O Senador Rebelde escrita por André Tornado


Capítulo 16
Buraco




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O tambor tribal que retumbava selvaticamente na sua cabeça foi o que o despertou. Imaginou-se rodeado pelos temíveis guerrilheiros ewok da lua santuário de Endor e achou que fosse uma espécie de presságio, pois viu-se nesse cenário, algures, num futuro que ele tinha delineado para si, com a ajuda de uma mão que não lhe pertencia – pequena, fragrante e feminina. A mulher apontava-lhe para Endor e ele tinha a certeza de que o fim estava próximo. Mas sentia-se tranquilo e até feliz.

Não. Apesar da poesia onírica, era só uma enorme dor de cabeça e ele acordava agoniado num lugar apertado e quente. Esqueceu de pronto o sonho para fazer a análise inicial da sua situação.

Embora não desdenhasse conhecer a dona daquela mão bonita…

Tossiu.

— Onde estou?

A sua voz estava áspera e cansada.

Primeiro, situar-se no tempo. Por quanto tempo estivera desmaiado? Teriam sido mais do que algumas horas-padrão. Sentiu-o no esqueleto e na alma. Fora mais do que um dia e ficou preocupado. Endireitou-se ou, pelo menos, tentou mudar a posição. Estava todo enrolado numa bola, apertado no tecido estriçado da sua capa. Ao mexer uma das pernas ouviu o som de algo a rasgar-se, mas não se importou. Se vestia a sua capa, então os planos dos compressores ainda estavam consigo.

Segundo, verificar o bolso. Sentou-se o melhor que conseguiu. Estava enfiado num poço estreito. Ele era um homem grande e magro, de membros longos. Precisava naturalmente de espaço e classificou aquele buraco como pequeno porque ao esticar os braços tocou de imediato nas paredes que se esboroaram ao contacto com as suas unhas. Eram feitas de terra e ele assustou-se. Ficou quieto, mas como, entretanto, não aconteceu nenhuma derrocada, concluiu que estava seguro. Ou pelo menos, não iria ficar soterrado no imediato. Tateou a capa, sentindo-lhe as fibras e alcançou o bolso. Continuava fechado. Teve um assomo de alegria. Omonda não tinha conseguido descobrir o disco com os planos! Pois ele presumia que estava ali por causa daquele maldito juiz.

Terceiro, colocar-se de pé e avaliar a profundidade do poço. Com algum cuidado e o mais devagar que conseguiu, pois começava a ficar ansioso, movimentou as pernas. Começou pela direita, que já tinha libertado de debaixo de si, passou para a esquerda. Ofegava de cada vez que alterava a sua posição, respirava pó, tossia e lembrava-se que continuava com uma horrível dor de cabeça e que estava cheio de sede. Ansiava por umas gotas de água para lhe aliviar a aspereza da garganta. Após algumas tentativas e umas torções que lhe estiraram os músculos e o cansaram, conseguiu por fim levantar-se. Olhou para cima e viu um alçapão a cobrir a entrada do poço, uma estrutura de madeira com as tábuas mal unidas. A luz clara do dia passava pelas frestas e ele viu as partículas a flutuar nesses feixes luminosos. Muito bem, era de dia. De qual dia, ele iria descobrir depois.

Quarto, sair do poço. Esticou um braço, mas não conseguiu alcançar o alçapão. Lógico. O poço teria de ser fundo para manter os prisioneiros no seu interior. Ele era um homem alto, mas mesmo assim foi-lhe impossível tocar na tampa que cobria aquele buraco com um salto que deu a medo, pois não queria destruir a estrutura.

Quinto, chamar por ajuda. Ele precisava de assinalar que estava acordado. Por um instante teve a ideia que o encheu de alegria de que o tinham colocado ali dentro para salvá-lo e escondê-lo de quem quer que o estivesse a perseguir. Murchou considerando que era uma estupidez julgar que aquela situação era benigna. Podiam protegê-lo trancando-o dentro de um quarto. Pelo menos, teria uma cama onde estaria deitado e podia ter um lanche à sua espera quando despertasse. Por isso ajuizou que seria melhor não gritar por socorro ou fazer qualquer ruído desnecessário.

