A Lenda de Cristal escrita por Tsu Keehl


Capítulo 20
Capítulo 19


Notas iniciais do capítulo

Olá, caro leitor (a).
Antes de começar a ler, gostaria que lesse aqui.
Como pode ver, acabei ultrapassando o prazo de atualização mensal da fanfic e peço desculpas por isso. Eu pensei que conseguiria atualizar bem antes disso, mas ocorreu alguns imprevistos relacionados a escrita literária: não com relação ao temido "bloqueio" mas sim a agregação de outras histórias.
Comecei a trabalhar no meu original e estou empolgada com isso! Estou aos poucos escrevendo as partes (de forma não-linear o que acho que pode me ajudar anão ficar em momentos de bloqueio criativo), fazendo as pesquisas necessárias e anotando todas as ideias que vão vindo.Achei que devo me focar nisso porque consegui a proeza de juntar 3 ideias de originais que eu tinha em uma só, conseguindo unir personagens e amarrar enredos. XD
Entretanto, como nem tudo são flores, ainda tive que atualizar minha fanfic do Cruello e escrever ela está sendo bem extenuante para minha criatividade. Não vejo a hora de conseguir terminá-la!
Por fim, como se não bastasse, minha mente me pregou uma peça e começou a desenvolver (sem a minha permissão, rs) uma nova história original e eu to desesperada porque a ideia é phoda, mas tenho de fazer pesquisas e arranjar tempo não sei aonde para poder colocar em prática.

Mas eu sei que vocês não estão aqui para lerem essas coisas e sim para ler a fic.
Bom, esse capítulo eu escrevi até que rápido, em uma semana praticamente. Cobnfesso que inicialmente tinha em mente uma parte mais focada na cena de Lugia e Cia mas notei que era preciso focar em Crystal e Cia a fim de poder fechar o pequeno arco em aberto no capítulo anterior. Então, esse capítulo está bem mais leve, mas com direito a um pequeno flash-back.
E desde ja agradeço imensamente a todos que estão acompanhando a fic!

Boa leitura!



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~*~

Fazia frio naquela montanha. Muito frio. Era uma das diversas montanhas presentes nas ilhas do arquipélago de Seafon Inslands, na região de Kanto.
  O helicóptero Rocket pousou em uma área acessível quando o sol estava começando a se pôr. O vento era cortante e Basho colocou o capuz do casaco de náilon que usava. Se agasalhara o melhor que podia, pois sabia que iria esfriar ainda mais. Só esperava que suas roupas fossem quentes o suficiente.

— Mas que carralho de frio do cacete é esse?! Puta merda!
  Moltres praguejava, empacotada em um grande casaco vermelho de náilon que a deixava com um aspecto rechonchudo. Ela usava grossas botas de neve, luvas de lã, touca e capuz, com o zíper fechado até a altura de seus lábios.
— Dentro da caverna tende a ser mais frio.
— Ah, que droga!
— Você tem ligação com o fogo. Seu corpo deve produzir calor de forma que nenhum frio deveria te incomodar.
— Não é assim que as coisas funcionam! – resmungou Moltres diante do comentário de Basho. – Eu nasci humana, não pokémon. Maldições não são coisas naturais. São maldições.

  Basho a observou por alguns segundos e voltou a atenção para o agente Rocket que se aproximava.
— Nos espere aqui. – ordenou ao recruta.- Fique com o helicóptero á postos e o comunicador ligado.
— Sim, senhor.
   O agente bateu continência, parecendo satisfeito por sair do vento gelado e voltar para dentro do helicóptero. Basho então colocou o comunicador no ouvido, ajustando a frequência e verificou o aparelho eletrônico que tinha em mãos, selecionando determinados itens na tela.
— Shiranui. – falou, através do comunicador. - Já estamos no local...sim. Pode destruir o cristal. Fico no aguardo.
  Basho voltou  a verificar o aparelho em suas mãos, digitando e analisando os dados que surgiam na ela.

— O que tá mostrando aí?
  Moltres se aproximou, olhando o aparelho, interessada. Basho já havia notado o quanto a garota era curiosa com tudo que fosse minimamente “moderno”. E levando em conta que ela voltara a ser humana após séculos, praticamente tudo lhe era novidade. Durante a viagem até ali, precisou tolerar as muitas perguntas dela acerca de tudo que via e procurava responder da forma mais polida e rápida que conseguia. Mas já estava começando a fixar exaustivo.
— Ei, ei! – ela cutucou seu braço. - O que é esse negócio? É um tipo daqueles computadores pequenos que vocês chamam de celular? O que esse daí faz? Como ele funciona?

