Universo em conflito escrita por Mallagueta Pepper


Capítulo 52
A hora está chegando




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O clima na escola era muito diferente. Os alunos conversavam alegremente, havia som de risadas nos corredores, música e até troca de beijos de alguns casais. Muitas garotas tingiram seus cabelos de volta para suas cores originais e os usavam soltos. Também havia cheiro de perfume no ar e revistas de moda, quadrinhos ou mangá circulando por toda parte.

Com o enfraquecimento da Vinha, os inspetores saíram das escolas para imensa alegria dos alunos. As manifestações estavam dando resultado e os processos contra a Vinha surgiam por todos os lados. Eles com certeza iam ter um grande prejuízo financeiro.

Outro assunto muito comentado no momento, além do fato de Agnes continuar à solta, era a grande festa de Halloween da Carmem e todos estavam muito animados. Quem recebeu um convite, ficou só na alegria. Quem não recebeu, só restava lamentar e chupar o dedo.

— Rapaz, a festa vai ser maneira! – Cascão falou feliz por ter sido convidado. – Nem acredito que ela deixou a gente ir mesmo!

— Vai ser muito legal! Assim a gente pode comemorar o conserto da barreira. – Mônica disse.

Cebola também estava otimista. Com os poderes da Magali, tudo ia ser resolvido e ele mal podia esperar para voltar para casa e reatar com a Mônica.

— Vocês já prepararam tudo pra amanhã? – Ele quis saber.

— Do meu lado já tá tudo pronto. – Magali respondeu.

— Eu também já arrumei tudo. – Mônica também disse.

— Ah, eu ainda tenho que ver umas paradas... ô, não vem me dar soco não!

— Seu lesado, você já devia estar com tudo pronto! Não deixa pra ultima hora senão dá problema. – Magali assumiu sua postura agressiva e depois deu um beijo na bochecha dele.

— Isso é importante, pessoal. A gente não deve facilitar. O lance vai ser perigoso porque Agnes pode aparecer com a Penha e a tal da Berenice. Não sabemos o que elas vão aprontar.

Eles foram pegar seu lanche na cantina. Pela primeira vez, a comida não estava tão ruim e tinha até fruta de sobremesa.

— Quem é essa Berenice? Você conhece? – Mônica perguntou.

Cebola contou a história dela no mundo alternativo e finalizou.

— Ela perdeu a filha e agora quer se vingar de todo mundo. Achei que ela tinha refeito a vida, mas pelo visto vai nos trazer muitos problemas.

— Que doido. – Cascão disse. – Qual cavalo você acha que ela vai ser?

Ele procurou agir como se aquilo fosse só um palpite.

— Sei lá, talvez o da morte. Quer dizer, a filha dela morreu e ela quer se vingar, algo assim.

— É... faz sentido. – Magali disse.

— Mas isso pode ser um problema bem grande, não? – Mônica perguntou. – Quer dizer, a Agnes é o cavalo da fome e suga as pessoas. Penha é o cavalo da guerra e deixa todo mundo com raiva. Que tipo de poder teria o cavalo da morte?

Os outros ficaram em silêncio, pois tinham medo de pensar naquela possibilidade.

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O sinal da escola tocou, os portões abriram e os alunos saíram em pequeno número inicialmente, depois em quantidades maiores. Sofia prestava atenção em cada um deles tentando encontrar o Cebola. Ela não sabia onde ele morava, então o jeito foi procurá-lo em frente ao colégio.

“Ah, ele tá ali. Ufa, pensei que não fosse achar!” ela foi até o rapaz, que estava conversando com seus amigos. Os outros três ficaram apreensivos com sua aproximação, mas Cebola pareceu não se importar.

— Sofia? O que tá fazendo aqui?

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Apesar de usar as mesmas roupas, ele estranhou bastante seus cabelos pretos já mostrando um pouco de raiz loira. Seu rosto era mais sombrio e ele a achou até mais magra que a original, com olheiras profundas e ar de abatimento.

