Livros e Cigarros escrita por Martíou Literário


Capítulo 21
Capítulo 20 - Olá, meu mordomo




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A paz que Ítalo sentia era tão boa, que achava que era uma falsa esperança de queda de pandemia para uma nova onda de catástrofe global. Mas não importava, já estava de saco cheio de tantos problemas, ia aproveitar que sentia que tudo estava em seu devido lugar para relaxar e se empolgar sem pensar no resto.

Depois que resolveu o problema com a agiotagem, Ítalo sentiu como se as coisas voltassem ao normal.

Mas que normal era esse?

Talvez fosse só alivio de se desprender daqueles criminosos, e, pelos deuses gregos, que Jânio não ousasse metê-lo em uma encrenca dessas tão cedo. Estava sossegado, sem se preocupar com o aviso dos búzios e com a pessoa do número desconhecido. Estava até voltando a trabalhar em seu livro que falava sobre um personagem baseado nas características dele e, claro, se adiantou em fazer um back-up de suas histórias.

Quando Jânio abriu a porta do apartamento, deparou-se com seu colega de quarto vincado em um grande dilema. Sentou-se do seu lado e puxou seu maço de cigarros do bolso.

Ítalo estava sentado na chaise com o notebook no colo. A iluminação forte da luz invadia pelas portas de vidro que davam para a varanda.

— Eu estava aqui pensando no meu livro. O primeiro capítulo tem oito mil palavras. Mas estou pensando se deveria mudar isso, sabe, se ficaria cansativo ou não.

Jânio tragou e soltou a fumaça, que circulava em novelos pelo ar. Seus olhos estavam reflexivos no quadro da parede. Ítalo não sabia se ele pensava no seu problema ou no dele com a Melissa. Jânio ergueu as mãos, como se quisesse medir algo.

— Sabe , Ítalo, imagine um pênis bem grande.

Ítalo estava digitando quando ouviu isso, arregalou os olhos e quase torceu a cabeça ao virar para o amigo.

— O que, mano?

Jânio tragou e olhou-o, assoprando na sua cara. Depois voltou a relaxar no sofá, recolocando o cigarro na boca.

— Um pênis de vinte centímetros. - disse com o derb entre os dentes.

— Cara, o que isso tem a ver?

— Tem pênis de vinte centímetros que podem dar prazer a uma mulher e outros não, mas por trás de um tamanho, vai ter a personalidade e envolvimento de um cara.

Ítalo voltou a mirar a parede, atônito. Ele engoliu em seco.

— Quer dizer que...

Jânio vergou a cabeça no encosto do sofá, mirando os olhos plácidos no teto.

— Tudo dependerá do seu talento na cama, parça. - houve uma pausa. Parecia indignado. - Mas sabe de uma coisa? Mesmo sendo bom de cama, ela ainda vai continuar me jogando farpas, brigando comigo, depois vindo mansinha como uma gata querendo fazer as pazes ardentemente. Sabe porque, hein? Sabe por que, Ítalo? Porque minha namorada é maluca. - Ele praticamente saltou dali, abriu as portas da varanda e debruçou-se nela, puxando o cigarro da boca e soltando as ondulações cinzentas. Houve um suspiro, despencou a cabeça para baixo, balançando-a e se lamentando.

Ítalo o assistia, preocupado. Não era um aspecto comum daquele mar sereno que era o Jânio ter um acesso de raivas como aquele.

Ítalo tomou um suspiro, voltando para sua história. Quando bateu os olhos na tela, abriu um sorriso de canto, já iluminado de ideias e, também, de alívio.

...

Clara molhava as plantas na casa de seu pai. A maneira como fazia era como um anjo tocando arpas. Desde pequena aprenderá a ter equilíbrio e leveza sobre as coisas, pois era como poderia emanar mais poder com elas.

Aquela era a forma de lidar com a briga que acabara de ter com um homem de posse majestosa em uma poltrona alguns metros longe dela.

...

O início daquela noite na Unifap estava começando prometendo alguma, era o que um rapaz presumia ao andar pelos corredores, vendo jovens dançando loucamente na frente de um bloco, visivelmente alterados por vinho.

— Muito obrigado por me trazer até aqui.

Ivan deu nos ombros.

— Se está à procura dele todos esses dias – sorriu. -, é um prazer poder contribuir pra esse encontro desde o conflito que ele teve na sua casa.

Passaram por duas meninas magrinhas, que pareciam ser gêmeas se não fosse pela diferença de tamanho.

— Boa noite, senhoritas.

Elas viraram-se, presas em uma reação de espanto por vê-lo ali.

— Oi. – disse a menorzinha.

— Boa noite. – disse a outra.

