O Homem que não era o Doutor escrita por Karina A de Souza


Capítulo 2
Zebediah


Notas iniciais do capítulo

Olá. Mais um capítulo hoje.
Acho que preciso avisar que a personagem Jessica NÃO é a Jessica Jones. A fanfic tem apenas referências e inspirações na série. Okay? Achei que isso poderia confundir um pouco.
Bem, vamos ao capítulo...



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Eu não queria acreditar. Não queria acreditar em Lynn. Mas ela havia sido sincera no que disse, eu podia sentir que não era uma mentira. Porém, se ela estava falando a verdade... O Doutor tinha se transformado num monstro.

Minha cabeça não conseguia aceitar uma imagem do Doutor sendo agressivo ou batendo em alguém, muito menos numa garota. Ele não era assim, era bom, gentil, atencioso... Algo tinha dado errado, algo tinha o feito ser Zebediah, o homem cruel de quem Lynn me contou.

Depois de conseguir o endereço da Purple Club, voltei para a TARDIS, onde fiquei um bom tempo andando de um lado para o outro, tentando decidir o que fazer. Eu precisava ir até lá... Mas e em seguida? Contar tudo? Não. Ele não ia acreditar. E se eu acabasse o irritando sem querer e ele... Não. Não. O Doutor nunca me machucaria... Mas esse não era o Doutor, era? Zebediah era um homem diferente.

Vasculhei o guarda roupa em busca de algo simples, quente e que poderia ser usado numa boate, sem querer chamar atenção. Quanto menos reparassem em mim, melhor. Antes de sair, me olhei no espelho e tentei me obrigar a ficar calma.

—Interface de voz!

—Interface de voz ativa.

—Como eu estou?-Me virei para a imagem do Doutor.

—Viva.

—Não foi o que eu perguntei. Vou atrás do Doutor... Ou melhor, de quem ele é agora. Estou com medo.

—Medo é normal para os humanos, e útil para sua sobrevivência.

—Certo. Você tem um pouquinho do Doutor em você.

—Eu não sou o Doutor, sou...

—É, é, eu sei. -Suspirei. -É melhor eu ir. Me deseje sorte.

—Sorte não existe, é apenas algo...

—Desativar interface de voz. -Ele desapareceu. -Certo... Boa sorte, Jessica. Fique viva, salve o Doutor.

***

A Purple Club enorme. A fachada ocupava toda a frente do prédio, com luzes roxas de neon, que incomodavam minha visão. A fila para entrar era gigante, mas consegui entrar em meia hora.

O interior era espaçoso e estava lotado. Mais luzes de neon roxas, me fazendo piscar até acostumar com elas. O bar era grande, com todo o tipo de bebidas lá atrás, muitas das quais eu nunca ouvi falar.

—Perdida?-Uma mulher perguntou, atrás do balcão. Ela devia ter uns quarenta anos, cheia de tatuagens nos braços e muita maquiagem.

—Um pouco.

—Acontece. Quer alguma coisa pra se soltar? Temos bebidas e coisinhas especiais. -Franzi a testa. Ela estava me oferecendo drogas?

—Hã... Não, obrigada.

—Imaginei. Não parece ser desse tipo. Então, o que está fazendo num lugar desses?

—Estou procurando o D... Estou procurando Zebediah. Parece que ele vem muito aqui e mora lá em cima. -A expressão dela mudou, parecia preocupada.

—O que você quer com Zebediah? Você parece uma boa garota, é melhor ficar longe dele.

—Eu preciso achá-lo.

—Mocinha, me ouça. Talvez sinta atração por caras maus, mas todas que vieram antes de você acabaram machucadas. Vá pra casa. -Meu Deus, em quem o Doutor tinha se transformado?

—Ouvi falar nas coisas que ele é capaz de fazer, mas eu...

—Se tivesse ouvido tudo, não estaria aqui.

—Por favor. Eu preciso encontrá-lo. É importante. -Suspirou, levando um tempo pra voltar a falar.

—Eu o vi faz uns dez minutos, deve estar aqui em baixo. Ele sempre é um dos últimos a sair da festa.

—Certo... Obri... -Segurou meu pulso.

—Tome cuidado. -Assenti. Ela me soltou e recuou, indo atender uma cliente.

