Universo em conflito escrita por Mallagueta Pepper


Capítulo 58
A vida pode seguir seu rumo




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Após ajudar a arrumar a bagunça (graças ao pedido educado de Toni), os rapazes foram embora ainda comemorando o sucesso da missão e consequente queda da Vinha. Cebola ficou sozinho olhando a internet a procura de notícias e não ficou decepcionado.

“Quarenta e cinco corpos foram encontrados em instalações debaixo da sede da Vinha. A polícia acredita que sejam os membros do conselho que desapareceram há vários dias juntamente com prefeitos, governadores e outras pessoas influentes. A identificação dos corpos será feita...”

Ele ficou satisfeito porque Boris fez tudo parecer uma denúncia anônima. Assim eles não iam ter problemas. Ao abrir outra reportagem, ele leu que a polícia suspeitava do envolvimento de Agnes, já que segundo depoimentos foi ela quem mandou as cartas marcando a reunião.

Em outra notícia, ele viu que ela ainda estava desaparecida juntamente com Penha e uma mulher estranha chamada Berenice. Eles nem sonhavam com o que tinha acontecido com elas e nunca iam saber.

O som de alguém batendo na janela do quarto chamou sua atenção e ele deu um grande sorriso ao ver quem era.

— Caramba! A gente tava preocupado com você!

— Agora eu tô melhor que nunca. Não notou nada de diferente não? – Ângelo entrou e ficou de costas para o Cebola intencionalmente.

— Suas asas ficaram brancas! Você voltou a ser anjo da guarda?

— Haha! Nem eu tô acreditando! – ele ajeitou a auréola sobre a cabeça e balançou as penas se deleitando com sua brancura.

— Poxa, parabéns então!

— Valeu, cara. Não teria conseguido sem a ajuda de vocês. A Dona Morte ficou orgulhosa de mim! Ela sempre fica feliz quando um de nós é promovido. E ainda fiquei livre dos petelecos dela!

Cebola notou que a cicatriz no rosto dele tinha sumido, ele não se vestia mais de preto e apesar dos cabelos ainda curtos, ele se parecia bem mais com o Ângelo original. E falando da Dona Morte, ainda havia outra pergunta.

— O que foi feito daquelas três? Fala aí!

— Foi o seguinte. – ele se sentou na cama e contou tudo o que tinha acontecido depois que foi sugado pela porta de Umbra.

Flashback

A sensação foi a de ter sido jogado dentro de uma máquina de lavar. Ele rolou em várias direções e estatelou no chão atordoado e com a visão duplicada. Agnes foi jogada para mais longe junto com Penha e tudo ficou escuro. Quando despertou, Dona Morte estava de pé diante dele.

— Levante-se. Tudo está bem agora.

Curiosamente, ele não sentia mais dor, cansaço, nada. Era como se suas energias tivessem sido renovadas.

— Tô me sentindo estranho...

— Você mudou. Com o tempo irá se acostumar novamente.

— Acostumar com o quê? – Só então ele reparou que tinha algo sobre sua cabeça e soltou um grito de alegria ao ver que era sua auréola. E quando viu que suas asas estavam brancas, ele pulou várias vezes, deu socos no ar e só não abraçou Dona Morte por medo de parecer inadequado.

— Você mereceu, pois se sacrificou por seus amigos sem se preocupar consigo mesmo. Finalmente você lembrou o que significa ser anjo da guarda.

— Valeu mesmo, Dona Morte! Vou dar o melhor de mim, pode acreditar!

— Assim espero. Se eu vê-lo novamente entre meus emissários, serei dez vezes mais rigorosa com você.

— Glup! – para disfarçar o desconforto, pois sabia que ela falava sério, ele perguntou. – E a Agnes? Cadê ela?

A morte virou o rosto em direção ao lago e Ângelo viu seu barco com três ocupantes. Sentada no chão estava Berenice, com os braços apoiados nos joelhos, cabeça baixa e cabelos totalmente brancos. No banco estavam Agnes e Penha. Agnes tinha voltado a sua forma humana e Penha estava inclinada em seu colo sendo protegida como uma criança pequena. Os ferimentos dela eram bem feios, mas a moça parecia não se importar. Nenhuma delas falava nada, nem se rebelava contra seu destino.

