Pokémon - Luz do Amanhecer escrita por Benihime


Capítulo 20
Feliz aniversário, Ash




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Algo o cutucava. Ash estendeu uma das mãos, ainda de olhos fechados, até encontrar e acertar a coisa com um tapa sem força.

— Para com isso, Pikachu. — O rapaz moreno murmurou, virando-se para enterrar o rosto no travesseiro. — Só mais cinco minutos, amigão.

Mas Pikachu não parou de cutucá-lo, o que fez Ash finalmente abrir os olhos, irritado. Ao invés de seu parceiro, o garoto encontrou a bocarra aberta de um Gyarados a centímetros de seu rosto.

O treinador kantoniano gritou de susto, sentando com tanto ímpeto que quase bateu a cabeça na parede ao lado da cama, na qual o móvel estava encostado. Foi então que Calista tirou a máscara, rindo tanto que lágrimas escorriam por seu rosto.

— Essa foi boa! — Ela exclamou, ainda rindo. — Valeu, Pikachu! Toca aqui!

Pikachu, parado aos pés da cama de seu treinador, também gargalhava. O Pokemon Rato bateu a ponta de sua cauda em forma de raio na palma da mão da jovem morena em uma saudação.

— Odeio você, Caly. — Ash resmungou, se jogando na cama de novo. — E você, Pikachu, você é um traidor.

— Qual é, Ash, tenha senso de humor. — Calista protestou, enquanto Pikachu cutucava a bochecha de seu treinador com o focinho, como se pedisse desculpas. — Devia ter visto seu rosto. Foi hilário, irmãozinho!

Pikachu recomeçou a rir junto com a morena, os dois quase perdendo o fôlego. Ash fechou a cara para a dupla.

— O café da manhã está pronto. — A jovem finalmente avisou quando conseguiu parar de rir, limpando as lágrimas que lhe escorriam pelo rosto. — A mamãe mandou você não demorar, Slugma.

— Tá, tá. — Ash resmungou, de mau humor, virando as costas para sua irmã mais velha. — Tanto faz. Não estou com fome.

— Mentira.

A morena praticamente cantou essa palavra, rindo novamente. Isso o fez cerrar os dentes. Calista sabia ser extremamente irritante quando queria.

— Cai fora, mana.

— Claro. — A performer riu. — E, antes que eu esqueça ... Feliz aniversário ... Pirralho.

Ash quase se virou para olhá-la. Quase, mas se viu mudando de ideia quando levou um tapinha na nuca. Ao invés disso, o rapaz grunhiu de raiva.

— Vê se cresce, Caly.

— Desça logo, seu bicho preguiça. — A morena riu em resposta. — Se eu sou um Slowpoke, você é um Slakoth. 

— Pelo menos os Slakoths são bonitinhos.

— Não no seu caso, bobão.

Depois dessa resposta, o rapaz ouviu os passos de sua irmã saírem do quarto. Ash sentou na cama novamente, resmungando consigo mesmo sobre irmãs mais velhas malucas saídas do inferno.

Pikachu, enrodilhado no travesseiro acima da cabeça de seu treinador, apenas o observava. Era óbvio que o pokemon tipo Elétrico estava se divertindo com tudo aquilo.

— É sério. — O jovem moreno declarou, agora em voz alta. — Tive sorte que foi só a máscara e não um Zubat debaixo da minha cama ou coisa pior.

Pikachu desatou a rir novamente, o que fez Ash fechar a cara e cruzar os braços, mais por birra do que por estar realmente irritado. Ele não conseguia ficar com raiva daquele malandrinho amarelo.

— De que lado você está, afinal? —  O rapaz murmurou simplesmente.

Pikachu riu de novo, mas ergueu as duas patas dianteiras no ar em sinal de rendição. Ash grunhiu novamente, ainda irritado com sua irmã mais velha, e rolou para fora da cama.

Logo depois o jovem e seu pokemon já estavam na cozinha, tomando café. Calista não estava lá, e Ash não a ouvira no quarto dela ao descer as escadas, o que o fez supor que a jovem havia saído.

— Ei mãe. — Ele chamou, deixando sua curiosidade vencer. — Pra onde a Caly foi?

— Pesquisa de campo. — Foi a resposta, enquanto sua mãe se ocupava limpando a cozinha. — Sua irmã está ajudando o professor Carvalho com alguns pokemon.

O garoto relaxou, tomando mais um gole de café, desfrutando o calor da bebida. Apesar de odiar café puro quando criança, aprendera a gostar depois de viajar por tanto tempo com Brock, que era um verdadeiro viciado em cafeína.

— Que bom. — O moreno comentou com Pikachu. — Eu juro, amigão, aquela mulher é totalmente louca. Doida de pedra.

— Ash Ketchum, não fale assim da sua irmã!

Ash deu um pulo de susto, o que fez Pikachu reprimir outra risada. O garoto fez uma careta para seu pokemon. O rato elétrico, um mímico por excelência, respondeu imitando a expressão de seu treinador, o que fez o moreno rir.

— Certo. — O treinador kantoniano disse, corando de leve. — Desculpe, mãe.

Ash terminou o resto do café em um único gole e levantou-se, lavando a xícara e deixando-a na pia para secar. Sabia que Dehlia ficaria furiosa se ele agisse de outra forma.

