Pokémon - Luz do Amanhecer escrita por Benihime


Capítulo 28
Amizade




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Calista ainda ficou no hospital por mais duas semanas depois do primeiro dia em que Cynthia a visitou.

Primeiro, mas não último. O interesse em comum por mitologia fora apenas o empurrão inicial, e isso evoluiu rapidamente, tornando-se uma amizade relutante por parte da morena.

Calista logo começou a pedir que Ash lhe levasse livros, estudando constantemente em uma tentativa de pegar a campeã desprevenida em seu próprio jogo. Cynthia, por sua vez, achou aquilo muitíssimo engraçado e não perdia uma chance de provocá-la. Era uma competição bem humorada, que rapidamente estava se transformando em uma amizade cada vez mais calorosa.

— Eu não acredito! — Calista exclamou um dia antes de deixar o hospital, quando a loira foi visitá-la e se despedir antes de voltar para Sinnoh. — É isso que você está pesquisando? Sua loira boba, devia ter me contado antes! Eu podia ter ajudado.

— Você? — A loira inquiriu ironicamente.

— Claro. — A irmã de Ash zombou. — Deixe de ser esnobe, campeã. Eu sei mais do que você imagina. Ou acha que, por ser bonita, não posso ser inteligente também?

— É mesmo? — Cynthia desafiou, erguendo uma sobrancelha. — Vamos lá, então, me mostre o que sabe. É um desafio.

Calista abriu um sorriso malicioso, fingindo pensar apenas para aumentar a expectativa. Era daquele tipo de desafio que ela mais gostava naquela nova amizade.

— Está bem. — A jovem kantoniana disse enfim. — Desafio aceito. Pode escolher qualquer uma das três Aves, sua metida.

— Articuno. — A loira respondeu prontamente.

— O Pokemon Congelante. — Calista provocou. — É, combina muito bem com você. Articuno pode parecer uma ave, mas as lendas dizem que é completamente feito de gelo. Por isso suas asas são translúcidas. Dizem que suas garras são como adagas.

— Você já o viu? — Cynthia inquiriu, curiosa.

— Infelizmente não, apenas ouvi isso de alguém que afirma tê-lo visto. Segundo ele, Articuno vive aqui na região de Kanto, escondido em algum lugar das Ilhas Espuma do Mar. Eu sempre discordei, acho que Articuno vive nos picos das montanhas ao norte, perto da fronteira com Johto, talvez até no próprio Monte Prata. O pico está sempre coberto de neve, e quase nenhum ser humano consegue chegar até lá.

— Há uma lenda sobre as ilhas Espuma do Mar, não é?

— Mais como uma crendice, eu diria. — A jovem kantoniana respondeu com um dar de ombros. — Nunca dei muito crédito a essa história em particular.

— Por que?

— Porque é fantástica demais.

— Você sabe tão bem quanto eu que o fantástico muitas vezes acaba se provando real.

— Você tem razão, eu acho ... — Calista se interrompeu, vendo o interesse claro como a luz do sol naqueles olhos cinzentos. Cynthia estava ardendo de curiosidade, isso era óbvio. Percebendo o fato, a jovem sorriu. — Suponho que você não conheça a lenda das ilhas, não é?

— Na verdade não. — A campeã admitiu. — Ou pelo menos não tão bem quanto eu gostaria.

— Bem, é uma lenda antiga. Poucas pessoas aqui em Kanto ainda se lembram, quanto mais alguém de outra região. Blaine, o líder do ginásio de Cinnabar, foi quem me contou. Segundo ele, no começo as ilhas Espuma do Mar eram apenas uma única e colossal caverna de gelo, que servia de ninho para Articuno, pelo menos até que os seres humanos descobriram sua presença e começaram a tentar capturá-lo. Então, uma noite, caiu a pior tempestade já vista na história dessa região e, na manhã seguinte, a caverna de gelo havia sido completamente submersa no mar. Em seu lugar, ninguém soube explicar como, surgiram duas pequenas ilhas rochosas idênticas. Mas é claro que nenhum dos caçadores desistiu do prêmio. Com o tempo, algumas pessoas chegaram mesmo a montar acampamento permanente naquelas ilhas. Por causa disso, cerca de trezentos anos atrás um centro pokemon foi construído em Cinnabar, a ilha habitável mais próxima. E a caçada continua até hoje.

