de sua orelha. Ele suspirou e ofegou sob seu toque, e Gothel estava começando a verdadeiramente se entreter com aquilo. A voz de Frollo era grave e profunda, proporcionando gemidos que ela classificaria como… Surpreendentemente bons de se ouvir.

 

Ele agarrou seu cabelo com força, enterrando o rosto em seu pescoço enquanto respirava profundamente. Ele era puro instinto, e possuía uma força surpreendente para um homem tão magro. Gothel ouviu o ar escapar dos pulmões do juiz todo de uma vez com um derradeiro gemido, as pernas trêmulas apoiando-se na parece para não cederem, e a umidade pegajosa que atravessava o tecido e atingia sua mão. 

 

Ela inclinou-se para o banco onde havia estendido as roupas molhadas, apanhou o chapéu do ministro e o ajustou na cabeça do pobre homem que jazia exasperado contra a enorme pilastra, encarando-a com um misto de fascínio e horror.

 

— Não esqueça seu chapéu, vossa excelência. — Ela disse, com um sorriso malicioso nos lábios.

 

Ele não respondeu. Não disse sequer uma única palavra. Apenas afastou abruptamente a mão de Gothel, derrubando o próprio chapéu ao chão; afastou-se dela como se tivesse visto o próprio diabo, tropeçando em direção à porta da catedral.

 

— Oh, será que foi algo que eu disse? — Com uma gargalhada, recolheu suas roupas há muito já secas e as vestiu. Vestiu também o chapéu de Frollo, chegando à conclusão de que este lhe servia muito bem. Com essa nova fase de seu plano concluída, só lhe restava fazer-lhe uma visita… Ele já era seu, e em breve a pedra filosofal também seria.


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Notas finais do capítulo

¹"Bola de Neve" (Snowball) é o nome do cavalo de Frollo, revelado pelos diretores do filme em uma entrevista. Por que alguém nomeria um cavalo preto assim, é um mistério.

²Antes das calcinhas modernas ou das calçolas do século XIX, as mulheres usavam uma espécie de camisolão branco por baixo de seus vestidos, e nada mais. Quando menstruadas, algumas amarravam panos de linho na cintura como uma espécie de "fralda", outras apenas colocavam panos de linho dobrados entre as pernas e os seguravam com as coxas, extremamente desconfortável e pouco prático.

³A expressão "desacato" só foi surgir no direito penal após o século XVII, onde a laicidade do Estado finalmente entrou na moda. Antes disso, quando os cargos que seriam "públicos" eram ocupados por membros do alto clero, os crimes correspondentes seriam apostasia, heresia, sacrilégio e etc, pois acreditava-se que desrespeitar um membro da Igreja era também desrespeitar à deus.

⁴Jezebel (ou Jezabel) foi uma princesa fenícia que se casou com Acabe, rei de Israel. Ela quase erradicou o culto a Yhwh, substituindo-o por sua fé ao deus Baal, tamanha sua influência política e religiosa na região. Assim como Helena de Tróia (e a guerra de Tróia como um todo), não há evidências históricas concisas sobre sua existência, podendo muito bem se tratar de mais um romance histórico do que uma crônica histórica precisa.

*Apesar da piada, ter pênis grande na idade média era considerado vulgar e animalesco. O "pau grande" só entrou na moda a partir do século XIX. Até então o "educado" e "viril" era ter um pênis pequeno. Tanto que as estátuas e pinturas que representam o "corpo masculino perfeito" nunca têm um pênis maior que poucos centímetros, enquanto representações gráficas de animais, bárbaros e demônios sempre exibem uma forma fálica gigantesca.



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