A Lenda de Cristal escrita por Tsu Keehl


Capítulo 40
Capítulo 39


Notas iniciais do capítulo

Olá caro leitor(a).
Antes de começar a ler, gostaria que lesse aqui.

Houve novamente demora em atualizar, mas em minha defesa, os últimos meses foram bem atarefados com relação a compromissos,

rolês, cosplays, trabalho e também tivemos copa do mundo (o hexa não veio mas seguimos...)
Esse capítulo é o último do ano e ele tá aqui, agradeçam a Cássia Freitas que me fez um pedido - quase chantagem - de bons

argumentos hahahah.
Para 2023 espero conseguir produzir mais na escrita e que eu consiga fazer isso dentro dos prazos que estabeleço (ganhei um

Planner, veremos se irá me ajudar).
Comentários sobre esse capítulo nas notas finais.
Chega de papo e boa leitura.



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~*~

  “Desculpa Blaziken. Não posso recuar você, os meus outros pokémon já estão fracos demais. E eu...aceitei um valor mais alto nessa batalha,preciso conseguir o dinheiro para pagar a fatura do cartão!”

Crystal não queria perder aquela batalha. Seu Blaziken sentia isso e queria cumprir as expectativas e confiança de sua treinadora sobre ele. Então, ao ouvir Crystal pedir que ele não desistisse e “fizesse como daquela vez”, ele sabia do que se tratava.
   Blaziken havia sido o pokémon que estava há mais tempo com Crystal. Ele fora o pokémon que recebera em Hoenn ao iniciar sua jornada, de modo que o vínculo entre ambos era bem forte.
   Assim, quando viu seu Blaziken finalizar a sequência de golpes com uma rasteira que fez o Emboar do oponente perder o equilíbrio e rolar pelo chão feito um barril, Crystal teve a certeza que aquela tarde de batalhas fora proveitosa e lucrativa.
  Aquela região de rotas e campos de batalha nos limites de Ecruteak se mostrou um ótimo lugar para enfrentar treinadores em jornada, podendo assim exercitar seus pokémon, colocar em ação algumas ideias de estratégias e claro, conseguir um dinheiro maior.
   Afinal, para treinadores em jornada, propor e participar de batalhas com seus pokémon apostando uma quantia em dinheiro era uma das formas mais práticas, comuns e tradicionais entre treinadores pokémon. Até por que, o auxílio do Bolsa Treinador não supria mensalmente as despesas mínimas de que um treinador comum precisava para cuidar de seus monstrinhos e se manter em jornada.
  Após a batalha ter terminado, o treinador recolheu seu pokémon e se aproximou de Crystal, acompanhado pela garota que o acompanhava e os três conversaram um pouco, trocando elogios a respeitos de seus pokémon e formas de batalha. Crystal gostava de conversar e se sentia á vontade quando outros treinadores se mostravam dispostos a isso, como era o caso. Assim, enquanto ela recebia a transferência do dinheiro do outro treinador direto em sua conta vinculada na pokégear,  ficaram conversando um pouco, com Blaziken aproveitando para descansar á sombra de uma pequena árvore.
   Crystal se despediu do jovem casal de treinadores antes de voltar a atenção para sua pokégear. Havia pensado em pegar o contato do rapaz no pokébook para que ocasionalmente trocassem ideias, pois ele parecia conhecer bastante sobre pokémon lutadores e competições das Ligas Pokémon. Mas desistiu de pedir isso por notar a forma meio possessiva que a amiga (que diz ser de jornada e de infância) do rapaz olhava e se intrometia na conversa. E Crystal não queria causar nenhum desconforto se de repente a garota achasse que ela estava á fim do rapaz.
   Enquanto olhava as notificações na pokégear, Crystal se lembrou da conversa que tivera com Alice poucas horas atrás. Ter se aberto e falado um pouco da frustração que sentia por nunca ter sido beijada a havia feito pensar sobre isso.
  Sentia-se frustrada ao ver que outras garotas da sua idade, um pouco mais velhas ou até mais jovens, já haviam ficado com uma ou mais pessoas. Que tinham namorados ou ficantes. Quando isso aconteceria para ela? Será que teria algum dia?
  Costumava imaginar como seria ser beijada pelo mestre Lance. Era impossível, mas seria muito bom.
   Mas como Lance era inalcançável, pensou em outras opções que seria interessante beijar. Havia o treinador de dreads que conhecera em Goldenrod e com quem conversava ocasionalmente (embora agora ele estivesse em Kanto e pretendia ficar por lá para participar de um campeonato na Zona do Safári), aquele colega de escola por quem tivera um crush por anos...Gary até seria alguém interessante , mas nunca teria qualquer coisa com ele. Primeiro porque ele era o ficante de Alice e sua amiga era mais importante. E segundo, porque Gary era um tipo de cara que poderia ter qualquer garota que quisesse.