   Mesmo sem vontade, Basho tratou de fazer o que ela pedira. Já que havia obtido a chance de ocupar uma boa posição e adquirir a confiança de Lugia, deveria jogar sabiamente a todo momento. “Aproveite a possibilidade que pode se abrir diante de si”, fora o que Igni lhe dissera. E mesmo antes de ele dizer, Basho já tinha intenção de fazer isso.
  De modo que tratou de tentar explicar  para a garota como funcionava o equipamento, mas  fazendo questão de utilizar termos técnicos para ver se ela se desinteressava logo.
  Moltres não compreendia metade do que ele dizia e estava começando a se irritar. Mas antes que arrancasse o aparelho das mãos dele e tratasse dela mesma mexer a fim de descobrir por conta própria como aquilo funcionava, Lugia surgiu, vindo detrás da parte da montanha em que estavam.
   Basho se perguntava como Lugia conseguia usar apenas um sobretudo e um cachecol para aguentar aquele frio cortante. Se fosse alguma consequência da maldição, sua irmã não estaria passando frio. Talvez o que Igni dissera fora verdade, de Lugia possuir uma capacidade magistral em se focar nos seus objetivos que era difícil que qualquer coisa o abalasse.

— Há uma entrada para a caverna perto daqui. Grande o suficiente para um Pokémon como Articuno entrar.
— Então vamos logo lá pra dentro antes que eu congele aqui!
— Dentro da caverna tender ser mais frio do que aqui fora. E mais escuro.
   Moltres soltou um gemido de frustração diante da revelação de Basho.
— Já está tudo pronto. – continuou Basho virando-se para Lugia. – Vamos entrar.

~*~

Mesmo protestando e dizendo que se sentia completamente bem, Crystal foi convencida (ou seria intimada?) por Alice a ir até a unidade de Pronto Atendimento no Posto de Saúde de Azalea.
  Por sorte, não precisaram esperar muito tempo para serem atendidos pelo clínico geral de plantão, que examinou Crystal e pediu um raio X de sua cabeça, verificando que não havia qualquer coisa que pudesse ser preocupante. Mas o que mais surpreendeu foi no momento em que o emplastro no tornozelo de Crystal foi tirado: não havia qualquer resquício de inchaço ou dor e a garota já conseguia caminhar normalmente.  Era como se nunca houvesse se machucado.
  Interessado, o médico pediu que o emplastro ficasse a seus cuidados a fim de que pudesse estudar os componentes das plantas utilizadas.

— Eu disse que estava tudo bem, nem precisaríamos ter vindo! – falou Crystal sentada em uma das cadeiras da recepção. – Já podemos ir embora!
— Vamos só esperar para entregarem o remédio que o médico receitou.
— Mas eu estou bem! Se eu estiver com dor, passo na farmácia e compro uma Dipirona!
— A Alice tem razão, não custa nada esperar, Crystal. – falou Kenta. - E foi bom termos vindo porque aí temos certeza que está tudo bem com você!
  A treinadora bufou.
— Estamos perdendo tempo demais aqui! Podemos nem conseguir vaga no Centro Pokémon!
  Nisso, sentiu algo cutucar sua perna e ao olhar, se deparou com o Bulbasaur que a encarava de forma alegre.
— E esse Pokémon? Ele está te seguindo desde que saímos de Ilex. Você vai pegar ele pra você ou não?
  Diante da pergunta do amigo, Crystal mordeu o lábio. Querer, ela queria muito. Mas seu dinheiro era pouco e ter mais um Pokémon para cuidar e treinar talvez fosse difícil.
— Se você não quiser ele, eu quero!
— NÃO! Eu vou ficar com ele!