— Preciso falar com você. Dá pra gente ir até outro lugar?

Eles foram para não muito longe dali e Magali falou.

— O que você quer com a gente? A Agnes te mandou? – Sofia balançou a cabeça.

— Eu não trabalho mais pra ela e nem pra Penha. – ela contou rapidamente o que tinha acontecido e Cascão assoviou.

— Fala sério, essa mulher é o Drácula mesmo!

— Que sufoco você deve ter passado, coitada! – Mônica lamentou.

— Ainda bem que ela não veio atrás de mim. Olha, eu sei o que vocês vão fazer amanhã.

— Sabe? Como? – Cebola quis saber.

— Elas sabem, sempre souberam.

Os quatro ficaram apreensivos, especialmente o Cebola. Mas ele não estava surpreso. De alguma forma, ele sabia que Agnes estava a par de tudo.

— Se ela sabe o que a gente vai fazer, por que não tentou nos impedir? – Mônica perguntou.

— Porque ela quer que vocês façam isso mesmo.

Cebola encostou no muro, ficou com a cabeça baixa e disse.

— Só assim a Serpente poderá voltar, não é?

— A tal Serpente? Aí danou tudo! – Cascão disse com medo.

— Mas como... – Mônica começou e Cebola respondeu.

— Sem o sobrenatural, a Serpente não tem como vir pro nosso mundo. Mas se a barreira for consertada... – Até Cascão entendeu a mensagem.

— A caipirota duzinferno volta pra puxar o nosso pé. Então a gente não pode consertar a barreira!

— Mas também não podemos deixar como tá.

— A Mônica tá certa. A gente vai ter que arrumar essa barreira e correr o risco. Pelo menos a gente tem uma vantagem: a serpente só vai poder voltar se os quatro cavalos aparecerem e até agora só temos 3. Sofia, por acaso elas já acharam o quarto?

— Que eu saiba não. A Agnes falou qualquer coisa sobre o último se juntar a elas quando chegar a hora.

— Mas vem cá... eu já sei que a Penha é o cavalo da guerra e Agnes o da fome. A Berenice é qual mesmo? – Sofia deu de ombros.

— Eu não sei, não estava com elas no dia em que a Berenice apareceu, só fui ver ela depois. Agnes e Penha nunca falaram.

— Entendo...

Apesar de Sofia ter falado um pouco sobre Berenice, Cebola não conseguiu deduzir qual cavalo era seria. Pelo que a moça tinha falado, a mulher era bem desagradável e dava muito medo ficar perto dela. Fora isso, não havia nenhuma pista e ele continuou achando que ela era o cavalo da morte por falta de opção melhor. Com isso, faltava saber quem era o cavalo da peste e seu olhar caiu no Cascão. Seria boa idéia levar o amigo naquela aventura? Talvez não, mas como explicar as suas suspeitas? Não tinha jeito e Cascão jamais aceitaria ficar de fora enquanto Magali enfrentava o perigo. Ele teria que dar um jeito naquilo de outra forma.

— A gente vai fazer tudo lá pelas 3 da manhã. – ele voltou a falar. - Só temos que encontrar o lugar certo onde vai dar pra consertar a barreira.

— Eu sei onde fica. Agnes e Penha já foram lá algumas vezes e eu fui junto. Posso levar vocês.

Parte dele estava desconfiada. Será que Sofia estava falando a verdade o queria levá-los para uma armadilha? Não fazia sentido. Se consertar a barreira era a única forma de trazer a Serpente de volta, então Agnes não ia fazer nada para lhes prejudicar. Depois disso seria outra história.

— É só falar pra gente onde fica. – Mônica tentou contornar.

— Vocês não vão saber andar ali nem com mapa. – Cascão arregalou os olhos.

— Como sabe do mapa? – Sofia deu de ombros.

