Cold escrita por Syrp


Capítulo 3
02. Um de Setembro


Notas iniciais do capítulo

❆ mil desculpas pela demora eterna, fiquei sem computador, quando voltei escrevi todo um capítulo e o perdi. não bastasse isso passei por um longo período de bloqueio criativo, mas se tem uma coisa que não estou disposta é desistir da história de Lily e Scorpius. espero que gostem! ❆



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"varinhas de cipestre encontram suas almas gêmeas

na bravura, na coragem e no auto-sacrifício:

aqueles que não tem medo de enfrentar

as sombras na alma dos outros

ou na sua própria."

 olivaras, garrick

 

Uma bagunça. É assim que qualquer um definiria minha casa em meados de setembro. E de bagunça ela passava para o caos quando o dia um chegava junto da volta às aulas em Hogwarts. A janela está entreaberta e a brisa leve de verão me aquece, Edwiges II parece contente com o clima ameno: silenciosamente empoleirada na gaiola, os olhinhos fechados e as penas brancas como a neve balançando com o vento ameno. Um sorriso cresce em meu rosto com a lembrança de Hagrid me levando ao beco diagonal para comprar minha coruja antes das aulas começarem, exatamente como fez com cada um dos Potter. James foi o primeiro: se foi com tio Hagrid e voltou com uma coruja marrom, a que ele chamava de Phobos – o deus grego do pânico, como Rose havia nos contado. Granger é fascinada por mitologia, sabe todos os deuses e panteões e podia passar horas falando sobre isso sem mesmo tomar fôlego. De qualquer forma, o pobre Phobos não era nada amedrontador. Era bem menor que as outras corujas, mas mais encrenqueiro que qualquer uma delas. A coruja parecia não obedecer ninguém que não fosse James, em parte por suas personalidades serem tão parecidas, em parte por que ela era de longe a coruja mais inconseqüente que eu já vi. O tipo perfeito pra ele.

Depois, veio Alvo. Hagrid queria animar meu irmão do meio diante de seu nervosismo e de lá voltaram com uma coruja de celeiro, imponente e com uma aura altiva e orgulhosa. Depois, Alvo acabou nos contando que eles a estavam vendendo pelo dobro do preço por lhe faltar um olho. Ele não ficou em duvida nem por um minuto: aquela coruja era incrível demais para ficar presa a aquela gaiola como um produto quebrado qualquer que se leva por metade do preço. Desde então, Luma e Alvo têm uma relação inexplicável de confiança.

Então finalmente chegou a minha vez. Eu esperei inquieta no sofá, pulando de um lado para o outro quando tio Hagrid finalmente chegou, cheio de sorrisos e parecendo tão animado quanto eu. Mais um Potter, embora ache que não seja o último ele me disse risonho enquanto eu me pendurava para olhar as gaiolas mais altas. Eram muitas corujas, umas mais estranhas, outras mais comuns, como a de James, piando alto e se remexendo em suas gaiolas, como se dissessem “ei, me escolha!”. Mas a que me importava estava ao alcance das minhas mãos: uma coruja das neves, numa gaiola bem a minha altura, olhando para mim como se estivesse me esperando há muito tempo. Eu prendi a respiração enquanto puxava ansiosa a manga de Hagrid, que abaixou-se para olhar a coruja que tanto me encantava de perto. Do nada, o sorriso do tio Hagrid sumiu. Os olhos dele encheram de lágrimas e eu procurei o que tinha de errado com a coruja, mas ela me parecia bem. Eu me lembro de dizer a ele:

— É ela, tio Hagrid! – eu disse bem séria, disposta a brigar pelos direitos de ir e vir de minha nova amiga. Uma coragem cresceu dentro de mim e eu quase me senti disposta a abraçar aquela gaiola e correr o tanto que meus pequenos pulmões agüentassem, mas tio Hagrid sorriu, enxugou as lágrimas com as mãos grandes e apertou meu ombro de leve.

 — Ela é perfeita, Lily. Igualzinha a do seu pai, na época em que ele era menino. Edwiges era o nome dela. – tio Hagrid me contou enquanto ingressávamos no assunto. Ali ficou deferido: aquela era Edwiges, em memória da coruja mais corajosa que já existiu. Leal o suficiente para se sacrificar por seu dono.