  Dissera de súbito e sua voz ecoou no local. Alguns pacientes olharam em sua direção e, envergonhada, Crystal baixou o rosto.
   O Pokémon parecia ansioso, empurrando sua perna com a patinha, como se a incentivasse.
— Olha, eu não falo “pokemonês” ... – brincou Alice. – Mas está óbvio que esse Bulbasaur quer ser seu.
— Senhorita Crystal Marine? – chamou a enfermeira atrás do balcão da recepção.
— Sou eu!
— Aqui está o remédio receitado pelo médico. – ela entregou um pacotinho. – Aqui está a receita. Em caso de sentir dor, deve tomar de duas a três vezes ao dia. Boa noite!
   Crystal agradeceu e se aproximou dos amigos.
— Que remédio ele...Dipirona?! – Kenta piscou, intrigado.
— Eu falei que não havia motivo de preocupação! E os postos de saúde só dão isso mesmo se você tiver com dor de cabeça ou cólica renal!
— Eu estou morrendo de fome... – resmungou Alice. - Vamos comer alguma coisa!
— Mas se formos comer agora, vamos chegar muito tarde no Centro Pokémon e  as chances de não houver dormitórios disponíveis é grande!
— Já sei! – exclamou Kenta. – Vocês podem ir indo no Centro Pokémon e garantir dormitório para nós três. Enquanto isso eu vou no supermercado e compro algumas coisas para comermos lá mesmo!
— ..é uma boa ideia. Eu topo! – Alice abriu a carteira. Acha que cinquenta dá?
— Cinquenta? É muito! Cada uma de vocês dá dez que tá beleza!
— ....acha que é o suficiente?
— Crystal, você me conhece. Eu sou um mestre em conseguir comprar muita coisa gastando pouco porque vivo sempre quase sem dinheiro! Só me dizerem o que querem comer que eu vejo o que consigo!
— Deixamos a escolha por sua conta.

  Tendo decidido, Crystal e Alice deram o dinheiro a Kenta, que entregou a amiga seu Cartão de Treinador, para que pudessem fazer juntos a reserva do dormitório.
   Assim que o rapaz se afastou, Alice comentou enquanto Crystal colocava o remédio na mochila e tirava uma pokébola de dentro da mesma.
— Crystal, posso te pedir um favorzinho?
— Claro!
— Bom, sei que o Kenta é seu amigo mas... – Alice mexia a ponta dos dedos uma com a outra.- Poderia não contar a ele sobre quem eu sou? Tipo, o fato do meu tutor ser um dos homens mais poderosos do mundo e coisa e tal...
— Tudo bem. Eu estava mesmo pensando que era melhor não falar nada. O seu tutor meio que deixou bem claro que não era bom que você se expusesse demais.
— Obrigada! E bom, então vamos lá pro Centro Pokémon! Vai ser a primeira vez que eu durmo em um local desses, quero saber como é porque até hoje só vi relatos!
— Sim. Eu só...preciso fazer uma coisinha antes. Não é Bulbasaur?

~*~

Os dormitórios dos Centros Pokémon eram menores do que Alice imaginava. Para os padrões nos quais estava acostumada, era praticamente um cubículo. A mobília se resumia a duas beliches velhas e gastas de uso e um criado-mudo.
     A existência de dormitórios para o pernoite de treinadores era uma obrigatoriedade de todos os Centros Pokémon. De acordo com as normas do Comitê da Liga Pokémon, os Centros Pokémon devem dispor de uma quantidade de dormitórios compatível com o tamanho do Centro e poderiam ser requisitados e utilizados somente por treinadores credenciados.
    O uso de tais dormitórios era gratuito e por isso acabavam se tornando muito utilizados por treinadores e em alguns Centros Pokémon havia até mesmo filas e listas de espera dependendo do local em que o centro se localizava.

   O tempo de permanência possuía um limite de horas e haviam regras que deveriam ser cumpridas e que constavam em tópicos de uma placa afixada na parede da entrada ao corredor que levava aos dormitórios. O não cumprimento de tais regras acarretava em advertências.
   O banheiro era comunitário e para o banho, o tempo limite de uso era de sete minutos. Extrapolando esse tempo, o chuveiro automaticamente desligava o modo quente, fazendo a pessoa receber um jato de água gelada.
   Alice aprendera isso na pele e fez um esforço para não reclamar sobre isso com a enfermeira Joy por respeito a Crystal. Acabou então transformando a experiência em motivo de riso junto da amiga, com Crystal contando que passara diversas vezes pela mesma situação.

