Um pequeno problema escrita por Celso Innocente


Capítulo 6
Um quebra cabeças




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Quinze minutos depois, estavam novamente na sala, Maysa deitada no sofá de dois lugares, enquanto o menino permanecia sentado no de três lugares, onde terminariam de assistir ao filme, enquanto a mãe recolhia a louça do jantar.

            — Pode deitar no sofá se você quiser! — Ofereceu-lhe a menina.

            Não precisou oferecer duas vezes. Ele estava deveras cansado e deitou-se com as pernas esticadas. Sentiu-se muito confortável em tal local aconchegante, mesmo porque, com certeza jamais tivera igual privilégio.

            O filme estava interessante e com cenas até assustadoras, inclusive com tais bichos pequenos e outros monstruosos, que por mistérios da tecnologia moderna que ele nem conhecia, até saltavam naquela sala, inclusive sobre ele e a menina.

            Enquanto ele, apesar de encantado com aquele jeito novo de assistir cinema, sofria diversos sustos, a menina até ria extravagante pelo jeito bobinho de menino ingênuo.

            Apesar do filme ser muito bom, principalmente para a idade dos dois e dos sustos que ele tomava, aos poucos seus olhinhos foram ficando sonolentos e com isso não se passara mais do que cinco minutos e ele já estava no mundo dos sonhos.

            Luciana, terminado seus afazeres na cozinha, voltou à sala, sentando-se ao seu lado no mesmo sofá e passando as mãos sobre seu rosto, percebeu que ele estava muito quieto, tirou-lhe os óculos e viu que estava dormindo.

            — Ele está cansado — alegou ela, tomando-o nos braços e levando-o para o quarto, provocando um pouco de ciúmes na menina, que sabia, já fazia muito tempo que não era assim carregada no colo.

            Do jeito que foi colocado na cama, resmungou algo sem nexo, virou-se para o lado e continuou dormindo. Luciana cobriu-o com manta leve, já que o calor do verão interiorano era forte. Embora já se fazendo noite, a temperatura oscilava por volta dos vinte e três graus.

            De volta à sala de estar, Maysa insistiu:

— Até quando ele vai ficar conosco?

— Não sei!

— Quem é ele?

— A hora que o Arthur chegar da escola eu explico para os dois ao mesmo tempo.

            — Credo mãe, que mistério!

©©©©

            Era quase metade da noite quando o irmão chegou da faculdade. Ele, Arthur, branco, cabelos curtos, lisos e negros.

            O rapaz já seguia para a cozinha em busca do jantar, pois tendo que ir para a escola às dezoito horas, nunca conseguia se alimentar antes.

            Luciana chamou-o:

            — Você já viu o menino que está dormindo no quarto de George?

            Embora George não morasse mais com os pais, mantinha seu quarto na residência para os finais de semana, já que o irmão Arthur se apoderara do que outrora fora seu, na casa de três cômodos na mesma chácara.

            — Que menino?! — Espantou-se ele, que não teria tomado ciência do que ocorrera durante todo o dia.

            Seguiu até o local e mesmo sem ascender à luz, com a iluminação do corredor, conseguiu ver tal intruso, que dormia tranquilo em uma das camas de solteiro.

            — Quem é?

            — Venha comigo!

            Arthur seguiu a mãe até a sala onde Maysa continuava assistindo televisão, que foi desligada pela mãe sem ter pedido permissão.

            — Ah mãe! Estou assistindo!

            — Chega né?! Vamos falar sobre Regis!

            — Regis?! — Estranhou Maysa. — O nome dele é Regis? Igual o nome do pai?

            — Não é só o nome que é igual ao do seu pai! — Tentou esclarecer Luciana.

            — Como assim, mãe? — Insistiu Maysa. — Não é só o nome!?

            — Você não está querendo dizer que aquele menino que está lá no quarto é… — preocupou-se o rapaz.

            — Filho de papai! — Completou a menina.

            — Não, ele não é filho de seu pai! Que eu saiba seu pai ainda não está me traindo, arrumando filhos bastardos.

            — E por que então todo esse mistério? — Especulou a menina.

— Tudo indica que esse menino não seja daqui.

            — Se tá biruta mãe? — Ironizou o rapazinho.

            — Vocês já repararam que seu pai está sumido. Certo?

            — Eu não reparei nada! — Deu de ombros o rapaz.

            — Você nem conta! Você nunca vê nada! — Protestou Luciana.

            — E a senhora nem mesmo foi à polícia, mãe — reclamou a menina.

            — Pra quê?! O que aconteceu ao seu pai e a relação desse menino estar aqui, não é a polícia quem vai resolver.

            — O que está acontecendo? — Insistiu Arthur. — Quem é esse moleque?

            — Seu pai! E veio do passado para nosso presente.

            — Mãe! Se tá biruta mesmo! — Riu Arthur fazendo gracejo. — Um moleque que não deve ter nem dez anos de idade é o meu pai que veio do passado!

            — Pois é! Já vi o suficiente pra ter certeza de que é isso o que está acontecendo.

            — Mãe! — Riu Arthur. — Mesmo que isso fosse real. Mesmo que viajar no tempo fosse possível. Sabemos que não é! Mas se fosse. Mesmo que papai tivesse vindo do passado pra cá; nosso pai daqui continuaria aqui pra nos dar seus castigos.

            — Você já estudou ciências? Física!

            — O que tem a ver?

            — Lembra? Dois corpos, ou que sejam duas matérias, não podem ocupar o mesmo espaço!

            — Nada a ver, mãe! — Negou Arthur. — Papai do passado está neste sofá, papai do presente fica no outro. Não é o mesmo espaço!

            — Não é assim que funciona e você é inteligente o bastante pra saber! Ambos são o mesmo corpo… a mesma matéria…não podem estar ao mesmo tempo no mesmo lugar!

            — Mãe, o que é impossível, é que aquele menino tenha vindo do passado! Isso não existe! Se fosse ao inverso, poderia até ser viável, embora seja impossível. Ninguém jamais viajará no tempo! Do presente para o passado poderia até ter alguma lógica. Mas do passado para o futuro, não tem mesmo como! Como alguém poderia ir a um local que ainda não existe?

            — Você sabe coisas da infância de seu pai?

            — Pra quê?

            — Pra você testá-lo. Faça-lhe perguntas de seu pai criança e ele lhe dará as respostas.

            — E o que ele disse que veio fazer aqui?

            — Pior! Ele nem sabe o que está acontecendo! Não sabe por que está aqui e como veio parar aqui!

            — Se tá é biruta! — Desanimou Arthur. — Eu vou dormir.

            — Não vai jantar?

            — Não! Estou sem fome!

            Naquela noite Luciana não conseguira pregar os olhos. Deitada sozinha em sua cama de casal rolava para todos os lados, pensando no que estava acontecendo, sem, contudo, conseguir decifrar tal quebra cabeças. Regis, ao contrário, cansado de perambular o dia todo, perdido em um local estranho, dormiu como uma pedra. Maysa só pensava o quanto era engraçado, de repente ter um pai que tinha sua própria idade, aliás, até menos; talvez fosse preferível considerá-lo como um irmãozinho caçula. Arthur nem ligava e dormiu rapidamente; para ele o menino era apenas um estranho e só o conheceria de verdade na manhã seguinte.


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