Ótimo. Lynn e a mulher sem nome me deixaram em pânico. O Doutor... O que o Doutor tinha se tornado? Um monstro, ao que parecia. Lynn tinha sido agredida e a bartender estava assustada. Zebediah aterrorizava as pessoas. Eu estava aterrorizada e nem tinha cruzado com ele ainda.

Dei uma volta pelo local, atenta aos rostos dos homens presentes. Nenhum deles era sequer parecido com o Doutor.

Desanimada, continuei caminhando, tentando olhar de rosto em rosto.

—Onde você está?-Sussurrei. -Doutor, por favor, me ajude a encontrá-lo...

Meu olhar caiu num casal afastado da pista de dança. A garota era ruiva, o vestido que usava era tão curto que até eu podia ver o que não devia. Ela estava se agarrando com um homem alto, de cabelos escuros e roupas em tons de roxo, eu não podia ver seu rosto, mas não conseguia ficar encarando toda aquela agarração por muito tempo.

Comecei a desviar o olhar, então o casal se separou um pouco e eu pude ver seus rostos. A garota eu não conhecia... Mas o homem... Era o Doutor. Ou melhor... Zebediah.

Meu corpo travou. Era ele, eu tinha certeza. As luzes eram péssimas, mas se tinha um rosto que eu conhecia bem, era o do Doutor. Dois anos olhando praquele rosto, e eu tinha o decorado perfeitamente.

O casal voltou a se agarrar, mas o olhar do Doutor... Digo, de Zebediah, nunca saiu de mim. Ele tinha me notado.

Não sei quanto tempo fiquei congelada ali. Só que em algum momento Zebediah dispensou a garota ruiva e se aproximou de mim. Ele era o Doutor, mas muito diferente. O olhar, a postura, as roupas, uma barba por fazer que não estava ali antes... E quando ele falou... Parecia outra voz.

—Precisa de alguma coisa, garotinha?-Abri a boca, mas nada saiu. Eu não devia ter ido até ali sem um plano... Não devia ir até Zebediah sem saber se ficaria em segurança... -Venha conhecer meu apartamento. -Agarrou meu braço, começando a andar, me levando junto. Eu queria me soltar e me afastar, mas o aperto era forte demais. -Acho que precisamos ter uma conversinha.

Nenhuma palavra foi trocada durante o trajeto. Mantive meu olhar no chão, tentando me acalmar e pensar num plano. Talvez tivesse mais segura lá embaixo, na boate, onde estava cercada de pessoas. Mas sozinha com Zebediah? Não... Eu sentia muitas coisas, mas segurança não era uma delas.

O tal apartamento ficava no último andar. Era enorme, espaçoso e chique. Não lembrava em nada a TARDIS ou o jeitinho do Doutor.

O que você esperava, Jess? Ele é uma pessoa muito diferente. Zebediah não é o Doutor. Não se esqueça. Ele não é...

—Então... Quer começar?-Trancou a porta. Recuei alguns passos. Eu queria correr dali, correr até a TARDIS, onde estaria segura. Agora era tarde demais. -Eu sei quem é você. -Meu coração acelerou ainda mais.

—Sabe?

—Sei. Você é a garota que estava no beco. Fiquei me perguntando quem era você e o que aconteceu. Não lembro nada daquele dia. O que houve lá? Cansamos demais e apagamos?

—O que?-Cruzou os braços.

—Quem é você?

—E-eu não devia ter vindo. Preciso ir embora...

—Não até eu ter minhas respostas. Pode pensar em qual vai responder primeiro. Quem é você? O que fizemos naquele beco? Por que veio atrás de mim?-Não consegui abrir a boca para responder. -Responda!-Estremeci. O Doutor nunca tinha gritado comigo antes... Mas aquele não era o Doutor.

Um som estranho veio de algum lugar do apartamento. Movi o olhar pela sala, confusa. Outro som. Vinha de trás de uma porta fechada.

—O que é isso?-Perguntei.

—Não é nada... -Mais uma vez aquele barulho. Corri até a porta e a abri... Então quase caí para trás.

Havia uma garota, loira, na cama. Ela tinha uma fita cobrindo a boca e algemas a prendendo na cabeceira da cama.

—O... O que você fez?-Corri para a garota. -Você está bem?-Tirei a fita. Ela se afastou de mim.

—É só um jogo. -Zebediah disse, entrando no quarto tranquilamente. -É divertido.

—Divertido?-Me virei pra ele. -Um jogo? Ela está presa...

