Eu já ia sair me sentindo incrível por ter parado uma briga, quando Yan entrou na loja.

— O que você quer? - Perguntei, ainda lembrando da nossa discussão.

Ele fez um esforço - apesar de ainda estar fraco - e nos deixou invisíveis para o resto das pessoas.

— Vai ficar fazendo drama agora? Olha, desculpa. - Ele disse, se aproximando - Mas você está aqui pra matar ele ou pra salvá-lo de intriguinhas? Dá pra ver que esse cara não quer viver mesmo.

Aquilo me irritou.

— Eu já disse que não pretendo matar ninguém. Mas você pelo visto não me deu ouvidos. - Falei enquanto me aproximava.

— É que isso não faz sentido. Como pretende fazer ele se esquecer? Brincando com golfinhos? - Ele dizia enquanto cruzava os braços - De um jeito ou de outro você vai machucá-lo.

Dei alguns passos pra trás, pensativa. Isso era verdade.

Se magias de esquecimento tem efeitos colaterais também, não havia outra forma...

— Foi mal por ter falado aquilo. Não quero brigar com você, estou pedindo pra confiar em mim e fazer a coisa certa. - Ele disse, com um olhar distante. - Caso contrário, quem vai sofrer nessa história é você.

É impressão minha ou ele parecia preocupado comigo? Ele quase nunca me mostra esse lado.

Pensei por alguns minutos, mas eu já sabia a resposta.

— Queria resolver de maneira pacífica... mas você tem razão. Porém só vou aceitar se me prometer uma coisa. - Eu disse enquanto olhava séria para ele.

— O quê?

— Estou vendo que ele tem uma vida um pouco difícil, não posso deixar de me sentir mal por ele apesar de tudo. Queria que ele tivesse momentos felizes antes de partir, então vamos ajudá-lo. - Respondi, enquanto sorria de forma triste.

— Sério? Está preocupada com quem nem conhece? - Ele dizia de forma fria. - Outra coisa, ele vai morrer. Não precisa de ajuda.

— Você não entende, Yan. Se eu tiver mesmo que matá-lo, pelo menos gostaria de fazer a coisa certa uma vez. Ou eu me sentirei horrível. - Falei seriamente.

— Sabe que eu posso eliminá-lo pra você, né? - Yan disse.

Por que ele continua insistindo?

— Eu sei. Mas isso é algo que eu causei, então eu vou terminar! - Continuei. - Se não quiser me ajudar, tudo bem.

Ele parecia frustrado com essa ideia, mas eu já estava decidida.

Não fui com a cara daquele humano no início, mas estou com pena. Se esse Bryan tem que morrer, é minha culpa. Ele ter seus últimos momentos felizes é o mínimo que eu posso fazer.

— Você dá trabalho, sério. - Yan suspirou. - Tudo bem, vamos fazer do seu jeito, heroína.

— Obrigada! - Eu sorri.

Porém a última palavra da sua frase me intrigou. Se tem uma heroína nessa história, com certeza não sou eu.

                                             ☂☂☂

Se passou dois dias desde que eu e Yan fizemos aquele trato. Nesse meio tempo, eu visitei o mar. A "surpresa" que Victória havia mencionado antes, era um convite para um baile no mar... só que minha cabeça está tão cheia que nem sei se vou ir.

Eu queria me aproximar daquele humano de uma forma normal, ou iria parecer uma esquisitona. Pra isso eu tive que criar uma identidade falsa! 

Iria me inscrever nas aulas de música, mas teria que fingir ser outra pessoa para a Yasmin também. Recomeçar do zero seria um pouco difícil agora que eu finalmente tinha uma "amiga".

Bem, que seja. Eu não ia precisar tanto dela agora.

— Como você é fria. Está aprendendo comigo? - Disse Yan, sentado no sofá da sua casa.

ESTAVA LENDO MINHA MENTE DE NOVO?

— Sim, deu vontade. Você anda desligada ultimamente. - Ele disse enquanto sorria.