— Eu as levarei a um local adequado. Tudo está terminado agora. – A morte caminhou para o lago e quando entrou no barco, a foice se transformou num remo e ela levou as três almas longe dali.

Fim flashback.

Cebola se lembrava bem dessa cena, pois tinha visto a mesma coisa acontecendo com Berenice e a menina do lago.

— Ufa, então a gente tá livre delas! O ruim é que todo mundo vai pensar que elas estão foragidas.

— Não tem jeito. Em uma situação normal Dona Morte poderia deixá-las sair pra separar os espíritos dos seus corpos. Mas como venderam suas almas, nem ela seria capaz de tirá-las dali. 

Ele não se importou com isso. O importante era ter três grandes ameaças fora da Terra.

— O bom é que a Serpente não apareceu. – o rosto do anjo se anuviou.

— Ela ainda pode voltar.

— Pode? Mas agora não tem nenhum cavalo! Quer dizer, tem eu, só que não vou querer fazer parte disso.

— Outros cavalos podem ser escolhidos e ela fará isso com o tempo. Você terminou de decifrar os códigos do Sr. Malacai e agora sabe do que precisa para derrotar a Serpente.

— Ih, é muita coisa, vai levar meses pra arranjar tudo!

— Então comece o quanto antes e estejam prontos porque a Serpente pode voltar a qualquer momento. Vocês vão precisar da Magali, só que ela não sabe usar seus poderes corretamente.

— Vou conversar com a Tia Nena e falar isso pra ela. Não tem jeito, ela vai ter que dar um jeito de ensiná-la.

Os dois conversaram mais um pouco, Cebola ofereceu alguns salgados que tinham sobrado da festinha e depois que Ângelo foi embora, ele ficou ali pensando.

Depois que tudo passou, até que a experiência não tinha sido ruim. Ele aprendeu muitas úteis, inclusive a forma de derrotar a Serpente. Ele com certeza ia levar aquele conhecimento para o mundo original e reunir a turma para que eles pudessem se preparar.

Ele deu um grande sorriso. Se conseguisse derrotar a serpente, Mônica ia achá-lo um grande herói e poderia se apaixonar por ele de novo, esquecendo aquele babaca do DC. Por que não?

“Hehehe! Hora de bolar uns planos!”

Daquela vez não tinha como dar errado.

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Na casa da Carmem, os preparativos para a festa corriam bem. Ela acompanhava tudo apontando qualquer defeito e exigindo sempre mais coisas.

— Tem que ter muitas teias de aranha! E esqueletos pendurados no teto. Credo, esse morcego aí é de papelão? Que pobreza!

Suas amigas olhavam seus celulares acompanhando as notícias, coisa que geralmente não gostavam de fazer a não ser que fosse sobre moda, beleza ou fofoca.

— Gente, olha que babado! – Irene falou. – Tá todo mundo revoltado com a Vinha!

— Já estão até falando em fechar tudo! Ai, tomara viu? – Maria Mello falou dando pulinhos de alegria junto com Isa.

— Nossa, vai ser tão bom!

Carmem deixou os preparativos de lado por um tempo para ler as notícias.

— E não é que o plano dele deu certo mesmo? Gente, nem acredito! Nunca mais vou ter que tingir meus lindos cabelos de preto!

— Vou cortar os meus de novo! – Irene falou. – E tingir de volta pro loiro!

— Também vou tingir os meus de loiro!

— Os meus vão ficar grandes de novo daqui a um tempo! Vou poder ser modelo!

Elas deram um gritinho para comemorar, quase estourando os tímpanos do pessoal que fazia os preparativos para a festa.

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O dia passou depressa e finalmente chegou a tão esperada festa da Carmem. Os convidados chegavam em grupos conversando animadamente. O jardim estava iluminado com lanternas em forma de fantasmas, caveiras e abóboras que faziam um caminho até a entrada do salão de festas, onde dois seguranças coletavam os convites.

O salão estava decorado no melhor estilo festa de Halloween. Grandes teias de aranha desciam do teto, juntamente com esqueletos, morcegos e fantasmas. Cortinas rasgadas feitas de tecido semitransparente enfeitavam as janelas e balançavam com o vento. Havia também galhos secos em vasos de plantas, vassouras de bruxa e imitações de insetos em toda parte.