—Por que você não para de se meter nas brincadeiras dos adultos e responde o que perguntei?-Não respondi. Não podia. Tinha que ir embora. -Ah. Ficou muda de novo.

Foi até a garota, tirando uma chave do bolso da calça e a soltando. A loira moveu os pulsos avermelhados e catou seu vestido que estava no chão.

—Dê o fora. -Zebediah mandou. A garota correu para fora do quarto e sumiu. -E você... Eu quero minhas respostas.

—Eu preciso...

—QUEM É VOCÊ?-Bateu na parede ao lado da minha cabeça. Me escolhi, tentando conter o choro e não tremer. Ele não era o Doutor... Não era meu Doutor...

—Eu quero ir embora...

—Me responda!-Agarrou meu pescoço com uma das mãos. Tentei empurrá-lo. -Quem é você e o que quer?

—Está... Me machucando... Por favor... Por favor...

—Responda!

—Por favor!-Lágrimas começaram a escorrer pelo rosto. Eu ia morrer. Ele ia me matar. Ele ia...

Me soltou. Comecei a tossir, tentando respirar. As palavras de Lynn e da mulher no bar se repetiram na minha cabeça. Elas estavam certas. Eu devia tê-las escutado.

“Zebediah é um dos caçadores. E você... Ah, garota, você definitivamente é uma presa”. Lynn tinha razão. O que eu ia fazer?

—Eu quero minhas respostas. -Zebediah exigiu.

Zebediah... Roupas roxas... Ele tinha assumido a identidade de Kilgrave?

Doutor... Doutor, eu preciso de você.

Me endireitei, controlando minha respiração. Zebediah ficou atento. Então disparei para a porta.

Eu era rápida. A mais rápida da minha cidade, ganhando cinco vezes seguidas o campeonato de corrida. De acordo com minha professora de educação física, podia ser uma atleta...

Mas Zebediah era rápido também. Eu não cheguei a cruzar a sala e ele estava lá, os braços agarrando minha cintura, me tirando do chão.

Comecei a gritar. Nem lembro o que. Talvez tenha pedido socorro, talvez tenha implorado para que ele me soltasse. Não lembro mesmo o que foi... Eu estava apavorada demais para lembrar do que tinha dito.

“Medo é normal para os humanos, e útil para sua sobrevivência”.

Ergui a perna e a desci com força, acertando Zebediah atrás de mim. Ele gritou e me soltou, então corri para a porta e disparei pelo corredor.

Nem mesmo peguei o elevador, apenas desci as escadas, ouvindo Zebediah me mandando voltar, mas não parei de correr.

Continuei correndo e correndo, parando apenas quando entrei na TARDIS e tropecei, caindo em frente ao console.

Aí não consegui aguentar mais e chorei.

E mais uma vez, dormi no chão da sala de controle, com o coração apertado.

***

Aparentemente a TARDIS tinha uma regra sobre proibir seus tripulantes de morrerem de fome. Durante os dois dias que passei no quarto, sem vontade nenhuma de sair, ela materializou bandejas com meus pratos e sucos favoritos.

—Estou sem fome. -Avisei, virando para o outro lado, ignorando o café da manhã. Insistente, ela moveu a bandeja para que ficasse na minha frente. -Pare com isso!

—Interface de voz ativa. -Me sentei, confusa.

—Eu não chamei você.

—Faz parte do protocolo emergencial de saúde me ativar automaticamente.

—Que?

—Se um dos tripulantes da TARDIS estiver com a saúde comprometida, eu sou ativado automaticamente. E, se for necessário, levar a nave até um dos hospitais que constam na lista de aprovação.

—Você tá brincando.

—Eu sou uma interface de voz, eu não brinco. Se continuar se recusando a comer, a nave a levará para um hospital.

—Não estou doente. Só estou sem fome...

—Sua energia está em trinta por cento. As chances da imunidade cair são oitenta e nove por cento. E, trancada no quarto chorando por dois dias, sua chance de ter algum problema emocional são...

—Tá legal, tá legal! Eu vou comer!-Peguei uma torrada na bandeja e dei uma mordida. -Satisfeito?-Desapareceu. -Sei que está só cuidando de mim, TARDIS. Mas toda essa situação está... Acabando comigo. Eu não sei o que fazer. Não sei como... Como agir. Fui até o Dou... Até Zebediah... E foi um desastre. Achei que ele ia me... Matar. Eu preciso fazer alguma coisa, e não saber o que acaba comigo. Por favor... Por favor, me ajuda.