— Vocês por acaso conhecem o Ítalo?

Elas acenaram um sim com a cabeça, como se não conseguissem responder. Ainda estavam bobas pela beleza do rapaz a sua frente. Com certeza, ele não era dali.

— Sim, ele sempre chega cedo, deve ta vindo.

— Obrigado.

— Espera. – disse Katerine, segurando na mão dele. – Vem com a gente. Estamos bebendo vinho.

Ele sorriu, simpático.

— Está bem.

Ivan ficou observando de longe. Estava empolgado, muito empolgado por esse encontro, avido para ver a reação de espanto do próprio irmão. Quem estava ali conversando com as gêmeas, iria poder satisfazer Ivan, pelo passado perturbador que voltará para Ítalo.

O sangue borbulhava como terremoto em suas veias.

...

Sua professora de literatura era hilária, pensava Ítalo, sorrindo. Ele estava mais leve depois de tirar um grande peso de si, mais despreocupado das tensões do último dia. Até mesmo estava começando a fazer algumas brincadeiras.

— De agora em diante, não vamos mais falar narrador em primeira ou terceira pessoa. Mas sim dizer... – e a professora começou a anotar no quadro, sendo acompanhada pelos alunos. – Narrador autodiegético, narrador heterodiegético. – parou um momento para explicar esse último. – Vocês sabem o que significam hétero? Não hétero de um casal em que uma tem pepeca e outro pipiu. – esclareceu. Ítalo ainda se impressionava ora ou ora com a diferença dos professores universitários para ensino médio. – Mas hétero que envolve várias coisas, como igreja ortodoxa e igreja heterodoxa. Gente, tem uma amiga minha cuja religião se chama vale do amanhecer. Eles acreditam num monte de coisa, engloba espiritismo, umbanda, catolicismo, até Et. Tipo. – ela faz uma cara. – Esses primeiros, tá, respeito, compreendo, mas ET, né, gente.

— Cuidado. – proferiu Ítalo. E todos viram seus rostos atenciosos e curiosos para ele. O garoto estava com os cotovelos apoiados na mesa, com o queixo em cima dos dedos entrelaçados. – Eu posso ser um Et. – deixou a dúvida no ar, simplesmente. Todos o encaravam em silencio. Sentiu-se convicto por dentro. E descansou as mãos sobre a mesa. – Posso estar disfarçado de humano e estar estudando todos vocês. Posso estar de olho em quem acredita e quem não acredita em nós. – ele apertou os lábios e deu uma erguida nas sobrancelhas. – Cuidado. Aqueles que acreditam em nós podem ser os únicos salvos.

A professora sorriu.

— Opa, nesse caso é melhor eu tomar cuidado, não, é gente?

— Cuidado, mesmo. – dessa vez quem disse algo foi Mateus. – Eu posso ser Jesus disfarça...

— Certo, voltando a aula. Temos também o homodiegético...

Mateus bufou, frustrado.

— É. Não rolou.

Ítalo riu e olhou para o lado, encontrando uma expressão contrária à sua. Enquanto ele estava mais feliz, Clara parecia ter sido detonada. Talvez tivesse a ver com os trampos e a correria que a família lhe fazia passar.

— Gente, vou passar mais um trabalho parecido com aquele um – a professora deu suas últimas explicações e foi embora.

Bianca ainda chamou todos para conversarem e ajudarem algumas coisas sobre a semana de Letras. Depois disso, Ítalo já chamava suas amigas para o trabalho do resumo expandido. Ele não tava vendo a hora de se livrar disso.

— Ai, não quero, moleque chato. – Emília já começou reclamando.

— Mas a gente tem que fazer – insistiu Ítalo, com um tom meio impaciente.

— Eu não vou fazer, égua, to cansada, não me enche, ítalo.

Ficaram em silêncio por um tempo, andando pelo bloco. Ítalo olhou de soslaio para ela. Essa pequena ta que ta hoje, pensou ele.

Tsk.

— Mas a gente tem que editar umas coisas ainda. – dizia, acompanhando-as pelo corredor. – aquele ta meio cagado ainda. – Gemeu sobre o pré preparado resumo.

— Cagado ta tua cara. – implicou ela ao colega.

Era impressão dele ou ela estava meio encrenqueira naquele dia?

— Sim, temos compromisso, tem que fazer. – retrucou ele.

— Eu não faço. – replicou ela.

— Então não faz, porra, faço só eu e a Clara. – revidou ele.

— To nem ai, ela também não faz. – redarguiu ela.

— Gente. – finalmente a voz de Clara, meio que rindo de estranheza. – eu to aqui.