Sexto, concluir o seu relatório. Repensou os últimos acontecimentos, traçando uma linha temporal onde tudo se encaixasse sem falhas. Fora convidado à casa do juiz Emile Omonda, bebera o seu vinho comprado para o piquenique que o outro envenenara pois desconfiava que ele estava a ajudar o gotal a fugir. O que efetivamente acontecera. Ele ajudara Lishma a fugir. Esperava realmente que Lishma tivesse fugido senão todos os seus sacrifícios, exposição e incómodo teriam sido em vão. O objetivo de Emile Omonda era recuperar os planos dos compressores roubados. O juiz já tinha tudo preparado de antemão. O logro, a dissimulação e a armadilha. Desde que tinham partilhado a sala do tribunal. Os vultos que ele vira sair de detrás da poltrona levaram-no para onde quer que ele estivesse agora, onde se situava o poço que o encarcerava. Serviria como castigo, como modo persuasor para que ele confessasse onde estavam os planos. Em resumo, fora feito prisioneiro por mercenários a soldo do juiz Omonda que estava a ser pressionado e pago pelo Império Galáctico.

Respirou fundo algumas vezes, usando apenas o nariz, para filtrar a poeira que chovia sobre ele. Tinha as mãos espalmadas na parede terrosa onde se encostava e as suas pernas fraquejavam. Estava numa aflição demasiado grande para conseguir congeminar um plano credível que o livrasse do seu cativeiro.

Olhou para cima. Apertou os lábios. Começou a contar, sem desfitar o alçapão. E nisto, um jorro de luz desceu sobre a sua cabeça, como uma torrente, quando a tampa do buraco foi afastada. Encolheu-se. Um calafrio de medo arrefeceu-lhe o suor. Escutou um resmungo:

— Sobe.

A ponta de uma escada entrançada em corda grossa bateu-lhe no ombro e ele olhou para aquilo com um pasmo tão grande que, de início, não soube o que fazer. Estava a ser-lhe oferecida a hipótese de sair do poço e ele hesitava, desnorteado. O medo também o paralisava, principalmente por não saber quem pudesse encontrar lá em cima.

A sua vida era preciosa, assim julgou, desde que conseguisse manter os planos dos compressores consigo. Omonda não iria livrar-se dele até ter a certeza de que recuperava o que o gotal tinha roubado. O juiz estava a lutar por uma promoção. Era ambicioso e mesquinho, não olhava a meios para atingir os seus fins e ele era uma importante moeda de troca. Afastou, portanto, o medo. Agarrou na corda e olhou para cima, mas a claridade branca da abertura do poço não o deixou ver mais do que luz.

Antes, retirou o disco do bolso da capa e enfiou-o no cano da sua bota alta. Incomodou-o à medida que fazia força em cada degrau maleável da escada de corda, era uma aresta que lhe cortava a pele, mas ignorou todas as picadas pois aquele pequeno objeto redondo e achatado era a sua única garantia de continuar vivo. O pensamento era amargo e dolorosamente verdadeiro.

Apenas trepou três degraus. Arfava e praguejava pois não estava em forma e os braços tremiam com a força que fazia para se impulsionar para cima, quando outros braços, mais fortes e brutos, agarraram-no pela capa e puxaram-no o resto do trajeto. Foi extraído do poço num puxão vigoroso. Assentou um joelho no limite terroso do buraco e percebeu-se livre. Alívio e felicidade. Levou aos mãos ao chão e gatinhou para fora do seu cativeiro. Apanhou com um estranho muro de calor, arfou mais pronunciadamente.

O ar ali em cima estava mais quente do que no fundo do poço. Dobrou o pescoço e viu uma silhueta gigantesca, de braços cruzados e pernas afastadas, que o observava. Ele pigarreou e pôs-se de pé. Bateu na capa com as mãos, para sacudi-la da poeira – um gesto praticamente inútil, pois a sua roupa estava tão empoeirada e suja que era impossível limpá-la com esse gesto – recuperou a sua postura e o seu orgulho.

Encarou a silhueta com o queixo levantado. Não se deixou intimidar. Fora do buraco, acordado e com o seu cérebro a funcionar normalmente, toda a acutilância tinha regressado e preparava-se para contra-atacar. Ele não era manso ou cobarde. Fora apanhado à falsa fé e só assim o tinham conseguido ludibriar e capturar. A sua única debilidade era a dor de cabeça resultante de uma ressaca esquisita que fora potenciada pelo veneno.

Um homem muito alto, coberto por uma armadura velha e rasgada, com um corpo musculado e potente, olhava-o de cima. Tinha uma estatura descomunal, mais de dois metros. Um gigante impressionante. Poderia ser um guerreiro, mas pela forma maltrapilha de se apresentar seria um mercenário que escolhia as suas guerras e fazia-se pagar muito bem pelos seus serviços. Das suas costas erguia-se a ponta de um bastão. À cintura, num coldre, duas pistolas laser que, pelo volume, seriam pesadas e mortíferas. Bastava que estalasse os dedos para amedrontar os seus inimigos.