Quando Calista terminou de falar, a loira ficou em silêncio por um momento. Parecia impressionada, embora tentasse esconder o fato.

— Muito bem, você venceu. — Declarou enfim, com um toque de má vontade. — Dessa vez.

— Vou vencer você em batalha também, espere para ver.

— Melhore primeiro, depois pode pensar em me enfrentar. — Cynthia rebateu. — Até porque ... Você ainda precisa treinar muito para sequer se comparar a mim.

— Ouch! Essa foi maldade! — Calista exclamou, levando uma das mãos ao peito dramaticamente. — Você é muito convencida, sabia, sua loira chata?

— Ah, claro. — A campeã foi irônica. — Olhe só quem fala, cabeça de pedra.

A irmã de Ash riu com gosto dessa resposta, ligeiramente surpresa. Mesmo já sabendo que havia errado ao julgar Cynthia tão severamente no passado, não havia se dado conta do quão longe da verdade estivera. Sempre soube que a campeã era inteligente, brilhante mesmo, mas a gentileza e o senso de humor da loira ainda tinham a capacidade de pegá-la de surpresa.

Uma vez em casa, os pesadelos novamente se tornaram mais vívidos. Calista acordava no meio da noite, suando frio e tremendo, fazendo o possível para sufocar os gritos de terror enquanto segurava a Asa Lunar em uma das mãos.

Para seu total espanto, Cynthia se provou a única capaz de compreendê-la. A loira obviamente sabia uma ou duas coisinhas sobre os pesadelos, embora as duas jamais os tenham discutido abertamente. Preferiam conversar sobre batalhas, mitologia ou simplesmente frivolidades do cotidiano, e em menos de um mês já estavam se falando diariamente.

Aos poucos o respeito relutante e a gratidão que Calista sentia por aquela mulher assumiu outra forma, e logo a morena se pegou ansiando por aquelas conversas, apreciando cada vez mais a companhia da campeã de Sinnoh. Além do mais, o coma e o total repouso de sua perna permitiram que os músculos tivessem tempo de curar como deveriam, e Calista não conseguiu esconder sua satisfação em ser capaz de dançar novamente.

Um dia, cerca de dois meses depois de sua irmã mais velha receber alta, Ash estava empoleirado em um galho da árvore grande em seu quintal dos fundos, vendo Calista ensaiar. Era um final de tarde razoavelmente quente, e a morena ensaiava com os pés descalços na grama, aproveitando o clima agradável.

— Você está indo muito bem, mana. — O rapaz comentou. — Parece melhor do que antes, até.

— Talvez. — Ela respondeu, encerrando o ensaio e se acomodando de pernas cruzadas sob a árvore, empoleirada em uma raiz protuberante próxima ao tronco. — Preciso mesmo melhorar. Estou decidida a voltar e tentar de novo, você sabe.

— Não sei não, Caly ... Tem certeza de que vai aguentar?

— Claro que sim, seu bobão. — Calista respondeu, erguendo a cabeça para encarar seu irmão mais novo. — Depois do que enfrentei com o Abismo das Sombras, as performances pokemon vão ser moleza.

Ash não se deixou enganar por aquela bravata, olhando-a com reprovação. Calista simplesmente se pôs de pé, fincando as mãos nos quadris e erguendo o queixo, altiva e arrogante. Determinada.

Mas o rapaz também sabia ser teimoso, e não iria desistir tão facilmente de fazê-la mudar de ideia. Isso resultou numa discussão tão acalorada entre os dois que Dehlia precisou interferir.

— Não é nada de mais, mamãe. — Calista lhe assegurou. — Ash só está sendo um babaca, como sempre.

— Deixe o Ash em paz. — Dehlia ordenou severamente. — E você, mocinho, é melhor dar um tempo à sua irmã. Entendido?

— 'Tá bem, mãe. — Ash resmungou, saltando do galho onde estivera sentado. — Mas acho que a senhora devia perguntar 'pra ela sobre o concurso de Rainha de Kalos.

