Sonhos de Grãos de Areia escrita por LaviniaCrist


Capítulo 8
Marionete


Notas iniciais do capítulo

Eu aconselho para lerem enquanto ouvem a música Masquerade Suite de Khachaturian.
Link da música: https://www.youtube.com/watch?v=fPp3Qh-GRqs



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/756022/chapter/8

 

A noite estava tão fria ao ponto da dormência se instalar nos extremos do corpo de qualquer pessoa. No caso de Kankuro, mesmo precisando de dedos ágeis, não poderia ser diferente.

Ele tentava controlar uma pequena agulha para regular um dos mecanismos novos em Sasori. O rapaz estava sorridente e orgulhoso de si mesmo pelo feito: entender o planejamento daquele “corpo” e continuar a desenvolve-lo era uma questão de honra.

Com muito zelo, Kankuro inseriu suas linhas de chacra na marionete para ver se o trabalho havia terminado e, talvez apenas por admiração, começou a reparar nos movimentos tão polidos e hábeis.

Um simples mover de dedos era quase uma peça teatral requerente de muito controle: primeiro firmou a palma da mão; em seguida, mexeu a primeira peça de um dos dedos, algo que se aproximava da falange proximal; depois foi a vez da falange média; e, por fim, a falange distal.

Era um movimento delicado e ao mesmo tempo hipnótico. Parecia até mesmo uma mão verdadeira se mexendo...

“Eu sou realmente bom nisso, jaan! ”.

O mestre titereiro só não sorriu por estar com uma chave fixa na boca.

Ele direcionou seu foco novamente para a peça que estava regulando, só então notando algo um tanto bizarro: a pequena agulha, antes enfiada em um minúsculo compartimento, agora estava enfiada em sua própria mão. Sem se importar, ele apenas tirou e voltou a trabalhar em Sasori.

Passou-se quase duas horas até que o Sabaku decidiu se levantar um pouco e esticar as pernas.

O rapaz foi até a janela olhar para a lua no céu escuro. Trocar o dia pela noite havia se tornado um habito: na madrugada havia o silencio, havia a calma, havia todo o tempo em que ele quisesse se dedicar a instalar mecanismos novos em suas marionetes e repara-las.

Outra coisa que ele pode ver foi a sombra seu reflexo nos vidros grossos da janela. Havia algo em seu braço.

— Mas o que...? — só então ele olhou para si mesmo, notando várias de suas pequenas agulhas de regulagem enfiadas no braço esquerdo.

Com cuidado e o auxílio de um espelho, ele começou a tirar uma por uma. A dormência poderia ser culpada facilmente, uma vez que bastava ele passar o braço por onde deixava as agulhas que elas se grudariam ali e ele não notaria.

“ Não são só venenos que causam dormência, jaan... ”.

— Gostei! Acho que vou colocar essa como a primeira pauta de uma aula quando eu tiver meus aprendizes: não são só venenos que causam dormência, jaan! — ele riu dos próprios pensamentos, acabando de tirar as agulhas. — Silencio Kankuro, não quer acordar a besta de cabelo vermelho que é o seu irmão com sono, quer? — novamente, ele riu de si mesmo, mas dessa vez bem mais baixo.

Voltando para a sua bancada de trabalho, ele notou outra coisa um tanto diferente: antes poderia jurar que Sasori estava deitado na bancada com as mãos para baixo, enquanto ele regulava uma pequena peça no tórax. Agora, a marionete estava com uma das mãos cobrindo os olhos e a outra fazendo sinal de silencio, próxima à boca.

“ O sono também nos deixa bêbado... “.

Ele pensou, soltando uma risada abafada pela chave fixa estar novamente em sua boca.

Mais algum tempo de trabalho duro se passou, até que Kankuro deu mais uma pausa. Dessa vez ele não se levantou para se esticar, apenas se recostou melhor na cadeira e a fez ficar apoiada apenas nas pernas traseiras.