Pouco tempo depois o rapaz estava saindo apressadamente, como sempre. E mesmo pensando que Calista era louca, decidiu ir ao encontro dela.

— Vamos ver se consigo me vingar pelo susto. — Ele disse, abrindo um sorriso malicioso ao imaginar as possibilidades. — Ela bem que merece isso.

Mas Calista não estava no laboratório. O professor Carvalho lhe disse que ela tinha ido à floricultura pegar uma encomenda para Dehlia antes de iniciar o trabalho de campo.

— Já deve estar voltando, então. — O moreno deduziu. — Anda, Pikachu, vamos ver se a pegamos no caminho!

Mas não, e Calista também não estava na floricultura. Ash desistiu de procurar e decidiu deixar a vingança para mais tarde. Sabia que oportunidades não lhe faltariam, se fosse criativo.

Ele e Pikachu seguiram para a Rota 2, que conduzia para fora de Pallet, esperando encontrar algum treinador da cidade de Viridian disposto a batalhar. Não tiveram sorte e acabaram apenas treinando nos arredores da cidade.

— Ei, Ash!

O garoto congelou de surpresa, no meio de uma batalha de treinamento entre Pikachu e Greninja. A voz que o chamara era familiar, mas uma das últimas que esperava ouvir.

Ao se virar, viu duas figuras conhecidas que lhe acenavam, um pouco mais adiante na estrada. Uma delas era um homem alto e musculoso. Mas foi a garota quem prendeu o olhar de Ash. Não, não mais uma garota. Misty havia se tornado uma mulher.

Aquela camiseta amarela, mesmo sendo larga, não conseguia disfarçar o modo como seu corpo se desenvolvera, esguio e atlético devido às horas de treinamento na piscina com seus pokemon tipo Água. Seu cabelo ruivo, naturalmente ondulado e agora longo o bastante para cair em cascata até sua cintura finíssima, estava preso em um rabo de cavalo alto que balançava a cada passo dela. Uma mudança e tanto em comparação com a garota desajeitada no começo da pré-adolescência de quem Ash se lembrava.

Brock, por outro lado, não mudara quase nada. Estava mais alto e mais musculoso, sem o físico levemente desajeitado do garoto de dezessete anos de quem o irmão de Calista se lembrava. Algumas rugas haviam se formado nos cantos de seus olhos e boca, ficando evidentes quando o líder de ginásio sorriu. Ele e Ash trocaram um aperto de mãos firme, satisfeitos em se verem novamente depois de tanto tempo.

— E aí, Ash. — O líder do ginásio de Pewter disse. — Que bom te ver, cara! Já faz muito tempo.

— É bom te ver também, Brock. — O garoto sorriu. — Como vão as coisas?

— Melhor impossível. — O homem mais velho declarou, erguendo com orgulho a mão esquerda para mostrar uma aliança em seu dedo anelar. — Lembra da Lucy, a Rainha do Pico, em Hoenn?

— Não! — Ash exclamou, entre surpreso e impressionado. — Sério? Vocês se casaram?

— Dois meses atrás. — Brock contou. — Não achei que ela fosse aceitar, mas parece que tirei a sorte grande.

— Pois é, foi uma surpresa ela aceitar se casar com um cabeça oca como você. — Misty declarou acidamente, fazendo Ash rir. — Oi, Ash. Feliz aniversário, seu pentelho.

Ash riu de novo. "Pentelho" era como Misty costumava chamá-lo antigamente, quando viajavam juntos. Parecia que o apelido jamais morreria.

A ruiva o abraçou brevemente, o que fez o rapaz corar. Verdade seja dita, tivera uma queda pela líder do ginásio de Cerulean anos antes, mas isso era algo que o rapaz sabia ter superado há muito tempo.

O par o acompanhou até em casa e Dehlia os recebeu sem nenhuma surpresa. De fato, fora ela quem convidara os dois líderes de ginásio, que também eram os amigos mais antigos de Ash.

— Mãe? — Eles ouviram Calista chamar, depois de estarem os três esparramados em um sofá da sala de estar, conversando há vários minutos. — Mãe, voltei.

Misty pulou de pé, seus olhos se arregalando de surpresa e seu rosto tão vermelho quanto seus cabelos. Em poucos passos rápidos ela estava na passagem do corredor que conduzia à cozinha.

— Star! — A surpresa da ruiva deu lugar a um sorriso enorme, de quase indizível felicidade ao ver a jovem morena que se aproximava. — Não acredito que é você!

Calista apareceu no corredor, de braços abertos e com um sorriso caloroso no rosto. Misty quase imediatamente se jogou nos braços da morena, que riu com gosto de seu entusiasmo.

— Caramba, ruivinha, como você cresceu! — A mulher mais velha comentou aprovadoramente. — E ficou bonita. Isso sim é uma surpresa!

A líder de ginásio se afastou um passo, fazendo cara feia para Calista, que riu novamente, achando graça de sua reação.

— Brincadeirinha. — A irmã de Ash provocou. — Oi, Brock. Como vai? Como vai a Lucy?

— Muito bem, obrigada. — Brock respondeu. — Ela vai adorar saber que encontrei você. Ainda está decidida a ter aquela revanche.

— Posso imaginar. — Calista revirou os olhos, bem humorada. — Diga a ela que estou guardando o melhor para o final. Vamos nos enfrentar de novo com certeza, e vou fazer aquele Seviper voar tão longe que ela vai precisar de binóculos para encontrá-lo.