A mesa de comes e bebes tinha candelabros assustadores, lápides de isopor que pareciam de verdade e muitos docinhos em forma de globos oculares, cupcakes com insetos feitos de pasta americana, biscoitos de chocolate decorados com vários pequenos olhos de chocolate branco com íris de chocolate ao leite, croissants que imitavam múmia, bolinhas de queijo em forma de aranhas e biscoitos em forma de dedo humano, com unha feita de amêndoa. 

Havia até um grande pote com chocolates em forma de crânio enrolados em papel alumínio de várias cores e um ponche verde bem vibrante sendo servido em taças com pequenos olhos de gelatina espetados em palito de dente. Alguns convidados ficaram um tanto enojados com o realismo daquela comida, outros comiam sem problema algum. Magali pertencia ao segundo grupo.

Ela tinha chegado junto com Cascão, Mônica e Cebola, todos felizes e animados. Depois de terem salvado o mundo, eles bem que mereciam um pouco de diversão.

Mônica e Cebola ficaram se olhando com cara de bobos.

— Nossa, sua fantasia tá muito legal! – ela elogiou a fantasia de zumbi do rapaz.

— E você ficou muito linda... cof cof... quer dizer, sua fantasia tá muito boa.... – ele se atrapalhou todo e ela deu uma risadinha com o rosto vermelho.

O resto do pessoal foi chegando. Jeremias com Aninha, Dorinha, Keika, Marina e Franja. Quim também veio com a namorada dele e Magali não sentiu nem um pouco de ciúmes, pois estava feliz com o Cascão. Sarah estava com sua fantasia de policial e algemas na mão pronta para pegar algum gatinho que estivesse dando sopa na festa.

— Essa festa tá bombando! – Luca falou girando sua cadeira de roda ao ritmo da música. Tikara e Nimbus também dançavam felizes enquanto comiam um prato de salgadinhos cada um enquanto DC estava ocupado paquerando uma garota que tinha ido vestida de bruxa.

Quando finalmente conseguiu tirar Magali da mesa de comida, Cascão a chamou para dançar. Felizmente para ela, ele tinha decidido ir de guerreiro Jedi ao invés de Bombril. Assim ficava mais fácil dançar abraçado. Vendo os dois dançando, Cebola viu que Mônica também esperava uma atitude da sua parte. Bem... que mal poderia haver numa dança? E aquela musica nem era lenta, algo que parte dele lamentava muito.

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Denise chegou com sua fantasia de Freddy Krueger e foi saudada pelas meninas.

— Nossa, você tá arrasando nessa fantasia! – Cascuda cumprimentou.

— Valeu gente.

Elas perceberam sua tristeza, apesar de tentar parecer alegre. E ela estava mesmo triste. A conversa que tivera com Toni naquele dia foi difícil e desgastante. O rapaz não parava de recriminá-la por ter ido junto com os outros ao invés de ficar em casa com as meninas.

Embora soubesse que ele estava certo, ela não ia aceitar de jeito nenhum que ele lhe desse bronca daquele jeito. Seus pais e suas amigas já tinham feito o serviço muito bem feito e ela não estava com paciência para mais recriminações.

— Olha gato, o que tá feito, tá feito. Tudo passou e terminou bem.

— Mas... você errou e...

— Tá, eu errei e já pedi desculpa pras meninas, porque foi com elas que eu vacilei.

O rosto dele ficou sombrio.

— Você não somente vacilou, também causou uma tragédia!

— Tragédia? Pirou na batatinha? – ela ficou escandalizada. – O mundo tá salvo, esqueceu?

— Mas por sua causa, Penha acabou sendo levada pro outro lado sem necessidade. Consegue imaginar a dor que os pais dela devem estar sentindo?

Aquilo lhe atingiu em cheio, pois até então não tinha pensado nisso. Se Magali tivesse conseguido derrotar Agnes, tudo teria sido evitado. Berenice já estava fora do jogo e Penha era praticamente inofensiva contanto que não tocasse ninguém. Só que Magali não pode fazer nada porque tinha lhe dado seu talismã. Sem isso, Denise teria morrido quando Agnes absorveu a energia de todos.

Ela sacudiu a cabeça para se livrar daqueles pensamentos e falou tentando não chorar.