Emília ainda irritou bem ele, fazendo-o soltar um “porra, caralho” bem grosso e levar uns tapas no ombro, com os olhos arregalados das duas. Sério? Pensou o coitado.

— Mas que audácia! – soou ele.

Clara que estava teclando no celular, comentou:

— Mano, às vezes tu parece a Stephany do três é demais.

Emília concordou, finalmente rindo daquele estresse dela.

— Que grosseria! – disseram elas, em uníssono, parando com o espanto de terem pensado na mesma fala e se matando de rir, arrancando um balançar de cabeça do amigo.

Eles se sentaram na outra extremidade do outro bloco, perto da copiadora. Era um lugar de canto visto que a partir dali só havia alguns metros de mato antes do muro que delimitava o fim do campus.

— Clara, abre ai o resumo expandido no teu celular.

Ela teve um pouco de dificuldade, mas achou e entregou para ele. Ele leu. Mas então Emília, quem ainda implicava um pouco, ficava rindo toda vez que ele lia.

Ela ria sempre que ele lia a segunda pergunta do questionário, fazendo com que seu amigo erguesse os olhos capetamente em sua direção, mostrando impaciência. Ai sim que ela ria.

— Égua, porra, caralho, presta atenção. – gritou sussurrando, com os olhos incisivos de raiva.

— Ei...vocês dois parecem dois adolescentes. – repreendeu Clara, contendo um riso.

— Mas é ela.  Essa doida ta de TPM. – acusou Ítalo.

— Ah, Ítalo, vai se fuder.

— Vai tu, vai. Que fica descontando teu estresse em mim.

— Protesto. – disse ela.

— Eu sonhei contigo, Ítalo. – atalhou Clara

— Vai te..  o que? – Interrompeu-se, encarando a amiga, desnorteado.

— Sonhei, a gente conversava. – explicou ela.

Égua, mas só isso?

— Pera, é que eu tenho um sentido de ambiguidade muito estranho em conversa, pra mim é sinônimo de ...

— Safadeza. – completou Emília, de enxerida que era ela.

— Deixa eu terminar.

— Ta. – disse, com um sorrisinho. – termina.

— Safadeza. – finalizou ele.

Clara riu, levando a cabeça para trás e lado, semicerrando os olhinhos.

Eles finalmente conversaram sobre o trabalho depois de ele perceber que Clara só os interrompeu para parar aquela discussão infantil entre ele e a amiga. Clara ajudou a editar e combinaram de se encontrar depois para dar os últimos aperfeiçoamentos ao trabalho.

— Ah. – Lembrou-se Ítalo, virando-se para Clara – da próxima vez que eu for te visitar em um sonho, me ofereça pelo menos uma xícara de café. –, se dirigindo para o corredor que dava para a saída.

Clara o alcançou, correndo o quanto podia e parando na frente dele, ofegante. Nesse momento, Emília ia passando por ele.

— Mano. – parou para controlar a respiração. – Preciso de um favor. – e olhou para trás, vendo Emília parando no bebedouro. Voltou-se para ele. – Da um desconto pra Emília. – ele parou pra pensar. – E... eu tava aqui me perguntando. Tú acha que ela pode estar com ciúmes de mim com o Jânio?

Ítalo se espantou um pouco com essa.

— Jânio? Como assim? Não... Não tem nada a ver. Por que tu acha isso? Só por causa daquela paixãozinha que ela teve por ele?

— É, acho sim. E lembra o clima no apartamento de vocês.

Sim, percebi a troca de olhares entre você e Jânio, e Emília pra ele, e Leandro pra você. Mas foi também porque estávamos com o cu na mão por causa de agiotas.

— Clara, acredito que você esteja viajando. – e levou um dedo até a testa dela, cutucando-a. Mas ela não mostrou nenhuma reação de divertimento. Ítalo piscou os olhos. – Você está falando sério?

Ela assentiu, com o olhar soturno acentuado.

Clara era uma mulher vivida e esperta, sempre dando bons conselhos para ele, e parecia ser a mais madura dali de todos, mas ele realmente não estava conseguindo levar a sério isso. Sabia dos climas, mas Emília estava mesmo estressada por causa de macho?

Mas por que não?

Ítalo encarou os sapatos dela.

— Tú acha que eu deva pedir desculpas pra ela, porque é óbvio que... ?

— Não, mano, não é isso, só tenta não culpar muito ela por isso. E não precisa pedir desculpas, mas eu me sinto um pouco culpada.

Ele a fitou de longe. Emília se encostou em um pilar de costas pra eles. Ítalo volveu seus olhos para Clara novamente.

— E o que pode acontecer, se o cara não é afim dela? Aliás, ele tem uma namorada, que fique sabendo. Além do mais, ela é doida.