— Que sorte que conseguimos ficar aqui e já era o último quarto disponível! – falou Crystal. – Se não, teríamos que gastar com hotel.
— Sabe que não teria problema para eu pagar uma hospedagem para nós.
— É melhor ficarmos aqui e o Kenta também não iria aceitar.
— Ele acha que uma garota não pode pagar as coisas?
— Não é isso! É que o Kenta é uma pessoa muito humilde e...não se sente bem fazendo uso de cosias que ele não tem condições, mesmo que ofereçam pagar pra ele...só isso.E já vamos partir amanhã cedo, então é só pra gente dormir mesmo.

  Com isso, Alice optou por não insistir e apenas observou Crystal forrar a sua cama do beliche com um lençol e uma fronha que havia trago na mochila. Concluiu que deveria comprar um lençol para fazer o mesmo da próxima vez, até porque os dormitórios de Centros Pokémon não eram exatamente um exemplo de limpeza.
   Lawrence certamente ficaria indignado se soubesse que ela estava passando a noite em um lugar daqueles. Quase podia ver a forma como os olhos dele se estreitavam sutilmente e o maxilar parecia endurecer discretamente quando constatava algo que não concordava.

“ Deveria sempre se deitar em grandes e macias camas, envolta em sedas.”

   Conteve um suspiro diante da lembrança daquelas palavras. Para Lawrence, se havia condições de viver no luxo, deveria usufruir.  Estaria ele ainda irritado com o que havia acontecido aquela noite no hotel?
— Ei, Aron, não pode roer o criado-mudo!
  Alice saiu de seus pensamentos e viu a amiga pegar o pequeno Pokémon no colo, colocando-o no meio do dormitório. Ele tentou voltar para roer o móvel, mas Crystal o segurou.
—  Mas que coisa, você está muito atiçado! Tó, brinca com a bolinha!
  O pokémon mordeu a bola e então a empurrou para longe, querendo voltar a roer o móvel.
— Eu acho que seu Aron tá precisando de uma companhia. Solta o novato!
  Crystal piscou sem entender nos primeiros segundos mas logo fez um “oh, tem razão” e foi até a mochila, tirando da pokébola, o Bulbasaur.
  O Pokémon olhou ao redor, curioso, mas ao ver Crystal, saltitou feliz até ela, mas parou quando se deparou com o Aron que prontamente estreitou os olhos e ficou na defensiva.
— ..isso vai ser interessante... – murmurou Alice.
— Aron, esse é o Bulbasaur. – Crystal se ajoelhou entre os Pokémon. – Ele é nosso novo parceiro e ficará em jornada conosco. Bulbasaur, depois te apresento aos outros!

   Ambos Pokémon se observaram por alguns segundos e foi o Bulbasaur quem fez a primeira aproximação. O Aron recuou alguns passos mas, quando o Bulbasaur se comunicou, batendo as patinhas no chão, o Aron retribuiu da mesma forma. E não demorou muito para que ambos Pokémon se aproximassem e começassem a brincar, correndo e rolando pelo chão.
— Fico me perguntando o que os Pokémon conversam....
   As duas garotas sentaram-se na cama de um dos beliches, observando os Pokémon. Crystal aproveitou para gravar um pequeno vídeo deles com sua pokégear, para postar em seu perfil no pokébook.
  Batidas na porta.
— Pode entrar!

    Kenta surgiu, segurando a mochila nas mãos e fechando a porta atrás de si. No seu ombro estava um Pidove de olhar estático e curioso. Assim que entrou no local, o Pokémon voou até o alto de um dos beliches, se aprumando na ponta dele.
— Ufa, consegui! Parece que a enfermeira Joy não suspeitou de nada!
  Ele ria, empolgado. Uma das principais regras para se utilizar os dormitórios do Centro Pokémon era o fato de ser proibido consumir alimentos dentro do quarto.
— Se a enfermeira Joy descobrir, estamos ferrados!
— Relaxa Crystal, ela não vai descobrir, parece que está ocupada demais de conversinha com um treinador lá na recepção.
— O que você trouxe de bom aí? – perguntou Alice.
— Eu fiz o melhor que pude para escolher as cosias no mercadinho com o dinheiro que dividimos! E acho que temos o suficiente pra fazer um lanchinho!