Brock soltou uma sonora gargalhada com aquela resposta tão característica. Ash simplesmente encarou sua irmã mais velha, boquiaberto.

— Eu não acredito! — O garoto exclamou — Vocês se conhecem?! Sério, mana?

— Calista é sua irmã?! — Brock e Misty exclamaram em uníssono, surpresos.

— Irmã mais velha. — A morena explicou, rindo alto com a surpresa dos três. — E sim, Ash, conheci Brock e Misty quando desafiei os ginásios de Kanto.

— E que desafio! — Misty interrompeu, sua voz aumentando em volume junto com sua empolgação. — Você devia ter visto isso, Ash. A Caly acabou com aquelas três bobocas usando só um Charmeleon!

Uma Charmeleon. — A morena corrigiu. — Fêmea. IceFire. Agora Charizard, como você bem sabe. Bem demais, eu diria. Não é, ruivinha?

— Nem me lembre. — O riso desapareceu do rosto de Misty, substituído por uma expressão intensa de desafio e contrariedade. — Precisamos ter uma revanche qualquer hora dessas.

— Quando quiser, garota. — A irmã de Ash declarou. — Fire e eu podemos acabar com suas estrelas do mar fracotas a qualquer momento.

— Ei! Não fale assim dos meus pokemon!

— OK. — Calista deu uma risadinha. — Estrelas do mar bobonas soa melhor, de qualquer jeito. E nós duas sabemos que nem Staryu nem Starmie têm chance contra minha IceFire, mesmo com uma vantagem de tipo. Nós venceremos de qualquer maneira, porque você não vai conseguir atingir a minha garota nem sequer uma vez.

Embora a intenção daquelas palavras fosse obviamente provocar Misty, a arrogância velada de sua irmã surpreendeu Ash. Não era o jeito dela. Competitividade sim, com certeza. Mas não arrogância.

— Eu não contaria com isso, Star. — A ruiva respondeu, sem se abalar.

— Star? — Ash inquiriu, curioso. — Sério, Misty? Minha irmã é mais parecida com o seu Psyduck do que com uma estrela.

As duas jovens estenderam os pulsos esquerdo e direito, respectivamente, pondo-os lado a lado para revelar tatuagens idênticas na forma de Starmies.

— Hoenn. — Calista explicou. — Misty me desafiou para uma batalha. Fire e eu totalmente acabamos com o Starmie dessa ruiva. E com aquela Azumarill brigona dela também. Daí o apelido de Star, porque minha garota dominou o campo de batalha com a velocidade de uma estrela cadente.

— Em desvantagem? — O moreno zombou. — Conta outra, mana! É mentira, não é, Misty?

Mas, para sua surpresa, Ash viu a líder de ginásio lançar à sua irmã um olhar ressentido, seus lábios se franzindo em um beicinho amuado.

— Só porque não estávamos lutando em um campo aquático. Caso contrário, Starmie teria vencido. — Ela rebateu em tom beligerante. — Além disso, você teve a ajuda de um campeão. Aquela batalha não valeu e você sabe disso.

— Ah, qual é! — A morena bufou ironicamente. — O Steven só arbitrou a batalha, ele não me ajudou em nada.

— Claro que ajudou. — Misty protestou, cruzando os braços. — Ele totalmente te favoreceu.

— Só na sua cabeça, tomatinha. Se quer saber, Steven até mudou um pouco as regras para garantir que eu não tivesse vantagem nenhuma.

Ash riu alto quando viu sua amiga ficar vermelha, mesmo assim erguendo o queixo com orgulho. Aquilo era tão tipicamente Misty.

— Eu. Você. Revanche. — Foi a única resposta da ruiva.

— Desista, Misty. — O moreno zombou. — Mesmo que você consiga vencer a IceFire, duvido que passe pela Mirabelle. E se você passar, é melhor sair correndo. A Mira odeia perder, certo, mana?

— Certíssimo. — Calista respondeu com uma sonora gargalhada. — Minha Sylveon, Mirabelle, é a pior perdedora que eu já vi. Ela é completamente maluca. Doida de pedra.

Mirabelle, que até então estivera dormindo na cama de Calista, e acabara de se juntar ao grupo, rosnou com raiva ao ouvir essas últimas palavras, acertando sua treinadora por trás com suas fitas. Ash estava esperando por isso e pegou sua Calista pelos pulsos para ajudá-la a manter o equilíbrio, enquanto os dois perdiam o fôlego de tanto rir.

— Ande, sua doida. — A morena disse, endireitando a postura e se virando para olhar sua parceira. — Vamos para a cozinha ajudar a mamãe. Pessoal, conversamos daqui a pouco.

Mas Ash não deixou sua irmã mais velha escapar. Ele a seguiu até o corredor. Ela se virou ao ouvir os passos dele, uma expressão inquisitiva no rosto e um brilho brincalhão nos olhos.

— Steven? — O rapaz inquiriu, curioso. — Misty? Até o Brock? Sério, mana? Por que você nunca me contou?

A jovem relaxou depois dessa pergunta. Ash pensou tê-la ouvido soltar um suspiro de alívio, mas não pôde dizer com certeza. Isso o deixou ainda mais curioso, e ele ergueu uma sobrancelha. Os lábios carnudos da morena se curvaram em um sorriso malicioso, provocando-o.