Meu pequeno momento de paz se vai com o grito estridente de mamãe e a risada escandalosa de James. Me sento rapidamente na cama ao mesmo tempo que meu irmão mais velho escancara a porta do quarto com o rosto vermelho e a camiseta preta ao avesso.

— Quando você vai aprender a bater na porta como uma pessoa comum, James? – pergunto a beira de um ataque de nervos. Mesmo Edwiges pia de dentro da gaiola, indignada com a invasão. Ou com a falta de silêncio.

— Se acalma estressadinha. Estou te fazendo um favor, você já devia estar pronta! – James me sorri enquanto bagunça meu cabelo. Observo meu irmão mais velho ajeitar pacientemente o cabelo diante do espelho em frente a cama. Dizem que James se parece muito com o vovô: mesmo sorriso, mesma inconseqüência, mesmos olhos.  Me levanto a tempo de ver Alvo passar correndo pelo corredor ainda de pijama atrás de um borrão verde voador.

— Eu vou querer saber o que é isso? – pergunto meio atordoada. James me deixa um beijo na bochecha.

— Por sua conta e risco. Não sei quem a mamãe vai matar primeiro, o tio George ou o Alvo – meu irmão tem mais um acesso de risada antes de sair apressado do quarto, tão rápido quanto chegou. Um tornado. Bato a porta enquanto observo meu reflexo resignada. Os cabelos ruivos estão uma zona, há algumas partes lisas e outras em onda e o nariz vermelho me faz parecer uma rena. Triste. Uma rena triste. O pijama de corujinhas que era de mamãe também não ajuda em nada. Balanço a cabeça e olho as coisas já devidamente arrumadas no canto do quarto, assim como o traje da grifinória pendurado na velha arara de roupas de madeira. Ao contrário de James e Alvo, que ficam as voltas em arrumar as coisas de última hora, me acostumei a deixar as coisas prontas, afinal sempre fui meio desatenta. Meio na verdade é um eufemismo.

Alcanço a toalha depois de mais um momento habitual de devaneio e sinto vontade de correr de volta pro quarto só de olhar o estado de calamidade do corredor. Roupas espalhadas, sapatos, a varinha de Alvo no chão, vou desviando de um mar coisas e pensando no ataque que mamãe vai ter. Chuto uma camiseta com os pés do chão do banheiro e me tranco nele antes que alguém tenha a chance de entrar antes de mim. Ainda dá tempo de escutar mamãe falar calmamente, bem pior que qualquer grito que ela pudesse dar. Não demora e dá pra ouvir os passos apressados na escada. Reprimo uma risada.

Quando deixo o banheiro um tempo depois já pronta, o corredor está impecável. O poder de mamãe. Desço as escadas para ver Teddy dormindo sentado, os cabelos azuis bagunçados e baba escorrendo pelo canto da boca. James devora nada educadamente uma tigela de cereais e Alvo parece entretido com a parede branca ao lado da porta.

— Quanto ânimo pra voltar a Hogwarts – digo em voz alta. Lupin acorda em um sobressalto. Me olha com desagrado, um olho aberto e o outro meio fechado.

— Acordar cedo me desanima – resmunga enquanto volta a encostar a cabeça no sofá. É meu irmão de mãe diferente, dividimos a mesma comida, a atenção de nossos pais, a casa na árvore atrás da casa da vovó Molly. Depois da morte de tio Remus e tia Tonks, papai sendo seu padrinho tomou a responsabilidade do lufano de cabelos azuis pra ele. Nunca nada o diferenciou de nenhum de nós: é o mesmo tipo de amor. Mamãe, antes preocupada com o quão longe ela poderia ir, agora vive as voltas tentando cortar o cabelo de Lupin, mas até ela sabe que isso é uma guerra perdida. Me sento a seu lado rindo enquanto ele se ajeita em meu ombro de forma confortável.

— Entendo sua dor, irmão – James fala dramaticamente enquanto se dá ao trabalho de lavar muito a contragosto a tigela em que comia. Acho que até ele sabe que chega de irritar a mamãe hoje.

— Vocês são impossíveis – nego com a cabeça. Papai aparece na sala, olha de um para outro impassível.