  O garoto sentou-se no chão, começando a tirar diversos itens de dentro da mochila. Havia latinhas de refrigerante e suco, pacotes de salgadinhos, barras de chocolate, biscoitos, uma cumbuca com morangos, pacote de pão de forma e duas bandejas; uma com mussarela e outra com presunto.
  Alice se sentara com as costas apoiadas na parede abaixo da janela, enquanto Crystal e Kenta terminavam de arrumar todas as guloseimas sobre o lençol da cama que Crystal tirara para colocar o seu próprio. Aron e Bulbasaur haviam voltado para suas pokébolas, a fim de não tentarem devorar a comida.
 
  Então é assim que os treinadores Pokémon comuns vivem em suas jornadas?
  Para uma garota como Alice, toda aquela simplicidade era novidade. O que sabia sobre havia visto em filmes ou lido comentários de treinadores na internet.
  Se Lawrence soubesse que sua protegida, que ele fazia questão de cuidar com tanto esmero, estava passando a noite em um dormitório de Centro Pokémon de higienização duvidosa, tomando banho em um chuveiro com água quente limitada, dormindo em uma beliche e tendo de utilizar banheiro comunitário, ficaria horrorizado e daria um jeito de levá-la de volta para casa nem que fosse carregada.
    Se postasse uma foto no seu Pokébook desse momento junto com os novos amigos fazendo um pic-nic no quartinho do centro Pokémon, quantos minutos levaria para Lawrence já estar lhe ligando?
  
— Aqui o pão!
   Alice saiu de seus pensamentos quando Kenta lhe estendeu um pacote.
— ...o-obrigada.
— E então. – o garoto continuou. - mastigando um pedaço do próprio lanche. – Você tá acompanhando a Crystal, mas tá em jornada Pokémon também? Vai competir na Liga daqui?
— Não, não! Eu estou digamos...em uma jornada para conhecer lugares e auto conhecimento. Embora eu seja uma treinadora, nunca tive interesse e pique para querer ser uma treinadora do tipo que luta pelas insígnias e participa de Ligas.
— Por quê? – o garoto bebeu um gole do refrigerante. – Tentar ser um grande treinador Pokémon é muito legal! Viajar pelo mundo, participar de Ligas, ser reconhecido por outros grandes treinadores, ser alvo de admiração de treinadores mais jovens, descobrir Pokémon raros e quem sabe até lendários...
  O garoto falava com tanta empolgação, que Crystal inclinou-se para Alice:
— O Kenta pensa em  ser um  membro da Elite 4.
—  Eu não apenas penso....eu vou ser um membro da Elite 4 um dia! Mais do que isso: serei um Líder da Elite 4 após vencer a Liga Mundial Pokémon! Esperem e verão! Daqui uns anos eu serei o maior treinador Pokémon e minha jornada será uma legítima lição de vida!

  As duas garotas sorriram com a empolgação do rapaz, que havia se levantado, altivo enquanto seu Pidove saía do beliche e pousara em seu ombro, defecando sobre ele.
— AAAAAAH! Cacete, Pidove! De novo isso?! Já falei que não pode, xô!
   Arrulhando, o Pokémon voou novamente até a ponta do beliche enquanto Kenta olhava enojado para a blusa suja.
— Credo, Kenta! Tira logo isso, estamos comendo!
— Mas que droga, toda vez esse pássaro faz isso! – ele tirou a blusa e a jogou em um canto. – Eu já falei pra ele, ensinei que não pode, mas ele continua fazendo! Já até perdi as contas de quantas vezes! Acho que faz isso para me provocar!
  Ele olhou de forma penetrante para o Pokémon pombo que o encarou de volta.

— Acho que antes dele se tornar líder da Elite 4, precisa controlar o ímpeto do Pidove em cagar nele. – sussurrou Alice no ouvido de Crystal.
  Ambas deram um risinho mas Kenta não notou, voltando a se sentar para comer.
— E não pensa que eu esqueci, Kenta. Você ainda não me explicou o motivo de ter vindo fazer jornada em Johto sendo que vivia dizendo que iria retomar sua jornada dessa vez em Sinnoh! Por quê?
   Crystal perguntou, pegando alguns salgadinhos do pacote que tinha no colo. Kenta olhou para a amiga, sentindo-se corar e tratou de tomar um gole do refrigerante antes de começar a explicar.
— B-bom...você também disse que iria fazer sua jornada por Sinnoh e no fim decidiu ficar por aqui, né!
— Eu decidi porque... – ela trocou um rápido olhar com Alice. – Por que me deu vontade!

  “E por quê o tutor dela meio que impôs que fizéssemos Jornada aqui.”