— Está bem, está bem. Conheci Steven praticamente no dia em que pus os pés em Hoenn. É uma longa história. Quando à sua última pergunta ... — Ela deu uma risadinha — Bem ... Você nunca me perguntou nada sobre isso.

— Estou perguntando agora.

— Mais tarde, garoto. — Foi a resposta. — Vá ficar com seus amigos, seria rude ignorá-los. Vou ver se a mamãe quer ajuda.

Ash revirou os olhos com o comentário sobre ser rude. Calista havia mesmo passado tempo demais em Kalos, o suficiente para que toda aquela afetação sobre boas maneiras e etiqueta começasse a se tornar um hábito. Na maior parte do tempo, pelo menos. Mas ela estava certa e o rapaz optou por obedecer, lançando um olhar significativo para sua irmã para que ela soubesse que não escaparia de sua curiosidade mais tarde. Assim que estivessem sozinhos.

— Caly. — Dehlia sussurrou assim que a viu entrar na cozinha. — Então, como foi?

— Perfeito. — Foi a resposta, dada com uma risada, em um tom de admiração incrédula. — Todo mundo confirmou. Foi uma ótima ideia, mãe. Como está indo a outra parte?

— Quase pronto. Pode pôr a mesa para mim, por favor?

— Claro.

Calista pôs a mesa e o grupo se reuniu para o almoço. Ash, Brock e Misty conversavam animadamente, atualizando uns aos outros sobre o que estava acontecendo em suas vidas. Calista e Dehlia trocaram um sorriso conspiratório. O garoto não tinha ideia de que vira a seguir, da surpresa que elas haviam preparado.

O grupo se reuniu de novo na sala de estar depois do almoço, ainda conversando. Ash decidiu colocar sua irmã contra a parede. Para conseguir isso, começou perguntando a Misty sobre a batalha delas em Hoenn, se achando muito engenhoso por conceber tal estratégia.

Calista, sentada em frente ao seu irmão mais novo, percebeu a tentativa nada sutil do jovem e sorriu astuciosamente. Mas se rendeu de qualquer forma, contando junto com Misty a história sobre sua batalha. Quando terminaram, a pedido dos outros três, a jovem contou como conhecera Steven Stone, o campeão de Hoenn. Essa história arrancou risadas de todos, até mesmo Dehlia, o que não era surpresa. A situação havia sido tão ridícula que a própria Calista ainda ria ante a lembrança.

— Droga! — Eu xingo quando a pedra em que eu estivera me apoiando se solta subitamente sob minha mão.

A súbita falta de apoio faz com que eu perca o equilíbrio, rolando pela fissura no piso da caverna. O chão é áspero, e posso sentir as pequenas pedras arranhando minha pele. Uma delas, mais afiada, abre um pequeno corte em minha bochecha.

A queda não é tão longa. Sete, oito metros no máximo, pelo menos é o que posso ver na luz da lanterna que tiro de minha mochila. Minha sorte foi que rolei pela descida íngreme. Se tivesse sido uma queda livre, eu certamente não sairia andando dessa situação.

Avalio rapidamente meus ferimentos. Nada severo, por sorte. Cortes, arranhões e hematomas, mas nada que me impeça de continuar. Me ponho de pé, medindo a distância da subida. Impossível escalar de volta sem uma corda. Coisa que, é claro, esqueci de trazer. Para piorar, além da fraca luz que vem lá de cima, minha única outra fonte de iluminação é a lanterna que estou segurando. Mesmo com uma corda, seria impossível escalar essa parede traiçoeira, cheia de pedras soltas, na penumbra.

Olho em volta. Parece que estou em um túnel, um bem estreito. Posso sentir uma parede contra minhas costas, pontas afiadas de rocha cutucando minha pele mesmo sobre a camiseta. Passo a alça de minha mochila, que se soltou durante a queda, e a ajeito em minhas costas, prevenindo qualquer ferimento causado pelas rochas atrás de mim.

Há mais túneis saindo desses, parecendo bocas negras na penumbra aqui em baixo. Eu os observo, tentando decidir qual deles me levará para fora daqui. 

— Olá? — Uma voz masculina reverbera pela caverna. — Você está bem?

— Estou, sim. — Respondo, aliviada por não precisar contar com a sorte para sair desse lugar. — Mas não dá pra subir de volta. Estou presa aqui.

— Vou jogar uma corda. — Ele responde imediatamente, e vejo a dita corda deslizar fissura abaixo segundos depois. — Amarre firme e dê dois puxões quando estiver pronta. Vamos puxá-la para cima.

Obedeço, amarrando a corda com firmeza ao redor de minha cintura. Verifico rapidamente o nó antes de dar dois puxões, como combinado. Um gritinho de susto escapa de meus lábios quando sou puxada para cima, muito mais rápido do que esperava.

Sinto um fragmento de rocha afiado cortar meu ombro, rompendo a alça de minha blusa. A parte esquerda da roupa se rasga, expondo meu torso até a cintura. Como se isso tudo não fosse suficiente, o impulso que me puxa para cima é forte demais.

Meus pés atingem a rocha mais firme da parte superior da caverna, mas não consigo me equilibrar e caio com tudo. O homem que me ajudou tem reflexos rápidos, mas não consegue me segurar. Ao invés disso, acabo caindo por cima dele, derrubando-o com tudo no chão rochoso.