   Tinha Kenta. Mas não...não conseguia se imaginar beijando o amigo.
  Se lembrou então do rapaz que havia conhecido na biblioteca e depois conversado (ou melhor, desabafado) na praça. Átila era o nome dele. É...beijar Átila seria interessante.
— Mas eu perdi a chance. E na verdade nem chance eu tive ou teria.
Wack?
— Oh, Blaziken! – ela exclamou, quando seu pokémon parou perto dela. – Não é nada, só estou pensando alto.
  Deixando os pensamentos de lado, Crystal verificou rapidamente sua conta bancária, guardou a pokégear na bolsinha que levava a tiracolo encarou seu pokémon.
— Você se saiu muito bem na batalha. porque aquele Emboar era forte. Você foi incrível, Blaziken!
   O pokémon ave se aprumou, feliz com o elogio.
— O que acha de uma Lemonade e um Candy? Acho que você super merece!
  O Blaziken deu pulinhos de aprovação, o que fez Crystal rir. Seu pokémon continuava  o mesmo de quando haviam iniciado jornada juntos. Quando ele era um pequeno Torchic, os pulinhos de animação que dava eram fofos e agora, tendo se tornado um grande Blaziken, os pulinhos de animação que ele dava eram engraçados. Gostava de vê-lo feliz assim, ainda que estivesse um pouco,as penas chamuscadas e um olho arroxeado devido a recente batalha.
— Mas antes vou te levar no Centro Pokémon para tratar...ah, não negue, Blaziken! Eu sei que você é forte... – ela falou, enquanto o pokémon posava imponente. = Mas tem que se cuidar! E aproveite enquanto o tratamento básico nos centros é de graça!
   Blaziken sabia que não tinha como fazer sua treinadora mudar de ideia, então aceitou. Mas fez questão de não entrar na pokébola, querendo acompanhá-la um pouco pelo caminho.
— Já é quase fim de tarde. Vamos encontrar a Alice e voltar para a cidade. – decidiu Crystal. – Aí passamos no Centro Pokémon e depois vamos comer!
   O pokémon concordou, contente. Ambos caminharam pela estradinha da rota, em direção ao local em que havia se separado de Alice. Como Morty não havia demonstrado muita disposição para batalhar, Crystal tinha achado melhor não propor uma batalha pokémon com ele. No fim das contas, concordou com Alice e Gary: ela havia ganhado a insígnia de forma justa. Assim, decidiu aproveitar a tarde para batalhar com alguns treinadores que haviam por ali, vencendo mais do que perdendo. Com o dinheiro ganho, poderia pagar a fatura do cartão e ainda sobrava um pouco para comprar alguns itens e mimos para seus pokémon.
   Treinadora e pokémon pararam subitamente quando viram algo rodopiar no ar, metros á frente. Quando a forma pairou por segundos como se flutuasse, puderam ver que se tratava de uma Blaziken. Suas penas reluziam em meio á faíscas de chamas na luz do sol. A pokémon rodopiou uma vez mais no ar, movimentando seus longos braços e pousou com graça e elegância no chão.
— Uau, que bonita!
  O comentário de Crystal fez seu Blaziken concordar, mantendo o olhar fixo na pokémon fêmea.
— Pô, mas aí já é apelação!
  A voz de Morty fez Crystal se aproximar do campo á frente, onde a Blaziken fêmea se postara ao lado de Alice enquanto Morty mantinha ambas mãos na cintura e seu Gengar parecia entediado.
— O que está havendo?
— O Morty não tá querendo ter umas dicas para ajudar a ensinar uma performance acrobática para o pokémon dele. – explicou Alice ante a pergunta de Crystal.
— Não foi bem isso que eu disse! Eu pedi apenas umas firulas rítmicas de pokémon, coisa simples e não uma demonstração de ginástica olímpica de Contests!
— Mas o que a minha Blazye fez não é uma ginástica olímpica! É um movimento até que padrão em Contests.
— Mas sua Blaziken é premiada nisso, que eu sei! E olha as pernas compridas, fortes e delineadas dela em comparação com as pernas curtas e roliças do meu Gengar! Lógico que a sua pokémon vai conseguir fazer um monte de pulos e rodopios no ar.
— Mas...o Gengar é do tipo Fantasma então o formato das pernas dele não afeta seus movimentos pois ele sendo um pokémon gasoso, mal tem peso. Ele pode flutuar e fazer diversos movimentos acrobáticos no ar sem se preocupar com a gravidade.
   O comentário lúcido de Crystal fez Morty coçar a cabeça meio constrangido enquanto Alice sorria satisfeita.
— Mas em todo caso... Eu só quero fazer umas acrobacias simples com o Gengar. A gente não vai participar de Contests nem nada.
