Luisa Parkinson: A Companheira Fantástica escrita por Gizelle PG


Capítulo 59
De Volta ao Grease


Notas iniciais do capítulo

Oiiiii! ;D

"Eles precisam chegar á cabine do maquinista, mas será bastante desafiador"



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Luisa estava tendo um dia difícil. Desde que começou a ter sintomas desconfortáveis e o dr. Watson presumiu que ela estivesse grávida, o tempo pareceu correr mais devagar que o normal, quase como se todo o peso do mundo recaísse sobre seus ombros. No entanto, tudo mudara no momento em que estiveram cara á cara com os Zygons, e perceberam com quem estavam lidando. A partir daí, cada segundo parecia ser decisivo enquanto eles percorriam os vagões em unânime desespero.

Deram algumas derrapadas e quase foram pegos, mas as habilidades evasivas do Doutor em parceria com o fantástico detetive, ameaçaram a força estratégica dos inimigos.

Quando não havia mais o que fazer para atrasá-los, Alicia surpreendeu a todos apanhando uma seqüência de bolinhas de gude no bolso e atirando-as contra o soalho do trem, que atrapalhou e provocou a queda de pelo menos meia dúzia dos monstros vermelhos. A equipe comemorou, poupando alguns segundos de fôlego e correndo com ainda mais afinco.

Em menos tempo do que o esperado, chegaram ao primeiro vagão oficial depois do carvoeiro: estavam quase na cabine do maquinista. Agora, só haveria entre eles um obstáculo: o próprio vagão carvoeiro.

—MARTY! –Melissa gritou, ao distinguir meio corpo de um rapaz estirado no chão.

—O quê? Ah não! O que aconteceu, Mel? Onde está o doutor Brown?

—Ainda não sabemos dele. Mas o Doutor tem um bom palpite de que seu amigo esteja na cabine do maquinista –ela assegurou.

Óh! Céus! Eu também desconfiei disso... –Marty passou a mão pelo rosto, fazendo uma expressão constante de dor. –Lembro-me de ter vindo até o carvoeiro, e logo depois ter apagado ao sentir uma forte pancada na cabeça... Alguém deve ter me acertado pelas costas... –então ele gemeu ao dobrar uma das pernas. –E, evidentemente, mordido meu calcanhar ao mesmo tempo! Ai! —grunhiu, massageando os lugares mencionados.

—A senhora Lancaster! –Alicia e Luisa se entreolharam, ao deduzirem.

—Como assim? A senhora Lancaster mordeu meu tornozelo?—Marty pareceu atônito.

Não, bobo! Ela te deu uma paulada na cabeça, enquanto o cão infernal dela fez o resto do trabalho... –Melissa explicou com bom humor, cortando o impacto que aquela idéia maluca causara aos ouvidos do primo.

Imediatamente, o Doutor correu até a outra extremidade do vagão em que estavam e tateou a parede sem porta, com uma expressão ansiosa no rosto.

—Não podemos perder mais tempo... Precisamos passar agora pelo carvoeiro!

—Mas não há como fazer isso com o trem em movimento... –articulou Marty. –Não há nenhuma passagem simplificada que nos leve até a cabine do maquinista!

—Não precisamente, meu caro rapaz –interveio Holmes, tateando as venezianas das janelas do expresso, com habilidade. –Ainda há um jeito de atravessarmos. Mas, pouco posso garantir-lhes de que será seguro.

Não me diga que...—começou Watson, desconfiado. –Ah... Não Holmes! Isso não!—repreendeu de imediato, ao notar o olhar impulsivo do companheiro.

—Como sabia o que eu ia dizer? Como pode ter tanta certeza de que é algo ruim? –questionou o detetive, indignado.

—Seus olhos esbugalhados me garantem que será perigoso. –respondeu o outro, com tranqüilidade.

—Meus olhos esbugalhados? –Holmes indagou. –Não entendi. Meus olhos são perfeitamente normais... Por acaso o formato de meus globos oculares é relevante para solucionarmos esse caso?

—É que seus olhos sempre ficam esbugalhados quando você tem uma idéia suicida. –esclareceu Watson. –O que de fato está ocorrendo agora, em tempo real, para ser exato...

Holmes fitou-o por um momento.

—Eu só ia dizer que devíamos sair pela janela e segurar nas barras de ferro laterais da caçamba de transportar carvão, para depois atravessarmo-la com cautela até chegarmos á cabine do maquinista. Como podem ver, é simples e direto. Não há possibilidade de erro... –Holmes anunciou e todos fitaram-no em silencio. –O que foi? Não é um plano ruim...

—Não é ruim... É péssimo!—amplificou Melissa. –Pensa que somos o quê: ACROBATAS? Nunca conseguiremos nos equilibrar na lateral de um trem em movimento... O dr. Watson tem razão, isso é suicídio!

—É Melissa, mas talvez Holmes tenha nos resumido a única possibilidade á que teremos alcance nesse momento... –o Doutor interveio. –Ao menos que algum de vocês saiba voar, levitar, ou algo do tipo, porque não vejo outra forma viável para chegarmos á cabine do maquinista, senão esta.

Todos pararam para pensar por um instante.

—O Doutor está certo. Precisamos tentar! –afirmou John Travolta.

—Pode contar conosco! –sorriu Olívia, voluntariando-se incrivelmente motivada. –E eu sei a melhor forma para conseguirmos manter a calma no trajeto...

—E qual seria? –Luisa perguntou, curiosa.

Olívia e John se entreolharam, cúmplices.

Em pouco tempo, um por um foram atravessando a janela, apoiando-se nas barras e torcendo para não escorregarem com o embalo do trem sob os trilhos pouco estáveis. Logo, todos estavam do lado de fora do vagão, rezando por suas vidas.

—Quer saber... Vendo tudo por esse ângulo, agora parece uma idéia bem idiota...—o Doutor gemeu, fazendo uma careta para o vento frio que estapeava seu rosto sem dó. Seus braços estavam esticados para cima, segurando forte na barra, o corpo inteiro estava rígido de receio e de frio, e estava na ponta dos pés, tentando não perder o equilíbrio. Em geral, essa era a situação de todos. –Muito idiota, na verdade. Foi mal, Holmes...

Nem me fale... -Luisa, que estava ao seu lado, olhou de relance para baixo. –Deus do céu! Vamos morrer!

Lembre-me de dar um chute bem dado no seu traseiro depois, se sobrevivermos á isso, está bem?—disse Melissa ao rapaz, irônica.

—E agora Olívia? O que fazemos? –instigou o Doutor, com dificuldade para se virar.

O que combinamos!—ela gritou em resposta, já que era a única forma de ser ouvida, com toda aquela barulheira importuna da Maria fumaça. –Vamos lá pessoal... Cantem! É o melhor jeito para se manter calmo...