— Ah, caramba! — Exclamo, horrorizada. — Você está bem? Eu sinto muito, muito mesmo!

Me ponho de pé em um pulo, automaticamente estendendo uma das mãos para ajudá-lo.

— Eu estou bem. — Ele responde, sem conseguir disfarçar o tom de divertimento em sua voz. — Venha, é melhor sairmos daqui antes que mais alguma coisa aconteça.

Esquecida do meu encontro desagradável com aquelas rochas, sigo meu salvador para fora da caverna. Passos pesados nos seguem de perto.

Atingimos a entrada mas, após vários minutos na escuridão, o sol fere meus olhos. Paro logo antes de sair da caverna, me protegendo nas sombras até meus olhos se acostumarem à luz. Um Aggron passa por mim para se juntar ao homem lá fora, e logo suponho que foi aquele pokemon quem me puxou para fora do túnel subterrâneo.

— Obrigada. — Eu digo. — Por me ajudar. Não sei o que eu teria feito se vocês não tivessem aparecido. É um labirinto lá embaixo.

— Sim, é extremamente perigo cair nessa rede de túneis. — Meu salvador responde. — Como você caiu, afinal?

— Fui descuidada. — Admito, zangada com minha própria estupidez. — Ignorei quando me disseram que era perigoso.

— Eu fiz o mesmo quando vim aqui pela primeira vez. — Ele confessa. 

Com meus olhos novamente acostumados à luz do sol, posso ver que meu salvador é um homem alto de cabelos claros, tanto que quase parecem prateados, num tom que me lembra a cor das penas de uma Altaria, embora mais azulado. Quando ele me olha, vejo que seus olhos são quase da mesma cor, de um azul claro metálico. Ele tem feições agradáveis e um porte esguio, elegante. É obviamente bem nascido, se sua postura for alguma indicação.

Saio da caverna e ele desvia o olhar, num gesto apressado que me pega de surpresa. Levo um segundo para lembrar o motivo, e então sinto minhas bochechas pegarem fogo.

— Me desculpe! — Exclamo novamente, pegando minha mochila e procurando freneticamente por outra camiseta.

Por sorte encontro rapidamente, e largo a mochila no chão para poder vestir a peça, uma camiseta que fica grande demais, mas pelo menos cobre o sutiã que minha camiseta rasgada deixou à mostra.

— Eu ... — Gaguejo levemente, por nervosismo e vergonha. — Meu nome é Calista.

— É um prazer conhecê-la. — Meu salvador responde agradavelmente. — Sou Steven.

Não consigo não arquejar, sentindo meu rosto arder ainda mais. Se eu achava que estava com vergonha antes, agora estou muito além disso. Só quero que o chão se abra e me engula.

Steven rompe a tensão com uma risada. Não é um riso de deboche, mas uma risada agradável e bem humorada que imediatamente me deixa à vontade. Quase sem querer, me pego rindo junto com ele.

Mirabelle, enrodilhada no colo de Calista, ria consigo mesma de tempos em tempos ao ouvi-la recontar a história. Havia sido parcialmente culpa daquela pokemon maluca que os dois se conhecessem, pois fora ela quem quisera explorar a caverna. A Sylveon inclusive ainda ressentia um enorme respeito pelo Metagross do campeão de Hoenn, um tanque que sozinho rendera uma derrota épica a ela e todos os seus cinco companheiros da época.

Algum tempo depois, o celular de Calista tocou. Ela conferiu o número e se pôs de pé rapidamente. Ash estranhou a agilidade do movimento, se perguntando como sua irmã havia melhorado tão rápido.

— É o professor. — A morena disse. — Preciso ir. Prometi que o ajudaria com um Victreebel violento.

— Ou melhor ... — Ash rebateu, divertido. — A IceFire vai cuidar do Victreebel.

— Somos um time, garoto. Não faz diferença. E você devia saber disso, se quer mesmo ser um mestre pokemon. — Calista rebateu, acenando em despedida para os dois líderes de ginásio. — Pessoal, vejo vocês daqui a pouco.

Brock e Misty disseram "até mais tarde" ao mesmo tempo, e o líder do ginásio de Pewter acrescentou um pedido para que a morena mandasse seus cumprimentos ao professor Carvalho. Calista garantiu que o faria.

O professor já a esperava na porta do laboratório, com as chaves do carro na mão. Ele tinha um sorriso malandro no rosto, de quem estava se divertindo muito com aquilo tudo.

— Tem certeza de que ele ainda não desconfia de nada? — Inquiriu.

— Absoluta. — Calista soltou uma risada travessa. — Ele nunca vai ver essa chegando.

— Sua mãe sempre tem as melhores ideias. — O professor declarou, rindo com gosto. — Então ... Vamos?

— Vamos lá. Quero só ver a cara daquele pirralho quando voltarmos!

— Somos dois, menina. — Samuel Carvalho disse, em tom conspiratório. — Somos dois.

A viagem até Celadon foi surpreendentemente curta, pouco mais de uma hora. O timing também fora perfeito, e os dois chegaram bem a tempo de pegar o grupo no aeroporto.

— Calista!

