O Preço da Glória escrita por Carol Coelho
Notas iniciais do capítulo
:-) Espero que gostem, boa leitura!
Os pingos grossos começaram a ser sentidos enquanto os irmãos Monjardim retiravam os pratos do jantar com pressa. Uma barraca havia sido improvisada para Milton, que às vezes se recusava a ficar no quarto, e Aluísio já se cobria com lonas no caralho para evitar se molhar muito. As velas já haviam sido rizadas. Todos utilizavam capas de chuva sobre as roupas e a cada trovão explodindo no céu, Veronica se espremia contra os filhos em desespero. Desde a vez em que havia caído para fora do barco durante uma tempestade e quase morrido afogada, ela tinha total pavor de chuvas muito fortes. Na ocasião, havia tudo muita sorte e sido resgatada pelo capitão, porém isso não a impediu de ficar doente e de cama por alguns dias.
Cristiano e outros três marujos da sala de armas se mantinham praticamente imóveis ao lado da grande vela, segurando com força o estai para que, em alguma eventualidade, a vela e o mastro não desabassem sobre o navio. Os outros seguravam as escotas para que o vento não os tirasse muito do caminho planejado. Juliano guardava a catraca para que ela não se descontrolasse com os ventos também e mirava Leonardo tenso e o capitão refletia sua tensão de forma muito mais discreta e ele só conseguia dizer isso pois o conhecia muito bem.
Os ventos aumentavam cada vez mais, tornando o barco instável. Quando os pingos grossos começaram a aumentar cada vez mais, nenhum marujo deixou o convés. Leonardo fincou a alavanca no timão, Veronica colocou Milton para dentro das cabines mesmo contra a vontade do cão e todos miravam os arredores de forma tensa, torcendo para que nenhum acidente acabasse por afundar o Salamandra do Mar. O mar violento jogava o barco para lá e para cá sem dó, deixando todos levemente nauseados dentro do navio, porém ainda firmes em suas funções. Já haviam sobrevivido a tempestades antes. Veronica tomou o cuidado de se manter longe das bordas do barco, sempre agarrada a seus filhos que encaravam o céu mal humorado com receio, um receio espelhado nos olhos de todos os presentes.
O convés estava escorregadio e muito sujo, porém o barco se mantinha de pé e isso era o suficiente. Uma onda gigante fez o navio titubear com mais violência ainda, obrigando Veronica a tencionar o joelhos para manter-se de pé. O vento não freava e as velas sacudiam desgovernadas. Cristiano não deixou a estai por um segundo sequer. Leonardo mirou sua tripulação e agradeceu em pensamento o destemor de todos, com a cabeça latejando com o pensamento de que talvez aquela fosse uma viagem sem volta. Os olhos de Veronica o queimava como duas brasas através do convés. Na cabeça de Leonardo, a oração de seu pai ecoava.
Peço aos senhores das águas que me deixe navegar,
posso me arriscar e da água meu sustento tirar,
posso mergulhar e um belo tesouro encontrar
suplico por boas doses enquanto estou no pleno mar.
Que belas sereias eu possa encontrar
que o mar me faça enriquecer
pois eu quero no meu barco belas festas fazer
Não deixe o mar meus homens levar
Peço que a âncora só seja usada
quando essa terra por nós for conquistada.
O vento agora era insuportavelmente forte.
— Mais homens! — gritou Cristiano lutando para não ser levado pelo cabo da vela. — Mais homens, por favor!
Juliano foi o primeiro a se precipitar e segurar a estai ao lado de Cristiano, que lhe lançou um olhar por cima do ombro. Por ser menor, Gregório assumiu seu lugar guardando a catraca. Outros dois homens abandonaram seus postos nos outros cabos para ajudar a firmar a estai.
O silêncio esmagador era rompido apenas pelas ondas que agora faziam questão de quebrar no casco no navio, molhando a todos. Leonardo lutava para manter o timão firme e o navio avançando em meio à tempestade.
— Nós já enfrentamos tempestades piores, marujos! — gritou Aluisio do caralho com a voz embolada.