— A mim também, oras! Fora que as coisas em Sinnoh custam o olho da cara! O preço de uma Potion lá é quase o dobro daqui! E tem vários lugares que o meu cartão do Bolsa Treinador não vale, é um absurdo!
  Crystal entendia bem sobre a última parte. Nos últimos meses, devido a pequenos conflitos políticos e comerciais entre as regiões, algumas coisas foram mudadas ou estavam em processo de alteração e isso impactou notavelmente na vida dos treinadores e criadores de Pokémon que dependem de ajuda financeira de programas de governo. Como Kanto, Johto e Hoenn eram parceiros comerciais, isso não chegava a influenciar tanto (pelo menos por enquanto, com as eleições cada vez chegando mais perto, havia uma constante apreensão sobre o que poderia acontecer nos grupos de treinadores no Pokébook) mas para as outras regiões a situação já era um pouco diferente.
  Porém, ela não notara que uma das motivações de Kenta para decidir fazer sua jornada em Johto  era algo mais relacionado á ela. Alice percebeu a forma como o garoto olhava para a amiga quando esta não percebia mas ele corava com facilidade e gaguejava com frequência. Era até engraçadinho.

— Sabe, Crystal... – ela resolveu falar. – Enquanto você estava perdida na floresta sendo cuidada pelo misterioso bonitão... – ao falar isso notou o franzir de cenho de Kenta. - Eu e o Kenta te procurávamos e acabamos conversando um pouco. Ele disse que vocês moravam em New Bark e que estudaram e iniciaram jornada juntos. É verdade?
— Bom, meio que sim. Iniciamos jornada ao mesmo tempo, mas nunca viajamos juntos. Nos conhecemos desde crianças, nossas casas são no mesmo bairro. E lembra, Kenta, quando éramos pequenos e ficávamos brincando na pracinha com nossos Pokémon de pelúcia fingindo que éramos membros da Elite 4 batalhando contra outros membros da elite ou brincando que íamos em jornada  á procura de um Pokémon lendário?
— Lembro sim! – ele riu. – Você sempre cismava que queria que procurássemos o Lugia! Aí a gente ia até a margem do rio ali e fingia que era o mar e o Lugia aparecia.
— Acho que tínhamos o quê? Seis anos na época.  – Crystal comeu mais um pouco de salgadinhos. – Como sempre mantivemos o desejo de nos tornar treinadores, completamos o Ensino Essencial não em uma escola comum, mas na Escola Pokémon de Violet.

   Alice conhecia a diferença entre ambos sistemas de ensino das escolas. O Ensino Essencial era o sistema de ensino padrão criado pelo governo e que abrangia do Fundamental ao Médio. Era o ensino que, por lei, todas as pessoas deveriam ter, embora a realidade se mostrasse diferente, principalmente na parcela mais pobre e isolada da população. Mas para aqueles jovens que desejavam se tornar treinadores licenciados, poderiam optar (com a assinatura de pais ou responsável) por cursarem o Ensino Essencial em uma Escola Pokémon.
   As Escolas Pokémon eram instituições particulares criadas pelo comitê da Liga Pokémon e ofereciam um sistema de ensino intensivo para os alunos, permitindo que eles se formassem mais cedo e assim pudessem retirar sua licença de Treinador Pokémon a partir dos 15 anos de idade.

— Nós estudamos na Escola Techi de Violet! – contou Crystal.- O ensino lá é período integral e é bem puxado...
— Nossa, nem me fale! Horror daqueles “provões” que rolava todo bimestre! Não sei quantas vezes caí de recuperação e fiquei com o cu na mão de medo de perder a bolsa!
— Bolsa?
— O Kenta conseguiu uma bolsa para estudar lá através de um programa derivado do Bolsa-Treinador.
— Oh, entendi.

    Alice cumprira o período do Ensino Essencial pela forma tradicional e complementando com mais cursos do que poderia enumerar e aulas particulares em demasia. Isso havia sido algo imposto por seu tutor até que ela atingisse a maioridade, alegando que era uma forma dela já estar apta e preparada para ter conhecimento e começar a administrar seu próprio patrimônio, se assim desejasse.
    Lembrava bem, há cinco anos atrás durante um dos seus limites de stress, entrando no imenso escritório particular do empresário em sua mansão.