— Agnes sabe. Ela sempre sabe das coisas porque as sombras contam tudo pra ela.

Um arrepio gelado percorreu o corpo deles.

— O mapa de vocês tá desatualizado. Eles fizeram muitas obras debaixo da Vinha depois disso. Eu levo vocês. Não precisam ter medo, não quero mais saber daquelas duas, só quero ajudar.

Por fim Cebola cedeu e aceitou a ajuda dela. Sofia ficou de encontrá-los em frente a sede da Vinha as duas da manhã. Os quatro se despediram e Cebola foi para casa com a sensação de que as coisas iam ficar muito complicadas.

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Assim que chegou em casa, Denise começou a fazer os preparativos para a festa do pijama. Revistas, bons CDs, alguns DVDs e produtos de beleza.

A fantasia dela estava adiantada, só precisava de alguns retoques. Naquele ano ela sentiu vontade de tentar algo diferente e providenciou uma fantasia de Freddy Krueger. O vestido tinha a gola bem larga, deixando um dos ombros a mostra e era vermelho com largas faixas pretas imitando a camiseta de Freddy. Ela arrumou um chapéu e fez uma luva com laminas nas pontas como a do filme. A fantasia ia ficar incrível, mas ela ainda não conseguia se decidir se colocava ou não uma calça legging por baixo ou se deixava as pernas à mostra. E nenhum dos seus sapatos parecia combinar com a fantasia. Bem, ela ia dar um jeito naquilo depois.

Ela também tinha outra coisa em mente e mal podia esperar para colocar seu plano em prática.

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Mônica conferia sua bolsa para ver se tudo estava em ordem. Ela tinha colocado produtos caros de beleza, algumas bijuterias fora de moda que sua mãe não queria mais, sua fantasia, uma lanterna potente e também 4 walkie talkies de qualidade que tinham alcance de 50km, porque os celulares poderiam não funcionar debaixo da Vinha. Era sempre bom prevenir.

Um deles ia ficar com Toni e Manezinho. Outro ia ficar com Denise e um terceiro com Boris, que ia esperá-los do lado de fora. O quarto seria levado com ela quando eles entrassem debaixo da organização.

“É... parece que tá tudo aqui.” Pensou. “Melhor eu me arrumar antes que a mãe mude de ideia e não me deixe ir. Tá quase na hora!”

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Magali já tinha a fantasia dela pronta. Era de gata, toda preta e foi feita com a ajuda da Mônica usando itens comprados em uma loja barata e outros que ela já tinha em casa. Do seu próprio guarda-roupa, ela tirou um corselete de couro falso, uma saia e botas. Ela também estava usando os seus antigos acessórios, que tinham sido aposentados desde que deixou os tempos de encrenqueira para trás.

Ela provou a roupa e ficou satisfeita com o resultado. Não ia ter nada para finalizar na casa da Denise e assim ela ia poder ajudar com a fantasia da Mônica, que era mais complicada. Tudo pronto, ela guardou a fantasia em sua bolsa junto com os itens que ia usar no dia seguinte. Ela também estava levando a corrente que antes levava na cintura e a roupa que pretendia usar: calça jeans, jaqueta e suas antigas botas militares.

— Mãe, pai, eu já tô indo.  - Falou depois de espremer tudo na bolsa para que sua mãe não estranhasse o volume extra.

— Pode ir, filha. – sua mãe falou mostrando estar feliz ao ver a filha levando uma vida normal.

— Divirta-se e juízo, hein? – seu pai falou após a filha dar um beijo em cada um e sair pela porta da frente com o coração pulando no peito de um jeito estranho. Era como se algo muito grande a aguardasse.

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Na sua casa, Cebola tinha preparado vários petiscos, jogos e DVD’s para manter os rapazes distraídos. Até que ia ser bem divertido dar uma festinha e quem sabe reatar com as antigas amizades que seu duplo tinha perdido.