— Agora você vai ficar jogando isso na minha cara, é? Acha que eu quis mandar a Penha pro outro mundo? Que eu fiz de propósito? Quer saber? Vai plantar batata que eu não vou ficar ouvindo isso não!

E saiu correndo e chorando, deixando-o no meio da rua chamando seu nome. Ser responsabilizada pelo fim da Penha lhe deixou muito magoada, embora sua consciência a acusasse disso. Ainda assim ela tentou não se deixar abater, ou acabaria enlouquecendo, e foi à festa da Carmem para ver se distraia a cabeça. E ainda vestiu a fantasia sem a calça legging deixando as pernas de fora porque decidiu que ia radicalizar naquele noite.

— Ah, gente! Vamos cair na ferveção que é melhor! – ela falou se animando e foi dançar, sendo seguida pelas amigas.

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Do lado de fora, Manezinho tentava convencer Toni a entrar de todo jeito.

— Vamos lá, cara! Vai deixar de se divertir só porque sua namorada te deu um fora?

— Não tô animado pra isso. Vá você, eu vou pra casa.

— Há! Vem com essa! Se você não quisesse vir, nem teria saído de casa! Até fantasia você colocou, agora vai entrar de qualquer jeito!

Manezino o puxou pelo braço e Toni o seguiu de má vontade. Ele ainda estava magoado pelo fim do namoro e não sabia se queria ver Denise tão cedo. Eles foram até o Cebola, que se divertia com a Mônica. O outro logo viu seu abatimento e com uma troca de olhares, ela foi conversar com as amigas e Manezinho acabou sendo encontrado pela Carmem que o arrastou pelo salão para dançar.

— E aí, cara? Deu ruim, não foi? – Cebola perguntou lhe dando um copo de refrigerante.

— A gente terminou. Quer dizer... ela terminou comigo só porque eu falei da Penha.

— Ué, o que tem a Penha?

— Você esqueceu? Ela foi mandada pro outro lado por causa da Denise!

Após ouvir a explicação, Cebola balançou a cabeça negativamente.

— Não foi a toa que ela te deu um chute. Que vacilo!

— Vacilo? – Toni rugiu fazendo Cebola se encolher um pouco, mas ele não recuou.

— Sim, vacilo! A gente não tem como saber como teriam sido as coisas se Denise não tivesse ido, então não fica inventando!

— Só que a Penha...

— Bah, até parece que você morria de amores por ela! Escuta, – Cebola falou muito sério. – sei que isso vai parecer cruel, mas a Penha ter ido pro outro mundo foi melhor.

— Melhor? Como melhor?

— Porque se ela tivesse ficado, teria dado um jeito de trazer Agnes de volta. E ela ainda tinha o poder de fazer as pessoas se matarem. Não dá pra ter alguém assim andando por aí ameaçando todo mundo.

— Mas...

— Ô, larga de ser vacilão! A Denise mandou mal, mas tudo ficou de boa no fim! Vai estragar seu namoro por causa disso?

Toni abaixou os olhos e Cebola notou que havia algo mais.

— Não só foi por isso, foi?

— Er... bem... é que a Denise é independente demais... só faz o que quer.

Ele pareceu ter matado a charada.

— Tô sabendo! E lá na Vinha eles viviam falando que mulher não pode ser independente, não pode isso, não pode aquilo! Eu heim, aquele povo vivia na idade da pedra e você tava indo pelo mesmo caminho! Tira essas ideias da cabeça ou garota nenhuma vai te querer!

E o deixou ali cismando consigo mesmo e foi dançar com a Mônica já que a companhia dela era muito melhor. De longe, ele viu Denise dançando com as amigas usando aquela fantasia que deixava suas pernas de fora. Outros rapazes estavam de olho e seu sangue ferveu de ciúme. Se continuasse daquele jeito, era bem capaz dela terminar a noite acompanhada com outro e aquilo não podia acontecer.

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Denise dançava alegremente ao som da música e não percebeu que alguém aproximou dela por trás.

— E aí, gata? Quer dançar? - ela levou um susto ao dar de cara com um rapaz fantasiado de palhaço assassino. Aquilo teoricamente deveria ser assustador, mas ficou patético porque a roupa era mal costurada, a máscara deve ter sido comprada em alguma loja de 1,99 e aqueles tufos vermelhos sobre a cabeça pareciam cabelo de boneca. O rapaz levantou a máscara e ela viu que era o Xaveco.