Heskey controlou-se para não se mostrar impressionado. Mas estava impressionado. E outra vez com medo.

— Bom dia.

Começou com um cumprimento. O outro não desmanchou a carranca que lhe enrijecia o rosto. Tinha cicatrizes em cada porção de pele que mostrava. Nas faces, na nesga de peito, nos pulsos, nas coxas que o pano grosso enrolado nas pernas não cobria. A cara era bulbosa, não era possível definir se era alguma doença, alguma marca hereditária ou se fazia parta da sua fisionomia peculiar. Era a primeira vez que via aquela espécie.

— Vais comer e beber. Depois partimos – anunciou o gigante numa voz trovejante.

Uma criatura corcunda mexia-se atrás de uma cortina, a preparar qualquer coisa numa panela metálica que fumegava. Não vinha nenhum cheiro do cubículo que seria uma cozinha. Nem agradável, nem desagradável. Estaria a ferver água, a preparar chá. Não viu comida, mas acreditou que haveria alguma coisa para trincar. Ele apreciou a lembrança, sentia-se esgotado e faminto.

— Onde estou?

— No planeta Pesak, Orla Exterior.

Assustou-se com o local. Teria dormido por incontáveis horas-padrão. A Orla Exterior ficava no extremo da galáxia, longe da civilização. Daí que tivesse fome e estivesse cansado. O corpo, agora que estava livre do buraco, pulsava em determinados pontos, acusando a postura pouco ortodoxa durante o seu sono forçado.

— O que faço aqui?

— Apenas recebi a encomenda, velhote.

Ignorou a forma pouco polida como foi tratado. Pelo menos o gigante concedia em responder-lhe às suas dúvidas. E não se mostrava agressivo. Seriam pontos a seu favor, bastava manobrar com inteligência e conseguiria safar-se. Assim esperava. Tinha os planos dos compressores consigo e precisava de fazer chegar o disco às mãos certas. De preferência que guardasse o segredo do seu portador. Continuava a não querer ligar-se à Aliança. Prosseguiu com as perguntas:

— Disseste que vamos partir. Vais levar-me para onde?

— Levo-te ao Templo. Depois, é lá com eles.

— Templo?

— Sim, ao Templo. Tudo o que acontece em Pesak passa pelo Templo.

— É o vosso centro… É uma cidade?

— O Templo é o Templo.

— Irei encontrar-me com alguém nesse Templo. Alguém que me procura?

— Ninguém te procura, velhote. Vais ser entregue.

— Não estou a perceber…

— Foste vendido como escravo. No Templo reúnem-se os escravos no pátio do Fazedor de Tormentas que depois decide os seus destinos. Vai ser glorioso! Vais ter um bom destino!

Houve uma nota de entusiasmo na voz grossa do gigante, como se fosse realmente espetacular o que o esperava no pátio desse Templo. No entanto, seria impossível. Ser um escravo não trazia glória a ninguém. Estremeceu, entre o terror e a indignação. Não era possível ou sequer concebível que Emile Omonda, reputado magistrado de Corulag, tivesse alinhado naquele esquema diabólico de o envenenar, capturar e entregar a um qualquer bando de bandidos que escravizava pessoas, liderado por aquele gigante.

— Não posso ser vendido como escravo! – disparou Heskey, perplexo. – Isso será um ultraje! Sou um senador do Império Galáctico e exijo que ser tratado como qualquer membro de um corpo diplomático. Com respeito.

— O Império Galáctico não tem qualquer jurisdição aqui, velhote.

— Não tem? E quem tem jurisdição neste fim do mundo?

— Os Hutt, de Tatooine.

— Tatooine? Esse planeta não é um covil de bandidos?

— Hum… talvez.

— Quem são os Hutt?

— Nunca ouviste falar dos Hutt, velhote?

— Não conheço a família. Tinham representação no Senado Imperial?

O gigante soltou uma gargalhada ruidosa que fez tremer as vigas do teto da cabana. Estavam numa casa miserável, de paredes redondas e teto baixo, em forma de cúpula. Tinha uma única porta, que a figura do mercenário tapava e, no centro, estava o poço onde o tinham mantido prisioneiro. Cortinas separavam os espaços definindo compartimentos e havia quatro postes que seguravam toda a estrutura precária. Seriam casas descartáveis, abrigos provisórios, para guardar segredos. Como presos capturados que seriam vendidos como escravos.

A criatura corcunda apareceu junto deles com uma bandeja nas mãos, onde fumegava uma malga ao lado de um prato com vários bolos escuros, com toda a aparência de serem duros como pedra.

— Come e bebe – ordenou o gigante. Continuava de braços cruzados. – Precisas de ter forças para a caminhada.