Clara inclinou a cabeça para o lado, desentendida.

— Ah, ta. – e olhou para baixo, triste e perdida, ou pelos menos era o que a expressão dela dava a entender. Clara tinha tanto com que se preocupar, ainda por cima ficava agoniada com um leve aborrecimento da amiga.

E ele não gostou disso. Soltando um suspiro audível, disse:

— Ta, ta bom. Posso dar um jeito.

— Ah mano, obrigada. – agradeceu ela.

Ítalo, então, começou a dirigir-se até o corredor que dava para a saída. Não ia pedir desculpas de jeito nenhum, mas sabia de uma coisa que Emília gostava.

Ele encostou-se em um pilar, de frente para o que Emília estava de braços cruzados. Pessoas passavam por entre eles, saindo de suas aulas.

Ítalo vestia jeans e camisa polo preto que parecia acentuar seus músculos, ela observou esse detalhe por um segundo, mas desviou rápido, fingindo disfarce.

Ele cerrou seus olhos para Emília naquele vestido solto até metade das coxas. Ela, que estava roendo a unha, encarando um ponto qualquer, agitada, depois desviou os olhos para ele, arqueando uma das sobrancelhas.

— O que foi, psicopata? – perguntou ela com tom ríspido.

Ele não respondeu, continuando a fita-la irredutível, o que a fez arregalar os olhos em medo.

— Que, já, macho?

Ele torceu um dos cantos dos lábios, se perguntando porque ela gostava tanto de uma dor de cabeça.

Ela arqueou as sobrancelhas, olhando-o dos pés à cabeça.

— Ta achando o que?

— To achando que tem outros becks por ai pra ficar se mordendo por esse.

Ele está falando desse tipo de dor de cabeça, pensou ela. Ela mudou sua expressão rapidamente depois disso.

— Acha que to estressada por causa de macho?

— Acho.

Emília não conseguia acreditar que ele respondeu isso. Admitia pra si mesma que era um pouco por isso, mas preferiu manter sua dignidade intacta e dizer que era devido a faculdade de direito. Mas a verdade era que ela tinha muita coisa na cabeça, os mistérios de Ítalo não diferenciavam muito dos do dela, além da faculdade de direito e sim, estressada por estar com ciúmes de Jânio, pois se negava a se estressar por isso.

Ele bufou, mas tão alto que a fez encarar com susto.

— Tá, oh, meu deus, é por que ela é super ocupada e orgulhosa demais pra dizer que é por macho.

Emília revirou os olhos.

— Jânio não sabe o que está perdendo. – brincou, puxando os lábios ressecados em seguida para dentro da boca um instante.

Emília virou o rosto para ele no mesmo instante, mas seu olhar não pareceu assustado de brincadeira, só que cintilou.

Ele piscou os olhos, tendo sua atenção chamada por aquilo.

Ela gostou?

Bom, para uma mulher que não se sentia desejada por um, poderia servir de consolo ser desejada por outro. Emília era sua amiga, e prometeu à Clara que faria algo.

Mas aquela troca de olhar parece que favoreceu tudo.

Ítalo ergueu um canto dos lábios, sugestivo.

— Sabe do que tú ta precisando? – deu nos ombros. - Eu posso tomar conta disso. – declarou, referindo-se ao estresse dela.

Ela suavizou os olhos e o encarou inteiramente, puxando um sorriso no canto dos lábios com gloss.

— Pode, é? – incitou, com uma voz mais suave e interesseira.

Seus colegas que estavam sentados, conversando no banco ao lado, de frente para a saída, começaram a prestar atenção neles. Ítalo desprendeu as costas da coluna e encurtou a distância entre os dois, prendendo a atenção dos que estavam por perto. A vice representante arregalou os olhos.

— Sabe o que vou fazer, senhorita? – perguntou baixinho, encarando-a bem nos olhos.

Ela deu nos ombros, como menininha.

Havia certo tempero em sua face que fazia Emília ser desejável naquele instante, seus olhos estavam sapecas, os cabelos brilhosos como se quisessem ser agarrados por seu punho.

Por um momento, nenhum dos dois sabia o que estava acontecendo, uma brincadeira ou um flerte.

E chegou bem perto de seu ouvido, abrindo os lábios e deixando-os parados por um momento, suscitando expectativa nos colegas.

Então, disse naturalmente e sem pausa na voz.

— Cê ta bem atraente aos meus olhos hoje.

E quando ela tava para morder os lábios, acordou daquele delírio e deu uns tapas no ombro dele, o afastando e vendo-o rindo, e ela ria junto, como se tudo não passasse de uma brincadeira.

Mesmo que tenham ativados alguns feromônios nessa brincadeira.