O rapaz de face pintada estava de olhos fechados, balançando-se com a cadeira para frente e para trás, pensando se terminaria logo todas as suas “novidades” ou iria para a cama, dormir por algumas horas.

Crack.

Ele saiu do mundo de pensamentos e tentou prestar atenção de onde vinha o som.

Crack.

Agora, ele parou de balançar a cadeira.

Crack.... Crack.

Por fim, Kankuro finalmente abriu os olhos, mas queria não ter visto o que viu: Sasori estava sentado na bancada, com as mãos segurando a cabeça e rodando-a. A face já estava virada para as costas e a marionete continuava seus movimentos. A surpresa foi tanta que Kankuro se levantou, engolindo o seco e deixando a chave cair no chão.

Um som metálico ecoou pelo cômodo, assim como os vários “cracks” que vieram de Sasori, até que a face dele estivesse frente a frente da de Kankuro.

— Que alivio. — a marionete de cabelos vermelhos sorriu, encarando o jovem a sua frente — Eu me arrependo em te ter confiado como meu sucessor... Que tipo de mestre titereiro não sabe qual o lado certo das próprias marionetes!? — agora, a expressão dele era de irritação enquanto abria os olhos completamente, ganhando um ar assustador.

— E-eu... Er... — Kankuro deu alguns passos para trás, sentindo o corpo ficar completamente dormente pelo medo. — Sasori, há quanto tempo, jaan! — um sorriso desesperado nasceu nos lábios do Sabaku.

A marionete olhava para si mesma e conferia os próprios movimentos, depois, ela se levantou da bancada, se esticando e fazendo mais alguns “craks”.

A esta altura, Kankuro já estava indo para a porta do melhor modo possível, sendo que seus movimentos estavam muito restringidos pela dormência e pelo medo.

“Eu deveria ter rido mais alto! Prefiro morrer pelo Gaara do que por uma múmia, jaan! ”.

— Venha cá, me dar um abraço! — a voz de Sasori era tenebrosa, seguida de um riso maquiavélico como em um filme de terror — Vou mostrar a você como incomoda ficar com a cabeça virada! — enquanto falava, ele usava o cabo de aço saindo de seu estomago para prender Kankuro pelos pés.

“EU SOU LINDO DEMAIS PARA MORRER ASSIM! EU SOU JOVEM DEMAIS PARA MORRER, JAAN! EU NÃO QUERO MORRER!!! EU NEM ESTOU PINTADO PARA MORRER!!!”

Mesmo tentando gritar e fugir, o corpo de Kankuro não o obedecia. Parecia até mesmo que, mais uma vez, ele havia sido envenenado por Sasori.

Talvez fosse verdade!

Talvez, desde a primeira agulha espetada na mão do jovem titereiro, a marionete estivesse armando a vingança...

— Agora você será minha marionete, Kankuro... — enquanto falava, Sasori levantou o rapaz pelos pés, encarando-o com as mesmas feições psicopatas que em suas lutas. — Você não se importou em ficar com o braço dormente, não vai se importar de ficar com o corpo todo assim...

“NÃO! VOU ME IMPORTAR SIM! NÃO QUERO! NÃO! NÃO! JAMAIS, JAAN! ”.

Ele tentava se debater, se contorcer e até mesmo falar alguma coisa... Tudo em vão.

Kankuro teve o corpo arremessado ao chão, batendo com a nuca. A dor o fez fechar os olhos com força por alguns momentos e prender o ar nos pulmões, enquanto ainda ouvia os “cracks” que Sasori fazia ao se mover...

...

Silencio...

...

Finalmente...

O...

Silencio...

...

Aos poucos, ainda atordoado, Kankuro começou a normalizar a respiração. Depois, abriu os olhos lentamente, já se preparando para dar de cara com Sasori.... Mas não!

Ele estava no chão, de fato.

A chave fixa estava em sua boca, o impedindo de fechar os lábios e a falar direito.