— Ainda não estão prontos? – pergunta de forma paciente, mas os olhos dizem outra coisa – ser pai de muitos é uma coisa complicada.

— Pai de muitos? – James pergunta risonho ajeitando os próprios óculos que ele nunca usa no rosto. Cheio de vida, um verdadeiro furacão categoria cinco.

— Criar vocês todos juntos nos fez pais de muitos, filho. – papai diz com um olhar cansado para a bagunça na própria sala de estar, Teddy agora desperto rindo de Alvo e sua cara de tédio – sinto que seu pai não esteja aqui pra ver isso, Teddy.

— Eu também, tio Harry. – Lupin sorri, um desses sorrisos cheios de saudade que me apertam o coração. Ele sente a falta de tio Remus e tia Tonks. Papai e ele trocam um olhar carinhoso.

— Exceto o Alvo que foi achado largado no beco diagonal – James explode numa crise de riso da própria piada, Alvo se vira possesso. Papai o repreende com um olhar severo, ao mesmo tempo risonho da eterna rixa de irmãos.

— Só por que eu não sou um irresponsável e não concordo com as algazarras que você faz naquela escola, Sirius? – Alvo diz grunhindo enquanto investe em socos em nosso irmão mais velho.

— Não era o próprio Salazar meio contra regras? Até nisso Alvo é averso, chato! – James se esquiva dos socos ainda em risadas, os dois correndo em torno do sofá em que eu e Teddy estamos. Papai estagnado no lugar sabendo que é impossível fazê-los obedecer. – dá um tempo, maninho!

— Se perderem aquele trem... – mamãe nem termina de concluir a ameaça enquanto passa veloz pela sala em seus saltos altos, elegância e ruivindade letal, como diz James, e cada um dissipa pra um lado. Papai ri inconformado, me levanto do sofá para abraçá-lo.

— O que a mamãe tem que eu não tenho? – me pergunta decepcionado, mas os olhos verdes como os meus estão risonhos.

— Ela é Gina Weasley, pai – digo por fim antes de me juntar ao trio de garotos subindo as escadas de forma desesperada, quase como se estivessem fugindo de um trasgo montanhês.

❆❆❆

Papai e mamãe acenam do lado de fora do expresso de Hogwarts. Não importa que estejamos velhos demais pra isso, e que já seja a milésima vez que fazem isso, é um ritual. Papai nos acena com um olhar amoroso, mamãe dá mil ordens que nem mesmo podemos escutar e James finge que vai cumprir tudo enquanto acena com a cabeça. Ficamos os quatro juntos observando pelo vidro de dentro de uma cabine.

— Mamãe me dá mil ordens toda vez, pobrezinha, não sei por que ainda acha que vou seguir alguma – James manda um beijo pra mamãe enquanto finge estar falando algo muito emocionante. Sua cara de pau é invejável. Quando o expresso parte James estapeia a nuca de Alvo e sai correndo pelos corredores com meu irmão do meio a seu encalço, ficamos eu e Teddy, um de frente para o outro.

— James é... – o lufano de cabelos azuis começa, nego com a cabeça rindo.

— O James. – não deixo que conclua. Meu irmão é ele mesmo e pronto. Irritante, inconsequente e um grande implicante desde sempre, mas ao mesmo tempo cheio de vida e amor, protetor ao extremo e mesmo que tente esconder isso sob uma máscara de grande encrenqueiro herdeiro dos dons de James Potter e Sirius Black, muito inteligente e um grande bruxo. Quando está com seu parceiro de crime Fred Weasley II então, é problema grande na certa. A dupla do mal tem uma gaveta só pra eles na sala do Filch e são a própria definição de “the boys are back”. Meu irmão mais velho é um furacão que leva tudo pela frente, e ao mesmo tempo, sei o quanto a casa vai ficar vazia quando ele concluir esse ano e tomar o próprio rumo.

Teddy confirma com a cabeça, um sorriso no próprio rosto e a cabeça encostada no vidro. Acha que não percebo sua agonia em querer partir, é um lufano metamorfo, fofoqueiro e disperso que não consegue parar em um só grupo, cheio de malícia e ideias, alegre e dono de um espírito livre que se misturam com sua incomparável lealdade e falta de filtro. A agonia, no entanto, tem nome: Victoire Weasley.

