As Contrações da Fala escrita por Lyn Black, Indignado Secreto de Natal


Capítulo 7
CAPÍTulo 7


Notas iniciais do capítulo

Como esse capítulo tinha ficado com umas 6.000 palavras, tive que rachá-lo, mas acho que ficou até melhor.
Um Natal gostosinho pra quem comemora, boa leitura!



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CAPÍTULO 7

 

Now the sky is gray

But honestly, it doesn’t hurt me (no)

I learned to find my way

On the path and no returnin’, oh, oh

Everything I’ve left behind

I'm reminded every time I meet your eyes

We were so bold and brave

Baby, can you imagine?

— When I Was Young. MØ

 

24 de dezembro de 1981

 

O dia anterior passara sem maiores problemas, pontuou Sirius, enquanto penteava seus cabelos de frente para o espelho. Ter Remus ali com ele significava poder tomar um banho longo sem se preocupar com a possibilidade de Harry acordar subitamente e se sentir sozinho demais. O desconforto no ar ao cruzar olhares com Remus valia diante da alegria de Harry ao ter um novo companheiro de estripulias.

Fechado no banheiro da suíte da casa, Black olhou a tatuagem geométrica triangular no ombro, feita com James ao seu lado jogando mil perguntas para o tatuador trouxa. Remus estava na época passando seu último Natal com a mãe, relembrou, deixando um risinho escapar pelo susto que o adolescente havia levado quando ele apareceu na sua casa sob o pretexto de exibir a marca.

Era a manhã antes do Natal, e Harry estava já agitado quando acordou pontualmente às seis da manhã. Para sorte do moreno, Lupin tinha um relógio biológico invejável, e estava prontamente passando café quando Black descera com a criança no colo para dar a ele o leite matinal. Agora, ele tinha que aproveitar seu tempo sozinho. Sirius passou perfume, e com a toalha amarrada na cintura, saiu do banheiro trazendo o vapor para seu quarto.

— Padio! – a vozinha infantil o surpreendeu, tão distraído estava.

Harry correu em direção das suas pernas, ainda se habituando a andar em pé, se molhando levemente.

— Pelas cuecas de Merlin, espera, Harry, seu padrinho ‘tá tomando banho. – O apelo não surtiu efeito. Remus entrava apressado atrás do bebê, falhando em impedir a fuga do Potter do quarto vizinho, onde estavam brincando antes.

— Tarde demais, Remus – falou Sirius, rindo ao pegar o afilhado.

Lupin passou as mãos pelos cabelos, mantendo os olhos no chão. Mãos rapidamente escondidas atrás das costas, ele tentava encontrar um espaço inexistente no quarto decorado em tons avermelhados. Sirius manteve um olho no homem enquanto balançava o afilhado no ar, entregando-o para o outro.

— Ele é rápido, tem que ser ágil com o pestinha – falou para Lupin enquanto passava Harry para os braços dele.

Remus jogou a cabeça para trás deixando um riso solto escapar, menos acanhado. Black notou curioso o tom vermelho nas bochechas do lobisomem, mas logo desviou a atenção para seu estado de seminudez.

Exibindo seu estado com as mãos e um sorriso sem-graça – uma raridade, afinal ele normalmente teria feito uma piada com a situação – falou:

— Bem, eu tenho que...

Remus o cortou, agora realmente vermelho, apesar de Harry estar puxando seus cabelos.

— Sim, sim. – Lupin deu uma risadinha, retornando para a porta, se atrapalhando um pouco com a criança no colo. – Até daqui a pouco.

Black assentiu com a cabeça, vendo os dois sumindo da sua vista. Um sorriso torto invadiu sua face, pensando nas várias vezes em Hogwarts onde estivera em estado muito mais comprometedor na presença de Remus. Por Morgana, ele se lembrava de ter até embebedado o certinho monitor numa festa e o convencido a pular no Lago Negro só com as roupas de baixo!  Aqueles eram, definitivamente, outros tempos.

 

 

—----

       

 

Já apropriadamente vestido, Sirius desceu as escadas seguindo as vozes da casa.