— Então vão fazer o quê?
— Malabare no semáforo. – Morty respondeu com naturalidade.
— Tá de zoas, né?
— Tô não! – retrucou ele ao comentário incrédulo de Alice. – Eu conheci uns hippies mochileiros de Alola uma vez que tavam dando rolê pelo mundo fazendo vários bicos, vendendo uns artesanatos e ainda lucravam bem fazendo malabares com ajuda dos seus pokémon nos semáforos nas cidades. Dá pra tirar uma grana boa!
   Enquanto os treinadores conversavam entre si, os pokémon tinham outros focos. Gengar estava entediado demais e tratou de ficar fazendo embaixadinhas tediosas com a própria pokébola. Já Blazye aproveitou para ajeitar as próprias penas do corpo, a fim de manter sua boa aparência. E isso chamou a atenção do Blaziken, que se mantinha mais afastado. Ele sabia que estava meio estropiado e chamuscado, além das penas despenteadas devido a recente batalha. Sabia também que parecia meio maltrapilho e por isso mesmo tinha vergonha de se aproximar da Blaziken fêmea, que achara tão limpa e bonita. A admirava de longe e quando ela, sentindo-se observada, olhou em sua direção. O Blaziken se atrapalhou e tentou se comunicar de forma amigável, mas de sua garganta saiu um grasnado alto e desafinado. O que fez a Blaziken fêmea arregalar os olhos, intrigada e se aproximar um pouco mais dos três humanos.
— A sua Blaziken é linda! – Crystal falou. - Eu sei que cuidar das penas de pokémon aves de fogo é bem difícil, porque as penas acabam ficando bem chamuscadas e quebradiças. Eu tento cuidar das penas do meu Blaziken, mas é tão difícil! Como você faz para manter as penas da sua Blaziken tão bem cuidadas?
— Ah, eu sempre tratei a Blazye com uma linha de produtos próprios para penas de Torchics e suas evoluções. É um kit de shampoo e cremes da linha Fyre Bird Beauty. Se quiser, te empresto e você testa no seu pokémon!
— Pode ser! Mas eu não sabia que você já tinha competido em Contests!
— Anos atrás, mas foi por pouco tempo. – revelou Alice.  – Eu e a Blazye entramos nessa quando era meio que uma tendência na época que surgiu os desafios pelo PokéTok e eu comecei a participar por diversão. Mas eu desisti porque no PokéTok era preciso produzir conteúdo constantemente e isso toma muito tempo. E nos Contests, rola muita competitividade e fofoca pesada entre os treinadores que participam.
— Guerra de egos, como o Gary diz... – Morty olhou ao redor. – E aliás, pra onde ele foi?
   Á pergunta de Morty, uma explosão próxima surgiu. Crystal deu um gritinho e prontamente seu Blaziken agiu, colocando-se a frente das duas garotas e da Blaziken fêmea, disposto a protegê-las.
   Dois jovens treinadores saíram do mato próximo, correndo destrambelhadamente pela trilha, um deles ainda tendo um Minum nos ombros (que tentava desesperadamente se manter pendurado em seu dono).
— Corre que o punk tá puto, Wesley!
— E é por culpa tua!
  Eles passaram pelo trio, quase os empurrando no processo e em seguida Gary surgiu do mesmo mato, correndo pela trilha enfurecido, com o rosto coberto do que parecia ser  fuligem ou pólvora  e o moicano despenteado. Ele então parou ao o lado dos amigos, se abaixou para pegar uma pedra do tamanho de um morango, mirou e jogou-a com força na direção dos garotos, como se fosse um arremessador de beisebol.
   A pedra cortou o ar quase zunindo e atingiu a cabeça de um dos treinadores. Com o golpe, ele caiu feito um saco de batatas.
  Um silêncio chocado pairou entre os presentes. O treinador com o Minum olhou em choque para o amigo abatido e a pedra que o atingira.
— Gary do céu! – Alice exclamou, em choque.
— Esse arrombado mereceu!
— Mas você não precisava atacar ele assim!
— Precisava! Eles explodiram um Voltorb em cima de mim depois que perderam a batalha!
— Mas eles são claramente menores de idade, isso pode dar o maior B.O, cara...
  Mal Morty fez o comentário, uma lambreta dirigida por uma oficial Jenny apareceu lá no início da trilha. Gary foi incisivo.
— Vamos vazar.
— Mas...mas aquele treinador pode estar machucado e... – Crystal tentou argumentar.
— Não é nada, ele já tá até se mexendo! Se a gente ficar aqui, vamos ter que ir pra delegacia!
   Não foi preciso dizer mais nada. Gary pegou Alice pela mão, Morty ordenou que seu Gengar fizesse uma cortina de fumaça, os dois Blaziken correram e Crystal não teve outra opção que não segui-los, podendo ouvir o amigo do treinador abatido gritar, chamando a polícia.