Ítalo olhou por cima dos ombros da amiga Bianca discutindo com as falsas gêmeas. Emília virou também o rosto, curiosa, depois olhou para o lado porque sua carona buzinava.

— Vou indo, tchau, amigo. – disse, o beijando na bochecha e saindo pelo corredor.

Ítalo já nem olhava mais para a bronca da Bianca, só estava paralisado por sentir lábios molhados em sua bochecha, espalhando um calor de seu toque cálido pelo rosto.

Tremeu os ombros com arrepio e desceu do corredor para o gramado, em direção de Katerine e Caroline bêbadas, mas limitou-se ainda parado e distante. Bianca dava um sermão nelas. Leandro estava junto, mas bebendo um suco de maracujá, assistindo tudo com um riso divertido em seu rosto. Ítalo olhou ao redor. Emília foi embora e Clara foi conversar com o professor de introdução a sociologia que a chamou.

Jânio estava agoniado com cigarro em uma mão e telefone na outra do outro lado do corredor. Esse beck mesmo. Ítalo ajeitou a mochila sobre um dos ombros e se aproximou das duas bêbadas, ouvindo parte do sermão. Mas Caroline virou o rosto pra ele e ergueu o corpo de vinho em sua direção, mas tão desajeitada e rápido que quase molhou ele, o fazendo dar um pulinho para trás.

— Ítalo. – exclamou ela, alegre.

— Por que vocês fizeram isso? A aula nem demorou muito, oito horas já fomos liberados. Não custava esperar um pouco? Olha só o Ítalo, ele gosta de beber, por que não bebem com ele? Mas assim, depois de terminar a aula ou no sábado. – balançou a cabeça. – Leandro, pega dois copos de água, por favor.

— Mas o Ítalo é chato. – disse Caroline, apontando para ele com o copo de vinho, também, fazendo-o fechar os olhos quando sentiu aquilo espirrar nele.

Já querem fazer graça.

— Ai. – dramatizou o letrado, mais pela ofensa que o vinho na cara, levando a mão teatralmente até o peito e dando um passo para o lado para Leandro passar.

Eles riram.

Caroline parecia querer parecer consciente mesmo bêbada, mas a voz embargada mesmo ela tentando parecer firme entregava. Já Katerine parecia não estar muito consciente, o olhar encontrava-se abstraído, os lábios, finos e molhados, da cor do próprio vinho, e os olhos escuros que pareciam nem ter claras.

— Gente, eu fiquei muito triste com vocês, não façam mais isso, ta bom? – Bianca disse e saiu logo em seguida.

Quando Ítalo estava para se afastar, Leandro chegou com os dois copos de água, e a mais alta segurou em seu braço.

— Um homem muuuito bonito estava te procurando. – disse isso e deu uma piscadela. – Você continua sendo um parceiro chato pra bebida.

Ele franziu as sobrancelhas, sem entender fagulhas do que ela disse. Simplesmente ignorou e estava para sair dali, mas antes, pegou os dois copos de água e jogou na cara delas.

— Fiquem espertas. – disse, vendo ambas piscarem seus olhos atordoadas.

Aos poucos suas amigas foram indo para suas caronas e só restou ele e Clara ali.

Mas antes foi até Jânio. Ele parecia frustrado, soltando um bufo encarando a tela do celular.

— Pelo visto, as coisas ainda andam complicadas pro teu lado.

Ele suspirou, indo em direção ao corredor.

— Vem aqui.

Ítalo o seguiu, e Jânio o levou para os fundos do campus, descerem do corredor para a grama, indo em direção às árvores, e foram para um canto que era início da descida, quase uma ribanceira, mas escondido por árvores. Jânio olhou para trás um momento, para ver se Ítalo estava tomando cuidado, pois aquela descida podia ser traiçoeira às vezes.

Ítalo franziu as sobrancelhas, olhando ao redor aquele lugar bizarro, porém calmo. De alguma forma, acalmava olhar pelas frestas das folhas e vigiar as pessoas dali.

— Você não precisa se culpar por estarem nessa fase. – depois Ítalo parou pra pensar. – Ou talvez não seja uma mera fase.

— O que quer dizer?

— Jânio, nesse relacionamento, você sempre se entregou, sempre se importou. Mas acho que é melhor terminar. Como namorados, você tem essa opção.

Jânio abaixou os olhos, balançando a cabeça depois de pensar um pouco.

— Não, não preciso terminar, preciso resolver.

Ítalo estalou o céu da boca, balançando cabeça.