~**~

  Alice abriu a grande porta e a fechou com mais força do que seria necessário ao entrar. Isso fez o empresário erguer os olhos dos relatórios que conferia junto a tela do computador.
— O que foi dessa vez?
— Eu já estou cansada! Quando penso que logo vou terminar um curso e então ficar com um tempinho livre, me aparece mais dois ou intensivo de algum que eu já estou fazendo!
   Enquanto a garota falava, Lawrence se limitava a observá-la, como se já estivesse acostumado com seus rompantes de irritação.

— Eu já passo cinco dias por semana no colégio de período integral e quando saio de lá, tenho um curso diferente pra fazer á cada dia. No sábado, mais cursos e aquelas insuportáveis aulas de etiqueta! Eu praticamente não tenho tempo para me divertir!
— Você tem alguns domingos livres.
— Quando não temos que ir aquelas confraternizações chatas da alta sociedade! E os domingos livres é o que me resta para treinar meus Pokémon!
— ...isso de treinar Pokémon foi uma escolha sua.
— Tá e alguns cursos também. Mas não todos eles! Não entendo por que preciso ter que aprender tanta coisa agora, algumas são chatas demais e estão ferrando com minha mente! Principalmente as que envolvem contas e eu odeio cálculos! Isso tudo está fazendo eu perder tempo da minha vida para fazer outras coisas!
— ...você tem quinze anos, Alice. Ainda possui muito tempo pela frente.
— Mas estou perdendo tempo da minha juventude agora! E todos dizem que ela passa rápido demais!
— O que você chama de “perder tempo”  é, na verdade agregar conhecimento. E isso nunca é perdido.
— Mas preciso de tanto agora? Posso fazer isso aos poucos. E conhecimento teórico é bom, mas experiência de vida é ainda mais importante! Na minha idade tá cheio de gente terminando o Ensino Essencial nas Escolas Pokémon e iniciando suas jornadas Pokémon pelo mundo!

   Lawrence recostou-se em sua cadeira, retirando os óculos e fitando a garota. Alice percebeu então que não havia notado direito antes, mas via agora que ele era um homem muito bonito.
— Alice, para uma adolescente, tudo isso pode parecer extenuante e perda de tempo em determinados momentos.
— O senhor não sabe...
— Eu sei, sim. Ao contrário de você, eu não tive um tutor de confiança em que eu pudesse permitir que cuidasse de tudo o que herdei. Estive cercado por pessoas que não pensariam duas vezes em me destronar e pegar o que tenho. Durante muitos anos e ainda hoje, boa parte do meu tempo além do trabalho, é gasto com estudos. Dos mais variados tipos. Sei o quanto pode ser uma pressão exaustiva agora, mas garanto que isso é o melhor para você no momento.
— Mas precisa ser tudo de uma vez? Eu tenho muitos anos pela frente, posso ir aprendendo aos poucos enquanto vou curtindo a vida! Até porque eu tenho você para cuidar das minhas coisas.
— ...por enquanto. Alice, eu sou seu tutor e isso significa que até os seus dezoito anos eu sou o responsável por você e por administrar sua herança. Mas após isso, seu dinheiro e patrimônio são passados á você e, mesmo que aceite que eu continue administrando, terá o direito de escolher quanto gastar ou o que fazer. E isso pode ser muito perigoso se não tiver conhecimento e discernimento. Os estudos servem para te auxiliarem a manter o maior controle de seus bens em suas próprias mãos.
— Eu sei, o senhor já me disse mas...eu estou cansada! Será que eu não posso ter alguns anos para relaxar? Para sair de uma sala de estudos e viver e curtir um pouco do mundo?

    Silêncio. Alice percebeu o pequeno suspiro do empresário quando ele voltou os olhos para os papéis que tinha sobre a mesa; pareciam ser relatórios repleto de números, valores e porcentagens. Só de ver aquilo por segundos, ela já sentia sono.
— Vamos decidir uma coisa. – falou Lawrence após um tempo. – Continue seus estudos por mais um tempo, conclua todos os cursos que estão em andamento e mais alguns que já estão programados. Quando você fizer dezoito anos, poderá escolher se quer iniciar a faculdade e começar a me acompanhar em alguns trabalhos administrativos na Silph Co. ou fazer algumas viagens e passeios durante um ou dois anos antes de focar-se definitivamente em suas responsabilidades.
— Sério?! – os olhos da garota se arregalaram. – Vou poder mesmo?
— ...se for a sua decisão. Mas primeiro, deve se dedicar por uns três anos em seus estudos. Aprenda o máximo que puder, usufrua dessa chance de obter uma formação completa e graduada. Depois...
— Eu aceito! – sorriu, empolgada. – Vou me dedicar, três anos passam rápido acho que posso aguentar esse calvário de estudos sabendo que depois vou poder curtir!
— Acho que você pode se dar ao luxo de viver um pouco despreocupadamente, algo que eu não pude. – ele suspirou, pegando a mão dela que estava sobre a mesa. - Mas só por pouco tempo, que fique claro. Você herdou responsabilidades, deve honrá-las.