~*~

A base de operações Rocket foi improvisada em um chalé localizado nos limites da cidade de Snowpoint. Ficava em uma das muitas trilhas que levavam a rotas pelas montanhas usadas por alpinistas em busca de desafios e treinadores em busca de pokémon selvagens.
   Pela janela, Mondo viu que a neve começava a cair e se enrolou mais no edredom, voltando a atenção para sua leitura no notebook. Já havia se passado mais de duas horas que Lugia e as irmãs haviam saído, assim como Dômino.
   Mondo se via em um impasse. O que deveria fazer? Fez um chá, mas isso não resolvia.
   A porta de um dos quartos foi aberta e Buson surgiu, passando por ele e atravessando a bancada que levava a cozinha. Ele se deparou com a mesa lotada de todo tipo de pães recheados, frios, sucos e guloseimas. Havia ainda xícaras e copos com bebidas pela metade, prato com restos de comida e pacotes abertos.
— Hey! – chamou, gesticulando para a mesa. – Quem deixou toda essa bagunça aqui?
— Foi...o senhor Lugia e suas irmãs.
— Ah, tinha que ser! – Buson resmungou, começando a mexer nas coisas da mesa. – Bando de folgados, acham que a gente é empregado deles deixando toda essa bagunça aqui! Nem pra tampar a manteiga ou lavar os próprios pratos!
— B-bom...o senhor Igni disse que devemos deixá-los confortáveis e...
— Conforto pra burguês arrogante, é? – Buson ralhou, enquanto cortava uma baguete.
— Eles não são arrogantes. – Mondo explicou, timidamente. - Eles são só...diferentes da gente. O senhor Lugia é mais sério e distante, mas Lady Artie e a senhorita Mol são gentis e divertidas.
— Quê?! - Buson indagou, continuando a colocar recheios no pão. – Tu é puxa saco da chefia que eu sei, mas não precisa forçar quando não tem nenhum deles presente.
   Mondo amuou.  Por mais que tivesse conhecimento de que a maioria dos Rockets o considerasse “puxa-saco”, não o era para obter vantagens. Só gostava realmente de fazer seu trabalho da melhor forma possível, de ser prestativo e útil.
   Buson saiu da cozinha e sentou-se na poltrona da sala, com um copo cheio de suco e um prato com um imenso lanche que ele mesmo montara, além dos salgadinhos em volta.
— Assim, a tal Artie a gente até entende de ser toda cheia de si, porque ela é uma grande gostosa. – Buson continuou. – Mas aquela Mol é uma pentelha militante chata, que acha que pode falar o que quiser e ainda andar com aquele Migthyena pulguento! – ele deu uma mordida no lanche, mastigou e continuou a falar. – E o tal Lugia...onde já se viu o cara ter nome de pokémon? É um metido! Mas o pessoal do Alto Conselho, que se acha superior pra carralho, praticamente lambe o chão que esse ele pisa e faz qualquer vontade dele!  Esse cara é um rei por acaso?
    Mondo quase engasgou com o chá que bebericava de sua caneca, mas disfarçou, tentando encerrar o assunto.
— Acho que tem coisas que a gente só fica sabendo e compreendendo com o tempo...
  Vendo que Buson estava concentrado em conseguir comer o lanche imenso que havia feito, Mondo voltou atenção para o livro que lia no notebook. Nos últimos meses, diante de toda a situação e relativa convivência com “aquelas pessoas”, começara a obter alguns livros de história que contivessem informações sobre o antigo Período Ilexiano. Mas conseguir informações precisas e completas sobre esse período histórico se mostrava bem difícil. Tudo o que havia conseguido até o momento se limitava a informações vagas e resumidas nos livros, mais focados em registrar artefatos históricos encontrados e traduções de lendas. Não queria perguntar diretamente a Moltres ou Articuno, pois achava que seria invasivo, mas os livros que comprara, quase nada tinham acerca do “rei Lugia de além-mar”.