—Mas cantaremos o quê? –indagou Alicia com o vento eriçando seus cabelos de modo á parecerem uma bandeira roxa e azul, agitada ao vento. –Só consigo me lembrar da musiquinha dos Três Indiozinhos... Isso porque estou super apavorada!

—Eu estava pensando em cantarmos o tema de Grease Summer Nights. –anunciou John Travolta. –Porque vocês sabem que cantar e dançar são o nosso departamento... –e apontou para si e para Olívia. –E, devo admitir que é mesmo relaxante... Mas para isso, devemos primeiro entrar no clima da música...

—Mas o Sherlock não conhece essa música... –interpôs Alicia. –Tão pouco eu, que vim do futuro!

—Mas nós conhecemos! –Luisa afirmou, indicando Melissa e o Doutor com a cabeça. –Nós podemos ensinar o refrão pra vocês, e o resto a gente se vira...

—Que tal cada um cantar o que mais lhe convém? –propôs Marty.

—Mas aí acaba a graça! –retrucou Melissa.

—E tem mais: como poderemos saber se cada um conseguiu adquirir um controle interno das próprias emoções para conseguir prosseguir? Precisamos nos unir como em um todo e fazer isso juntos!—destacou Luisa.

—Luisa tem razão! –apoiou Melissa. -Pense bem, Marty: Estamos pendurados fora do Expresso Oriente nos anos 30, com Sherlock Holmes, Watson, John Travolta e Olívia Newton-John! Quantas vezes poderemos passar por uma situação parecida, durante nossa vida? Criatividade, meu povo!  Essa aventura deve ser épica!

—Espero nunca mais ter que passar por isso de novo –reclamou Marty, evitando olhar par abaixo, amedrontado.

Vamos lá pessoal!—Melissa animou todo mundo. –Eu quero ouvir solos vibrantes e corais ecoantes no fundo! Nada de monólogos... Eles são chatos e cansativos! Vai lá Lu! Começa você!

Luisa respirou fundo, e olhou para o melhor amigo, que sorriu inquieto. Inquieto, mas crente. Crente de que ela conseguiria ajudá-los a começar a musica e que, muito em breve, todos estariam com os pés novamente no soalho do trem, em segurança. Aquela foi sua deixa.

Sem se preocupar muito em manter a voz afinada (o que não era muito problema para ela, já que Luisa estava acostumada a tocar violão e, sucessivamente, também cantar), ela começou, deixando a melodia rolar. Logo, o Doutor continuou o verso, sorrindo para ela; (a música era para ser cantada em casal, e eles estavam bem adequados para o papel). Em pouco menos de alguns segundos, Olívia e Melissa entraram, ajudando-a com o coro da parte das garotas, e John e Marty uniu-se ao Doutor, lhe dando cobertura. Alicia, Holmes e Watson logo pegaram o refrão “Tell Me More” e juntaram-se á cantoria, sem deixar ninguém de fora. Realmente, começaram a se sentir mais determinados e confiantes, já que a concentração na letra da música não permitia que eles perdessem tempo ficando com medo ou temendo dar o próximo passo. Devagar, foram rastejando os pés, passando de barra em barra, até finalmente a ponta do tênis de Melissa tocar a veneziana da cabine do maquinista. Ela, que era a primeira da fila, abriu um imenso sorriso e gritou para os companheiros:

—É isso aí pessoal! CONTINUEM Á NADAR! CONTINUEM Á NADAR!—brincou, fazendo uma clara referencia ao filme “Procurando Nemo”. Então, esticou-se para frente e quase perdeu o equilíbrio por um segundo, mas felizmente, alguém segurou-a pela cintura: ela olhou de esguelha para trás e vislumbrou a mão de Luisa e a do Doutor, segurando-a um de cada lado. Isso lhe rendeu a força final que ela necessitava para abrir a janela pouco estreita. –CONSEGUI!

TELL ME MORE... TELL ME MOOOOOOOOOOORE!—eles finalizaram em conjunto, já pulando um de cada vez para dentro da cabine principal do trem. Acabaram por se darem um rápido abraço grupal, como em comemoração ao que acabaram de fazer. Por fim, estavam onde precisavam estar: lá estava a cabine do maquinista e, gradativamente, como já fora esperado: o dr. Brown cochilava, amarrado aos controles principais. 

—O que estamos esperando? Vamos desamarrá-lo! –agitou Holmes. Porém, quando todos deram um passo á frente, uma sombra estranha se moveu á sua esquerda e, de repente, uma planta carnívora geneticamente alterada ergueu-se sobressaltando-os, mostrando a cabeçorra média em forma de losango, posicionando-se com o corpo bem em frente á cadeira do cientista adormecido, como se montasse guarda. Então encarou-os firmemente, quase como se eles fossem a verdadeira ameaça na sala.

—Fica longe dele! –o Doutor gritou, tomando a frente do grupo, referindo-se ao dr. Brown, desacordado. Ao invés de obedece-lo, a planta avançou na direção dele, quase desequilibrando-o. –EU JÁ DISSE PRA VOCÊ FICAR LONGE! –ele arrancou a espada que Holmes portava junto do corpo e já ia avançar contra a planta carnívora, ameaçando-a com o objeto, quando a voz de Marty irrompeu inesperadamente em meio á confusão:

Doutor, não faça isso!—o Doutor e a planta voltaram-se para ele, ambos abismados. –Esse é o Dexter! A planta adestrada do dr. Brown! A primeira e única no mundo. Ele é completamente leal á nós. Só ataca quando pressente algum perigo que possa botar nossas vidas em risco... Dexter não sabia de quem se tratada, por isso ele avançou em nossa direção! –defendeu Marty, ainda em tempo de impedir uma briga feia.

Devagar, o Doutor girou a cabeça de volta para a planta, ainda desconfiado.

Dexter?—o Senhor do Tempo baixou a espada e correu os olhos rapidamente pelo corpo da planta, fixando o olhar bem em cima de uma espécie de coleira que ela tinha no pescoço, onde pendia uma pequena medalha de prata, com os dizeres: “Dexter -Um eterno fanfarrão. Criação do dr. Brown”. Então voltou a fitá-la de modo intrigado, com as duas sobrancelhas erguidas. A planta pareceu fazer o mesmo para com ele, apesar da falta de olhos e sobrancelhas visíveis. –Então você é amigo? Não é mau como as outras plantas?

—Quem? O Dexter? Ele não machucaria nem uma mosca! –Marty riu, dirigindo-se ao espécime e alisando-lhe a cabeça, como á um cachorrinho manso. A planta começou a fazer festa e alguns ruídos, como se estivesse satisfeita com os agrados. Até seria capaz de abanar o rabo, se tivesse um. –Estão vendo? Ele não morde!