— É fácil quando não se está segurando uma vela de trocentos quilos, seu bêbado maldito! — respondeu João, fazendo muita força para manter a vela de pé.
Essa resposta foi o necessário para quebrar um pouco da tensão entre os marinheiros.
— É — concordou Teófilo, que segurava uma escota. — Cala a boca, Aluisio.
Veronica o reprovou com um olhar. Seus olhos encontraram os do capitão novamente e ele até conseguiu sorrir um pouco. Se eles sobrevivessem à tempestade, pensou, ele conversaria com Veronica sobre seu dilema.
O clima de relaxamento durou bem pouco. Não tem como manter o bom humor quando uma onda de quatro metros invade o navio com violência derrubando toda a tripulação e arrastando a todos pelo convés.
Gritos de desespero puderam ser ouvidos e quando o capitão voltou a si, seus olhos buscaram por Veronica. Ela estava com as duas mãos na cabeça encostada na buja, onde provavelmente havia batido com tudo.
— Mãe! — gritaram Gregório e Teófilo em uníssono.
— A estai! — berrou Cristiano. — Segurem a porra da estai!
— Devemos rizar as velas ainda mais! — gritou Mariano.
Juliano tentou se levantar, porém escorregou na madeira encharcada do convés e caiu novamente no chão no momento que outra onda rebentava dentro da embarcação, o arrastando para a borda. Na mesma hora, Cristiano largou a estai sem pensar duas vezes, que arrebentou e serpenteou desgovernada pelo navio, acertando muitos marujos no meio do caminho. Ele correu até Juliano e o puxou para cima, dando suporte para que se levantasse.
Na buja, Veronica era amparada pelos filhos e pelo capitão. Nas cabines, o cão Milton uivava de desespero pelos trovões violentos, a barulheira e a água que muito provavelmente havia se infiltrado pelas frestas das portas.
No centro do convés havia um caos generalizado para tentar conter a estai que balançava violentamente seguindo o vento e acertando qualquer um que se aproximasse demais.
— Cacete, Cristiano! — berrou Heitor após levar uma forte lapada do cabo no rosto.
— Desculpa, desculpa — devolvia Cristiano tentando se manter de pé entre as sacudidas fortes do barco. — Levanta, Juliano! — gritou o puxando para cima com violência após mais uma queda para que o rapaz se mantivesse de pé.
O rugido do motor funcionando na potência máxima para os afastar da tempestade o mais rápido possível podia ser ouvido na embarcação inteira entre os gritos por ajuda nesta ou naquela função.
— Outra onda! — gritou Aluisio.
Por sorte, essa não havia rebentado dentro do barco, somente no casco, o sacudindo ainda mais. Nesse momento, o rosto inchado do marujo no caralho pode ser visto antes de ele vomitar no convés tudo o que havia comido.
— Grande ajuda, maldito! — gritou Heitor que, com a ajuda de João, havia recuperado o cabo da vela, obtendo assim um controle maior do navio uma vez que a estai finalmente havia parado de girar enlouquecida.
A chuva continuou bruta conforme as horas da noite se tornavam horas da madrugada. A tempestade se transformou em garoa lá pelas três ou quatro horas da manhã e só aí todos tiveram um pouco de paz para se olharem nos olhos e perguntar se tudo estava bem.
Com a vela grande já estabilizada e o timão os guiando para Ákilah, Leonardo fez questão de perguntar individualmente para cada marujo se tudo estava bem.
— E então? Como está a cabeça? — quis saber de Veronica.
— Latejando um pouco na verdade.
Agora ela estava enrolada em uma blusa de frio espessa após um banho quente e sustentava uma compressa na cabeça para evitar a formação de um galo. Leonardo sacou de seu sobretudo uma garrafinha de aguardente que havia surrupiado de Aluisio e tomou um longo gole, a entregando para Veronica logo em seguida.
— Aluisio não precisa saber — o capitão piscou um olho em cumplicidade para a moça enquanto dividiam a garrafa mais que merecida após uma noite como aquela.
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Eeeita que tempestade foi essa meus amigossss. Espero que tenham gostado, vcejo vocês no próximo capitulo ♥