— Eu posso não ser um agente genial como o Basho ou tão cheio de vantagens como a Dômino... – a voz de Buson tirou Mondo de sua leitura. – Mas eu não sou um Slowpoke! Se eu fosse, não seria um agente de elite como sou e ainda treinador de recrutas Rocket! – ele soltou um arroto curto. – Eu percebo há tempos que tá rolando coisa grande e importante e que o tal Lugia é que tá na frente disso junto com o Igni. O chefe Giovanni tem que voltar logo e colocar tudo em seu devido lugar, não acha?
— E-eu... – Mondo encolheu o corpo debaixo do edredom.- É, bem...
— Sabe de uma coisa? Cansei de esperar. – o loiro continuou. – Você vai me dar agora.
— O QUÊ?! Vo-você...e-eu...
  Mondo exclamou alto, sentindo todo seu corpo arrepiar, mil pensamentos atravessando sua mente e seu estômago parecendo um ninho de Buterfrees frenéticas.
— Respostas.
— Hãn?
— Eu quero respostas sobre todo esse negócio que tá rolando. – Buson arqueou uma sobrancelha. – Tu pensou que eu queria o quê?
— ...nada.
  Mondo desviou o olhar. Sentia-se envergonhado, aliviado e frustrado. Mas nem teve tempo de refletir sobre isso porque Buson já perguntava.
— Cadê a Dômino? Ela falou que ia conversar comigo pra contar sobre “certas coisas” que não disse o que é, mas até agora nada!
  Mondo olhou novamente para a janela. Nevava um pouco mais agora.
— Ela..saiu faz mais de uma hora e não avisou pra onde ia. Já está tarde, pode ser meio perigoso.
— Perigoso não pra ela, né? – Buson deu um riso pejorativo. – Coitado de quem se meter com ela isso sim! Aquela lá só tem cara de frágil porque na verdade é uma peste.
  Mondo forçou um risinho sem graça enquanto via Buson terminar de beber. De fato, Dômino sabia se virar sozinha. Mas o que preocupava Mondo era a forma como Dômino mudara nas últimas horas após ter conversado em particular com Lugia. O que haviam conversado? O que Lugia poderia ter falado com ela? Dômino não dissera nada depois da rápida conversa que havia tido com Lugia e sequer levou adiante o fato de querer conversar com ele, que era seu amigo, a respeito disso.
   Agora, além de Lugia e as irmãs terem saído sem darem qualquer satisfação, Dômino fizera o  mesmo. Teria ela ido segui-los para espionar?
   Mondo sentiu todo seu corpo gelar quando Buson subitamente sentou-se do seu lado, passando um dos braços no encosto do sofá para em seguida aproximar o rosto do seu. O homem o encarava sério e Mondo não pôde deixar de notar o quanto Buson lhe parecia atraente, com aquela pele morena bem bronzeada, corpo largo e braços musculosos. Ele era mesmo grande.
   Sem demonstrar que havia percebido o nervosismo e rubor do rapaz, Buson falou.
— Muito bem, agora que estamos a sós, tu vai me falar.Quem é realmente esse tal Lugia e o que ele, o Igni e o Alto Conselho realmente tão planejando? E não adianta dizer “eu não sei”. Porque tu pode não saber tudo, mas uma parte tu sabe.
  Mondo sentiu as Buterfrees em seus estômago ficarem histéricas. E isso aumentou quando Buson segurou seu queixo com firmeza.
— Agora fala.
  A mente e o corpo de Mondo estavam em uma ansiedade desenfreada e ele apenas murmurou, com a voz falha.
— O-olha...se...se eu contar...você não vai acreditar.