Mesmo com aquela afirmação e com a comprovação sendo executada na frente de seus olhos, todos ainda tinha suas dúvidas. Luisa foi a primeira a tentar se aproximar, mas ao estender a mão, a planta não identificou suas intenções e acabou rosnando para ela.

—O que eu fiz de errado?

—Ah! Eu esqueci de avisar... O Dexter é incrivelmente sensível! Ele se torna leal a você a partir do momento que você se mostra confiável... –Marty explicou. –Se quer mesmo uma dica sincera, ele costuma ficar mais acessível quando ouve música... 

—Música? –indagou Alicia.

—Por que não estou surpreso? –o Doutor levou a mão ao queixo, pensativo. –Foi a mesma situação que presenciamos mais cedo, no Expresso Continental. Lembram-se? Elas também não atacaram quando ouviram a música sair do rádio, no vagão de apresentações...

—É verdade! Eu me lembro disso... –Olívia afirmou, procurando apoio em John, que também assentiu. –Nós quase não escapamos! Foi por um fio. 

—Então, quer dizer que isso meio que “as deixa mais calmas”? –sondou Luisa. Marty assentiu, então imediatamente, ela tirou o celular da bolsa e ligou-o. Em poucos segundos abriu um sorriso. –Por acaso o Dexter gosta de Lady Gaga?

—Lady o quê? –Marty coçou a cabeça, e Luisa considerou aquilo como um “vai servir”.

—Vamos lá então! –ela apertou play e, imediatamente a musica “Alejandro”, da Lady Gaga, começou a tocar, preenchendo o ambiente. Todos ficaram parados, esperando ver alguma reação da planta. A musica era boa, e não demorou muito para a planta mostrar-se um pouco descontraída com a batida animada. Ao reparar que sua intenção provocara um bom resultado, Luisa sorriu para os demais, então voltou-se empolgada para Dexter. –Oi... Meu nome é Luisa. Eu sou boa gente. Será que podemos ser amigos?

A planta não demorou nem mais um segundo: enrolou um cipó frouxo no braço dela, (ao menos essa planta carnívora dócil tinha controle de sua força), e começou a explorá-la, como se estivesse brincando.

—Acho que ela gostou de você... –riu Marty, orgulhoso. Vendo que não havia mais perigo, Melissa imitou a amiga, ligando o celular e colocando a mesma musica para tocar sincronizada com a primeira. A planta ficou maluca com a possibilidade de ouvir a mesma música saindo de duas caixas de som diferentes, e logo quis também a amizade de Melissa. Alicia foi a próxima a se aproximar, e logo todos estavam passando a mão nela, como se fosse um gatinho fofo.

—Fascinante! Isso é lindo de se ver... –os olhos do Doutor brilhavam, enquanto ele lhe fez um cafuné no alto da cabeçorra. –Você não é nada mal, não é mesmo Dexter?

A planta lambeu-lhe o rosto com a língua vermelha e áspera. Mesmo ficando todo babado, e com o cabelo espigado, ele não deixou de sorrir.

—Agora que o Dexter já acostumou com vocês, nós podemos desamarrar o doutor Brown! –guiou-os Marty, entrando atrás da planta. Acabou que ela lhes abriu espaço, e tudo ficou mais fácil. Infelizmente, foi só em teoria:

—Ele está muito preso! São mais daquelas coisas vermelhas dos Zygons! Por algum motivo incerto, essas aqui não se desfizeram como as outras...

—Um espécime mais resistente –supôs o Doutor, passando sua chave sônica nos cipós. –Precisamos de uma...

—Temos tesoura, estilete, canivete suíço e uma faca sem ponta... –Luisa tirou todos os objetos que conseguiu encontrar em sua bolsa e esticou-os na direção do amigo. –Qual vai ser?

—Caramba! Você tem um arsenal de guerra aí dentro, hein!? –o Doutor mais uma vez se surpreendeu. –Me lembre de fazer uma checagem nessas suas artilharias pessoais, mais tarde...

Luisa riu, cruzando os braços, divertida.

—Por quê? Acha que eu seria capaz de começar uma guerra com um canivete suíço?

Ele ergueu as sobrancelhas para ela.

—Não, mas com certeza deixaria o inimigo muito irritado... –e cortou os cipós que caíram ao chão e também, gradativamente, desfizeram-se todos. –Prontinho... Dr. Brown? Pode me ouvir?

O homem de cabelos brancos espaventados e roupas coloridas dormia pesado, e conseqüentemente demorou a dar-lhes um retorno. Marty correu até ele e chacoalhou-o com força, sem cerimônia. Não podiam se dar ao luxo de perder nem mais um minuto...

—DOUTOR NÓS PRECISAMOS DO SENHOR! DOUTOR! ACORDE!

Hã? O quê? O que está havendo?—o homem se pôs em pé em um sobressalto, fitando a todos com uma cara espantada. –Marty! Pelo amor de Deus... Saia daqui! Eles voltaram!—então apanhou a cadeira onde estivera amarrado até pouco tempo e ameaçou o grupo recém chegado, com ela. –Não vão me obrigar a executar seu plano perverso novamente, nunca mais! Aaaaarrrr!

O homem gritou, ameaçando-os, ao que o Doutor e os demais apenas piscaram, aturdidos. Aquilo não era exatamente o que esperavam encontrar pela frente, á essa altura do campeonato. 

—Acalme-se doutor... –interveio Marty, segurando seu braço e impedindo-o de arremessar a cadeira. –Eles estão do nosso lado. Esse aqui é o Doutor. É o homem que você me pediu para procurar...

Ah! Sim! Como eu imaginei...—disfarçou. Logo, o dr. Brown sorriu, mudando a fisionomia radicalmente, largando a cadeira no chão como um saco de batatas e apertando freneticamente a mão do Senhor do Tempo. -É um imenso prazer conhecê-lo, Doutor! Um imenso prazer!

—Então já ouviu falar de mim? –o Doutor abriu um sorriso largo.

—Bem... Não, na verdade. –o outro retorquiu. –O que aconteceu foi que ouvi aqueles alienígenas babões falando alguma coisa sobre outro portador de uma máquina do tempo no planeta Terra... Depois disso, não foi difícil somar dois mais dois! —o cientista sorriu, tocando o topo da cabeça, onde faltava cabelo. –Eu estava determinado à encontrar uma saída, e disse á mim mesmo que precisaria dar um jeito de encontrar esse homem, quem quer que fosse, antes daqueles radicais desumanos conseguirem por as mãos na sua máquina, então enviei meu fiel companheiro Marty, em uma busca secreta através dos séculos!