O grito partira de uma garotinha loira, que se separou do grupo e correu para abraçar Calista. Estava mais alta, seus braços agora facilmente se fechando ao redor da cintura da jovem kantoniana, fazendo-a rir. Bonnie crescera um pouco, mas continuava exuberante como sempre.

— Ash nunca me disse que tinha uma irmã. — Uma garota com longos cabelos selvagens, de um negro tão profundo que parecia violeta ou azul-escuro conforme ela movia a cabeça, declarou. — Ele é tão criança! Aposto que escondeu pra que ninguém comparasse vocês dois.

— Iris, por favor ... — Um rapaz alto  e elegante com cabelos pintados de verde disse em tom exasperado. — Não comece.

Calista riu e se voltou para a jovem, um de seus braços ainda ao redor dos ombros de Bonnie. Aqueles olhos verdes brilhavam maliciosamente, e a jovem treinadora de dragões não conseguiu deixar de retribuir aquele sorriso.

— Iris, certo? — A jovem de cabelos rebeldes assentiu em resposta. — Boa teoria, mas está errada. Ash só não falou sobre mim porque sabia que iriam querer me conhecer. E que eu iria contar coisas que ele prefere que ninguém saiba.

Os olhos cor de chocolate de Iris brilharam de empolgação, seu rosto se iluminando com deleite e malícia. Se o sorriso simpático e o brilho naqueles olhos verdes não bastassem, aquela frase brincalhona definitivamente ganhara a simpatia da garota.

— Histórias constrangedoras? — A jovem unoviana inquiriu esperançosamente.

— Pode apostar. — A irmã mais velha de Ash respondeu, com uma piscadela conspiratória. — As mais constrangedoras de todas.

— Me conte tudo!

O restante do grupo riu da reação da jovem treinadora de dragões. Calista aproveitou a oportunidade para cumprimentar Clemont e Serena, os únicos que conhecia pessoalmente.

Fora sua mãe quem se encarregara daquela parte, entrando em contato com todos os antigos amigos de Ash. Para ajudar a manter a surpresa, a morena e o professor Carvalho haviam concordado em buscar todos no aeroporto.

— Pensei que a Dawn viria também. — Calista comentou em voz baixa com Serena. — Ela ainda estava em Kalos, não é?

— Sim, estava. — A jovem performer kalosiana confirmou. — Mas ela disse que recebeu um convite de última hora e precisava se encontrar com uma amiga. Dawn prometeu que chegaria a tempo e nos encontraria na sua casa. Ela deve ter embarcado no voo seguinte ao nosso.

A morena estranhou aquilo, mas tentou não pensar muito no assunto. Não pôde, porém, deixar de suspeitar que Ash talvez tivesse descoberto sobre a surpresa e estivesse tramando algo com Dawn. Seria bem típico daqueles dois, dada a forma como se uniam para implicar com ela quando estavam juntos em Kalos.

A personalidade extremamente falante de Iris, o jeito esfuziante de Bonnie e a simpatia natural de Calista rapidamente quebraram o gelo entre o grupo. Antes mesmo de voltarem a Pallet, todos já estavam conversando e rindo como velhos amigos.

Quando pararam na frente da casa dos Ketchum, Calista fez sinal para que Serena se aproximasse.

— Entre por último. — A morena pediu, mal conseguindo conter um sorriso ante a peça que estava para pregar em seu irmão. — Fique atrás do Cilan, ele é alto. Assim o Ash não vai conseguir te ver.

O Especialista Pokemon riu, achando graça, e aceitou participar da brincadeira. Calista e o resto do grupo entraram, Serena seguindo Cilan como uma sombra, praticamente invisível atrás do jovem.

Bonnie e Clemont foram os primeiros que Ash viu, especialmente porque a garotinha correu para cumprimentá-lo. Isso o fez rir e lançar um olhar de acusação jocosa para sua irmã mais velha.

— Ideia sua, não foi? — O moreno indagou.

— Da mamãe. — Calista revelou. — Eu só dei uma mãozinha.

May foi a próxima a cumprimentar o rapaz, dando-lhe um rápido beijo no rosto. Calista riu consigo mesma ao ver que os olhos de seu irmão, embora discretamente, pareciam procurar insistentemente por alguém.

— Ela não pôde vir. — Bonnie anunciou, para surpresa da treinadora kantoniana, que não esperava ver a garotinha compreender tudo tão rapidamente. — A Serena. Mamãe precisava dela para alguma coisa, eu acho. Provavelmente com os Rhyhorn.

— Ah ...

Foi só o que Ash disse, mas o olhar desapontado em seu rosto valeu por mil palavras. Calista caiu na gargalhada, especialmente ao ver Bonnie lhe lançar uma piscadela pelas costas de seu irmão mais novo. A garota era esperta, apesar da pouca idade.

— Enganamos você. — Serena riu, saindo de trás de Cilan. — Até parece que eu perderia seu aniversário. Parabéns, Ash.

O rapaz corou como um pimentão, e todos viram o sorriso bobo que curvou seus lábios. Calista riu mais ainda. Ali estava um primeiro amor, mesmo que seu irmão fosse idiota demais para perceber.

A morena deixou Ash com os amigos e saiu discretamente da sala, indo até a cozinha. Sua mãe estava de costas, e Calista decidiu se divertir mais um pouco. Aproximando-se silenciosamente, deu-lhe um tapinha no ombro e riu ao vê-la pular de susto.