— Ela já sabe, idiota! — Calista esbravejou. — E, se quer saber, a mamãe está do meu lado. Ela sabe que a decisão é minha, e de mais ninguém!

— Já chega! — Dehlia exigiu. — Parem de discutir, vocês dois!

Calista simplesmente ficou em silêncio por um momento, ainda vermelha de raiva, então assentiu e entrou em casa sem olhar para trás.

Algumas horas mais tarde, depois do jantar, ao passar em frente ao quarto de sua irmã mais velha, Ash a ouviu rir. Curioso, ele espiou pela fresta na porta entreaberta. Só viu o cabelo de sua irmã caindo em cascata pelas costas da cadeira na frente da escrivaninha. Ela estava no computador conversando com alguém.

— Tenho que admitir, você o descreveu perfeitamente. — Calista dizia, ainda rindo. — Teimoso como um Tauros e mais irritante do que um Wobbuffet.

— Não seja tão dura com ele. — Uma voz familiar respondeu gentilmente. — Ash só está preocupado com você. Na verdade ... Eu também. Tem certeza de que é uma boa ideia?

O queixo de Ash caiu quando percebeu com quem sua irmã estava conversando. Até então a morena mantivera sua amizade com Cynthia como uma espécie de segredo. Não que escondesse o fato, mas o banalizava de tal forma que ninguém suspeitaria do quão próximas as duas haviam se tornado.

— Honestamente? Não. —  Foi a resposta, e mesmo sem olhá-la Ash pôde ver sua irmã dar de ombros. — Mas sonho com isso desde que pisei em Kalos pela primeira vez. Eu jamais me perdoaria se não tentasse de novo.

— Eu sabia que você diria isso. — Cynthia declarou, com uma nota de admiração na voz. — Ainda assim, com os pesadelos ...

— Eu sei, eu sei. — Calista interrompeu com um suspiro pesado. — É arriscado. Mas não posso deixar que isso me faça desistir. Já perdi tempo demais.

Ash mais uma vez ficou surpreso. Aquele não era o tom animado que sua irmã usava normalmente, ou mesmo o tom arrogante que ela usava quando estava com raiva. Era franco, vulnerável, e ele nunca a vira falar daquele jeito com ninguém.

— É, eu entendo. — A campeã respondeu. — Quando você vai?

O moreno recuou contra a parede do outro lado do corredor, ainda boquiaberto. Não conseguia acreditar que sua irmã estava conversando tão abertamente com alguém que, até pouco tempo atrás, dizia odiar mais do que qualquer outra pessoa.

— Semana que vem. — Calista confessou, suspirando mais uma vez. — Minha família ainda não sabe disso. E duvido que vão reagir muito bem quando eu contar. Ash já está maluco só por eu considerar a possibilidade.

— No fim das contas, a escolha é sua. — Cynthia a lembrou gentilmente — Nunca esqueça disso.

— Obrigada. — A morena ergueu o rosto e, pelo tom de sua voz, Ash quase podia ver o sorriso em seus lábios, mesmo ela estando de costas. — Mas é mais fácil falar do que encarar.

— Nem tanto. — A campeã admitiu. Calista a viu erguer uma das mãos num gesto distraído, brincando com uma mecha de seus cabelos loiros. Era algo que fazia quando estava nervosa, ou simplesmente distraída demais para perceber. — Quando decidi me tornar uma treinadora pokemon, apenas minha avó me apoiou. O resto da família ... Bom ... Nem quiseram ouvir falar disso. Especialmente meu avô.

— Sinto muito. — O tom da morena foi o mais gentil que Ash jamais havia ouvido. — Deve ter sido difícil.

— Ninguém saberia disso melhor do que você, não é? — Cynthia respondeu. — Mas tudo bem, já faz muito tempo.

— Admitindo sua idade, campeã?

— Muito engraçado, cabeça de pedra. — A campeã loira riu. — Temos praticamente a mesma idade.

— Com alguns meses de diferença. — A jovem kantoniana rebateu — Mas, quanto à idade mental ...

— É, tem razão. Nisso você é bem mais nova.

As duas riram juntas, deixando Ash boquiaberto mais uma vez. Elas conversavam e implicavam uma com a outra como se fossem amigas de longa data, que se conhecessem desde sempre.