Minha prima e uma de minhas melhores amigas, uma descendente de veela que parece uma miragem. O que tanto gosto nela é justamente o que encanta a Teddy – o equilíbrio. Ao mesmo tempo que é uma garota linda por fora de muitas maneiras com toda sua elegância francesa, é também linda por dentro e extremamente inteligente. Não atoa foi parar na Corvinal; uma das melhores alunas e um gênio da transfiguração que com toda a certeza vai se tornar uma monitora em seu último ano. Victoire é uma bruxa brilhante – tanto no quesito de ter um brilho natural, tanto no quesito inteligência.

Para o desespero de Lupin, porém, durante o quarto ano, Victoire acabou iniciando um relacionamento com Robert Calahan, um lufano muito gentil e atencioso que realmente é apaixonado por ela. O que nós duas sabemos e os dois lufanos não, é que a Weasley-Delacour não tem os mesmos sentimentos por ele. Pelo que Victoire me disse, ela gosta dele, mas não da maneira que deveria gostar. Acho mesmo que ela vai acabar ficando com Teddy hora ou outra, posso não ser uma corvina genial, mas não é preciso ser muito esperto para notar o brilho no olhar de Victoire e o avermelhar das bochechas toda vez que o garoto de cabelos azuis a faz rir – e ele faz isso muitas vezes no dia.

— Teddy, dá o fora, eu sei que você está louco pra sair daqui e ir fofocar – conto uma meia-mentira, que ele quer sair é verdade, sua intenção porém não é fazer nenhuma fofoca e sim ir atrás de minha prima, mas essa parte guardo pra mim mesma.

— Está me chamando de fofoqueiro, Lilian? – Teddy finge muito mal se ofender enquanto deixa a cabine com um sorriso gigantesco no rosto, não sabe esconder o que sente, e nem mesmo acho que faça questão

Fico sozinha na cabine observando a paisagem distraída, rodeada por risadas abafadas, conversas altas demais e algumas discussões acaloradas sobre quadribol. Pelo menos no expresso a grande família Potter-Weasley se separa, cada um em seu próprio grupo, já que vivemos juntos praticamente o tempo todo seja em Hogwarts ou em casa, mesmo na antiga casa na árvore da vovó Molly.

A cabine se abre e me viro assustada, Hadley me sorri zombeteira.

— Lilian Luna, estava se escondendo de mim? – corre para junto de mim, nos misturamos num meio abraço durante uma longa crise de riso. Hadley Thomas é uma sonserina desbocada, inteligente e a pessoa mais bem articulada que já vi, seus dons de persuasão chegam a parecer obscuros. A garota dobra a qualquer um, de Filch a McGonagall. Até meu terceiro ano eu não era exatamente a maior fã da sonserina, mas formar uma dupla nada convencional com ela na aula de poções mudou tudo. Uma competição boba entre nós duas resultou em dois eventos nada previstos: o primeiro foi uma detenção na Floresta Proibida, eu e ela nos engalfinhando em brigas com galhos em meio a risos e Hagrid a nosso encalço e o segundo foi uma amizade que surgiu do nada e uniu duas pessoas nada parecidas. Como um encontro de almas, mas não de gêmeas, das mais opostas possíveis.

 Hadley não tem boa fama na escola, em partes por conta de Brook Maville, uma grifina insuportavelmente arrogante de todas as formas. Definição de maldade, Maville está sempre a espreita pra destilar seu ódio a Sonserina e causar todo tipo de problema a quem discorda dela – e a má fama ainda fica com a casa das serpentes.

De qualquer forma, Brook não perdeu tempo em espalhar boatos pela escola que garantiam que Hadley estava metida com magia das trevas, que seus pais eram comensais e seu pai já havia sido mandado para Azkaban. Os mais próximos sabiam que era tudo mentira, mas alguns alunos de Hogwarts podiam ser péssimos as vezes. Maville tinha uma bruxa incrivelmente inteligente e ambiciosa como mãe, uma mulher exemplar que eu já havia conhecido e que também havia ido para a Sonserina, já seu pai era nascido trouxa e um bruxo lufano muito bondoso.