~*~

Tudo o que ele queria desde as últimas horas, era poder se livrar daquela companhia desagradável. Mas tinha de manter a postura calma, indiferente e profissional, agindo com educação e altivez mesmo desejando pegar a cabeça daquele homem e mergulhá-la em uma bacia de água até que se afogasse.
   Não. Isso não seria certo.
   Era melhor contratar alguém que fizesse isso enquanto ele apenas assistiria.
— É impressão minha ou está irritado, meu caro Lawrence?
— Não estou irritado com coisa alguma.
  Por mais que Lawrence fosse uma pessoa calma e centrada, que sabia manter a postura e a clareza mesmo em momentos de grande estresse, não conseguia refrear seus pensamentos de raiva homicida contra Eusine.
  Se não fosse aquele imbecil sem senso de moda que surgira do nada, ele poderia estar com Alice.
  A simples constatação disso, fez com que as lembranças recentes do que ele e sua tutelada estavam fazendo naquela sala da torre voltasse com força,causando uma sensação em seu baixo ventre. Se não tivessem sido interrompidos, teria transado com Alice, depois a levado para seu quarto do hotel e dali para casa.
  E o pior era que ele queria que isso tivesse acontecido.
  Mas agora estava ali, tendo que almoçar em uma companhia que desprezava. Aquele era um dos restaurantes mais tradicionais e elitizados de Ecruteak, o que o tornava famoso não apenas na cidade, mas em toda a região de Kanto e Johto. Chamava-se le Tangela dansant  e possuía toda uma estética que, embora diferenciasse do padrão asiático antigo predominante na cidade, mantinha uma atmosfera de requinte, com suas cadeiras de madeira maciça, assentos acolchoados, mesas impecáveis, lustres ornamentados  e janelas com grossas cortinas. Nas paredes, havia diversos quadros realistas, retratando cenários de belezas naturais e locais históricos da cidade, sempre com algum pokémon posicionado discretamente no ambiente.
   E mantendo a tradição como um restaurante que evocava a atmosfera de épocas passadas, o uso de equipamentos eletrônicos era evitado, de modo que o cardápio era belamente impresso e encadernado em um tipo de couro.
   As opções de pratos eram limitadas, mas possuíam requintes e peculiaridades que tornavam o  le Tangela dansant  único em todo o continente e tendo renome internacional. E isso significavam pratos inteiramente compostos por pokémon. Desde saladas, passando por carnes, acompanhamentos, sobremesas e até mesmo temperos.
— Sempre fiquei intrigado com uma coisa.
  Lawrence conteve um esgar de desagrado. Se Eusine viesse com insinuações, iria responder de forma não muito educada.
— Aqui diz que eles possuem o filé mignon de Gogoat recheado e temperado com especiarias. Mas o Gogoat é um pokémon Planta, apesar de ser uma espécie de carneiro. Então...seria o Gogoat uma prato de carne ou vegetariano?
— Gogoats são pokémon e, independente do Tipo, continuam sendo animais.
— Mas o que realmente definiria se determinado pokémon é animal, planta, fungo ou entidade? – Eusine indagou. – Todos os pokémon Planta realizam fotossíntese, como os vegetais.
— Em minha opinião com base em estudos, diferente dos vegetais, os pokémon Planta necessitam se alimentar de vegetais para obter nutrientes. – Lawrence começou a explicar. - Há até mesmo pokémon Planta que se alimentam da carne de outros pokémon, como  Carnivines, por exemplo. Logo, não seria correto assumir que todos os pokémon Planta são, essencialmente, vegetais em suas composições.
— Mas há pokémon Planta que alimentam-se única e exclusivamente de vegetais, então seriam eles mesmos vegetais. Sunfloras por exemplo tiram praticamente todos seus nutrientes através de fotossíntese.
— A composição corporal desses pokémon não é como a de vegetais. Por mais que pareçam, eles ainda possuem órgãos como animais. Se fossem plantas, não os teriam.
— Então não acredita em carne vegana pokémon?
— Óbvio que não.
— Acaso tem conhecimento do vídeo que está rolando nas redes sociais, sobre o preparo visceral de Chikorita? Se assistir, garanto que...
— Eusine, preciso lhe informar que não tenho o dia todo. Voltarei para Goldenrod ainda hoje, estou extremamente ocupado.  Então, acho melhor almoçarmos logo.
  Dito isso, Lawrence fez um sinal discreto para o garçom e, ignorando o olhar fuzilante de Eusine, solicitou seu pedido.
— Eu gostaria de Farfetch’d ao molho velouté...carne bem passada. E uma salada Simisage. Um vinho Chianti para acompanhar.
  O garçom anotou o pedido e se virou para Eusine. Este olhou novamente o cardápio, decidido a escolher um prato mais requintado do que o que Lawrence pedira.
— Hum...me sirva esse Lickitung Langue ao molho de especiarias Scovillain. Vinho Bourbon.
  Lawrence arqueou uma sobrancelha ao ouvi-lo fazer o pedido, mas não disse nada. Eusine entregou o cardápio ao garçom, que se retirou.
  Os dois homens ficaram um tempo em silêncio, e Lawrence pegou o próprio celular, verificando notícias e notificações a fim de evitar uma conversa.