Mais cedo naquele dia, ele tinha concluído a tradução dos escritos do Sr. Malacai e ficou feliz e ao mesmo tempo triste. A boa notícia era que se tratava de um guia detalhado para derrotar a Serpente de uma vez por todas. A má notícia era o fato de aquilo ser muito difícil e trabalhoso. Havia itens que ele sequer conhecia e nem fazia ideia de como conseguir.

E para fazer todo aquele procedimento, era necessário um poder muito grande e no momento ele só conhecia Magali e tia Nena para fazer isso. Então, infelizmente, ele não ia poder usar nada daquilo no dia trinta e um caso tudo desse errado e a Serpente acabasse voltando. Então o jeito era fazer todo esforço possível para que a entidade maligna ficasse quieta no universo inferior. 

Cascão tinha sido o primeiro a chegar trazendo uma garrafa de refrigerante e vários salgadinhos que sua mãe tinha feito.

— Até que a festinha vai ser legal. – o rapaz falou após entregar tudo ao amigo.

— Vai mesmo, acho que a gente tava precisando disso.

Não demorou muito e os outros rapazes foram chegando. Primeiro vieram Xaveco e Luca, depois Tikara, DC, Nimbus e Jeremias. Até Franja e Quim foram convidados. Toni e Manezinho vieram por último e todos ficaram bem nervosos diante do temido Tonhão da rua de baixo que já tinha puxado a cueca de muitos deles.

— Er... espero que me desculpem. – o ex-encrenqueiro se desculpou muito sem jeito. Foi meio estranho no início, mas aos poucos eles foram se soltando. Cebola pegou um dos seus jogos e num instante todos ficaram empolgados e começaram a jogar.

Franja e Jeremias conversavam animadamente com Manezinho relembrando os bons tempos de infância e Toni também participava da conversa feliz em saber que não ia ficar isolado naquela festa.

Mônica tinha deixado ali mais cedo vários petiscos para os rapazes. Salgadinhos, batata frita e algumas pizzas congeladas que eram de excelente qualidade. Assim ninguém ia ficar com fome.

— E como vai ser o esquema da madrugada? – Luca perguntou quando terminou de jogar e passou a vez para o Tikara.

— Não tem erro. Uma e meia da manhã Cascão e eu vamos buscar as meninas e de lá vamos pra Vinha. A gente deve voltar lá pelas 6 se tudo der certo.

— E se não der? – DC perguntou só para contrariar. Ou para ser irritante, Cebola não sabia ao certo.

— Comigo não tem erro, mas vocês vão ter que dar cobertura pro Cascão.

— Meus pais só vão dar pela minha falta perto da hora do almoço. – Cascão falou. – Isso vai dar mais tempo pra nós.

— De qualquer forma, vocês tentam fingir que o Cascão continua aqui. Mas a gente vai dar um jeito de chegar na hora.

— Beleza! – os rapazes falaram e voltaram ao jogo.

Quando ninguém estava olhando, Cebola falou para Toni e Manezinho.

— Eu devo chegar na hora do pessoal acordar, mas é bom vocês ficarem de olho pra eles não fazerem bagunça na casa.

— Pode deixar com a gente. – Tonhão falou. – E a Denise vai mesmo dar a festa do pijama?

— Vai sim. Ela e as meninas vão dar cobertura pra Mônica e pra Magali.

Cebola viu como o amigo ficou aliviado ao saber que a namorada não ia se meter em nenhuma confusão. Ele só concordou em ficar esperando na casa do Cebola porque sabia que ela ia ficar na casa dela também. Era melhor assim.

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Mônica e Magali chegaram juntas na casa da Denise. As outras garotas já estavam reunidas e tagarelando animadamente.

— Oi, meninas.

— Oi! Chega mais! Nós vamos hidratar os cabelos daqui a pouco. – Denise convidou. Pelo menos estava conseguindo disfarçar a má vontade com relação à Magali.