— Aff, só podia ser você nessa fantasia tosca. Me deixa dançar sossegada que é melhor.

— Ei, qualé? Ainda tá zangada comigo? Só uma dança, vai! E talvez uns beijinhos.

— Não tô interessada.

Ela ia saindo quando ele segurou seu braço, deixando-a irritada.

— Tira a mão de mim senão eu enfio a minha na sua cara!

— Poxa, Denise, faz isso não! Você tá aqui sozinha, sem ninguém, por que não fica comigo?

—Porque ela tá comigo! - uma voz rosnou atrás dele, fazendo-o gelar na hora.

Xaveco virou para trás tremendo como vara verde e quase molhou as calças ao dar de cara com Toni olhando para ele como se fosse lhe dar uma surra.

— Tá mexendo com a minha namorada por quê?

— Mexendo com ela? Eu? Nãaaoooo! Eu tava só perguntando as horas e... por favor não me mate! - e saiu dali correndo com o rabo entre as pernas.

Denise olhou para ele admirada, pois não esperava vê-lo ali na festa. Ainda mais vestido de cowboy. Ele usava camisa xadrez, chapéu, botas de couro, calça jeans e por cima uma calça para montaria imitando couro. Para completar, um cinto com uma grande fivela oval. Ela não imaginava que ele poderia ficar tão bem usando aquela calça apertada que mostrava suas pernas grossas e bem torneadas. Ah, tentação!

— Er... oi... - ele cumprimentou bastante sem jeito.

— Resolveu aparecer, foi?

— Bem... sim... eu... - ele engoliu, esfregou a nuca e disse. - Me desculpe. Eu não devia ter dito aquelas coisas e...

Ela virou os olhos, ficou na ponta dos pés e lhe deu um beijo, deixando-o desnorteado.

— Vem dançar, gato. A festa tá fervendo e temos que aproveitar.

— Mas... - ele ia protestar e desistiu. Afinal, aquela era Denise, a garota maluquinha por quem tinha se apaixonado. Eles ainda precisavam acertar muitas coisas, mas Toni sentia que estavam no caminho certo.

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Carmem dançava pendurada no pescoço de Manezinho e ele parecia não se importar nem um pouco. Cascão e Magali também dançavam quando ela não estava agarrada à mesa de guloseimas. Os outros casais também aproveitavam a festa, até Cascuda com o namorado dela. Pelo visto, eles tinham se acertado e o rapaz entendeu que não precisava entupi-la de sorvete para agradar.

Ver tantos casais ao seu redor estava complicando um pouco sua vida porque ele não sabia o que fazer com a Mônica. Beijá-la pareceu ter sido uma excelente ideia na hora, mas isso tinha feito com que ela criasse esperanças. O que fazer agora? Ele tinha sentimentos por ela, claro, pois era a Mônica, ainda que fosse um duplo. Mas ela não era a SUA Mônica, a garota que ele amava de verdade.

— Parece que tudo vai ficar bem agora, né? – ela perguntou dançando com ele. Pelo menos não era música lenta.

— Vai levar um tempo até tudo se ajeitar, mas a gente pode ficar de boa por enquanto.

— Por enquanto?

— Ainda tem uma coisa, mas eu vou falar com vocês depois. Hoje é dia de aproveitar a festa!

Eles continuaram dançando e Cebola não se lembrava de ter divertido tanto assim. O laço que unia os quatro estava se fortalecendo cada vez mais. Cascão tinha se tornado seu melhor amigo naquele mundo, Mônica e Magali estavam muito unidas e ele sentiu que aquela amizade era para a vida toda, como deveria ser.

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Uma semana se passou e várias coisas foram acontecendo. Com a barreira reequilibrada, as tragédias naturais começaram a desaparecer. Choveu pela primeira vez em um lugar onde não chovia há anos. O campo magnético terrestre estava voltando ao normal, o aquecimento global estava diminuindo e várias pragas que assolavam as colheitas foram contidas.

Os conflitos pelo mundo também estavam se amenizando e o crimes hediondos caíram bastante. As pessoas estavam ficando mais calmas e menos estressadas porque não havia mais a Penha para deixá-las malucas e com a barreira de volta ao normal, anjos da guarda e bons espíritos tinham mais influência sobre as pessoas.