  Eusine conteve um sorriso de satisfação. Por mais que disfarçasse (e ele sabia disfarçar muito bem), sabia que Lawrence estava irritado com toda a situação desde que ele, Eusine, havia aparecido. Ele não sabia o que havia frustrado do homem á sua frente, mas tinha fortes especulações.
   Ainda que a chegada estonteante (como a si próprio se referia) de Eusine não houvesse sido planejada, sabia que interrompera alguma coisa. Mesmo que Lawrence e sua tutelada parecessem estar apenas estudando um artefato antigo, Eusine percebeu que não era apenas isso.
  Todo boato tem um fundo de verdade. E muito se cochichava no círculo da alta sociedade acerca do nível e tipo de relacionamento aqueles dois realmente tinham. 
  Assim, poder ver sendo o responsável por irritar e prejudicar os esquemas da vida perfeita de Lawrence, por menores que fossem, era algo que Eusine apreciava.
   Eusine não era o tipo de pessoa que se intrometia na vida alheia, tinha orgulho do empresário, colecionador e estudioso pokémon que era. Mas seu reconhecimento e conquistas eram sempre ofuscados pela existência dele.
   Lawrence Carrol III era tudo o que se poderia esperar de alguém da sua estirpe. Ele tinha tudo. Riqueza, boa aparência, inteligência, vários talentos e habilidades, respeito, fama, influência, bons contatos, coleções admiráveis, herdeiro de um império de renome e poder. Muito poder.
  E como se já não bastasse tudo isso, Lawrence ainda tinha uma garota linda e agradável ao seu lado.
  Eusine detestava injustiças. E a vida de Lawrence era uma injustiça para ele. Porque Lawrence tinha quase tudo. Era para Lawrence que todos sempre se voltavam. E Eusine era sempre menos relevante, com coleções e padrões menos interessantes. Aquilo o incomodava em um grau cada vez mais crescente.
   Quanto a Lawrence, ele sabia que Eusine o detestava e invejava. Talvez não soubesse o nível disso, mas sabia que havia. Eusine o via como rival, ainda que ele não o visse da mesma forma. Lawrence sabia que era superior. Então, procurava manter o mínimo de contato possível com Eusine, mesmo ambos sendo colecionadores renomados de pokémon e antiguidades e também membros da Ordem (escolha que Lawrence ocasionalmente ponderava) acabava tendo que se deparar com ele mais vezes do que gostaria. E ter que tolerá-lo em ocasiões que evitaria se fosse possível. Mas havia outras, como aquela, que não poderia evitar sem que acabasse despertando suspeitas. Afinal, conhecia Eusine e sua predileção por alimentar certos boatos.
— Fazia tempo que eu não via a sua protegida... – Eusine comentou de forma casual. – Acho que a última vez foi naquela confraternização em Sinnoh. Vocês não tinham brigado por algum motivo e ela decidiu ir embora da sua casa?
— Nunca brigamos. Alice só quis viajar um pouco.
  Eusine não retrucou. Os boatos teorizavam outros motivos. Ao perceber que Lawrence continuava a verificar notificações no delular, Eusine decidiu alfinetar.
— Ela continua muito bonita, não acha?
— Alice é uma bela moça.
— Mas acho um pouco arriscado que uma jovem bonita e valiosa como ela esteja andando por aí sozinha.
— Alice não está viajando sozinha. – Lawrence murmurou, sem tirar os olhos do celular. - Além do mais, ela possui pokémon extremamente capazes de ferir pessoas.
— A quantidade de pretendentes que ela tem deve ser notável! - Eusine continuou, ignorando o desagrado do empresário. - Me pergunto como lida com isso. Uma garota linda e curvilínea como ela... – ele balançou a cabeça. – Uma tentação e tanto!
  Lawrence o encarou com uma expressão lívida de raiva tanto pelas palavras quanto pelo tom que o outro usara. Falou, ríspido.
— Como ousa se referir dessa forma á Alice?!Ponha-se no seu lugar e na sua idade, seu subversivo!
— Acho que isso serve para você também, meu caro. - Eusine retrucou, ofendido. – É muita patifaria da sua parte dizer isso quando você é o subversivo que nutre e faz coisas nada púdicas com... 
— Não ouse tentar me provocar com indiretas oriundas de fofocas mentirosas que eu sei que você e vários outros adoram espalhar e aumentar.
— Oras, por qual motivo se incomoda tanto com o fato de Alice poder se interessar por alguém? Ela é maior de idade e já não é mais, pela lei, sua proprie...digo, protegida.
  Lawrence  desejou realmente contratar alguém para pegar Eusine e mergulhar sua cabeça em uma vasilha até que se afogasse. Mantendo o semblante mais calmo que conseguia, falou, casualmente, como se falasse sobre frivolidades.
 - Você não tem e nem terá intimidade alguma com Alice. E nem ouse tentar qualquer coisa vinda de sua mente pútrida com ela motivado por seu ego distorcido. Ou eu lhe juro que não ficará impune.
— Está me ameaçando?
— Sim.
  A conversa foi interrompida com a chegada dos pedidos solicitados. Ambos permitiram que o garçom lhes servisse os respectivos vinhos e, após ele se retirar, Lawrence e Eusine observaram cada qual o seu próprio prato e começaram a comer, sem sequer brindarem ou desejarem “bom apetite” ao outro.