— Ah, que bom! Eu trouxe uns cremes que minha mãe ganhou de amostra.

As meninas foram ávidas aos produtos de beleza que Mônica tinha trazido. Era um verdadeiro arsenal: cremes para limpeza de pele, remoção de cravos, hidratantes, máscaras faciais, maquiagem, alongadores de cílios e até cera para depilação. Tudo de marcas caríssimas que as garotas jamais teriam condições de comprar.

Magali tinha levado várias guloseimas.

— Você tá querendo deixar a gente enorme! – Marina falou pegando uma barrinha de chocolate e levando à boca sem hesitação.

— Hum, delícia! – Cascuda pegou alguns biscoitos recheados e Keika se serviu de um donut.

— Se Carmem e as amigas dela vissem isso... – Aninha brincou e as garotas deram risadas.

Era um falatório incessante enquanto elas faziam tratamento nos cabelos, máscaras faciais e cantavam e dançavam pelo quarto. Denise se divertia muito e Magali fazia de tudo para não causar nenhuma situação desagradável. E ela se divertia também, algo que nunca imaginou ser possível. Há um ano ela estaria chutando os traseiros daquelas patricinhas, não se divertindo com elas.

— Olha a minha fantasia, gente! – Sarah mostrou a dela.

— Uia, você vai prender alguém amanhã? – Aninha brincou ao ver a fantasia de policial da amiga.

— De repente eu prendo um rapaz bem bonitão pra mim!

As outras foram mostrando suas fantasias. Marina fez uma versão feminina da fantasia de Chuck, o boneco assassino. Keika resolveu ir de Vandinha Adams e Aninha estava fazendo sua fantasia de noiva cadáver.

— Experimenta essas bijus, Cascuda. Vai dar certinho com sua fantasia. – Mônica sugeriu colocando alguns colares na amiga para complementar sua fantasia de Cruella Devil. Ela até tinha comprado uma peruca de duas cores.

— Menina, vai ficar incrível! – as outras elogiaram.

Magali acompanhava a animação das moças quando Dorinha lhe cutucou de leve.

— Me ajuda com esses botões? Eu não sei se estou colocando certo.

— Deixa eu ver... tá certo sim. – ela pegou a fantasia e terminou de pregar os botões. Era a fantasia da Sra. Lovett do filme Sweeney Todd: O Barbeiro Demoníaco da Rua Fleet. – A fantasia tá ficando legal. Você vai levar um rolo de massa também?

— Tem que levar, né? E vou colocar aplique no meu cabelo pra parecer com o dela.

— Vai ficar bem bacana.

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— A minha vai ser do Pyramid Head! – Jeremias falou mostrando a foto da fantasia que tinha tirado com o celular.

— Cê é louco, véi! Pyramid Head é tenso! – Luca respondeu. – A minha vai ser de Shrek.

— Pois eu vou todo de Bombril! – Cascão falou orgulhoso e explicou quando todos olharam para ele com cara de espanto. – É porque eu tenho mil e uma utilidades. A Magali vai pirar!

O riso foi geral e cada um foi descrevendo sua fantasia. Xaveco decidiu ir de palhaço assassino e Nimbus tinha feito uma espécie de fantasia de mágico malvado. Franja conseguiu uma fantasia de Frankenstein com a ajuda de Marina e DC disse que ia fantasiado de esqueleto, o que Cebola achou bem clichê. O original tinha se fantasiado de Papai Noel certa vez. Quim decidiu ir de Múmia.

— E você, Manezinho? Vai de quê?

— A Carmem me convidou meio em cima da hora, então tive que improvisar e fazer uma de vampiro mesmo. – Xaveco lhe deu uma cutucada.

— Parece que ela tá na sua, hein? Seu malandrão!

O rapaz ficou meio sem jeito. Quando Cebola o apresentou para a turma, Carmem logo deu um jeito de entrelaçar seu braço no dele e o saiu arrastando para lhe mostrar a escola. Seus pais o tinham matriculado no colégio Limoeiro e ele estava bem animado para voltar aos estudos depois de tanto tempo.