Ângelo observava, junto com Dona Morte, várias ninfas, gnomos e elementais trabalhando com afinco para colocarem ordem em tudo. Eles iam ter muito trabalho pela frente.

— Vai demorar muito pra eles colocarem as coisas no lugar, não vai? – Ângelo perguntou.

— Algumas décadas se os humanos colaborarem.

— Pelo menos aquelas doenças malucas da Berenice estão desaparecendo.

— Com o tempo vão desaparecer e ficar só as doenças normais dos humanos. Pelo menos vai diminuir bastante o meu trabalho.

Eles voltaram a olhar os seres mágicos que cuidavam do equilíbrio da natureza e uma ninfa em particular lhe chamou a atenção. Ela usava um longo vestido enfeitado com flores, tinha belos cabelos prateados e olhos cor de violeta. O rapaz logo ficou animado.

— Hum... será que eles precisam de ajuda? Tem muita coisa pra fazer!

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Cebola estava correndo contra o tempo para deixar tudo pronto para o seu duplo. A casa estava muito bem arrumada, as contas em dia e ele fez anotações contando tudo o que tinha acontecido no tempo em que esteve ali com o máximo de detalhes que pode acrescentar. Até vídeo ele fez, tudo para que seu duplo pudesse saber o que estava acontecendo e assim não ter problemas. Ele só esperava que aquele babaca não estragasse tudo o que ele tinha feito com tanto trabalho.

Como ainda havia a questão da volta da Serpente, ele achou melhor ir resolvendo alguns assuntos que o outro não ia ter condições de resolver e para isso precisou dar um telefonema muito importante.

— E foi isso que aconteceu. – Cebola falou após contar tudo o que tinha acontecido no dia trinta e um.

— Céus, ela correu um perigo muito grande! – Tia Nena ficou aflita em pensar que sua sobrinha preferida podia ter morrido.

— É por isso que a senhora tem que ensinar os paranauê da magia pra ela.

Cebola explicou sobre a importância de lhe ensinar a usar seus poderes corretamente e até contou o que tinha acontecido com a Magali do seu mundo.

— Se ela tivesse aprendido a controlar seus poderes, teria derrotado o Cascão do mal numa boa. Mas como ainda não sabia, ele acabou fazendo sei lá o quê na cabeça dela e agora acho que seus poderes já eram. Nem sei como a gente vai fazer quando a Serpente voltar no meu mundo.

— Eu queria que ela levasse uma vida normal... Viver com tanto poder é difícil e desgastante.

— A Magali já mostrou que dá conta de controlar. Se a senhora ensinar, vai dar tudo certo.

Ela sabia que o rapaz tinha razão e por mais que quisesse que Magali vivesse longe daquele tipo de responsabilidade, Nena entendeu que havia um bem maior envolvido e ela não podia ignorar isso.

— Vou falar com a Magali. Ela aprenderá a usar seus poderes. O futuro da humanidade pode depender disso e não posso deixar de lado. 

Tendo encaminhado esse assunto, ele também procurou cuidar do grêmio estudantil. Depois de tantos escândalos e processos, a Vinha tinha desmoronado de vez e ele sabia que eles não iam conseguir se recuperar tão cedo, mas a ameaça ainda existia. O mundo continuava com grandes problemas e o conservadorismo ainda assombrava a sociedade. Era preciso ficar vigilante para não deixar que uma nova onda conservadora ameaçasse destruir a liberdade e o progresso.

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Após fazer as contas, Boris concluiu que aquele dinheiro era suficiente para lhe dar uma vida boa contanto que não fizesse extravagâncias. Além da sua parte da herança dos pais, também tinha a parte de Agnes. Por lei o dinheiro era dela, mas ela não tinha como reclamá-lo estando presa no outro lado.

“Finalmente vou ter a vida que sempre quis!” ele pensou sentindo-se feliz pela primeira vez em muitos anos.

A Vinha estava se despedaçando, pois já não tinha liderança alguma. Os membros remanescentes queriam que ele assumisse tudo, o que não ia acontecer jamais. Com o tempo ele esperava que aquela instituição maldita fosse desaparecer para sempre.