— ... e então a Dona Aranha falou para o Senhor Patas, “É claro que eu consigo, olhe minhas pernas!”. – Black pegou o último fragmento da história seguido dos grunhidos de Harry exigindo mais.

Sentados em um tapete colorido na sala de estar, mesinha de centro empurrada para um canto, Remus estava deitado de lado, as costas viradas para Sirius. O moço de cabelos castanhos claros usava as pelúcias de Harry como personagens criativamente, entretendo o pequeno.

Remus automaticamente percebeu a aproximação do passo arrastado de Sirius graças à sua audição aguçada, e entortou o pescoço, rapidamente virando-se para o pequeno Potter.

— Olha quem chegou, ‘Arry – falou com uma enorme animação para o bebê, indicando o amigo com a aranha de pelúcia – A Dona Aranha pode dar um abraço nele?

Terminando de dobrar as barras da calça preta, Sirius deixou seu corpo cair no sofá azulado, fazendo um barulho que chamou a atenção Harry. Esticou os pés esquentados por um par de meias decorado com vários cachorros – uma piada de Marlene – e cutucou o arteiro Potter.

Após parecer pensar profundamente sobre o assunto, um delicado vinco se mostrando entre suas sobrancelhas, Harry balançou a cabeça positivamente, emitindo alguns sons no processo. A formulação das palavras ainda era rudimentar, afinal, ele tinha seus 18 meses, mas Remus aproximou a aranha peluda, conforme o desejo de Harry, do padrinho.

— Hora do abraço! – exclamou Remus numa voz mais aguda e calorosa, colocando-se de joelhos para fazer a encenação pro menino.

Divertido, Harry bateu as mãos, mostrando no seu sorriso os dentes que nasciam. Sirius abraçou com força aranha na mão de Remus, olhando a reação do pequeno.

— Que abraço gostoso, Dona Aranha!

Interessado em recuperar a sua amiga, Harry engatinhou até a perna de Sirius, agarrando-se a ela para subir no pé dele e tentar escalar a perna do padrinho. Querendo dar um susto em Harry, Black o pegou de súbito e começou a girá-lo no ar, causando uma outra série de risadinhas, até o menino ficar tonto.

Remus não era acostumado a choros diferentes do seu, mas o choramingar de Harry parecia fazer seu coração quebrar, mesmo sabendo ser apenas uma reação comum da criança. Beicinho feito, olhos apertados e um baixo chorinho não foram previstos, mas Sirius imediatamente parou de balançá-lo.

— Calma, estrelinha. – Afagando as costas de Harry, Sirius o manteve perto do peito, até as lágrimas cessarem, balançando-o ritmicamente de leve.

O rapaz assistiu a cena em silêncio, um pouco impressionado pela pequena explosão de choro da criança. Sirius acenou para ele se levantar.

— Vamos tentar dar algo para ele comer. – orientou.

Remus prontamente tomou a dianteira, andando apressado para a cozinha, que ficava ao lado da sala de estar, ligada por uma porta. Ao entrar no ambiente, fez um mapeamento mental do que tinha. Remexeu no cesto de frutas disposto no centro da bancada da cozinha, em dúvida dos apetites da criança. Levantou os olhos, buscando um guia de alimentação para Harry Potter.

— Vamos comer uma maçãzinha, Pontas Junior? – perguntou para o bebê de olhos verdes, quem chupava o dedo, o rostinho avermelhado.

Ao ver que Harry não tendia a outra crise diante da fruta vermelha, Remus mexeu uma mão, encantando a faca mais próxima para chegar até ele.

— A maçã serve, Aluado – falou Sirius.

A bancada de madeira clara era equipada com banquinhos de madeira para fazerem refeições caso quisessem, então Sirius sentou-se num dos bancos, colocando a criança no colo. Logo Harry voltava sua atenção para a fruta picada, e os dois trocavam um olhar cúmplice de missão cumprida.

Sentado lá, Lupin juntou-se na tarefa de manter Harry interessado em comer tudo. Como o bebê estava mais do que disposto a devorar a fruta, Remus sentiu a necessidade de puxar um assunto, afinal, diálogos complexos só poderiam ser travados entre eles.