— E a sua, Cebola? – Manezinho quis saber porque estava um tanto sem jeito de falar sobre a Carmem. Ela era bonita, mas ainda era cedo para pensar se ia ou não acontecer algo entre eles.

— Eu vou de zumbi mesmo. Tem umas roupas velhas que vou rasgar, pintar com sangue falso, talvez umas correntes pra sair arrastando... – ele não teve muito tempo para pensar na sua fantasia, então se inspirou na que o Cascão tinha usado na ultima festa de Halloween que teve no mundo original. Como estariam seus amigos?

Será que também era Halloween no mundo original? Ele imaginava que os calendários fossem semelhantes, mas não tinha certeza. Como iam ser as fantasias? Eles finalmente iam ter uma festa normal ou havia chance de acontecer algum evento bizarro? E o mais importante: será que alguém já notou que seu duplo era um impostor? Ele realmente queria saber o que estava acontecendo no mundo original, mas nunca conseguiu arrancar uma única informação do Paradoxo.

— Eu é que ainda não sei o que vestir... nem acredito que a Carmem me convidou!- Toni falou sem jeito.

— Vai de lobisomem. – Luca sugeriu.

— Assim em cima da hora? É complicado. Por que não vai de esqueleto?

— Mas eu vou de esqueleto! – DC falou.

— Cara, muita gente vai repetir as fantasias, não tem problema. – Jeremias disse. 

Após muita discussão e várias sugestões, Cebola o convenceu a ir de Cowboy. Nem todos iam usar fantasias assustadoras, então não havia problemas em Toni usar algo diferente. E ele sabia que a Denise podia gostar.

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— A minha tá pronta! – Mônica falou feliz por conseguir terminar sua fantasia a tempo. Era uma fantasia de anjo negro, que ela fez inspirada no amigo anjo do Cebola que ajudou a salvar sua vida.

As mangas eram compridas e esvoaçantes, decote em forma de coração e saia com pontas irregulares. Ela ia usar botas de cano longo, asas de penas pretas e maquiagem.

— Menina, arrasou Paris em chamas! – Denise falou.

— Valeu. E a sua, como ficou?

Denise vestiu a fantasia dela para mostrar as amigas e disse.

— Só não sei o que vou calçar. Meus sapatos não combinam. E eu visto ou não uma legging por baixo?

— Ah, com as pernas de fora fica bonito! – Aninha disse.

— Só que os garotos vão mexer com você e o seu namorado pode brigar. Melhor usar a calça. – Cascuda sugeriu.

As opiniões estavam divididas e tiveram que fazer uma votação. A calça legging acabou ganhando, só faltavam os sapatos. Magali resolveu aquilo facilmente.

— Tá meio gasto, mas combina com sua fantasia. – falou oferecendo seus sapatos deixando a outra surpresa. Eram botas pretas de cano baixo, tiras com detalhes metalizados e fecho com zíper. Aquele sim combinava com sua fantasia.

— E você vai calçar o quê?

— Eu trouxe botas pra usar amanhã. Posso ir pra casa com elas quando tudo terminar.

Denise ficou oscilando entre aceitar a oferta e jogar aqueles sapatos na cara da Magali. Mas eles combinavam tão bem com sua fantasia!

— Er... valeu... – agradeceu sem jeito e Mônica disse.

— Bom, eu acho que Magali e eu devíamos dormir. A gente vai ter que acordar muito cedo. Vocês podem continuar, pra nós não vai ter problema.

— Vocês têm certeza de que querem fazer isso? Parece muito assustador! – Marina disse e as outras concordaram.

— A gente precisa. – Magali respondeu. – Pega nada não que vai dar tudo certo. A gente volta o mais rápido que puder e ninguém vai dar pela nossa falta.