— Isso está te fazendo mal. Você precisa deixar essa garota. – estalou o céu da boca de novo, dessa vez com mais raiva. – Égua do cara. – E após um silencio, olhando um pouco o corredor para espairecer, disse. – Sai dessa, tem tanta outras opções boas ai.

— Tipo o que?

Ele apenas moveu seus olhos para Jânio, este o encarando, sem um curvar de sobrancelhas ou de lábios, apenas olhos concentrados desafiadoramente em ítalo.

— Saberia se se deixasse se desprender dessa... da sua perseguida.

Impaciente, um suspiro escapou do letrado, olhando ao redor.

— É aqui que você fuma?

— Me parece apropriado.

Ítalo olhou de um lado para outro daquele lugar, com uma dobra entre as sobrancelhas e o lábio superior erguido.

— Esse lugar é muito bizarro, cara. - disse antes de brechar.

— Não é à toa, aqui já foi usado para desova de corpos. - disse Jânio concentrado em procurar um isqueiro com o cigarro na boca, e suas pálpebras indiferentes e relaxadas reluziam. Ele falou isso no exato momento que Ítalo ouviu um barulho atrás deles.

— Como é que é?

— Ah. - disse com um som vibrante por estar com o cigarro entre os dentes, erguendo olhos surpresos pra ele. - É apenas um rumor, esquece disso.

Dele, Ítalo olhou para o mato, fechou os olhos e balançou a cabeça.

— Deve ser só uma cobra. - disse Jânio antes de acender, tragar e assoprar na cara incrédula do letrado. Sem expressar diferença de expressão pelo ar cinzento na face, Ítalo balançou a cabeça em desaprovação para Jânio.

— Eu vou lá pra frente.

— Vai lá. – disse Jânio, pegando um cigarro.

Ele saiu daquele esconderijo terapêutico e bizarro ao mesmo tempo, e foi atrás de Clara, mas como estava ocupada, decidiu esperar no banco na entrada da universidade.

Ela estava conversando com o professor de introdução à sociologia. Era muito comum alunos serem grandes admiradores e puxa sacos dos professores ali, mas naquela situação, era mais que evidente como o professor se animava com a energia que Clara transmitia. Ela, no entanto, parecia cansada.

— Amanhã, podemos retornar ao assunto, Clara, podemos levar adiante seu artigo, eu realmente fiquei encantado pelas suas palavras naquele último parágrafo.

Ela riu. Aquela forma que seus olhinhos estreitavam e levava a cabeça para trás era um detalhe que mostrava que tinha ficado sem graça.

— Ta bom, então. – disse rindo, balançando a cabeça.

Ele riu também, como se achasse engraçado. E quando chegaram no final do primeiro corredor, se despediram, bem na frente de Ítalo.

Ela suspirou cansada e despencou no banco de concreto como se fosse nuvens. Ítalo ficou encarando-a estirando a cabeça no encosto de concreto. E como se percebesse que estava sendo observada, abriu os olhos, permanecendo a perdurá-los no teto.

— Emília está bem? – ela quis saber.

— Ela é mesma afim de Jânio, né?

Clara fechou os olhos de novo.

— Emília não é imatura, Clara, não vai deixar de ser sua amiga por causa de Jânio. É capaz de sacrificar a vida desprezível dele para mantê-la viva. – assegurou o amigo.

Ela reabriu os olhos arregalados, dessa vez encarando ele, toda aprumada e comprimindo um riso de nervoso.

— Ok, amigo, obrigada pelo consolo, mas menos.

Ele deu nos ombros, esticando seu braço pelo encosto agora que ela havia livrado. Olhou por detrás dela Leandro conversando com as falsas gêmeas.

— E o Leandro, como fica? – perguntou sem pensar, mas já era.

Ela estranhou.

— O que?

— Hã? – volveu os olhos para ela de novo.

Perdido em sua mancada, ele olhou de um lado para outro do chão antes de voltar a encará-la.

— E o cansaço?

— Não, você disse...

— Parece eu depois de brigar com a família. – desconversou.

Ela desistiu de retornar ao assunto, concordando com ele.

— Sim. Meu pai chamando atenção. – até a voz da coitada estava quase decadente em gemidos pelo seu desgaste.

— Ele leva a sério mesmo isso. – pensou ele em voz alta.

— É tradição.

— Mas você é dona do seu próprio nariz, sempre se orgulhou disso, estranho baixar tanto a bola pra ele.

— Ai, amigo, você não entende. É algo que preciso.

Ele franziu as sobrancelhas.

— Dos treinamentos? Precisa tanto?

Ela ficou cabisbaixa.

— Sabe, me Lembra um pouco Emília. Não gosta da pressão, mas acabou precisando. Além disso, se ela sabe algumas coisas, foi porque abaixou a bola.