— Certo, chega de bobagem. — A morena disse. — É melhor eu desligar. Boa noite, campeã.

— Bons sonhos, Calista.

— Até parece. Mas obrigada.

A morena se desconectou da chamada de vídeo e se pôs de pé. Ao se virar, notou a porta entreaberta.

Ash recuou para a parede oposta bem a tempo e conseguiu evitar ser visto, ou assim pensou, pois segundos depois a porta do quarto de sua irmã mais velha se abriu completamente. Ela o encarou de braços cruzados, tentando manter uma expressão severa. O sorriso malicioso em seus lábios, porém, a delatava.

— É muito feio ficar ouvindo atrás da porta, pirralho. — Ela declarou.

— Ah, dá um tempo! — Ash sibilou — Mentir também é feio, mana.

— Eu não menti. Só omiti uma parte da verdade.

— Qual é! Você disse que estava pensando em voltar, não que já tinha organizado tudo. Foi uma mentira deslavada!

— Que seja. — Calista disse friamente, sua expressão se tornando séria. — Eu te amo, Ash, mas não devo satisfações a você. Vou voltar, sim, quer concorde com isso ou não. Aceite o fato.

— Então eu vou com você.

— O que?! Ash, eu não preciso de uma babá. Posso me cuidar muito bem sozinha.

— Não tem nada a ver com isso. — Ash insistiu. — Eu acabaria voltando mais cedo ou mais tarde, já que ainda não consegui todas as insígnias. E vai ser melhor se estivermos juntos.

— Tem razão. Como quando éramos crianças, um cuidando do outro. — Calista enfim sorriu novamente, maliciosa. — E é claro que ver a Serena de novo não tem nada a ver com isso, não é, irmãozinho?

Ash corou violentamente com aquela provocação.

— Dá um tempo, Caly. — Ele resmungou. — Então ... Eu não sabia que você e Cynthia eram tão próximas.

— Ah, por favor! — A jovem performer revirou os olhos. — Não somos. Só temos assuntos em comum.

— Sei. — Ash riu baixo. — Não foi o que eu ouvi, mana.

— Calado, pirralho, ou empurro você da escada agora mesmo.

— Não empurra, não. A mamãe te mataria.

— Com certeza.

Os dois irmãos riram, mas Ash logo ficou sério. Calista sabia que aquelas provocações eram só uma forma de ele evitar dizer o que realmente estava pensando.

— Vai dar tudo certo. — A morena garantiu. — Boa noite, maninho. E cuidado com o bicho papão.

— Até parece. Já estou acostumado com a sua cara feia, mana.

— Seu babaca! — Ela riu, dando-lhe um soco sem força do qual Ash se esquivou facilmente. Ele não esperava, porém, que ela logo em seguida se inclinasse e lhe desse um beijo na bochecha. — Obrigada, irmãozinho.

— Pelo que, exatamente, sua maluca?

— Por ser você. — Ela respondeu. — Em quanto tempo acha que pode deixar tudo em ordem para partirmos?

— Três semanas. 

— Por mim tudo bem. — A morena sorriu. — Boa noite, seu babaca.

Alguns dias depois, Calista estava jogada na cama lendo. Ainda era cedo e a morena se surpreendeu ao ouvir seu celular tocar. Ela pegou o aparelho e atendeu sem sequer conferir o número de quem ligava.

— Bom dia. — Cynthia disse, sua voz borbulhando de empolgação. — Ora, ora. Acordou cedo, cabeça de pedra.

— Talvez seja culpa sua. — A morena rebateu jocosamente. — O que você quer, campeã?

— Saber se você está livre hoje. — Foi a resposta. — Encontrei uma pista sobre Articuno. Que tal irmos dar uma olhada?

— O que?! — A jovem exclamou, quase pulando de pé ao perceber o significado daquele convite. — Você está em Kanto?!

— Desde ontem. — A loira revelou, rindo alto do tom de surpresa da irmã de Ash. — E então, o que me diz?

— Eu digo com certeza! — A morena exclamou. — Onde e quando?

— Podemos nos encontrar perto do centro pokemon de Cinnabar. Hoje à tarde, às três.

— Combinado. Nos vemos mais tarde, campeã.

— Até mais tarde, Calista.

