O Lobo-homem e o Feiticeiro Mestiço escrita por Melvin


Capítulo 15
Névoa, carvão e cicatrizes.


Notas iniciais do capítulo

Olá!
Não ia ter capítulo novo até sábado, mass quando chega gente chegando e como vocês alimentaram meu monstrinho autor com a companhia e palavras... Surpresa! Mais uma parte da história.

Confesso: as vezes penso no que vou fazer nessa história e coisas que fiz e dou uma risada maléfica internamente, tipo: "muahahah!"
Há pequenos detalhes que migalhei desde o começo. Tem gente que vê... vou usar no futuro...
Em fim, tô falando muito, desculpa. Tô feliz hoje!
Boa leitura!
(aliás, morango e leite condensado é muito bom!)



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A morte me rondou mais uma vez na vida, como se soubesse que escapei de suas mãos quando era apenas um lobo solitário. Se eu tivesse morrido na primeira vez não teria conhecido o mestiço, não passaríamos por tudo aquilo e ele certamente teria sido extinguido na floresta perto de seu vilarejo. Mas o destino ainda é um mistério para todos, e ali estávamos nós dois juntos e nos curando de ferimentos graves, enquanto eu tomava coragem para contar ao rapaz sobre o massacre que ele causou na primeira noite de lua cheia.

No início da tarde, deitei-me sobre uma tábua corroída que estava jogada na frente do casebre, observando o mestiço mexendo nos canteiros de hortaliças junto com a mulher. Seus cabelos brilhavam mais dourados com a luz do sol e seu rosto possuía um vermelho sutil pelo calor. Depois de três semanas Luahn parecia completamente saudável. Mas as roupas largas faziam-me lembrar de quando foi uma fêmea, porém, no caso, usava roupas de um homem grande dadas pela Carlyne. Ele parecia feliz com a humana, apesar dela mal corresponder aos seus sorrisos e conversa.

Desde que minha plena consciência retornou fui atormentado pelas cenas e cenários daquela noite de sangue quando dormia. Havia momentos que eu era o lobo partido, o engolido, o mordido, o pisado, o que caia do barranco para as águas frias ou aquele que era pego por garras e mutilado por ódio sem que a morte me acalcasse rapidamente. Por dias tive certo medo de ver Luahn ser tornar aquela fera novamente e acabar o desafio que propus, mas pelo jeito que me tratava, o como sempre, e se aguentava para saber o que aconteceu, ele não se lembrava de nada.

Era uma paz e calmaria que apreciava e que remediou meus sonhos, mas a verdade poderia acabar com alegria do rapaz e seu jeito bom. Estando como lobo, o mestiço não investia flerte algum, mas eu notava alguns olhares pra mim, ele desejava me ver da outra forma e eu lutava fortemente para não obedecer, pois uma pequena parte de mim tinha receio sobre os ferimentos e como eles se comportariam com a mudança.

De repente, Luahn levantou-se do meio das abóbora e olhou diretamente para mim, parecendo saber que pensava nele, e piscou um olho liberando um sorriso torto que me fez mover um pouco desconfortável, contendo rápido um movimento denunciante de minha cauda. Era uma coisa nova ter uma sensação agitando-se em mim quando ele fazia coisas assim, algo que me lembrava da empolgação que sentia quando era filhote e a mãe chegava de alguma viagem de caçada, mas era diferente.

Distrai-me dele, vigiando os arredores do terreno de plantação. Além da cerca de tronos secos, tortos e velhos só havia o muro de árvores verdes e o sons da floresta. No terreno havia um celeiro não muito longe da casa, onde tentadoras galinhas corriam ao redor e um porco malhado vivia preso no mesmo cercado do velho cavalo monótono, o dos dois tinha uma entrada para o deposito de forma que podiam se abrigar sozinhos.

No ar veio um cheio familiar e vasculhei novamente o panorama. Numa distante junta da cerca havia um lobo escuro encarando-me e hesitando avançar sobre os canteiros. Ele balançou de leve a cauda caída ao encontrar meu olhar e depois observou os humanos distraídos. Levantei-me e fui até ele com passos rápidos, a irmã branca logo surgiu assistindo-me chegar.