— E ainda por cima vamos a andar para o Templo… Não existem speeders em Pesak?

— Existem, mas estão constantemente avariados devido às tempestades de areia. É muito caro manter um speeder. Existem transportadores, mas estão sempre muito cheios. Acho que não vais querer estar num lugar apinhado de gente, espremido com a ralé… senador.

O gigante sorriu-lhe, levantando uma das borbulhas que lhe escondeu o olho esquerdo. Heskey olhou em volta.

— Onde irei comer?

— Senta-te no chão e come.

Ele retirou a bandeja das mãos da criatura corcunda e sentou-se no chão, de pernas cruzadas. Pousou a bandeja nas rótulas, equilibrando-a o melhor que conseguiu. Os bolos eram pequenos pedregulhos e ele nem tentou trincar aquele que agarrou, para lhe sentir a consistência. A bebida estava a ferver e tinha um gosto horrível. Bebeu um gole e desistiu da refeição. Suspirou alto.

— Deves molhar o pão no molho – explicou o gigante, divertido.

— Qual molho? Esta aguadilha fedorenta?

— Não saímos daqui enquanto não comeres e beberes tudo… senador. Se te portares bem damos-te algo doce para terminar.

— Algo doce… até tremo só de pensar no teu conceito de doce.

— É mesmo doce, garanto-te.

— E se eu não quiser sair daqui? E se eu não quiser ser vendido como escravo nesse Templo?

— Enfio-te o pão pela goela abaixo e empurro tudo com o molho. Depois, levo-te à força, arrastado pelo caminho das pedras.

— Encantador…

O cenário de ser alimentado à bruta e de ser transportado contra a sua vontade era pior do que fazer o sacrifício de aproveitar o que lhe estava a ser dado. Heskey, por isso, fez o esforço e atirou um dos pães para a malga que se desfez numa papa efervescente. Apertando o nariz com a ponta dos dedos, sorveu a mistela borbulhante. Fez o mesmo aos outros três pães e comeu tudo com uma rapidez surpreendente. O molho foi absorvido pela massa e no fim de mastigar o último pão restava pouco líquido, que bebeu de um só trago, continuando com o nariz apertado para inibir o sabor. Lembrou-se do esplêndido vinho que desgraçadamente tinha partilhado com Omonda. Que desperdício!

A bandeja foi-lhe arrancada das mãos pela criatura corcunda que se escapuliu para a cozinha e o gigante ordenou-lhe que se pusesse de pé. Heskey tinha o estômago cheio e estava saciado. Declinou a sobremesa. Ajeitou a capa nos ombros e experimentou uma nota de esperança. A comida fora horrível, mas tivera o mérito de o confortar. Mais forte, alimentado e sem sede, a dor de cabeça regredia. Estava pronto para a luta.

— Meu amigo…

— Não sou o teu amigo. Vamos! – retorquiu o gigante saindo pela porta, chamando-o com um aceno.

— És o quê, então?

O deserto estendia-se como um mar impossível de areia macia e plana, tão amarela que refulgia os raios luminosos do sol gigante que se colava no zénite do céu. Heskey colocou a mão em pala sobre os olhos para cortar a claridade e olhou em redor, girando sobre si mesmo num ângulo completo. Nada. Absolutamente nada. Só existia a cabana e areia, uma planície árida sem fim. Nenhuma montanha, elevação no horizonte. Outras casas, um povoado, um speeder avariado. Nada. Ondas quentes tremiam à distância.

Havia um trilho marcado com seixos redondos, uma linha reta de pedras tão pretas como os pães que tinha comido. O gigante seguia ao lado dessa linha. Voltou a chamá-lo com um braço, mas não se voltou para trás. Ele não tinha outra hipótese senão seguir o gigante e o maldito sabia-o. Dali iria para onde? Existiria o tal Templo e possivelmente existiriam outros lugares, mas Heskey nunca ouvira falar de Pesak e desconhecia totalmente o que o planeta tinha para oferecer. Teria de confiar no mercenário. Era a sua garantia de sobrevivência, mesmo que este o levasse, muito provavelmente, para um cativeiro pior do que o poço onde estivera a dormir inconsciente.

Emile Omonda iria pagar por tudo aquilo que lhe estava a fazer! Heskey cerrou os dentes e fixou-se nesse pensamento azedo de vingança. Iria regressar a Corulag e iria destruir esse homenzinho ridículo e ambicioso. Emile Omonda não iria vencer.