—Brilhante! –o Doutor exclamou. –Só não consigo entender como foi que o Marty descobriu que sua prima Melissa, que ele ainda nem conhecia, estava viajando comigo... Como ele sabia onde me encontrar?

—As notícias correm rápido Doutor... –Marty aproximou-se com um aparelho com tela, em mãos. –Aparentemente, uma tal de UNIT e Torchwood não dormem em serviço. Os Zygons invadiram os sistemas internos das duas bases para localizá-lo e eu consegui copiar as coordenadas por pura sorte. É, devo admitir que foi sorte mesmo... Aquela máquina de pesquisas é resistente: mesmo depois de eu ter derrubado café nela, sem querer, ela continuou a funcionar! -ele desabafou. –Tive apenas um curto intervalo de tempo para poder pesquisar sobre você nos formulários digitais das duas unidades, já que a senha fora raqueada e todo o banco de dados estava disponível –ele apanhou um punhado de papeis amassados, de dentro do bolso. Virou e estendeu-os para o Doutor. –Dê só uma olhada: Esses foram todos os arquivos que eu consegui fazer cópia. De acordo com os últimos registros, vocês começaram a se encontrar desde a última sexta feira. Como podem ver, há um exato controle entre datas e horas, e é possível encontrar gráficos esquematizados e imagens de vocês, por todos os lugares, seguidos sempre de uma lista de ataques alienígenas. O padrão é sempre o mesmo: um homem com uma caixa azul e duas garotas.

O Doutor franziu a testa. Luisa e Melissa se aproximaram.

—Ih! Somos nós! –Luisa espantou-se. –Aquelas primeiras são imagens nossas no pátio da minha escola, no dia da formatura, quando os Slitheens atacaram... Devem ter sido captadas pelas câmeras de segurança, já que todo mundo estava “meio que em coma”, enquanto trabalhávamos... –ela fez uma pausa. -Olha só! Aquele não é o Capitão Jack?

—E aqueles somos nós no Palácio de São Cristóvão, durante o juramento da Princesa Isabel de apenas 14 anos... –o Doutor murmurou, incrédulo. –Não pode ser... Eles têm registros nossos até na torre de Pisa!

—E olha aquela gravura do assassinato do presidente Kennedy...!? –Melissa acrescentou com os olhos arregalados. –Aquela garota parece você, Lu! E a outra da esquerda sou eu! Caramba! Somos as únicas com expressão de horror no rosto, antes do assassinato acontecer... E olha só quem está bem no meio da multidão: o Doutor!—Melissa franziu a testa, fitando o rapaz. –Mas você está mesmo em todas, hein? Nunca perde uma festa...—provocou.

—Aquele não sou eu... Aquele no canto sou eu! –e apontou para sua imagem novamente, desta vez de perfil, exposta duas vezes na mesma fotografia.

—Mas isso é impossível! –o dr. Brown se aproximou para analisar. –Como poderia haver dois de você ao mesmo tempo?

—Um deles não era eu... –então o Doutor fitou Luisa e Melissa com um olhar excepcionalmente significativo e tudo ficou claro de repente. –Teselecta.

Mas como?—Melissa pareceu indignada. –Vocês disse que os registros se apagariam! Disse que depois que concertássemos tudo, os estragos e mudanças que a Teselecta causou seriam apagados permanentemente...

—É, mas parece que alguém conseguiu proteger a fotografia contra trotes temporais.

Melissa cruzou os braços e fez um bico.

—Será que dá pra falar nossa língua?

O Doutor revirou os olhos ao que o dr. Brown se ofereceu para explicar.

—Ele quis dizer que alguém desta UNIT e Torchwood conseguiu congelar a imagem contra mudanças temporais, de modo que, apesar da história ter sido restaurada, o fragmento ainda se manteve intacto, aparentemente oculto e fora de alcance para que o tempo consiga restaurá-lo.

Luisa levou a mão á testa.

—Tem alguém monitorando nossas vidas... Há cada minuto! –ela pareceu frustrada. O amigo aproximou-se dela. –Eu pensei que tudo isso fosse nós. Apenas nós três e a TARDIS. Mas na verdade, tudo que somos é notícia para um bando de desocupados que se negam á afirmar a existência de extraterrestres para o restante da população... Francamente, eu me sinto usada!—Luisa amarrou a cara, evitando cruzar com os olhos do amigo.

—Eu sinto muito Luisa... Eu não sabia de nada! Eu juro que jamais imaginei que alguém estivesse nos monitorando... Do contrário, já teria ido tirar satisfação com eles há muito tempo! –ele destacou em sua própria defesa. –E se serve de consolo, eu também me sinto invadido! Todos esses anos de viagens pelo tempo e espaço, sabe-se lá o que eles tem guardado no histórico!—o Doutor receou.

—A verdade pode ser devastadora, Doutor, e até um pouco embaraçosa. Apesar de tudo, se não fosse por essas imagens, eu nunca conseguiria rastreá-los!—prosseguiu Marty, fazendo com que todos encarassem a situação por outro angulo. -Vocês podem ter viajado por pouco tempo juntos, mas mesmo assim há registros de vocês zanzando por aí, Doutor. Imagens claras e esclarecedoras. Um trio. Sempre um trio. Você e mais duas garotas, identificadas claramente pelo sistema como Luisa Parkinson e uma tal de Melissa Riveira. Minha prima. É claro que eu também me espantei ao descobrir que tínhamos parentesco! Como é que eu ia imaginar que teria uma prima no futuro que também viajaria pelo tempo, e que, de tantas garotas no mundo, seria logo Melissa, uma das duas que viajariam com você? -ele acabou rindo da coisa toda. -Parece até herança de família! O fato é que eu até cheguei a pensar que havia alguma espécie de pegadinha no programa... Talvez algum tipo de antivírus telepático de baixo alcance, que estivesse drenando informações da minha cabeça para me pregar uma peça; O doutor me preveniu sobre essa possibilidade. Esse é o tipo de coisa que não se pode ignorar, já que seria possível, de acordo com ele, em algum futuro distante... Mas no final, tudo se comprovou quando encontrei uma imagem de um recorte de jornal, no próprio arquivo, datado de 2050 e, logo em baixo, a foto mais clara de todas, revelando minha futura prima, a melhor amiga dela e um estranho de roupas nada futuristas. Era a deixa que eu precisava para poder encontrá-los...

—Tudo bem pessoal! Já chega de tanta troca de informações... –intrometeu-se Sherlock. –Vamos aos fatos: Foi o senhor, dr. Brown, que criou as plantas carnívoras gigantes... Estou certo?