Só faltavam alguns metros e eles avançaram agitados e felizes:

“O senhor está vivo!” o macho falou dando uma volta ao meu redor com leves saltos e a irmã veio de cabeça baixa, contida, mas igualmente feliz, e ambos roçando-me e buscando uma lambida, me esquivei do que pude da recepção.

“O que fazem aqui?” questionei, após liberar um rosnado rápido que os fez sossegarem.

“Nós o seguimos, senhor, e encontramos uma árvore com seu sangue!” a loba branca contou assombrada. “Tivemos dificuldades em achá-lo, estávamos preocupados. Toda a floresta na parte superior sudeste é uma confusão de sangue e corvos. É um péssimo cenário, mas meu irmão conseguiu uma pista e levamos dias para chegarmos por aqui.”

“Sim! Eu mesmo!” O cinzento agitou-se e esperou alguma reação minha, mas apenas o olhei de volta, pensava instantaneamente em outra coisa.

“Conseguem encontrar essa árvore novamente? Deixei coisas no alto dela”.

A fêmea olhou o irmão e ele respondeu:

“Claro! É uma missão, senhor?”

“Não levaríamos muito tempo, agora sabemos por onde subir e descer do penhasco do rio, mas depende de como deixou” a branca olhou-me, parecia mais ajuizada que seu companheiro.

“Terão que dar alguns saltos ou escalar. Façam o que puderem, se vocês não conseguirem voltem e irei junto”.

“Olha, os humanos nos viram!” O cinzento deu um recuo súbito, mas conteve seu instinto de fuga, e da branca vi os pelos se eriçarem enquanto encaravam Luahn se aproximando.

O mestiço parou a alguns metros atrás de mim, estava curioso e olhou os dois jovens lobos com atenção.

“É um feiticeiro...” comentou a loba branca em tom baixo e rosnado, sem desviar o olhar do de Luahn. “Foi ele que lhe lançou o feitiço de mudar para homem?”

“Podemos libertá-lo se o matarmos?” o cinzento interessou-se, esperançoso.

— Não o enfeiticei! — intrometeu-se o humano e riu breve, num misto de riso e admiração.

“Ele nos entende?” A branca virou a cabeça de lado, confusa e o olhando. “E fala conosco?”

Ambos pareceram abismados e Luahn sorriu para ela:

— Parece que sim — deu os últimos passos até agachar-se do meu lado, encarando a face dos irmãos mais de perto. — Vocês conhecem o Fiel?

“Fiel?” A fêmea estranhou, olhando-me.

“É nosso alfa!” meteu-se o cinzento, parecendo perder o medo do mestiço após ver que eu continuava calmo. “Nosso líder. E recebemos uma missão”.

— Ah, um macho — constatou Luahn, depois olhou para a branca. – E uma fêmea... — a expressão dele amenizou-se, pensativo e analisando a loba com mancha preta sobre o olho direito, que deu um balançar de cauda por ser reconhecida. — Um pequeno bando — e olhou-me como se descobrisse algo que escondi, mas eu não escondi nada.

“Não somos um bando” afirmei. “Eles são jovens e são livres de mim.”

“Mas o adoramos!” o cinzento comentou. “E o escolhemos. Agora sabemos até seu nome! Poderemos chamá-lo!”

Luahn sorriu com o abaixar da dianteira dele para mim e o balançar da cauda divertida. Logo o mestiço perguntou:

— E como vocês se chamam?

“Chamo-o de irmão” a branca respondeu. “E ele chama-me de irmã. O alfa nunca chamou-nos de algo”.

O feiticeiro ficou entristecido e curioso:

— Vocês lobos não tem nomes?

A loba ia responder, mas interrompi:

“A mãe lhe dita um nome quando é filhote, Luahn” deite-me, cansado de ficar de pé. “Eles são nômades. Certamente nascido de uma fêmea nômade, cujo pai seria seu companheiro, se não um solitário qualquer sem direito a cultura ou presença na criação.”