Mas, como sempre... Apenas o silêncio me respondeu.

***

—Você aqui de novo?-A mulher de trás do balcão perguntou. Pude notar um pequeno crachá com o nome dela. Ruby. -Achei que não voltaria mais, depois do que houve outro dia.

—Eu não tenho escolha.

—Zebediah está te ameaçando?

—Não. Se trata... Se trata de um salvamento. E infelizmente, pra isso... Eu não posso fugir de Zebediah. -Suspirou, se apoiando no balcão.

—Você me lembra minha filha. Toda inocente, achando que tinha o controle de tudo, tentando ser corajosa... Isso nunca acaba bem. Por favor, não insista aqui, vá embora antes que se machuque.

—Eu não posso. Queria, mas não tenho escolha. Há alguém que precisa ser salvo... Só eu posso fazer isso.

—Não há nada de errado em pedir ajuda.

—Eu sei. Mas não há ninguém capaz de ajudar agora. -Olhei em volta. -Tenho que ir.

—Tome cuidado.

—Vou tentar.

***

Invadir o apartamento de Zebediah parecia um plano suicida. Mas, por enquanto, era o único que eu tinha. Me certifiquei de que ele estava ocupado na boate (o vi numa mesa com alguns homens, jogando cartas e bebendo), e me arrisquei a subir.

O apartamento era muito impessoal. Sem nada que lembrasse de quem era. Zebediah devia não ligar pra essas coisas.

Achei melhor começar pelo quarto. Coisas importantes normalmente ficam no quarto. Se for invadir a casa (ou o apartamento) de alguém, comece pelo quarto.

O guarda roupa não me impressionou muito. Apenas variações das roupas que Zebediah usava dias atrás, todas bem arrumadas. Ele devia ter alguém pra manter o apartamento em ordem. Só me perguntei de onde o dinheiro saía.

Me arrependi um pouco de mexer no criado mudo. Havia apenas algemas, números de telefone... E camisinhas. É... Pelo menos o Doutor... Quer dizer, Zebediah, não deixaria nenhum filho em Nova Iorque. Podia ser pior.

Não havia nada importante no quarto, para o meu desapontamento. E não havia sinal do relógio de bolso. Será que ele tinha jogado fora? Isso seria muito ruim... Muito, muito, muito...

—Achou algo interessante?-Congelei onde estava, espiando em baixo da cama, então me virei. Zebediah estava na porta, não parecia zangado e sim... Entretido. -Algo me disse que você ia voltar. -Fiquei de pé. -Sem voz de novo? O Lobo Mal comeu sua língua, garotinha? Qual o seu nome?

—Jessica.

—Jessica. -Não gostei do jeito que ele disse meu nome. Parecia... Estranho... Errado... -Você vasculha o apartamento de todos os homens que conhece?

—Não.

—Por que está aqui? Por que veio até mim?-Respirei fundo. Eu não tinha um plano. Era melhor improvisar... Cuidadosamente.

—O dia... No beco, nós nos conhecemos nesse dia.

—Não lembro nada do que houve nesse dia.

—Nós bebemos muito. Estávamos numa festa. Bebemos e... Acho que a gente acabou... Desmaiando, sei lá.

—Você parece lembrar do que houve.

—Não bebi tanto quanto você. Beber demais pode... Fazer as pessoas esquecerem.

—E você bebe muito pra saber disso?-Dei de ombros.

—Às vezes.

—Tudo bem. Nos conhecemos naquele dia... Mas por que vir até aqui?

—Eu... Eu... -Pense, pense, pense!—Nós nos divertimos muito. Achei que não devia deixar passar.

—Certo. -Sorriu. Não gostei do sorriso dele, só me deu mais vontade de correr pra longe. -Tudo bem, Jessica. Eu estou aqui, você me encontrou.

—É... Parece... Parece que sim. Eu... Tenho que ir.

—Não quer continuar sua investigação? Olhou em todos os lugares?

—Realmente preciso ir. Nós... Nos vemos outra... Noite.

—Tudo bem. -Saiu da frente da porta. -Até logo... Jessica.


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Notas finais do capítulo

Okay, não foram dois bons primeiros encontros. Jessica realmente está encrencada... E acreditem, pode piorar.
Até o próximo domingo.



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