—De fato, fui eu sim. –o cientista de jaleco unicamente amarelo baixou a cabeça, envergonhado. –E eu lamento por isso. Lamento muito por tudo o que meus experimentos causaram á todos vocês... Mas os Zygons me obrigaram a mexer com a biologia dos espécimes! –o dr. Brown fitou-os um por um, sentindo-se a pior criatura da face da Terra. -Sou um homem de palavra, senhores... E, mais do que isso, um cientista dedicado! Eu seria incapaz de criar uma coisa que pudesse ir contra o desenvolvimento dos seres humanos... Isso soaria quase como sabotar a própria existência!

Por um segundo, todos o encararam com firmeza.

—A gente sabe disso! –o Doutor anunciou de repente, sem mais nem menos, sorrindo e dando-lhe um tapinha no ombro. O cientista suspirou aliviado, enquanto o Doutor inclinou-se sobre o painel de controles do trem, fitando os botões e alavancas de um modo geral. –Uau! Agora isso é chocante! Um trem do século XX sem maquinista, andando sozinho, e mantendo a mesma velocidade o percurso todo... Sem erros, nem aumento da velocidade, sem deslizes sob os trilos... Isso é praticamente um piloto-automático!

Holmes, Watson e John imitaram o Doutor, também estudando o painel cuidadosamente.

—Espero que isso seja alguma coisa boa, porque já estamos carregados até os fios de cabelo de noticias ruins... –comentou Watson.

—Se ao menos algum de nós soubesse conduzir um trem... –resmungou John, apertando um ou dois botões em vão.

—Ah! Claro! Deixem comigo! –o dr. Brown abriu caminho e voltou a se sentar na sua poltrona, clicando alguns botões aleatórios. Mas quando o fez, recebeu uma carga estática tão forte que deixou seus cabelos brancos ainda mais eriçados. –Por Einstein! Essa foi por pouco...

—Ah! Mais é aí que eu entro... –o Doutor foi logo fuçando o painel, mas teve o braço seguro pelo dr. Brown, aflito.

—É inútil continuar com isso... Pode ver por mim mesmo: eu acabei de tentar fazer isso e não funcionou!

—É, mas eu tenho uma pequena vantagem sob o senhor, doutor Brown... –o Doutor anunciou, deixando todos curiosos, então laçou uma piscadela significativa para Alicia. –Meus tênis usam sola de borracha!

—É isso aí, cara! -Alicia comemorou. Então o Doutor ativou todos os botões indicados pelo dr. Brown, com a sola dos sapatos. O plano pareceu funcionar, mas infelizmente, não por completo. Porque agora ele conseguia manusear os controles, mas por outro lado, eles não repercutiam nenhum comando ao trem. Foi perceber, algum tempo depois, que os controles estavam travados.

—Não é como no futuro... –prosseguiu John. -Lá os trens só funcionariam á luz do dia... Já está de noite! Em breve não enxergaremos mais nada...

—E a coisa toda não para por aí... –Holmes interveio. –Ainda temos que impedir os bichos papões gosmentos de destruírem o mundo... Qual o resto do plano?

—Acredito que eles pretendam rastrear as duas máquinas do tempo e depois uni-las em uma coisa só. Após passarem dessa etapa, não precisarão mais de nós...—o dr. Brown fez uma pausa, em que lançou um olhar exasperado para o Doutor. –De uma forma geral, isso significa que eles desligarão o piloto-automático que nos mantém nos trilhos e nos impedem de descarrilar, e sentenciarão nossa morte. –ele fez outra pausa, em que todos ficaram quietos, presos em seus próprios pensamentos. –Só então, executarão seu plano mesquinho e vaidoso, em busca de vingança... Com o poder ilimitado de duas máquinas do tempo, eles poderão devastar o universo sem fazer médios esforços! Se isso de fato ocorrer, todos estarão perdidos... Menos nós, é claro, que já estaremos mortos há muito tempo.

Puxa! Mas que encorajador... –Melissa resmungou. –Que pena que a gente não vive no final, não é? Seria ainda mais dramático!

O Doutor trincou o maxilar.

Agora chega!—ele gritou, ao que todos fitaram-no de imediato. –A GENTE NÃO VAI MORRER AQUI! VOCÊS ME ENTENDERAM? Eu só estou fazendo questão de deixar isso bem claro... Porque nós não vamos nos entregar tão fácil! Nós ainda temos tempo... Somos inteligentes!!! –ele gritou, cutucando a própria testa. -Qual é pessoal? Olha só pra vocês! –o Doutor apontou para todos. –Cada um de vocês... Você: Alicia Lenner. A garota que não sabe o que quer da vida; Holmes e Watson, em mais um dia de trabalho; John e Olívia, com seus conselhos e técnicas teatrais para nos livrar do estresse e do medo; Luisa e Melissa, brilhantes como sempre! Marty e o dr. Brown, incrivelmente humildes, simplesmente focados na causa cientifica e humanitária que nos rodeia... Cada um de vocês tem um motivo especial para estar aqui, nesse momento, nesse instante. É porque vocês têm condição de ajudar! É porque são as pessoas certas nos momentos certos que fazem toda a diferença... –ele fez uma pausa, colocando as mãos nos bolsos e fitando-os com orgulho. -E hoje, nós estamos muito bem equipados! 

Era o que eles precisavam para se convencer de que fariam mesmo aquilo. De que estavam prestes á reverter toda aquela situação e virar de uma vez por todas o tabuleiro do jogo. De repente, todos estavam se entreolhando e sorrindo, satisfeitos com seus feitos, descobertas e evoluções, até agora. Por entre meio, uma voz feminina se manifestou:

—Também temos você –Luisa acrescentou, dando um sorriso amplo de canto de lábios, para o melhor amigo. –Você esqueceu-se de se incluir na contagem vantajosa que temos perante aos Zygons...

Eu?—ele riu, modesto. –Eu sou só um velho bobo... O que você espera de mim?

Ela sorriu abertamente e lhe lançou um olhar sonhador.

—Apenas... Seja incrível.

O Doutor abriu um sorriso torto. Ele também se motivara.

—Já sei o que vamos fazer! –anunciou no mento seguinte, com a corda toda. –Escutem todos! Vamos parar esse trem á moda antiga... –todos se entreolharam e ele sorriu insano. –Vamos por curto no piloto-automático!

Então virou-se de costas, tirou a chave sônica comprometida do bolso e a apontou na direção do painel de controles. Até que para quem estava “quebrada”, ela os auxiliara bastante em pequenas utilizações durante a aventura... A filosofia do Doutor era a mesma de um inventor que testava os limites de seu invento pouco a pouco, dando um pequeno passo de cada vez. Recentemente, ele submetera a chave a pequenos testes simples, como acender luzes, afrouxar amarras e trancar portas. Até então os resultados estavam sendo bem animadores, o que fez o Senhor do Tempo supor que apenas a função de scanner estaria inoperante. Se seus cálculos estivessem corretos, ele não precisaria descartá-la, apenas consertar a função depois e ela ficaria novinha em folha! Porém, naquele momento, ele precisava exigir um pouco mais de sua capacidade, e não sabia se a chave agüentaria o tranco.