— Um encontro, mana? — Ash provocou, parado na porta.

Calista agarrou um dos bichos de pelúcia sobre a cama, atirando-o no irmão mais novo com pontaria perfeita enquanto exclamava "cai fora, Ash!". O rapaz se afastou às gargalhadas.

Naquela tarde, Calista foi para Cinnabar. Ela e IceFire pousaram no topo da montanha vulcânica e a jovem ficou surpresa ao ver que a campeã já a esperava. Se aproveitando do fato de ela estar de costas, a performer kantoniana se aproximou sorrateiramente.

— Eu deveria empurrar você agora mesmo.

Cynthia mal pareceu se surpreender ao ouvi-la, apenas se virou para olhá-la com um sorriso zombeteiro.

— Não se eu empurrar você primeiro.

— Quer apostar quem é a mais rápida?

— Você é impossível, Calista. — A campeã riu. — É bom te ver de novo.

— Igualmente, loira.

Um borrão laranja subitamente passou voando por elas, empurrando a campeã e fazendo com que perdesse o equilíbrio. Calista foi rápida e a segurou pelo pulso, mas acabou tropeçando em uma pedra e caindo também.

As duas mulheres caíram juntas no chão rochoso à beira da cratera, o que terminou com a irmã de Ash por cima da loira, seu corpo prendendo o dela contra as rochas. A jovem praticamente pulou de pé, estendendo uma das mãos para ajudá-la. Cynthia aceitou o gesto.

— Você se machucou? — Calista inquiriu.

— Não. — A loira respondeu. — Estou bem. Você?

— Tudo bem. — Ao responder, Calista notou o quanto a campeã de Sinnoh estava corada. Isso a fez rir alto. — Alguma ideia do que diabos aconteceu aqui?

— Talvez. — Foi a resposta. — Ande logo, vamos descer antes que mais alguma coisa aconteça.

— Essa é uma ótima ideia.

Apesar da encosta escarpada, a descida havia sido facilitada por mãos humanas. Havia, inclusive, uma escada que conduzia ao topo da montanha. As duas não tiveram problemas para atingir a base do vulcão, onde se localizava o centro pokemon. Uma vez lá dentro, Calista reparou em um rapaz de cabelos escuros sentado sozinho em um canto, mexendo no celular.

— Só um minuto, Cal. — Cynthia disse. — Preciso resolver um assunto.

O apelido e a forma natural como a loira o dissera surpreendeu as duas por um momento. Cynthia, porém, não se deixou distrair por aquilo. Ela praticamente marchou até o rapaz moreno.

— Eu já devia saber que aquilo foi obra sua. — A loira declarou acidamente.

— Oi pra você também, nee-chan. — Hitoshi respondeu ironicamente. — Que surpresa te ver por aqui!

— Você é um grande idiota. — Cynthia rebateu. — Sabe disso, não sabe?

— O que eu sei é que só um idiota reconhece outro, sua bobona.

Cynthia não soube o que responder por um segundo, se esforçando para manter a calma. Hitoshi realmente tinha o dom de tirá-la do sério. A pior parte é que ele sabia disso, e adorava o fato.

— Seu moleque idiota. — Ela declarou enfim, com toda a arrogância que conseguiu reunir. — Que seja. Não vou perder meu tempo discutindo com você.

— Boa escolha. — Hitoshi zombou. — Se concentre no seu encontro.

 Cynthia, que já havia lhe virado as costas, voltou-se novamente. Seu rosto era uma máscara de gelo, mas os olhos luziam de raiva. Ela sibilou um "cale essa boca" e se afastou a passos largos, o que o fez soltar uma sonora gargalhada.

A loira o ignorou e foi se juntar a Calista, que analisava o enorme mapa da região de Kanto que decorava uma das paredes do saguão principal do centro pokemon.

— Tudo bem, loira?

— Claro. — Foi a resposta, embora a campeã mal conseguisse disfarçar a irritação. — Me desculpe por meu irmão ter causado problemas. Ele é um tremendo idiota.

— Sem problemas. — A morena respondeu, virando-se e lhe dirigindo um sorriso. — O meu também é. E aí, vamos? As Ilhas Espuma do Mar ficam ao sul daqui, podemos ir voando. Ou surfando. Você decide.