  Alice agradeceu, entusiasmada. Segurou a mão dele e ambos se fitaram, em um entendimento mútuo.

~**~

 
“Será que foi nesse momento que eu comecei a vê-lo de outra forma?”


— Alice, ALICE!
  A garota piscou, quando viu a mão de Crystal se agitando na frente do seu rosto.
— Hein, o quê?
— Em que frequência você está? Ficou aí parada, olhando para o nada e segurando o sanduíche na mão...
— Ah, na-nada! Deve ser o cansaço! – mentiu.
— De fato, agora que você falou, eu estou me sentindo bem cansada também... – murmurou Crystal. - Mas minha fome ainda é maior! Passa esse pacote de bolacha, Kenta!
— É biscoito!
— ...bolacha.

    Kenta e Crystal continuaram um intenso debate se aquilo era bolacha ou biscoito recheado enquanto Alice os observava divertida, saboreando seu lanche. Toda aquela vivência simples de treinadores era algo inteiramente novo para ela e estava gostando. Embora sentisse falta do conforto de sua casa com todos os luxos e regalias, com as refeições saborosas, os passeios pela ilha, as baladinhas de sábado, até mesmo (quem diria!) de alguns estudos. Mas principalmente, sentia falta da companhia de Lawrence.
    Mas talvez por enquanto, fosse melhor assim.
    Embora isso a machucasse e a deixasse confusa emocionalmente a parte racional de si compreendia. Mas compreender não significava que aceitava. Pelo que sentia e via nos olhos dele, constantemente duvidava sobre o que deveria escolher.

— Alice, decide!
— ..quê?!
— É biscoito ou bolacha?
— Eu...eu acho que é... – ela sorriu. - ...rosquinha.
— Ah! Só complicou mais!
  Enquanto os dois jovens voltavam ao debate sobre o alimento, Alice percebeu algo.

  Sempre achara que sua situação com Lawrence só havia como escolher entre duas opções. Mas, assim como aquele doce poderia ser uma bolacha, um biscoito ou uma rosquinha, sua situação relacional também poderia ter três opções.
  Pensaria naquilo depois. Por hora iria aproveitar as novas experiências que estava tendo em acompanhar a jornada Pokémon de Crystal. Afinal estava sendo uma experiência divertida, ao lado de uma pessoa incrível. Certamente seria uma jornada muito interessante.

~*~


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Notas finais do capítulo

Terminando o capítulo aqui...
Só posso dizer que no próximo capítulo, prometo, haverá muito mais do Lugia! Queria ter colocado aqui mas aí o cappie ultrapassaria o limite de caracteres que imponho rs.
Eu gostei de fazer a parte do trio no dormitório do Centro Pokémon...claro que uma situação dessas abre leque para se trabalhar muitas possibilidades, mas procurei intercalar as conversas com uma explicação básica de como eu acho que funcionaria o sistema de ensino no mundo pokémon. Nos games, há a existência das Escolas Pokémon mas duvido que todo mundo tenha estudado em uma dessas, o que me leva a crer que sejam instituições especiais. Então procurei criar uma explicação que soasse no mínimo convincente. Eu já mudei a faixa etária para se iniciar uma jornada pokémon porque acho absurdo isso acontecer para uma criança de 10 anos de idade sair pelo mundo caçando bicho, porque o mundo é um lugar escuro e repleto de horrores 0_0
Então joguei uma idade mínima de 15 anos para tal. Acho que faria mais sentido. XD

Bom, espero agora poder não demorar tanto para tornar a atualizar aqui, quem sabe com a graça de Lugia eu consiga entregar mais um capítulo até o fim do ano? ;)



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