Agora sei como uma galinha no abatedouro se sente. Aquele monte de jornalistas enlouquecidos por qualquer sinal de uma famosa, me lembravam muito carniceiros ou abutres atrás da presa. Quero dizer, ficar bloqueando a entrada em casa, só para publicar um furo de reportagem. E se eu fosse uma estrela mesmo, vivendo ali por opção, seria algum pecado? Eu mesma estava cheia de dúvidas e eles tentavam forçar uma resposta...

Ainda bem que Benjamin foi me socorrer e atraiu a atenção de todos eles, dizendo que também era fã. Ok, quem eu quero enganar? Foi um gesto lindo, mas uma ideia péssima. Assim que ele falou que uma jornalista tinha entrevistado ele não me liguei muito, mas minutos depois, catando algo na internet para me distrair um pouco dos meus problemas pessoais, me deparo com uma manchete:

" Riley tem um Novo Motivo para Causar: Pop Star vai Viver uma Vida Frugal com um Affair.

Após diminuir a agenda, aparecem indícios de uma união estável entre a cantora e um fã."

Aquilo só podia significar problema. Receosa, cliquei no link da notícia, para lê-la toda. Era mencionada ali a publicação em um blog de celebridades sobre uma localização pouco provável para uma celebridade de férias. A jornalista se vangloriava muito de ido até o local investigar o "babado" e em seguida vem a entrevista com Benjamin. Ele não chegou a me entregar, mas a jornalista analisou minuciosamente todas as afirmações e negações dele e chegou aquela afirmação acima. Ok, ela não passou nem perto da verdade das minhas intenções mas agora qualquer pessoa na internet tinha acesso a duas informações bastante importantes: onde eu morava e quem eu namorava.

Demorou bem pouco para meu suado pré-pago ficar abarrotado de mensagens. Por mais ansiosa que eu estivesse com tudo aquilo, não abri nenhuma, porque eu simplesmente não estaria preparada para responder nada. A susposta cantora muito bem resolvida e corajosa o bastante para abandonar tudo e adotar uma vida "frugal", tinha ido, sem falar nada com ninguém, chorar trancada no banheiro de casa, sentada no chão enquanto abraçava os joelhos. Eu não fazia a menor ideia nem de como era o mundo alguns meses atrás, e agora todos me cobravam uma resposta. Por algum motivo difícil de explicar, aquela situação me deixava muito ansiosa.

Não sei quanto tempo fiquei assim, escondida do mundo, mas em algum momento daquela tarde ouvi o barulho da campainha. O Benjamin atendeu, com a voz que era sempre alegre soando estranha , e logo reconheci pela conversa que se tratava de uma visita de Pietra.

A conversa não foi tranquila. Pelo que pude ouvir, os dois já tinham lido a notícia. Isso me deixou ainda mais preocupada, mas acho que meu corpo já estava cansado de chorar,porque consegui ouvir os dois discutindo bastante:

— Seu burro, retardado,idiota, imbecil! Por que foi responder logo aquela naja em forma de repórter?! Ela não poupa ninguém! Você pode até não ter dado nenhuma informação sólida, mas adivinha, só? A recalcada chutou e acertou!

— Eieiei, ela não acertou tudo. Eles não acham que a Rita é a Riley, acham?

— Não, mas se você der uma mancada dessas de novo, rapidinho descobrem! E agora vai ficar todo mundo em cima de você. Olha, eu não sei por quanto tempo vocês querem se esconder, mas vou avisar: não tá funcionando!

Daí para frente só ouvi o som do all star que benjamin estava usando, indo de um lado para outro do corredor. Pietra deu um suspiro:

— Antes de mais nada, eu sei que tão os dois exaltados, mas vamos falar com a Rita.. Riley... ah, vamos falar com o ser que você diz que namora!

Meu esconderijo foi rapidamente descoberto, afinal, o apartamento era pequeno, não havia muitos lugares para se refugiar do mundo além do canto na frente da privada. Foi uma sintonia de gentis socos na porta até eu me render e sair dali para falar com eles.