Ele estreitou os olhos, desviando para Clara.

— Sabe que só notei agora algo.

— Há? – ela estava assustada.

— Vocês também tem oráculo?

Ela inflou o peito, mas aliviando-se logo em seguida.

— Sim.

Ele piscou os olhos.

— Achou que eu falaria outra coisa?

Ela riu.

— Eu só to cansada.

Ele quase estreitou os olhos.

Nunca tinha parado tanto para analisar. Mas depois que percebeu Emília esconder algo em relação a sua descendência, teve um súbito pressentimento em relação a Clara.

Percebia que perdurava os olhos nela e a mesma não o encarava.

Clara, Clara.

— Eu nunca fui a sua casa. Acho que eu poderia conhecer mais de você, Clara.

Ela retribuiu o olhar, se deparando em algo estranho no olhar de Ítalo. Clara sentia-se exposta naquele momento. Mas ela era sempre boa e condescendente com seu coração de mãe.

Ela sorriu.

— Claro, mano, quando quiser

Depois disso, ela se abriu sobre todo esse desgaste, Clara falou do relacionamento dela com o pai de sua filha, com quem já se separou, que não cumpria com as obrigações de pai e jogava todo o peso para cima dela pra variar, e Ítalo identificou que a relação abusiva pelo que ela passava era igual a de Jânio.

Ele a encarou. Eles eram pessoas tão boas, se fossem um casal, teria bastante amor um com o outro, até a forma como ela falava com ele a respeito de seus problemas. Ela saberia lidar com isso?
Por coincidência, Jânio apareceu na frente deles, calmo, relaxado, mas com marcas de aflição, olhos vermelhos.

Ele tinha ido cumprimentar Clara e parecia querer conversar com ela

Essa história toda mais a tarde de surto de Jânio lembrou Ítalo que o beck ainda tinha uma namorada, louca, mas tinha. E isso acabou fazendo Ítalo se lembrar de Carolina. Os dias andavam tão intensos que não andava mandando nenhuma mensagem para ela. Curiosamente, ela também não.

Decidiu ligar para ela depois que seus amigos se afastaram pra conversar mais à vontade, afim perguntar como ela estava, de ouvir aquela voz doce e rouca de mulher.

Estava com saudades daquele corpo, saudades daquele tipo de contato humano, das carícias de uma carne, beijar aquele corpo belo dos pés à cabeça, e de ficar deitado em uma cama e sentindo o abraço.

Mas Carolina parecia nunca ter tempo ou parecia não querer, às vezes ele tinha vontade de levá-la a algum lugar, passear, fazer uma viagem.

Será que ela não queria porque ele era doze anos mais jovem?

Ela nem parecia ter 32 , parecia ter 27, 29, assim como ele parecia ter uns 22, as pessoas nem ligariam.

Ela atendeu.

— Alô?

Ele piscou os olhos.

— Oi, Carolina.

— Oi, quem é? Sai.

Ele franziu as sobrancelhas, confuso, por ela não reconhece-lo e curioso de saber quem estava por perto.

— Sou eu, Ítalo? – respondeu, com tom dúbio para si mesmo.

Houve um suspiro exasperado do outro lado e ele não sabia se era por ele ou outra pessoa.

— Sai daqui.

Ele franziu as sobrancelhas.

— Está tudo bem?

— Hã? – ela parecia atordoada. – Oi, Ítalo, desculpe o mal jeito. – terminou a frase com força, como se estivesse se livrando de algo e depois Ítalo só ouviu o barulho da porta, e pelo eco, era o banheiro. – Ando toda atrapalhada aqui em casa.

Ele franziu as sobrancelhas.

— Sério? Parece aborrecida mesmo. – ele riu. – Parece eu tentando me livrar das bagunças da minha sobrinha.

Ela riu sem jeito.

Houve outro suspiro e ela sentando. Ítalo piscou os olhos, ouvindo indistinto sons, poderia até mesmo imaginar que ela estava no banheiro para procurar um refúgio.

— Estou cuidando dos sobrinhos da minha irmã. Estou cansada, querendo amor. – gemeu, e riu, parecendo melhor. – Faz tempo que nós não nos vemos, baby, temos que marcar logo isso.

Ele sorriu, mais aquecido por dentro por ela ter demonstrado interesse.

— Eu posso ir ai na sua casa agora. Posso te ajudar com os pequenos ai.

Ela ficou em silencio, e ele pareceu ouvir algo, como se ela tivesse travado.

— Não, não, ai fico dividida entre você e eles, e eles só vão me aborrecer mais ainda. Prefiro só eu e você.

Ele sorriu pelo nariz.

— Tudo bem, então.

— Mã...