Apesar das personalidades opostas, eu e Hadley tínhamos muitas coisas em comum: a principal delas era o pré-julgamento instaurado na escola. Se meu pai por um lado fora o garoto que sobreviveu, as más línguas costumavam dizer que eu era a garota que tinha ido pra casa errada. Ao oposto de minha melhor amiga, eu me esforçava pra agradar. Tentava não ser arrogante, não ser mal-educada e fazer o bem se possível. Eram regras que eu havia imposto para mim mesma, mas a casa dos corajosos era conhecida pelo total desprezo por elas.

Não que eu fosse tão certinha assim – eu podia quebrar regras facilmente, e uma partezinha escondida de mim se sentia orgulhosa por isso. Eu só havia trancado esse sentimento transgressor dentro de mim. Essa facilidade para quebrar regras. A parte de mim que gritava “pode tirar minha varinha, eu acabo com você com uma espada”. E eu não me sentia nada corajosa escondendo essa parte de mim.

Talvez eu estivesse negando um lado muito importante meu por falta de coragem, e isso significaria que eu realmente estava na casa errada e o chapéu seletor dava sinais de velhice, talvez por duvidar de mim mesma. E nenhuma das duas opções parecia muito com a Grifinória. Ao menos eu achava que não.

Retorno a realidade quando Brutus Nott se junta a nós. Só nos conhecemos de vista, o cumprimento nos corredores e nas aulas. Batedor da Sonserina, um grande jogador de quadribol que levou sua casa a muitas vitórias desde que entrou, também é muito inteligente, me lembro dele nas aulas de poção – nenhum erro, quase sempre impecável e recebendo elogios infindáveis. Não tem uma expressão muito simpática, no entanto, embora seja bonito, tenho que admitir. Olhos verdes bem claros e um cabelo loiro escuro, uma cicatriz grande que desce da sobrancelha ao canto do olho que não sei como conseguiu.

— Os caras estão insuportáveis, não param de falar no Irlandês que vai entrar pra Lufa-Lufa, dizem que o cara é bom – Nott balança a cabeça, se senta a nossa frente. Hadley olha entediada pra ele.

— Não aguento mais ouvir em quadribol – a sonserina reclama, uma careta no rosto. Nott sorri minimamente pra ela enquanto tira a própria jaqueta.

— Pronta pra perder pra Sonserina esse ano? – me pergunta, uma sobrancelha arqueada e um olhar malicioso que recai sobre mim.

— A Grifinória leva a taça – falo mais pra provocar, está acabando o tempo de James e Fred na escola e sei que estão dispostos a causar o quanto de confusão puderem até o ultimo minuto e isso vai resultar na perca de todos os pontos possíveis. Por sorte os dois tem uma fama surpreendente na Grifinória e quase nunca recebem represália pelo que aprontam.

— Quer apostar? – quando se vira para a luz a cicatriz fica ainda mais evidente, uma expressão divertida no rosto enquanto sorri tranquilo. É muito mais simpático que pensava.

— Não que seja justo com você, mas sim. – faço uma pausa antes de continuar, quem sabe um milagre e levamos a taça novamente – se eu ganhar você me conta como ganhou essa cicatriz.

— Se perder? – questiona com um olhar presunçoso de quem já ganhou.

— Você vai pensar em algo até lá – dou de ombros. Acho que até lá já esqueceu a aposta, mas não comento. Hadley rindo da aposta nitidamente do lado de Nott, traidora. Apertamos as mãos, o sonserino se recosta no próprio assento. Ele e Hadley engatam em um outro assunto, dessa vez não entro no assunto.

E não é que eu gosto de serpentes?

❆❆❆

Já é noite quando o expresso chega a estação de Hogsmeade. Quando nos aproximamos dos portões que levam aos terrenos de Hogwarts, Hadley parte primeiro com Nott e outros três sonserinos. Aceno para ela, a mochila pendurada em meu ombro balança. Ela segura o riso de minha situação. Minha família toda provavelmente já se foi, penso olhando desanimada para trás. Quem mandou demorar demais lá dentro, me recrimino esperando a próxima carruagem. Escuto o riso escandaloso de James, fico aliviada.  

Meu irmão para a meu lado ofegante, Alvo a seu encalço. Os dois me olham confusos. James semicerra os olhos. Ignoro os olhares e me concentro em alisar meus próprios braços com frio.