A cadeira, com a qual antes ele se balançava, estava caída no chão também, com as pernas quebradas.

O rapaz se levantou, passou as mãos nos cabelos e tentou entender o que havia acontecido.

— Foi um pesadelo! — ele riu de si mesmo, uma risada gostosa e de alivio — Eu não acredito que tive um pesadelo com marionetes, jaan! — as risadas ecoaram ainda mais, enquanto ele chutava o que restou da cadeira para um canto qualquer, onde não o atrapalhasse.

Direcionando o olhar para a bancada de trabalhos, o gelo percorreu sua espinha novamente e fez com que a dormência invadisse seu corpo:

Sasori estava sentado sobre a bancada, apoiado na parede, com as duas mãos segurando a cabeça.

“Não quero morrer, não quero morrer, não estou pronto para morrer...”.

Enquanto repetia este mantra na cabeça, o Sabaku ousou abaixar as mãos da marionete com delicadeza, ouvindo o tão tenebroso “crack” ecoar pelo quarto, de novo, enquanto as junções eram movidas.

— E-Eu prometo colocar óleo em você amanhã de manhã, tá, Sasori no... Sasori no Dana!? — o rapaz disse aflito, recorrendo a até mesmo o título que Deidara havia dado ao mais velho — Vou até costurar roupas novas para você, vai ficar como novo em folha, jaan! Nem vai parecer que você tem mais de vinte!

Enquanto tentava entrar em acordo com Sasori, o rapaz já destrancava a porta do cômodo e se preparava para ir direto para cama. Ele estava prestes a sair quando se lembrou do motivo de tudo aquilo ter começado: a cabeça estava virada para o lado errado.

Armado de suor, tremedeira e o pingo de coragem que ainda tinha, Kankuro foi até a marionete e colocou as mãos no rosto de Sasori, virando lentamente o rosto para o lado certo. Os “cracks” e alguns outros estalos eram ouvidos conforme a peça era movida.

— Assim está mais confortável? — Kankuro sorriu, nervosamente, acabando de colocar o rosto de Sasori no lugar e tentando endireitar os fios avermelhados.

Os olhos da marionete não estavam como de costume. Pareciam estar bem mais arregalados do que antes, como se girar a cabeça tivesse feito com que isso acontecesse. Talvez fosse uma "postura psicopática para lutas".

— Belos olhos, ja-aan... — um riso picotado e aflito saiu de Kankuro, até ele engoliu o seco e se afastou alguns passos da marionete. Não era hora de brincadeiras.

“Pelo menos eu já regulei tudo e amanhã só preciso colocar as coisas no lugar... Ou já deixo tudo em ordem, jaan?”...

CRACK.

O som seco ecoou pelo quarto silencioso novamente, fazendo com que o Sabaku saísse em disparada porta afora sem nem querer saber o motivo daquilo.

O rapaz de vestes pretas só parou de correr quando finalmente chegou no próprio quarto e se jogou na cama, depois de tirar o capuz e os sapatos para joga-los em um canto qualquer. Era como se ficar embaixo dos cobertores pudesse o proteger de todas as armas afiadas e dolorosas de Sasori.

Sendo um pesadelo ou não, ele finalmente estava se sentindo seguro e poderia ficar tranquilo, descansar até de manhã...

Crack.

O som seco ecoou novamente pelo quarto em silencio, fazendo uma onda de frio percorresse a espinha de Kankuro e o nervosismo se instalasse nele novamente, chegando a deixa-lo dormente.

"Eu não quero ser uma marionete, jaan... Eu não quero! Eu não quero virar uma marionete... Eu não estou pronto para isso, jaan! ".

E foi repetindo estes pensamentos que o jovem titereiro passou o fim da madrugada.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado!
Sugestões para próximos capítulos, dicas, críticas e observações são muito bem-vindas.



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Sonhos de Grãos de Areia" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.