— Precisamos de material para preparar a ceia, posso ir tentar comprar no mercadinho local – sugeriu, sondando Sirius.

Black negou com a cabeça, explicando:

— Não vou arriscar colocar as mãos no fogo tendo que prestar atenção nele também –, indicou Harry com a cabeça – além do mais, Monstro não se mostrou completamente desagradado em preparar a ceia.

Remus arqueou uma sobrancelha.

— Monstro? O elfo da sua família que você odiava?

— Ele mesmo – respondeu Sirius.

— Nunca parei para pensar no que aconteceu com ele após... – deixou a falta de palavras completar a frase, hesitante em mencionar a morte da família de sangue de Sirius. Assunto delicado e nunca discutido.

— De todos morrerem – completou tentando aparentar indiferença.

— Sim. – Meneou a cabeça após o último Black concluir a ideia.

— Mesmo deserdado, sou um Black – Sirius disse enquanto dava de ombros, limpando a baba do queixo de Harry. –, quando soube que iria servir Harry Potter, ele pareceu engolir o desgosto, apesar de toda sua rabugentisse.

Concordando com a cabeça, ele ofereceu o último pedaço para Harry. Sirius encarou o teto, pensativo.

— Se você quiser preparar algo, fique a vontade. Vai ver Harry se anima em provar algo novo, não é, Harry? – A criança não respondeu, entretida com os vários anéis na mão do padrinho.

Lupin assentiu, um pouco fora de lugar na cozinha reconstruída.

— Eu nem sei se lembro bem da receita da rabanada de mamãe – , divagou – e aí de mim ofender Monstro.

— Ele não vai ligar – colocou Sirius.

Remus suspirou, levantou-se e abriu os armários da cozinha. Coçou a cabeça diante dos salgadinhos e comidas industrializadas trouxas.

— Deixa pra outra vez – concluiu após sua análise.

Sirius revirou os olhos.

— Realmente, Aluado, meus suprimentos não são tão desprezíveis assim. – O tom de brincadeira não pareceu descer bem nos ouvidos de Remus.

— Já me resolvi –, replicou com firmeza – acho que vou ler um pouco, você se importa?

Sem jeito e pego de surpresa pela repentina mudança de tratamento, alguns graus mais fria, simplesmente balançou a cabeça.

— De jeito nenhum, Remmie.

Lupin apenas olhou-o de soslaio enquanto saia, pés firmes fazendo um constante batuque nas escadas até o som desaparecer pelo corredor. Black suspirou, apoiando a mão livre na testa.

— Acho que somos só nós dois então – lamentou para Harry quem continuava piamente ignorante da últimas interações.

 

 

—----

 

 

A sessão de leitura do lobisomem não durou muito, interrompida pelas pontadas de culpa por não aproveitar seu tempo com Harry. Sirius o tratava, literalmente, como se nada tivesse acontecido. Remus não se sentia doído em Natais devido às memórias de família, contanto que se mantivesse ocupado com o presente. O passado e as perdas eram inalteráveis. Estar ali na antiga casa de James e Lily era um soco no estômago e, apesar de seus esforços, as acusações de Sirius ainda estavam sangrando e ardendo.

Era tão fácil para o moreno! Entrar na sua casa, apelar por Harry e sair ainda se justificando por ter banido Remus durante a guerra sem nem deixá-lo falar.  Talvez esse machucado se tornasse imperceptível com o tempo, mas agir como se ele não existisse seria impraticável.

Ainda tentando se manter seguro com o livro a tiracolo, Remus recolocou os sapatos e encantou-os com um feitiço de isolamento térmico, afinal, mesmo os feitiços de aquecimento na casa não davam conta da nevasca que começara a cair pouco antes da hora do almoço.

Sirius assistia uma partida de quadribol através de um feitiço e um projetor mágico no sofá enquanto Harry brincava no tapete ocupado algumas horas antes por Lupin. Esgueirando-se pelo hall de entrada – lugar onde a escada desembocava – o rapaz parou um pouco, olhando a cena que se desenrolava com tanta naturalidade. Porém, Harry, mostrando ter herdado os instintos de Lily, o tirou de seu momento.