— Mas eu lhe dei um nome. E vocês fazem um bando...

“Não somos um bando” murmurei, mas ninguém poderia interrompê-lo de falar quando se empolga.

—... logo criarão sua cultura, então batizarei vocês também.

Os irmãos apenas observavam as expressões do garoto até que ele aproximou a mão do alto da cabeça da branca, a mais próxima dele, ela ameaçou rosnar, mas a encarei e ela resolveu farejá-lo, deixando que lhe acariciasse entre as orelhas.

— Você será a Névoa.

Estranhei tal criatividade infantil, mas a loba balançou a cauda e lambeu-lhe a mão.

— E você... — chamou o cinzento com um estalar de dedos e a criatura veio submissa, amigável e feliz, já lhe passando a língua na mão e deixando-o esfregar-lhe os pêlos dos pescoços em uma coçadinha.— Será, hm... Carvão.

Eu ri. Mesmo como lobo Luahn deve ter me ouvido, pois se virou para mim estreitando os olhos:

— Sabe que no fundo seu nome ia ser peludo, não é? Eu até poderia mudar seu nome agora, mas vou deixá-lo sendo Fiel — voltou-se para os dois. — Devem estar com fome, vou buscar algo.

O mestiço deu meia volta e foi em direção ao casebre. Carlyne observava tudo do meio do canteiro, atenta.

“O feiticeiro não parece perigoso” comentou o nomeado Carvão. “Ele tem um gosto bom”.

“Tem sim!” a irmã correspondeu, lambendo os bigodes.

“Não digam isso, vocês não irão comê-lo!”

“Perdão, Alfa, mas não nesse sentindo. Sabemos que não deixaria. É com respeito, ele apenas é agradável” Névoa esclareceu.

“Depois de comerem, façam o que pedi e não se aproximem da casa, a mulher não confia em lobos” ressaltei. “E tenham cuidado para não serem seguidos pelas alcatéias”.

“Não há alcatéia” e encarei o Carvão. “Os lobos afastaram-se desta área, estão em um momento de paz por enquanto”.

“Pelo que soubemos, foram perdas demais. A segunda alcatéia que veio auxiliar aquela que já lhe seguia se retirou. E da primeira resta poucos e estão juntos ao seu perseguidor para se recuperarem, mas é certo que retornarão aos seus territórios em breve”.

“E o que eles ganharam com a união?” perguntei à branca, intrigado.

“Ouvimos poucas coisas sendo sorrateiros, mas aqueles que procuram por você cederam parte do território de caça em troca da ajuda e ao outro entregaram alguns membros jovens. Estavam determinados em ser um ataque único e sem volta, mas houve algo na floresta que os surpreendeu”.

“O senhor deve ter o enfrentado também” incrementou Carvão, curioso e nervoso.

“Sim...” encarei o chão por um segundo, incerto se os dois odiariam o mestiço se soubessem que foi ele.

“Mas a coisa ainda esta por aí, na floresta”.

“Não irmão, é outra coisa, eu já lhe disse!” Contestou Névoa, com tom sério. “Há algo vindo, senhor. É mais fácil senti-la do alto do penhasco, com o vento do planalto ao nosso favor. Parece estar viajando em busca da área dos mortos e é forte. Não sabemos o que é ou o que quer por aqui, mas está chegando”.

Eu já tinha com o que me preocupar e não explorei o assunto, havia coisas no mundo que eu desconhecia e preferia deixá-las em seus cantos, mas uma sensação incomoda ficou registrada com aquela informação.

 

...

 

Diante da lareira acesa, Luahn erguia meu queixo, espalhando a pasta de cura dele no arranhão da minha face depois de já ter cuidado dos outros ferimentos que demoravam mais para cicatrizar. Carlyne, a mulher, havia ido à cidade de Prata Leal no final da tarde com um cesto de verduras e duas galinhas para vender ou trocar em algum lugar na manhã seguinte.