As duas foram dormir num colchonete ajeitado no canto do quarto e as outras continuaram com a festinha, só tomando cuidado para não fazer barulho demais. Mônica e Magali usavam máscaras de dormir e protetores auriculares. O celular tinha sido acertado para acordá-las a uma da manhã. O dia seguinte prometia muitas surpresas que elas nem esperavam.

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O tempo foi passando e por volta das dez da noite, Cebola decidiu que estava na hora de dormir. Ele e Cascão precisavam acordar de madrugada e Cebola sabia como era difícil acordar o amigo do seu sono pesado. Os dois foram para o quarto e deixaram os rapazes se divertindo sob a supervisão de Toni e Manezinho.

Ele estava muito feliz com a ideia que teve e em poder contar com a ajuda de Paradoxo. E sabendo que o cientista era especialista em tempo, saberia ajudá-los no momento certo.

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Tudo estava escuro e só assim Agnes pode andar pelas ruas sem problemas. A luz dos postes não a incomodava, pois não eram fortes o suficiente para feri-la. Ela tinha que providenciar as coisas de Penha e também comida, já que a moça não tinha comido nada desde a noite anterior.

No entanto, ela tinha que fazer algo primeiro.

Todos os objetos que ela vinha colecionando ao longo dos anos foram levados para um depósito onde eram guardados provas dos crimes e foram embalados um a um. Ela levou um tempo para encontrar o que estava procurando e ficou satisfeita ao ver que estava intacto.

Era uma caixa de veludo e dentro havia um lindíssimo conjunto de colar e brincos de ouro com turmalina rosa. O pingente do colar era oval e cercado com pequenos diamantes tendo a turmalina no centro. Os brincos tinham o mesmo formato e eram a coisa mais linda e delicada que ela tinha visto. Aquele era um presente do seu falecido noivo. Para outra mulher.

Quando seus pais disseram que estavam a procura de um noivo para ela, seu coração se encheu de pavor porque sabia muito bem o que o casamento significava para as mulheres da organização: viver somente como serva e propriedade do marido, tendo que lhe servir como ele achasse melhor e não ter direito algum. Não podia haver destino pior do que aquele.

Seu pretendente era um homem muito bonito de vinte e cinco anos, com belos olhos verdes que encantariam qualquer mulher. Até que não seria desagradável tê-lo como marido se não fosse o fato de ele olhá-la como quem olha uma lesma sobre a folha de alface. Naquele instante ela viu que ele ia ser tão ruim quanto seu pai.

— Você não irá se casar. – as sombras disseram quando pediu ajuda- Seu compromisso é com o povo das sombras. Não se preocupe, no momento certo iremos lhe ajudar.

E sua chance chegou. Certo dia, guiada pelas sombras, ela foi até seu noivo e descobriu que ele tinha uma amante. Pior: descobriu que com essa amante, ele era muito gentil, amável e generoso. Então foi para isso que ela aprendeu durante anos a ser boa esposa? Para ver tudo de bom ser dado para outra mulher enquanto ela estaria condenada a uma vida de escravidão e silencio?

Sentindo mais raiva do que nunca, ela o sugou, coisa que nunca tinha feito antes.  Aquele miserável estava disposto a dar o melhor para outra pessoa e nada de bom para ela. Então ela decidiu que ia sugar tudo dele. Toda sua alegria, toda sua felicidade, força, saúde, vigor, toda sua vida até não sobrar nenhuma gota. Ela queria mais, muito mais. Queria tudo o que ele tivesse.

Sua amante foi a próxima vítima e mais uma vez ela se esbaldou. E depois levou embora a caixa contendo o colar e os brincos, que eram seus por direito.

Dias depois, quando encontraram o cadáver dos dois, o escândalo foi geral. Após o funeral e enterro, Sr. Malacai deu a ela a aliança do seu noivo cuidadosamente embrulhada em um lenço, achando que ela ia querer guardar aquilo. Quando foi ao porão agradecer as sombras, elas instruíram a fazer um altar com os objetos pessoais das suas vítimas.