— Caly! — Dehlia repreendeu, embora longe de soar zangada. — Quase me matou de susto, menina!

— Desculpe. — A morena teve que morder o lábio para conter outro sorriso, tentando parecer realmente arrependida. — Quer ajuda, mãe?

— Quero. Pode tirar o chantilly da geladeira para mim, por favor?

Calista obedeceu, enquanto sua mãe colocava um enorme bolo em forma de pokebola na bancada.

— Está incrível. — A irmã mais velha de Ash opinou — Mas falta uma coisa.

— E o que seria, mocinha?

— Dezoito velas em cima. — Foi a resposta maliciosa. — Lembra? Como quando éramos crianças.

— Engraçadinha. — Dehlia repreendeu, falhando em parecer séria quando cedeu a uma risadinha. — Nada de provocar seu irmão, ouviu? Deixe ele em paz por hoje.

— Vou tentar. Mas não prometo nada.

As duas mulheres riram juntas e continuaram a dar os toques finais no bolo em silêncio. Podiam ouvir a conversa animada do grupo na sala de estar, um ruído de fundo que acabava se tornando agradável quando estavam concentradas na tarefa à sua frente.

— Ei, pessoal — Calista chamou, algum tempo depois. — Venham cá, está na hora da melhor parte! Ash, você vem quando eu chamar. Não se atreva a me desobedecer, ouviu, pirralho?

Risadas soaram ante aquela ordem. O grupo se reuniu na cozinha para cantar parabéns. Calista entregou a todos uma bombinha de confete, indicando que as escondessem, e então chamou Ash. Quando o parabéns terminou e a morena deu o sinal todos explodiram as bombinhas ao mesmo tempo. O moreno pulou de susto, depois caiu na gargalhada.

— Feliz aniversário, Ash! — Gritaram em coro.

Calista então foi até a geladeira e tirou de lá uma garrafa de champanhe. Dehlia colocou as taças sobre o balcão.

— Dezoito anos, Ash. — A morena declarou. — Vem, garoto, vamos brindar.

A maioria do grupo, exceto por Max, Bonnie e Serena, que estava a alguns meses de seu décimo oitavo aniversário, era maior de idade e todos brindaram.

— Anda, Ash. — Iris provocou. — Não seja criancinha, beba de uma vez.

Ash dirigiu uma careta de contrariedade à amiga e tomou um gole. Imediatamente engasgou e teve um violento acesso de tosse, provocando gargalhadas gerais.

— Goles menores, rapaz. — O professor Carvalho instruiu, dando um pequeno gole em sua própria taça. — Vá devagar.

— Bobagem, professor. — Calista protestou, brincalhona. — Só há um jeito de beber, e é ir com tudo até cair.

— Nem pense nisso, mocinha!

Mais uma vez todos riram do olhar mortal que Dehlia lançou para sua filha mais velha. Max e Bonnie, que haviam simpatizado um com o outro, se acomodaram à mesa depois que Ash cortou o bolo, conversando animadamente sobre pokemon. Estavam ainda no começo de suas jornadas, quando cada coisa que acontecia era nova e empolgante. Daisy se juntou a eles. Mesmo sendo muito mais velha, ela se entrosava muito bem com crianças. Sempre havia sido assim.

O restante do grupo se espalhou. Ash, Misty, Brock, May, Iris e o professor Carvalho foram para a sala de estar, podia-se ouvir as vozes deles enquanto conversavam. Cilan, que adorava culinária, discutia animadamente com Dehlia sobre bolos e outros doces. Calista aproveitou o momento e escapou para seu quarto.

Inari e Mirabelle estavam enrodilhadas sobre sua cama. Apenas a Sylveon ergueu a cabeça ao ouvi-la entrar, mas Calista a tranquilizou com um aceno para indicar que estava tudo bem.

A jovem sentou na beira da cama, apoiando a costas contra a parede, fechando os olhos e deixando que a máscara alegre sumisse de seu rosto. Tentar não demonstrar o que sentia a deixava exausta. Era bom poder se livrar do peso por alguns momentos.

— Caly?

A voz de Dehlia a fez pular de susto. Erguendo a cabeça, a morena encontrou o olhar preocupado de sua mãe, parada à porta. Quase que por reflexo, a expressão de Calista relaxou em um sorriso. Pouquíssimas pessoas, se é que havia alguma, perceberiam que o gesto era totalmente forçado.

— Eu estou bem, mamãe. — A ex performer garantiu. — Apenas cansada. Só preciso de meia hora, está bem?

Os olhos castanhos da mulher mais velha se suavizaram em uma compreensão tristonha enquanto ela assentia, fechando a porta atrás de si ao deixar o quarto. Só então Calista tirou de sob o travesseiro o amuleto que seu pai lhe dera. Seus olhos verdes se enevoaram de tristeza.

Ah, pai. Ela pensou com um longo suspiro. Queria que você estivesse aqui hoje. Não consigo acreditar que o Ash já tem dezoito anos. Nós perdemos tanto, tanto tempo! Desperdiçamos tantos anos.

Mirabelle, um dos poucos seres no mundo que conhecia o segredo por trás do sorriso e da atitude energética de sua treinadora, percebeu sua tristeza e se aproximou, envolvendo-a em suas fitas. A morena permitiu o gesto, estendendo a mão livre para acariciar sua pokemon.