~*~


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Notas finais do capítulo

Terminando o capítulo aqui...

O "arco de Ecruteak" se estendeu mais do que pensei, mas ele já está no final. Sinto que não explorei tudo o que pretendia nele, mas consegui ligar alguns personagens, então acho que tudo bem.
Inicialmente, haveria uma cena de batalha entre Blaziken e Emboar, mas descartei isso quando percebi que seria algo irrelevante para a história e eu não queria ficar "enchendo linguiça" sendo que há tanta coisa relevante para se colocar na trama. Embora essa história seja de pokémon, ela não é focada em batalhas do tipo, de modo que decidi inserir cenas de batalha nela somente quando for realmente necessário. Como eu acredito que a maior parte dos leitores prefere as cenas de interação de personagens e as tramas nas narrativas em vez de batalhas aleatórias, penso que é uma decisão boa.
Estou feliz de ter conseguido colocar novamente 3 cenas no mesmo capítulo, fazia tempo que isso não acontecia! A cena de Mondo e Buson foi para ser um pequeno fio de conexão para o capítulo seguinte e eu também quis colocar um pouco dos dois que fazia tempinho que não apareciam, XD
Dito isso, vamos sobre a cena de Lawrence e Eusine.
Eu gostei de desenvolvê-la, embora essa tenha sido a parte que mais me deu trabalho. Mas com base em certas experiências, escrever sobre Lawrence sendo alvo da inveja de alguém disposto a prejudicar de forma obsessiva,m é algo que considero um assunto extremamente importante de se pincelar. E claro, aproveitando o fato da cena ocorrer em um restaurante, quis mostrar um pouco da gastronom,ia do mundo pokémon. Se tiverem sugestões sobre comidas do tipo, digam aí! (e sobre o vídeo da Chikorita...entendedores que o viram na web, entenderão hahahah).

Enfim, acho que é isso. Desejo boas festas a todos que seguem acompanhando essa história. Espero que em 2023 eu produza mais e alcance mais leitores/leitoras. Oremos!
Nos vemos no próximo capítulo.



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