É mesmo, eu estava morando com o Yan enquanto isso. Mas ele é tão chato que estou pensando em arranjar outro lugar pra ficar...

— Para de ler a minha mente, não te dei permissão. - Falei, cruzando os braços.

— Eu já parei. - Ele riu - Você pensa demais, ler a sua mente é tão cansativo.

Eu estava andando por todo lado, apenas pensando. Como eu devia me chamar aqui no mundo humano? Como Yan devia fazer a minha aparência temporária?

— Yan, você já me inscreveu naquelas aulas...? - Eu perguntei.

Por favor, diz que ainda não. Eu não pensei em nada.

— Sim. Se comportar como humano é tão chato. - Ele respondeu, com uma casquinha de sorvete de chocolate nas mãos.

— NÃO ACREDITO NISSO. Que nome você usou? - Falei em desespero.

— Lily. É uma "amiga" bruxa minha e já visitou esse mundo antes, então já tinha uma identidade humana. Ela aceitou o acordo.

— Como? A Lily? - Perguntei, querendo enfiar a cara em um buraco.

— Sim, mas aquela chata disse que queria vir junto, então falei para ela fingir ser você. Mal posso esperar pra ver essa cena.

— QUÊ? - Gritei e continuei a andar pra lá e pra cá.

Me sentei no sofá ainda pensativa. Nós iríamos trocar as identidades? SÉRIO MESMO, YAN?

Alguém bateu na porta e Yan se levantou para atender.

— Olá, Érica. - Yan disse, se referindo a pessoa na porta. Olhei para ver quem seria.

Era a Lily. Ela continuava a se vestir de forma infantil e com seu chapéu de bruxa, mesmo estando no mundo humano.

— Olá, Yanzinho! E... oi, Lily. - Ela se referiu a mim quando disse "Lily", provavelmente pelas identidades falsas que Yan causou. Lily desfez o sorriso quando olhou pra mim. Já sei que ela não vai com a minha cara, então por que aceitou esse acordo?

— Entra aí. - Yan parecia estar se divertindo.

Lily deu uma risadinha e entrou saltitando. Enquanto isso eu estava sentada com cara de paisagem.

Ela se jogou no sofá como se já tivesse intimidade.

— Como você vai fazer, Yanzinho? Eu vou ter que trocar a minha aparência linda com ela também? - Disse ela, fazendo bico.

— De jeito nenhum! - Falei, antes mesmo de Yan responder.

Yan começou a rir sem parar e Lily olhava pra mim com ódio.

— Não acho que será necessário, mas como você disse que não quer ser reconhecida... - Ele se referia a mim - Vamos mudar um pouco seu estilo, pelo menos.

Mas que merda.

— Mudando de assunto, Yanzinho. Agora que eu estou aqui, podemos passar um tempo juntos, não acha? - Ela dizia, voltando a agir que nem boba.

— Bipolar. - Sussurrei, irritada.

— Você disse algo? - Ela perguntou, olhando pra mim enquanto disfarçava.

— Não disse nadinha. - Dei um sorriso forçado, mas a verdade é que eu queria expulsar ela dali.

Yan disse que iria até a cozinha pegar alguns sucos. Mas eu tenho certeza que ele queria uma briga entre nós duas.

Nós estávamos sozinhas na sala.

— Por que aceitou esse acordo? - Perguntei, indo direto ao ponto.

— Porque é uma chance de eu passar um tempo com meu Yanzinho. — Ela disse, tirando sua expressão fofa - Não estava pensando que eu ia deixar você ficar dando em cima dele, né?

— Eu nunca fiz isso, pra início de conversa! - Suspirei. - Mas que ódio.

Ela ficou pensativa por alguns segundos, até que ela olhou pra mim novamente.

— Posso te ajudar nisso que você quer. Sim, eu já sei de tudo. - Ela falou. - E posso te fazer causar uma boa impressão naquelas aulas também.

— Sério mesmo? - Perguntei, afinal sabia que ela não me ajudaria assim tão fácil.

— Aham. Mas só se você me ajudar a ter um encontro com o Yanzinho.

Continua