—Vamos lá... Não me abandona agora, que eu tô contando com você! –sussurrou para a chave, então respirou fundo e ativou-a. Uma pequena explosão se seguiu e o trem aumentou a velocidade imediatamente, quase como se alguém tivesse enterrado o pé no acelerador. Quando terminou, o Doutor guardou a ferramenta no bolso, radiante de tanta felicidade.

Ah, se eu tô animado!—o rapaz se dirigiu a um espaço abaixo do painel, varrendo os olhos pelas alavancas extras. –Vamos lá! Isso não pode ser mais difícil que dirigir um tanque de guerra...

—Desculpe Doutor, mas acho que talvez eu possa ajudá-lo... –Holmes aproximou-se do painel com sua lupa. –De acordo com as digitais de poeira de carvão deixadas no material, todas as alavancas foram acionadas nesse ultimo dia, exceto uma... –e afastou-se satisfeito.

—Essa aqui. –Watson apontou para a maior alavanca de todas. -Suponho que esse seja o freio...

Trabalho em equipe... Eu gosto do som que isso tem!—o Doutor sorriu, então segurou a maior das alavancas e pendeu o corpo para trás, usando todo seu peso para impulsioná-la ao máximo para o outro extremo, ao mesmo tempo que sua mão agarrou o puxador de uma cordinha que pendia do teto, por coincidência. –E por falar em som... Allons-y! —ele acionou o apito do trem, que soou como um hino de esperança, para eles. –Rá! É isso que eu chamo de apitar o trem! TODO MUNDO SE SEGURA!

Todos tiveram que se segurar quando uma freada brusca direcionou seus corpos para frente. Até a planta carnívora foi pega de surpresa, mas tudo acabou bem. Em pouco tempo, o trem foi desacelerando, até parar por completo.

—Nós conseguimos? Paramos á tempo? –sondou Luisa, erguendo-se ao lado de Dexter.

O dr. Brown ergueu-se do chão e confirmou o relógio de pulso sincronizado com o de Marty.

19:50 da noite, em ponto! —ele comemorou. –O piloto-automático estava marcado para ser desabilitado ás 20:00 horas! Nós conseguimos! —ele abraçou junto de si, Marty e Melissa. -Parece que as coisas finalmente começaram a melhorar... Ao menos nós não fomos de embrulho, com o trem desgovernado!

—É, mas é melhor guardar o champanhe pra mais tarde... Ainda temos que impedir os Zygons de localizarem a TARDIS! –o Doutor anunciou, saltando para a terra firme, do lado de fora do vagão parado.

Todos eles, acompanhados pela planta carnívora dócil, foram correndo até a entrada principal do trem, localizada bem no centro da locomotiva, porém, ela estava trancada. Os Zygons haviam mesmo pensado em tudo...

Santa cascata da Medusa!—exclamou o Doutor, levando as mãos á cabeça. –Paramos o trem com sucesso, mas ficamos trancados do lado de fora! Ai... Perfeito! “Muito bem Doutor! Ótimo plano!”. —ele resmungou consigo mesmo.

—E o que fazemos agora? –perguntou Luisa, ficando aflita ao vê-lo andar de um lado para o outro, com as mãos enganchadas em tufos de cabelos. –Não podemos improvisar? A gente sempre improvisa...

—Não podemos tentar as janelas? –sugeriu Alicia.

—Todas trancadas. –Watson afirmou, ao prensar o ombro contra a veneziana, sem sucesso. –Melhor tentarmos outra coisa... Alguém tem um pé de cabra?

Eu tenho isto!—Holmes tirou um pequeno martelo de dentro do casaco e lascou uma pancada contra o vidro, sem cerimônia, mas esta não proporcionou nada mais que um pequeno trinco superficial. –Não é possível! Mais essa agora... “Fortaleceram o vidro”. Quem é o idiota que usa vidro fortalecido em uma locomotiva?—reclamou Holmes, indignado.

—Os Zygons –Luisa deu de ombros. –Uma idéia tão idiota que chega a ser inteligente... Afinal, nós não conseguimos invadir!

—Já que estamos usando a força, que tal nós tentarmos aquilo ali?—Melissa apontou para duas portinhas pequenas, abaixo da janela mais próxima, indiferente. –Alguém quer arriscar?

Todos se entreolharam, depois fixaram o olhar, todos ao mesmo tempo, no Doutor.

Ah... Tudo bem! Eu vou primeiro. –ele suspirou revirando os olhos, agachou-se e virou de costas para a equipe. –Querem invadir o trem pela entrada do bagageiro? Isso não tem muita dignidade... Não sei quanto á vocês, mas acho que nossa entrada deveria ser um pouco mais espontânea...

—ENTRA LOGO AÍ! –Melissa deu-lhe um empurrão com o pé, arremessando-o para frente. Depois sorriu satisfeita, para a melhor amiga. –Não sabe quanto eu ansiava por esse momento...

Ai!—o Doutor massageou o traseiro, chateado, fitando Melissa penetrantemente. –Da próxima vez, faço questão de que você vá na frente...

Mais nem sonhando, meu bem!—ela riu agachando-se, e apertou-lhe uma das bochechas, contra sua vontade, para provocá-lo. –Chega pra lá que eu sou a próxima...  

Depois desse pequeno contratempo, deslocaram-se pelo depósito de bagagens, até saírem novamente dentro do trem.

—Tudo em ordem? –o Doutor sondou, fitando um por um. –Podemos prosseguir? Holmes? Alicia? Watson? Luisa? John? Melissa? Marty? dr. Brown? Dexter? Olívia? –todos assentiram (até mesmo a planta), todos menos Olívia, que parecia mais pálida do que nunca. –Olívia!?

Ela revirou os olhos e ameaçou desmaiar, mas John logo a segurou, antes que seus joelhos cedessem de vez.

—OLÍVIA! Ah meu Deus, Doutor! O que ela tem? –gritou John, desesperado.

Eu não sei! —o Doutor retorquiu, correndo ao encontro deles e colocando-se em ação. Com uma mão só, colocou os óculos pretos de armação quadrada, enquanto tirava seu estetoscópio do bolso com a outra. –Olívia, fala comigo... Sou eu, o Doutor! Eu preciso que você fique acordada...

Watson também se prontificou na direção deles, na intenção de ajudar o Senhor do Tempo. Olívia se mexeu um pouco, acomodando-se nos braços de John, então finalmente conseguiu fitar Watson e o Doutor, sem a vista embaralhar.