— Olha esse nariz gelado — e, rindo, o garoto cutucou-me quando estava distraído. Afastei-me, abaixando as orelhas pela bobeira. — Você parece bem melhor, encontrando amigos, correndo pelo terreno, comendo sozinho. Podemos conversar como homem agora?

Meu coração bateu um pouco rápido, lembrando que o que ele queria saber era simples: ele fez tudo e ouve morte e sangue.

“Naquela noite, depois que me beijou...”

— Não! — segurou meu focinho, embora a conversa de lobo nem mesmo usasse cordas vocais — Assim não, Fiel. Quero ver seu rosto falando isso e entender suas expressões. Vamos, — soltou-me sorrindo — quero aquele rapaz diante de mim.

Encarei-o por uns instantes: “Não acho seguro. Os ferimentos podem abrir ou me causar alguma dor. Não quero fazer isso”.

Luahn olhou-me docemente, fisgando minha atenção.

— Lobinho medroso. Logo fará um mês e a transformações funcionam sem dor. Acho que quem fez isso com você não explicou nada, não é? — acariciou-me. — Seu tipo de feitiço lida com o que os olhos não vêem. A força da magia manipula sua áurea e partículas, unindo o que usa ou separando o que não precisa, e remonta tudo como lhe foi programado, o fazendo real, sólido e — apertou os pelos do meu pescoço rindo — fofinho. É por isso que mesmo quando ferido, ao mudar de forma, as coisas ficam no lugar que deviam ficar e como eram... Dizendo de outro modo: seria como se sua áurea carregasse as informações de sua outra forma o tempo todo, registrando o que faz consigo em si, e ela se solidifica corretamente com a ajuda da magia quando você decide se transformar, mas usando a mesma matéria física.

Fascinei com aquela explicação, ainda tentando compreender tudo e como os humanos foram descobrir sobre essas coisas e como utilizá-las. Um feiticeiro era algo que nós, da fauna, não entendíamos como funcionava, mas estando com Luahn descobri que talvez sejam criaturas com dons que nós não tínhamos.

Olhando-o enquanto refletia, notei uma cicatriz na linha do maxilar se afinando na direção do queixo, possivelmente era a mordida que dei nele, mas com um tamanho menor no corpo humano. E quando dei por mim lambi seu no rosto, bem sobre ela; e os irmãos estavam certos, ele tinha um gosto bom. Luahn riu, mas a mão que apoiou em meu corpo não teve intenção de me afastar. Sem resistir, experimentei-o no pescoço outras vezes e ele encolheu-se rindo mais. Obriguei-me a parar, afastando-me e deixando-o com um sorriso bobo enquanto me olhava de volta.

Uma sensação morna e aconchegante esparramou-se como se por dentro de mim, e estranhamente ali parecia meu lugar. Era uma tentação de apego e eu precisava resistir. Luahn era um humano destinado a desafios, era uma fera matadora de lobos, um feiticeiro, um mortal frágil. Bastaria um novo dia e um novo desafio para nos separar, para deixar o ardor de perder uma metade, para deixar o pesar que aprendi a ficar longe para sobreviver... Entretanto, sobreviver também era aproveitar o hoje como um presente irrecusável ao seguir por um destino tão tortuoso e incerto.

Mentalmente citei: “lobo-homem”.


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Notas finais do capítulo

E fim.
Obrigado por ter lido.

Moreira Ygor, surgidor, eu já tava feliz quarta feira e chegar quinta com sua recomendação e presença que tocou no limite do que suporto, estou bobo e contente praticamente o dia todo! Obrigado pelas palavras! (Ainda vou responder o comentário ♡).

****
Não percam no próximo episódio: pois eu não sei direito o que terá, haha, fico receoso do momento e o que fazer. Contudo um novo passo vou dar! Talvez com revelações e gente com novas partes da história para você descobrir!

Potinho de ouro, até breve!

—off.: mano, tão sozinho e o fiel obedeceu. Ah. E agora que ele vai contar o que houve? to perdido! Funciona sótão! (sinto que estou travando no proximo, não pode, nao deixe.Preciso contar coisas).-



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