— Você sempre vai com Roxy, Lucy e o resto das garotas, o que aconteceu? – Alvo me pergunta curioso, James se escora no ombro de meu irmão como se falando “conta logo”.

— Eu demorei lá dentro, o que tem de mais? Vocês dois parecem duas velhas fofoqueiras – cruzo os braços com uma expressão de desagrado.

— Lilian você é insuportavelmente chata – James cruza os braços também, finge muito mal que está bravo. Não passam dois minutos e está tagarelando a nossa volta, sabia que não ia longe. Me mantenho afastada da confusão habitual de meus irmãos de forma distraída, os dois intercalando entre brigar e rir de forma cômica. Duas lufanas e três grifinos se juntam a nós na espera, uma das lufanas, Lennox Scamander pisca pra mim. É uma encrenqueira nata como James, conhecida em Hogwarts e tão cheia de vida quanto ele. É uma grande amiga e não bastasse isso, filha de minha madrinha Luna e Rolf Scamander.

Junto da carruagem, observo de canto de olho alguém se aproximar. Levanto a cabeça para olhar, os fios ruivos se espalham em meu rosto com o vento. Scorpius Malfoy, com toda sua postura altiva e aura não-se-aproxime-muito habitual. Não olha pra ninguém em especial, mas vem em minha direção, me refreio antes de dizer oi quando me dou conta que ele se aproximou para cumprimentar os Testrálios. Se estica para tocá-los de forma carinhosa, não consigo vê-los, mas posso jurar que se esticam para receber o toque do sonserino. A sombra de um sorriso cresce em seu rosto.

É óbvio que ele seria capaz de ver os Testrálios – ele já viu a morte. Me lembro da morte de sua mãe e as coisas que Alvo dissera, busco meu irmão com olhar, agora incomodado e ignorando a presença de James enquanto encara fixamente o ex melhor amigo. Retorno meu olhar pra Malfoy, mas ele nem mesmo parece consciente de minha presença diante de sua devoção aos animais.

É a primeira vez o que o vejo tão perto: sempre de longe, no caminho das aulas, pelos corredores, no grande salão, nunca perto. Posso sentir o cheiro de seu cabelo úmido – a que aliás, reparo, não são tão claros agora que vejo de perto, talvez por causa de sua mãe. Os olhos são levemente esverdeados e muito bonitos, e há pequenas pintinhas espalhadas pelo rosto. É uma beleza traiçoeira, uma que grita que ele é diferente.

Me afasto depois de balançar a cabeça pra dissipar os pensamentos. É o que digo, sou muito desatenta. James se aproxima de mim com um sorriso sacana no rosto. Olho com a mesma repreensão de sempre a suas provocações.

— Esquece a serpente só um segundinho e foca no que vou falar, irmãzinha – fecho a cara pra meu irmão enquanto belisco seu braço. James geme de desagrado. – ai Lily. Só estou falando. Já avisei o Alvo que logo que chegarmos vou dar uma festa de recepção, eu e Fred, e só pra constar a ideia foi dele, ele é a mente maquiavélica por trás dos planos.

Encaro James estupefata e esquecida de todo resto, ele não tem jeito. Meu pai e minha mãe é que foram loucos de colocar o nome do garoto logo de James Sirius, era óbvio que coisa boa não ia sair.

— E onde você vai dar essa festa, James? – pergunto entre sussurros, meu irmão me olha tranquilo como se estivesse falando sobre o tempo.

— Relaxa irmãzinha, esses detalhes já estão acertados. Falamos mais depois – se despede. Nego veemente com a cabeça.

— Você vai com a gente! – digo enfática. James ri bem na minha cara de forma exagerada.

— E ficar no meio do embate entre duas serpentes? Nem morto! – James diz em meu ouvido – essa eu deixo pra você que vive no habitat deles – meu irmão corre de mim e se junta a carruagem já partindo entre Lennox e a outra lufana e outros amigos seus. Olho para o longo caminho pela clareira da Floresta Proibida, a cabeça dividida entre a festa de James e Alvo e Scorpius Malfoy se encarando atrás de mim em um embate silencioso.

Será que não posso me juntar aos primeiranistas de onze anos nos barcos?


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