—Fique calma, minha cara... É a única forma de conseguirmos ajudá-la. –consolou-a Watson.

—O que está havendo comigo? –soluçou ela, sem forças.

—Eu ainda não sei, mas eu vou descobrir... Eu prometo! –o Senhor do Tempo disse, determinado. –Seu coração está disparado... Está estranho. O que você fez...? Parece que correu na São Silvestre! —então brincou para descontrair.

—Me dê seu pulso. –pediu Watson. Ele foi sentir sua pulsação, mas ao fazê-lo acabou franzindo o cenho ao máximo. –Espere um instante... –e encostou o indicador no pescoço dela, onde também seria possível sentir pulsação. Acabou por afastar-se indignado. –Mas isso é impossível! Não pode ser verdade...

—O quê? –Holmes deu uma risadinha zombeteira, aproximando-se de seu colega e apoiou a mão no ombro do amigo, cheio de si. –Quer dizer que o “bravo dr. Watson” não consegue encontrar o pulso dessa moça?

Watson fez uma cara de pouco caso.

Seu humor é invejável, sabia?—retrucou o médico, irônico. –Por que não desiste de ser um detetive consultor e pede emprego para o circo?

Holmes gargalhou sonoramente.

—Você é hilário, Watson, mas não perderei meu tempo com tais pensamentos. É obvio que minhas habilidades com equilíbrio e reflexo seriam, no mínimo, incomparáveis para um mero equilibrista, e que eu poderia facilmente tocar violino no alto da corda bamba...

Watson bufou, ajeitando o chapéu coco na cabeça, logo em seguida voltando a fitar o colega, com impaciência.

—Mas eu renunciaria. –terminou Holmes. –Não tenho tempo para desperdiçar. Minha vocação eu já exerço...

Enquanto os dois se cutucavam, o Doutor fez uma segunda checagem, conferindo o diagnóstico inicial de Watson. Acabou por erguer as duas sobrancelhas, com espanto, e morder o lábio, ao contemplar Olívia.

Auh...  

—O que foi? –John adiantou-se. -O que ela tem, Doutor?

—“O que ela não tem”, é sem dúvida uma pergunta muito melhor... –ele acrescentou, inclinando a cabeça de leve, ao fitá-la.

—Como assim? –Olívia arfou, assustada, segurando a mão de John. Watson aproximou-se dela novamente.

—Eu sinto muito, minha querida, mas você não tem pulso. -disse, com delicadeza. –Eu sinto muito, mas você não pode estar viva. Não há como estar, sem ter pulso... E você definitivamente não tem.

—O quê? Mas isso é impossível! –John rebateu.

Enquanto todos focavam em Watson e debatiam que aquela afirmação era, no mínimo, uma loucura completa, o Doutor reparou em uma pequena ferida que ela tinha no braço.

—Isso é besteira! –dizia John, indignado. –Eu conheço seu dia a dia! Ela se alimenta bem... Sempre se exercita! É mais ativa que muita gente... Como podem dizer uma coisa dessas?

—Nenhum de nós duvida disso. –Watson interveio. –O que eu estou tentando dizer, é que ela não tem pulso! Não disse nada sobre não ser saudável...

—Mesmo assim! –John insistiu. –Isso é ridículo! É o diagnóstico mais ridículo que eu já ouvi na minha vida!

—Tem razão -o Doutor comentou, encarando um ponto fixo com a cabeça apoiada na mão, de modo que todos pararam de discutir para prestar atenção nele. –Com pulso ou sem pulso; Sendo saudável ou não; Nada disso explica o porquê está vazando óleo do braço de Olívia, nesse exato instante, ao invés de sangue...

Naquele momento, todos os olhares voltaram-se para ela e, como em um escape, Olívia deixou-se escorregar até o chão, parecendo muito impressionada, e um tanto confusa, com aquilo tudo. Devagar, para não alarmá-la, o Doutor se ajoelhou junto á ela.

—Posso ver? –ele estendeu a mão e ela permitiu que ele examinasse seu braço. –Isso dói?

—Não sinto nada. –ela disse. Lágrimas escorreram de seus olhos. –Por que eu não sinto nada?

—Por que isso não é um corte em uma pele de verdade e isso escorrendo não é sangue. –ele anunciou, cuidadoso para não magoá-la. –Isso é óleo, Olívia. E eu sou um grande idiota. Me desculpe por isso... Eu já deveria ter percebido há muito tempo: Vocês são Cyber-humanóides. Vocês dois. –e lançou um olhar complementar á John Travolta que também pareceu chocado.

—Como assim? O que é um Cyber-humanóide? O que isso significa? –John Travolta ajoelhou-se também, fitando o Doutor, receoso.

—Significa que vocês não são humanos, mas foram criados com o propósito de simbolizarem ícones marcantes da memória dos seres humanos e imortalizá-los... É um jeito de manter as lendas vivas. Assim que foram fabricados, em suas cabeças foram inseridas memórias e lembranças das pessoas que teriam que representar. –ele anunciou, analisando-os com admiração. –Os robôs perfeitos... Com sentimentos, sonhos, planos futuros, energia de sobra para dançar e cantar, aparência humana... Tudo. Inclusive necessidades fisiológicas. Vocês comem e dormem, como pessoas. Choram com lágrimas de verdade. A água dentro de seu corpo não danifica o sistema... Vocês foram feitos para sobreviver á todo tipo de impacto. É claro que ninguém esperaria que vocês fizessem uma viagem turbulenta pelo Hiper-espaço... Isso pegou á todos nós de surpresa. Sem querer, a viagem acabou prejudicando o material que os constitui... –o Doutor constatou, sem pressa, fitando John demoradamente. –Você também tem alguns machucados. Posso ver por algumas manchas escuras na sua roupa. Infelizmente, eles não irão cicatrizar como os nossos...

—O que vai ser de nós agora? –Olívia se pôs a chorar, encostando a cabeça no ombro de John.

—O lado bom é que nenhum dos cortes são profundos... –continuou o Doutor, pensativo, mordiscando a armação do óculos. -Eu poderia arrumar isso com um pouco de solda e as funções que ainda sobraram da minha chave sônica...

—Faria isso? –John sorriu para Olívia e ela fez o mesmo em retorno.

—Sem problemas... –o Doutor assentiu. -Mas vocês teriam que conviver com essas cicatrizes. Isso eu não posso arrumar. Contudo, acho que não faria mal algum tê-las por perto... –ele avaliou. -Sabe? Elas são pequenas, e as pessoas gostam de ver que vocês se esforçam... Digam apenas que se machucaram fazendo um treino de dança, ou qualquer coisa do tipo... Aposto que todos vão se encantar ainda mais por vocês.