O que fazer com sua vida dali para frente? Trabalhar como diretor de colégio estava fora de cogitação. Licurgo que ficasse com aquela porcaria de cargo, pois ele ia procurar algo de que gostasse. Um emprego simples, que não o sugasse até os ossos como a Vinha fazia. Mesmo que isso significasse ganhar menos, ele não se importava. O importante era ter uma vida boa e tranquila. Quem sabe ele não podia até conseguir uma namorada? Era o seu sonho!

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Infelizmente as coisas não estavam boas para os pais da Penha, que sofriam muito com o desaparecimento da filha. Eles contrataram detetives, ofereceram recompensa e estavam fazendo de tudo para encontrá-la novamente.

Cebola sabia que todo aquele esforço era em vão e sentia pena deles, mas não havia nada que ele pudesse fazer. Não dava para lhes dizer que sua filha foi levada para o outro mundo juntamente com uma entidade maligna feita de sombras. Aquele casal ia ter que viver com aquela perda pelo resto da vida.

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A visita da tia Nena não era uma surpresa, pois Magali imaginava que ela ia querer mais detalhes do que tinha acontecido no subsolo da Vinha. Só que ela não era exatamente a pessoa mais indicada para contar a história toda porque tinha ficado desacordada durante a maior parte do tempo, só acordando no final. Para sua surpresa, no entanto, não era sobre aquilo que sua tia queria falar.

— Eu tenho um assunto muito sério para falar com você. É sobre quem você é e suas origens.

— Como assim? Eu já sei quem eu sou, ué!

A mulher sentou no sofá e fez a sobrinha sentar do seu lado.

— A história é mais complexa do que isso, querida. Eu vou te explicar.

À medida que tia Nena falava, Magali foi arregalando os olhos. Aquilo era mesmo sério? Ela era mesmo uma bruxa herdeira da Casa de Hécate? Poderes de verdade?

— Peraí! Então foi isso que aconteceu? Por que eu não lembro de nada? – ela perguntou quando sua tia terminou o relato.

— Existe uma frase de bloqueio que quando falada, tranca seus poderes dentro da sua mente e você esquece tudo que aconteceu. É uma trava mental.

Era difícil processar tudo aquilo. E pensando bem, a história que o Cebola tinha lhe contado pareceu um tanto incompleta, como se faltassem algumas partes.

— Ainda não entendo por que ninguém me falou nada.

— Porque eu pedi para que mantivessem segredo. Sinto muito, sei que não é justo. Mas seus poderes são perigosos demais quando saem fora do controle. A quantidade de conhecimento é tão grande que pode te enlouquecer em poucos minutos. É por isso que você precisa aprender a lidar com tudo isso antes de poder acessar seus poderes.

Apesar do receio, os olhos dela se iluminaram.

— Tá falando sério? A senhora vai mesmo me ensinar? – ela falou como se sua tia estivesse lhe prometendo um bolo gigante de chocolate com nozes e cerejas.

— Sim, mas vou logo avisando que esse é um assunto muito sério. Você precisa se dedicar de corpo e alma, estudar muito, treinar sua mente e o mais importante: manter segredo. Quanto menos gente souber, melhor. Tantos poderes trazem uma responsabilidade enorme e você terá que lidar com isso. Você ainda está disposta?

— Se a tal Serpente vai voltar pra tocar o terror, então eu tenho que fazer alguma coisa mesmo.

Tia Nena pegou suas mãos com carinho.

— Eu sei que você pensa em proteger as pessoas, mas é importante que queira fazer isso, pois a estrada será longa e difícil.

— Sei disso, tia, e quero mesmo entrar nessa. Se é o que sou, então eu quero entender melhor.

A mulher sorriu e deu um beijo em sua testa. Em seguida, lhe deu alguns livros para que começasse a estudar.

— Isso aqui é uma introdução. – Disse colocando um calhamaço nas mãos da sobrinha, que precisou fazer um grande esforço para não soltar uma careta. – À medida que você for avançando, lhe darei mais livros e ensinamentos. Anote suas dúvidas e me pergunte sempre. Eu não sei quanto tempo nós temos, então você precisa se dedicar totalmente. E cuidado para que seus pais não vejam esses livros. Eles não entenderiam.

Apesar de saber que teria de estudar muito e se esforçar, Magali não desanimou. Um mundo totalmente novo estava se abrindo para ela.


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