— Esses objetos servirão como uma espécie de ligação entre as almas dessas vítimas e o mundo material. Através deles, seremos capazes de nos comunicamos com você e te ajudar. Você já tem dois. Precisa de mais.

E foi isso que ela fez ao longo dos anos. Graças aqueles objetos, as sombras puderam continuar lhe ajudando mesmo com a barreira cada vez mais forte. Eles já tinham cumprido sua finalidade e não lhe interessavam mais. Ela só queria suas lindas jóias, pois pretendia usá-las para aguardar a volta da Serpente. Em breve, ela ia ter muito mais.

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Penha já estava quase arrancando os cabelos por ter que ficar trancada com Berenice, que só sabia resmungar, fazer sons esquisitos com a boca e soltar gases tão fedidos que várias vezes ela precisou sair para respirar. Aquela mulher lhe dava nojo e estava cada vez pior. Sua pele estava ficando bem enrugada e dois dentes tinham caído, deixando-a com um sorriso feio e banguela. Mais da metade dos seus cabelos estavam brancos deixando-a com a aparência de bruxa.

— Penha. Voltei. – Agnes falou entrando pela porta segurando vários pacotes.

— Ah, que bom! – a moça foi receber a amiga feliz em vê-la.

— Trouxe o vestido que você tinha mandado fazer para amanhã.

Mon Dieu, eu pensei que não ia dar parra pegar o meu vestido! Aquela costurreirra é muito lerda!

A vantagem de ter se tornado uma criatura feita de sombras era poder entrar e sair onde e quando quisesse. Nem as câmeras de segurança podiam pegá-la. Foi assim que ela foi ao quarto de Penha e pegou seus produtos de beleza e várias jóias para que a moça escolhesse para o dia seguinte.

— Trouxe comida também. – aquilo deixou Berenice interessada. Comida era muito melhor do que aquelas frescuras de mocinha nova.

— Já não era sem tempo! Eu estava quase desaparecendo de fome! O que tem aí?

Agnes dividiu a comida entre elas, tomando o cuidado de dar o melhor para Penha. Aquela criatura grotesca só tinha utilidade até a chegada da Serpente.

— Foi difícil parra você pegar essas coisas? – Penha perguntou abrindo um pacote de biscoitos finos e comendo avidamente junto com frutas secas.

— Foi fácil. As lojas estavam fechadas, só precisei entrar e pegar. Coma bem, tome um banho e descanse. Amanhã será um dia cheio.

Um arroto sonoro ecoou pelo quarto e Agnes teve vontade de quebrar o pescoço da Berenice.

— Eu também vou ter um dia cheio amanhã, você podia ter caprichado mais na comida. – a mulher falou limpando a boca suja de geleia, que ela tirava do pote com a mão e enfiava na boca.

— Descanse também.

— E você? – Penha quis saber. – Acabou não trazendo sua roupa.

Agnes se concentrou e suas roupas mudaram na hora, fazendo Penha e até Berenice arregalar os olhos.

— Posso mudar minha aparência como quiser. Não é fantástico?

— Oh, eu também querro! – Penha falou batendo palmas e sentiu um frio na barriga quando Agnes respondeu.

— E você terá em breve.

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Todos estavam dormindo e Ângelo resolveu voltar para o mundo espiritual, pois precisava manter suas forças para o dia seguinte. Ele queria ter contado ao Cebola sobre Agnes, mas D. Morte disse que aquilo não ia fazer diferença ao rapaz e podia preocupá-lo sem necessidade. O melhor que ele poderia fazer era ajudar quando as coisas ficassem complicadas. Pelo menos aquilo ela permitiu. Assuntos humanos eram com os humanos, mas quando algo tão sinistro e perigoso estava envolvido, anjos podiam interferir. E daquela vez ele não ia falhar de jeito nenhum.


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