Até mesmo Inari, que acordara ao ouvir a voz de Dehlia, percebeu que havia algo errado. A Vulpix subiu para o colo de sua treinadora e esfregou a bochecha contra a dela. Calista sorriu de novo, um gesto sincero dessa vez, enquanto passava um braço ao redor da pokemon tipo Gelo.

— Vamos, meninas. — A morena disse depois de alguns minutos. — Vamos descer e aproveitar a festa.

As três saíram juntas do quarto, e Calista ouviu a voz de Dawn. A jovem se inclinou sobre o corrimão no patamar superior da escada, esticando o pescoço para ver a figura pequena e delicada da garota. Seus olhos, porém, se fixaram na pessoa ao lado dela, e a morena paralisou.

Era uma mulher alta, esguia e elegante. Mesmo ela estando de costas, impossibilitando que Calista visse seu rosto, a jovem kantoniana imediatamente reconheceu aquela cabeleira loiro-dourada que cascateava pelas costas da recém chegada.

— Ah, Cynthia! — Ash exclamou, tirando de vez qualquer dúvida que sua irmã ainda pudesse ter. — Por favor! Um contra um. Greninja contra Garchomp. Por favor!

A campeã riu, dando uma resposta que Calista não conseguiu ouvir. A jovem recuou um passo, agindo por reflexo, recuando para voltar ao seu quarto. Pretendia se esconder lá para não vê-la ou precisar falar com ela.

Mas, de alguma forma, mesmo acima da cacofonia de vozes do grupo, Cynthia a ouviu se aproximar. A morena não teve certeza de como sabia disso, simplesmente soube, e antes mesmo que a campeã se virasse, olhando-a com franca surpresa.

— Calista?!

A irmã de Ash respirou fundo, reunindo todo o seu auto controle. Só então teve forças para dar um passo à frente, esboçando um sorriso que torceu para ser minimamente convincente.

— Olá, Cynthia. — Disse simplesmente, sem querer se arriscar a dizer nada mais.

— Olá, Calista. — A loira respondeu, uma nota de satisfação se infiltrando sob seu tom subitamente formal. — É bom te ver de novo.

A morena não respondeu, mas também não desviou os olhos dos da campeã de Sinnoh. Mirabelle empurrou sua treinadora com o focinho, num gesto de impaciência. A jovem, pega de surpresa, perdeu o equilíbrio. Ela tentou segurar-se no corrimão, mas não foi rápida o bastante e caiu sobre os dois últimos degraus, aterrissando de joelhos na base da escada, corando violentamente de pura humilhação.

— Mirabelle!

A resposta da Sylveon foi baixa, um pedido de desculpas que se perdeu no som das exclamações preocupadas que encheram a sala. Quando ergueu os olhos, Calista viu uma mão feminina que se estendia para ajudá-la. A morena aceitou, embora com relutância, e permitiu que Cynthia a ajudasse a levantar.

— Eu estou bem. — A jovem disse para todos, então baixou a voz e se inclinou na direção da mulher loira, sussurrando quase inaudivelmente. — Sério, campeã? Toda vez que nos encontramos, eu levo a pior. Isso já está ficando cansativo.

A expressão naqueles olhos verdes ao encarar a campeã de Sinnoh poderia congelar lava pura. Calista passou por ela e seguiu para fora a passos rápidos, acompanhada por Mirabelle.

— Caramba! — Ash exclamou, surpreso. — O que deu nela? Nunca vi a Caly agir assim.

— Sua irmã está cansada, Ash. — Dehlia respondeu. — Só isso. Não se preocupe, ela vai voltar logo.

O rapaz assentiu e as conversas foram retomadas. Cynthia, porém, lançou um olhar preocupado na direção em que Calista havia seguido.

— Isso tem a ver com você, não tem? — Ash perguntou em voz baixa, torcendo para que seus amigos não o ouvissem. — Alguma coisa aconteceu entre você e a Caly.

— É tão óbvio assim?

— Não. — O rapaz asseverou. — Eu simplesmente conheço a minha irmã. só isso.

A campeã hesitou por um breve momento antes de assentir, admitindo que o moreno tinha razão.

— Essa é uma história própria, Ash. — Cynthia declarou enfim. — Só posso dizer que sua irmã e eu nos encontramos uma vez, há alguns anos, e não acabou bem. O resto, vai ter que perguntar a ela.

Ash apenas assentiu, seu instinto lhe dizendo a razão para a raiva nos olhos de Calista. Era orgulho. Rivalidade. Uma rivalidade antiga, pela forma como ela reagira.

— Isso é entre vocês duas. — O rapaz declarou. — Mas eu falaria com ela, se fosse você.

— Você conhece sua irmã melhor do que eu. — Foi a resposta. — Ela já tem uma opinião formada a meu respeito, duvido que mude de ideia.

— Pode ser, mas sei de uma coisa sobre você, Cynthia: você não deixa as coisas pela metade. E isso ... — O rapaz meneou a cabeça na direção da porta e do caminho que sua irmã havia tomado. — Com certeza se encaixa.

A loira ponderou sobre aquelas palavras por um momento, concluindo que Ash tinha razão. Já devia ter resolvido a situação com Calista anos atrás. E estava mais do que disposta a fazê-lo naquele momento.


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