— Auado, auado! – a criança chamou-o em gritinhos, os cabelos pretos balançando.

Sirius desviou o olhar da partida, e convidou-o para se juntar a ele.

— Puddlemores estão perdendo – comentou – mas sempre temos bebidas para acompanhar um fracasso – indicou a garrafa de cerveja amanteigada na mão.   

Remus o olhou duvidoso.

— Não sei se é uma boa ideia beber perto de Harry.

Sirius assentiu e deu outro gole.

— Primeira vez que faço, juro! – Levantou a mão em uma expressão de juramento. – Mas eu não estou sozinho aqui, então...

Um sorriso tímido e um pouco forçado se moldou nos lábios de Lupin.

— Aceito um gole e só. – disse, apontando o dedo indicador para a garrafa de Sirius.

Black riu e arremessou a garrafa para o outro, quase causando um ataque cardíaco no bruxo. Agilmente, com um gesto de varinha ele paralisou os movimentos da garrafa, impedindo que ela caísse no chão por um triz.

— A árvore ficou legal, né? – Sirius pareceu se esquecer do  jogo, admirando a árvore que haviam montado na tarde anterior.

Remus teve que concordar.

— Fazia anos desde que eu decorava uma. – Suspirou, e tomou o gole prometido. – Acho que Harry se divertiu.

O pinheiro envasado – de fato, Sirius se prontificara a replantá-lo antes mesmo de Lupin mencionar a ideia – fora retirado da neve e agora brilhava com luzes pisca-pisca, enfeitado por várias decorações brilhosas compradas por Sirius no Beco Diagonal. Remus tentara até fazer decorações artesanais com Harry, pendurando alguns desenhos do menino nos galhos, mas a estrela da festa era, de fato, as fotos bruxas levitando ao redor da árvore.

— Eu me diverti, se vale qualquer coisa. – Sirius deixou escapar, não encontrando os olhos de Remus, que o deixou no silêncio.

Lupin mantinha os olhos na partida de quadribol, completamente desinteressado, mas desconfortável em manter uma conversa afável com Sirius. O rapaz tatuado insistiu no diálogo:

— Já dei a comida pro Harry, aliás. Podemos dividir uma pizza congelada.

Remus abaixou a cabeça, escondendo um sorriso. As recordações dos dias passados na base de pizza trouxa preservada com feitiços de congelamento no apartamento de Sirius eram bem interessantes, por assim dizer. Remus completamente desempregado aos dezessete anos e sem onde cair morto já que precisara vender a casa que restara para quitar dívidas. Sirius o acolhera no mesmo colchão por uma temporada, até ele juntar galeões suficientes para se sustentar.

— Aqui ou na cozinha? – perguntou Remus.

— Se eu fosse você não tiraria os olhos desse diabinho. Assim parece um anjo, mas é só se ver sozinho que vai querer tacar fogo na casa.

— Exagerado - retrucou.

Remus sorriu para o menino de olhos esmeraldas, e agachou-se para oferecer um brinquedo colorido que emitia notas musicais para ele. Harry o agarrou, e deixou a peça cair no seu colo, mas se houve dor, ele não pareceu achar relevante.

— Calabresa ou aquela cheia de vegetais? – gritou Sirius, da cozinha.

— Você tem uma pizza com vegetais, estou impressionado! – ironizou.
Black colocou a cabeça pela porta da cozinha.

— Eu tento ser saudável, okay?

Remus apenas continuou a brincar com Harry, risonho.

— Eu como a parte com vegetais, Black – finalmente respondeu.

O sussurro de Sirius foi audível:

— Obrigada por responder às minhas preces, Merlin e Morgana.

— Dramático – murmurou Lupin para si mesmo, vendo Sirius chegar com as pizzas esquentadas magicamente.

Eles comeram assistindo o jogo, mas até mesmo Harry poderia dizer que as suas atenções estavam definitivamente fora dali.





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Notas finais do capítulo

Como estão sentindo as interações entre esses dois?



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