— Voando, com certeza.

— Ótima escolha. É só me seguir.

As duas deixaram o centro pokemon, subindo a escadaria ao lado do prédio para atingir o ponto mais alto da praia, ao pé do vulcão. Garchomp e IceFire foram tiradas de suas pokebolas mais uma vez.

— Pronta, campeã?

A pergunta foi o suficiente para fazer com que Cynthia, que ainda não se acalmara totalmente após a discussão com Hitoshi, soltasse um grunhido de raiva.

— Por que você sempre me chama desse jeito? — Ela inquiriu. — É tão difícil assim me chamar pelo nome?

Calista arquejou de surpresa, tanto pela pergunta inesperada quanto pela súbita explosão da campeã. Vendo isso, Cynthia recuou, respirando fundo para se controlar.

— Sinto muito. — Disse enfim, de volta ao seu habitual tom sereno. — Hitoshi sabe mesmo como me irritar. Desculpe por descontar em você.

— Tudo bem, eu faria pior. Desculpas aceitas.

— Mesmo assim ... — Cynthia olhava para o mar, evitando os olhos da mulher ao seu lado. Uma de suas mãos brincava com uma mecha de seu cabelo loiro. — Por que você sempre usa meu título? É meio ridículo ficar me chamando de "campeã" o tempo todo.

— Eu não chamo você de "campeã" o tempo todo. — A morena protestou. — Só quando você está sendo insuportável.

— Muito engraçado, Cal.

Mais uma vez, o apelido e a forma casual como fora dito pegaram Calista de surpresa. Mas não de uma forma ruim.

— Não fique assim, loira. — A jovem kantoniana provocou amigavelmente. — Você está sendo ranzinza, sabia? Como um velho Slaking.

— Talvez. — Cynthia cedeu, finalmente sorrindo, como Calista queria. —  Ande, vamos logo ver essas ilhas.

Calista tinha razão ao dizer que as ilhas Espuma do Mar eram próximas de Cinnabar. A rota 20, uma rota aquática, era extremamente rápida se percorrida pelo ar, e as duas mulheres pousaram em seu destino poucos minutos depois.

— Ei, Cynthia, lembra de quando nos conhecemos? — A irmã de Ash disse enquanto caminhavam na direção da entrada da caverna da primeira ilha. — Naquela noite, ao pé da estátua. Você me disse que eu ainda não tinha visto nada. Estava certa, sabia? Você é bem diferente do que eu pensava.

A campeã loira respondeu apenas com um gesto afirmativo de cabeça.

— Obrigada. — Disse enfim — Por ter aceitado vir comigo hoje.

— E para que servem os amigos, afinal?

Cynthia pareceu surpresa por ouvir aquilo. Quantidades iguais de surpresa e prazer.

— É isso mesmo que somos?

— Claro. — Calista respondeu arrogantemente, como se declarasse um fato extremamente óbvio. — A não ser que você pense diferente.

— Não. — Cynthia lhe garantiu. — Eu penso o mesmo.

Algo lançou uma sombra sobre as duas. As mulheres olharam para cima ao mesmo tempo para ver do que se tratava.

Era um pokemon, uma gigantesca ave que voava na direção da segunda ilha. Suas asas eram enormes, brilhando sob o sol como se fossem feitas de diamantes, e uma longa cauda que ondulava no ar seguia os movimentos de seu voo como se fosse uma graciosa fita. O pokemon entrou direto por uma abertura no topo da caverna da segunda ilha.

As duas levaram alguns segundos para conseguir se mexer, tomadas pelo deslumbramento ante aquele pokemon majestoso. Calista e Cynthia trocaram um olhar de pura empolgação.

— Aquele pokemon é o que estou pensando que é? — A loira inquiriu.

— Articuno. — O sorriso de Calista espelhava o da campeã. — Então é verdade. Ele vive mesmo nos túneis sob as ilhas.

— Então o que estamos esperando? Vamos lá!

Calista riu da empolgação de Cynthia, embora tivesse que confessar estar sentindo a mesma coisa. Juntas, as duas dispararam para dentro da caverna, em direção aos túneis que ligavam as duas Ilhas Espuma do Mar.


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