Fui surpreendida com um gostoso abraço coletivo vindo dos dois. Depois de alguns minutos, quando a gente se soltou, perguntei para Pietra o que ela estava achando de toda aquela maluquice:

— Eu não acho nada, o que REALMENTE sei é que você é gente boa e é minha amiga. Nós te aceitamos antes mesmo de você ter qualquer lembrança de quem era, lembra? Isso é o que menos importa agora...

— Eer.. - Benjamin pigarreou, levando uma cotovelada de Pietra bem no meio da barriga na mesma hora.

— Aaaii, sua grossa! Me deixa explicar! É que... é bem louco, sabem? Sei lá, eu sempre fui vidrado nas coisas que a Riley fazia, e agora, sem saber, eu posso... Ok, isso pode parecer interesseiro, mas o que quero dizer é... Ai, palavras, me ajudem!Talvez,quem sabe, pode ser que... - ele respirou fundo antes de completar, olhando nos meus olhos- eu já era apaixonado por você antes de te conhecer.

Eu e Pietra ficamos mudas e estarrecidas.

— É, eu sei que é uma parada um pouco estranha mas assim...

Antes que ele terminasse eu já tinha colado meus lábios nos dele. Pietra pigarreou:

— Ôu, casal meloso, eu ainda tô aqui, ok?! Aff, por isso que eu prefiro não ter namorado!

Nós dois rimos um pouco, apesar da encrenca em que nos metemos. Um pouco mais calmos, fomos nos sentar na sala, e Pietra perguntou se eu me importaria em tirar a peruca para ela ver meu cabelo natural. Não estava ainda muito segura, mas concordei, e deixei meus fios livres na frente dos dois. Minha amiga assumiu um ar mais sério ao observar minha cabeça descoberta e falou:

 — É, tá bem curtinho ainda, mas é o mesmo tom da Riley. Radiante-brilho-de-sol, eu tinha pesquisado uma vez quando estava pensando em pintar o meu.

E tirando uma com a minha cara, o destino resolveu aprontar comigo mais uma vez. Na hora mais errada possível ouvimos um toque na porta.

— Ué, será que é...

— O Kaio? - Benjamin completou - Impressionante, a gente não pode elogiar o porteiro que ele já faz cagada! Ahh, se for aquele filhote de boi, eu vou fazer questão de mostrar para ele onde meter os chifres! - esbravejou e foi determinado na direção da porta.

— Olha aqui seu lazarento de uma figa! - levantou a cabeça. - Opa, foi mal, achei que era... meu amigo. Quem é o senhor?

— Prazer, meu nome é Edgar. Você deve ser o Benjamin, certo?

Gelei na mesma hora com a menção do nome. Edgar era o nome do homem que eu via sempre antes de desmaiar. Se minhas lembranças estivessem certas, ele era o meu empresário. Por sorte, eu já tinha comentado qualquer coisa com o Ben, então ele começou a enrolar na porta, não deixando o outro passar:

 — Olá, seu Edgar! Sou eu mesmo, o melhor dublador de toda Niterói! Ouviu falar de mim no museu do Disco Voador, né? Ou foi nas barcas da Baía de Guanabara? Já sei, na Ponte! Ô, seu Edgar, o senhor vai me desculpar agora, mas estou um pouquinho ocupado não posso dar autógrafos, infelizmente. Tenha uma boa tarde!

E bateu a porta na cara dele.

Eu ia até começar a rir da conversa aleatória, mas Edgar bateu mais forte na porta e começou a falar alto, dando para ouvir claramente de dentro do apartamento:

— Olha, eu soube que uma antiga parceira minha tem vindo muito para essa casa, ou algo assim. Se você souber qualquer coisa, avisa ela. A mãe dela está muito preocupada.

Podia ser uma frase comum para qualquer um, mas para mim, foi aquilo que mudou tudo e vez. Eu tinha uma mãe viva,em algum lugar, querendo me encontrar. Não interessava fama,fortuna, vida estável ou mesmo um relacionamento amoroso. Desde que acordei do acidente, o que mais queria conhecer sobre minha vida original, seria alguém que se importasse.

Se essa mulher existia, eu precisava encontrá-la.