John e Olívia sorriram um para o outro.

—Ah! Com certeza! Obrigado Doutor... –John apertou sua mão, sorridente.

—Eu prometo que faço isso assim que tudo tiver acabado... –o Doutor destacou. -Até lá, preciso que vocês dois tomem cuidado para não arranjarem mais lesões... 

—Pode deixar. –Olívia despreocupou-o. –Vamos tomar cuidado...

—Ótimo. –o Doutor sorriu em retorno e dirigiu-se à Watson, ainda parado na mesma posição, pasmo com todas aquelas constatações. –Ah! Watson! Ainda está aqui? Eu havia me esquecido... Bom, já que está presente, será que pode receitar alguma coisa para Olívia não se sentir fraca?

—Ah! Claro! Com prazer... –Watson pareceu acordar de um devaneio e, meio atrapalhado, pôs-se a revirar os bolsos. –Aqui está: Ainda tenho uma cartela de ácidos carboxilos. Tome duas desses á cada hora e ficará completamente renovada. –instruiu, entregando-lhe os comprimidos. Olívia fitou-os por um instante e Watson se viu em posição de esclarecer:  –São vitaminas minha cara. Pode tomar sem receio...

—Olívia precisará de água para engolir os comprimidos. Precisamos de água... –Alicia enfatizou. –Alguém tem água?

—Água em um bagageiro? –o Doutor começou.

—Aqui! Eu achei um copo! –Luisa exclamou, para seu espanto, e foi correndo entregar a água à Olívia. Ao retornar ao seu lugar de partida, percebeu que o Doutor a encarava permanentemente, sem nem se tocar o quanto a estava deixando desconfortável. –Eu fiz alguma coisa errada?

—Não fez não. –ele afirmou.

Ela entrelaçou as mãos, ansiosa.

—Então... Porque está me olhando assim?

O Doutor demorou um tempo para responder.

—Já reparou que quase todas as vezes que precisamos de água, você é sempre a primeira a localizar um copo? –ele desabafou. Luisa riu de nervoso.

—Isso é besteira... –ela massageou a nuca, desviando os olhos. –Deve ser coincidência... Já parou pra pensar nessa possibilidade?

—Só que, julgando pelo fato de que tecnicamente não existem coincidências, a coisa fica um pouco mais complicada... –ele argumentou e ela se calou, sem mais argumentos. –Não me leve á mal, eu acreditarei em você se me disser que nunca desconfiou disso, ou que nunca havia reparado... Não tem problema, já que isso é questão de percepção, mas negar essa evidencia seria pura tolice...

Luisa fitou-o intrigada.

—Eu acho que me lembro de alguma coisa... –então seu cérebro buscou, uma por uma, das vezes em que situações parecidas ocorreram: Na formatura, quando estivera esperando impacientemente pelo ataque dos Slitheens e acabara ficando com sede durante a espera, localizou imediatamente água na mesa dos refrigerantes; no Egito, quando precisavam de água e, misteriosamente vários copos d’água começaram a aparecer ao lado do seu pé; na Índia alternativa, quando ela acordou com vertigem por causa de um sonho, e imediatamente conseguiu encontrar um banheiro para lavar o rosto e tomar banho; Durante o sonho estranho que teve na TARDIS, na parte em que ela e Charles apagavam o fogo do gabinete incendiado onde o Tenente-Coronel fora deixado pelo general Marte, para morrer; Na prisão do Tormento, quando o Doutor foi pego por ele na primeira vez e ela e Adriana trouxeram-no de volta a si jogando um balde de água fria em seus rosto: aquele balde surgira inesperadamente atrás dela após Luisa desejar muito poder acordar o amigo de alguma foram; E agora acontecera de novo, quando sentiu que Olívia precisava de ajuda... Ao analisar tudo que conseguiu se lembrar, em uma breve questão de segundos, era possível se constatar que todas aquelas situações eram completamente distintas, e que não parecia haver uma relação clara entre os ocorridos. Em geral, isso sempre parecia acontecer quando ela se via precisando de água para si ou para ajudar alguém... No entanto, não havia porque esquentar a cabeça com isso agora.

BAMG!

Como se lesse seus pensamentos, a porta do compartimento onde estavam caiu ao chão e os Zygons adentraram no espaço, portando armas.

Que lindo!—riu a senhora Lancaster, abrindo caminho e sendo escoltada por mais dois Zygons. –Brincando de esconde-esconde? Pois agora já chega de correr, Doutor. Vamos! Entregue sua máquina do tempo de uma vez por todas! Você não tem escolha! Está cercado...  

Do fundo do bagageiro, Dexter rosnou para os recém chegados.

—Não faça isso, Doutor! –gritou o dr. Brown. –Não obedeça! Ela vai nos matar assim que você o fizer...

—Muito mais coisas, além de nossas próprias vidas, estarão em risco se eu me render... –o Doutor argumentou, sério. –Já que os Zygons invadiram o sistema da UNIT e da Torchwood, então acho que posso presumir que não estou tratando com principiantes. Sendo assim, nenhum Zygon aqui presente pode se dar ao luxo de ser tão ingênuo: Vocês sabem quem sou eu! Vocês leram meu histórico e registros pessoais... O que faz vocês pensarem que eu serei tolo o bastante para entregar minha TARDIS de mão beijada?

A senhora Lancaster sorriu, pretensiosa:

E o que te faz pensar que nós desistiremos?—então ela endireitou o corpo, adquirindo uma postura mais rígida. –Se for necessário, nós tiraremos sua máquina á força!

Ah-hã! Essa eu quero ver... –ele exclamou, convencido, sustentando meticulosamente o olhar da outra.

Mil coisas se passaram por suas cabeças em meio á tudo aquilo. Mas, foi somente no momento em que ambos os dois pareciam prestes á se fuzilarem com o olhar, á quase meio metro de distancia, que o Doutor abriu um grande sorriso travesso e deu um passo á frente, ainda mais confiante. Deixando todos abismados.

—Tudo bem. Podem levar. –sorriu amigavelmente, revirando o bolso e trazendo a chave prata da TARDIS, em punho. Imediatamente, os olhos da mulher pareceram cintilar.


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Notas finais do capítulo

Pois é, o Doutor é mesmo cheio de surpresas! Ele e a fiel chave sônica dele que parece que reviveu de repente! kkkkk Combinemos que existem coisas que precisam de pressão pra pegarem no tranco ;D

E aí gente, será que entregar a chave da TARDIS aos Zygons é um bom plano?

Bom, semana que vem você vão ficar sabendo, porque será o desfecho da aventura do Expresso! Fiquem ligadoooos!!!




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