Por enquanto, era o juiz que vencia. Por cada passada que dava ao longo das pedras pretas – de certeza que não seriam os mesmos bolos? – de capa cingida ao peito, uma das dobras sobre a cabeça para não sofrer nenhuma insolação e para proteger a pele da eventual queimadura por o sol estar demasiado forte, Heskey tentava não entrar em pânico por saber que estava a seguir para um mercado onde seria vendido como escravo. Ao pertencer a alguém, como um objeto, perderia a oportunidade de poder reagir, nos tempos mais próximos. Deixaria de ser dono de si mesmo, deixaria de ser livre, deixaria de ter vontade ou voz. E ele continuava com os planos dos compressores escondidos na bota! Deixaria também de ter posses. E se o revistassem e o despojassem de tudo o que tinha consigo? Era o mais provável…

Trotou para se juntar ao gigante e arriscou:

— Preciso contactar a Aliança.

O mercenário espreitou-o.

— A Aliança…

— Disseste que o Império Galáctico não tem qualquer jurisdição sobre Pesak. Esses Hutt… eles estão com a Aliança?

— Os Hutt são independentes. Não prestam lealdade a ninguém, nem a nenhuma organização.

— Certo, certo… compreendi. A Aliança… Como posso contactar a Aliança aqui?

O mercenário calou-se.

— Nesse Templo… existe alguém?

— Lamento, não te posso ajudar.

— Isto é muito importante. Eu pago-te. Pago-te mais do que o Omonda te está a pagar. Duplico ou triplico o preço que ele combinou contigo.

— Não sei quem é o Omonda.

Heskey gelou por dentro. Ele tinha passado por várias mãos. O gigante seria um intermediário, apenas mais um, numa longa cadeia comercial que traficava gente caída em desgraça. O juiz enlouquecera se julgava que lhe podia fazer aquilo e sair impune. Os planos dos compressores seriam assim tão valiosos ao ponto de Omonda ter achado que livrar-se dele seria a opção mais válida? Bem, os traidores eram punidos com a morte, recordou Onca a dizer-lhe essa verdade de forma tão veemente. Omonda provavelmente fora misericordioso ao tê-lo atirado a uma morte que era tão só o anonimato na Orla Exterior.

Era pior do que a morte!

— Alguém te está a pagar, amigo – insistiu. – E eu cubro o que te deram por mim

Fazia parte do seu plano. Ele teria de continuar a ser livre ou não iria escapar-se nunca daquele ordálio.

— Não sou o teu amigo – refutou o mercenário. – Irei receber o meu pagamento quando fores vendido no pátio do Fazedor de Tormentas. Este é o meu negócio e não abro mão dele. Não me interessam as tuas compensações e as tuas ofertas… És mercadoria. Não se negoceia com uma saca de especiarias ou com uma arma. Descansa, sou dos melhores. Eu, de certa forma, apego-me à minha mercadoria. Vou apostar em ti. E talvez possa ganhar um pouco mais… Estou a contar com isso. De ganhar um pouco mais, mesmo depois de te vender. Nada do que me possas oferecer compensará todo o lucro que farei contigo. Não insistas. Perdes o teu tempo e a tua saliva.

— Vais apostar em mim?

— Sim, velhote. Tu és rijo. Vais sobreviver à tua estreia. Basta-me isso. Que sobrevivas… Depois verei se continuarei a acreditar na tua boa fortuna.

— Sobreviver?

O mercenário olhou por cima do ombro e sorriu-lhe, naquele jeito esquisito que lhe arrepanhava as borbulhas e o desfeava ainda mais.

Heskey fechou a boca. Olhou para o deserto vazio.

Era mercadoria. Que excelente maneira de definir a situação e de o colocar no devido lugar. Mas ele iria lutar, ele iria conseguir regressar a Corulag e estrangular, com as suas próprias mãos, Emile Omonda. Porque ele iria… sobreviver.

As suas perspetivas eram terríveis.

Apostas implicavam jogo e ele iria entrar numa qualquer espécie de entretenimento. Só podia ser isso. Abriu e fechou os olhos, engolindo em seco, tentando não se assustar e sair a correr no sentido contrário ao do gigante, para tentar fugir desse destino que seria tudo menos glorioso.

Podia ser que, entretanto, encontrasse alguém da Aliança.

Podia ser que nesse ambiente de incerteza e de perigo existisse alguém que lutasse contra o Império. Os rebeldes escondiam-se nos buracos mais improváveis. Como Pesak. Talvez… talvez…

Agarrado a essa minúscula esperança, Heskey continuou a fazer o seu caminho ao lado do gigante. Nunca mais disse nada. Nem o gigante fez conversa com ele.


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Notas finais do capítulo

Próximo capítulo:
Divertimentos.



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