Ítalo estranhou. Parece que ela tapou o celular, ouvia apenas ruídos, ela conversando com as crianças.

— Olha, preciso desligar, desculpa, tchau. – e desligou.

Atordoado, ele encarou a tela. Aquilo não foi nem um pouco legal. E logo em seguida, apareceu uma mensagem dela.

(18/06/18) Carolina: Desculpe desligar na sua cara, mas criança é fogo, quero por eles logo para dormir e descansar junto.

Ele suspirou, curvando os lábios em um cansado sorriso.

(18/06/18) Ítalo: Tudo bem, paixão. Se cuida, beijos pelos seu corpo que tanto amo.

(18/06/18) Carolina: Rs Rs, queria.

Ótimo. Ele estava indo tão bem para se sentir mal de novo. Suspirou. Calma, Ítalo, pelo menos não está com a vida em risco como no dia anterior.

Fechou os olhos, quando certos sussurros pareceram ficar audíveis, e olhou para Jânio, que parecia desabar e muito mal, mas Clara o acudia. Logo outros sussurros lhe chamaram a atenção. E eles tinham uma melodia, como sussurros da melancolia, quando uma música toca no final do episódio de uma serie no decorrer de vários acontecimentos até o mais desagradável. E isso fez despontar amargamente uma sensação nervosa no peito. Olhou para o lado e viu a patrulha de Nicolai desfilando pelos corredores novamente. Algumas pessoas diziam que eles estavam contra a greve.

Como se perdessem a sintonia, os sussurros pareciam ter virados zumbidos.

Greve? Mas...

— As greves voltaram. – alguém em meio aquelas vozes disse.

Aquilo voltou, pensou Ítalo.

A sensação ruim voltou. E com zumbidos dolorosos em sua cabeça.

Ele abanou a mão e não viu nenhum mosquito, estranhou, colocou o cabelo atrás da orelha e se concentrou. Era como se estivesse sincronizando com alguma frequência, e o zumbido pareceu modificar para som de fogo. Era como um metamorfo em seu ouvido, depois como se ele perdesse o sinal, virando zumbido de novo.

Greve dos caminhoneiros voltou pois precisava-se pensar no Brasil segundo o conselho, e a gangue de Nicolai se preparava cada vez mais.

Quando ele passou na sua frente, o ritmo do mundo pareceu desacelerar quando o russo olhou para o lado, em sua direção, com um sorriso como se fosse um aviso.

Ele não se cansava mesmo.

Logo à frente de Ítalo, vinha seu irmão Ivan, sorrindo ardilosamente para ele. Mas o que ele fazia ali na sua faculdade se era do outro campus?

O que estava acontecendo? Será que era alguma matéria que faltava pagar?

Era possível que só estava ali para atormenta-lo?

Numa história, as pessoas sempre queriam um vilão. Isso era um saco para Ítalo.

Ivan, Nicolai? Sua história era incerta. Para ele, seria coisa de filme. Mas ele sentiu algo que fez ele tremer ao dar de cara com ele.

Nicolai passando, descortinando outra pessoa que lhe dava nervoso também.

Aqueles olhos verdes que tanto repugnava lhe arrepiaram sob sobrancelhas arqueadas de megera, aquele sorriso insolente e inconsequente e seu cabelo não o mais o topete de sempre, mas não deixava fugir sua pose. Aquele cara vinha da primeira casa que Ítalo morou antes da de Jânio.

O que queria deixar no passado.

E muitos flashes vieram ao passo que aquele homem se aproximava, as mensagens misteriosas, Ivan falando que alguém o procurava, Caroline quando disse que alguém estava atrás dele.

Os zumbidos eram fortes, lhe causando uma sensação atordoante. Mesmo sentindo que tava pra cair, tentou se segurar. Eram como fantasmas ao redor.

Ver eles ali lembrou de Ellen, sobre cada um ter valor em seu destino, Ivan, Nicolai e benjamim. Podia ser qualquer um deles a alma tóxica, mesmo sendo todos eles. Eles vão guiar tudo, vão ser a chave, o caminho e o desencadear. Era muito agoniante saber que não podia escapar facilmente deles.

Fechou os olhos com o zumbido oscilando arduamente.

Ele ainda não tinha sentido isso antes. Era novo.

Era exatamente como pensava, uma mera pausa para uma nova onda de catástrofes para sua vida. Pelos deus gregos, nunca iria ter sossego?

Benjamim, a pessoal antes misterioso que lhe perseguia, aproximou-se.

Você mesmo disse para ele dar as caras, Ítalo. Gostou da surpresa?

Ítalo temera cada passo.

Pior, foi o cumprimento.

— Olá, meu mordomo.


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