Um Horizonte Maior escrita por André Tornado


Capítulo 4
Curiosidade


Notas iniciais do capítulo

“Uma preparação mais cuidadosa estava a ser dada a uma nave particular, num dos cantos de um dos hangares. O enorme vulto de Darth Vader teve dificuldade em instalar-se.”
In A Guerra das Estrelas, LUCAS, George, Publicações Europa-América



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O caça TIE Advanced x1 aterrou suavemente na pista principal do star destroyer e os motores foram imediatamente desligados. A aproximação ordinária e o pouco alarme que aquele feito lançou no pessoal de terra, no pelotão de stormtroopers, no pequeno grupo de pessoal técnico que aguardava para intervir acompanhado dos seus androides astromec não revelava a gravidade daquela situação, nem o perigo subjacente a um movimento mal calculado. Mas quem seguia aos comandos do caça TIE Advanced x1 era aquele que fora considerado, no passado, como um dos melhores pilotos da galáxia e havia a confiança entre o grupo que esperava pela sua chegada de que a aproximação iria correr bem.

Se corresse mal seriam todos presos, acusados de traição e executados.

Assim que se imobilizou na pista, a pequena nave de assalto com um desenho aerodinâmico único, que tinha sido rebocada por um feixe trator para evitar problemas no vetor de aproximação, pois todas as leituras do seu desempenho realizadas remotamente indicavam enormes danos e anomalias irreparáveis, soltou densas nuvens de fumo branco que a engoliram totalmente. Os androides astromec avançaram imediatamente, despejando o conteúdo dos seus extintores sobre a carcaça sobreaquecida. Criou-se uma montanha de espuma branca que começou a escorrer pelo metal, que chiava à medida que ficava mais frio.

O almirante Harish Muitel, comandante supremo da frota Punisher da qual aquele star destroyer fazia parte como navio bandeira, assistia à operação em silêncio, após ter estado numa breve reunião tática onde foi revelado o plano para recuperar o caça TIE Advanced x1 e o seu piloto, sem danos e completamente ileso, respetivamente. De qualquer modo, a sua sobrevivência dependia do sucesso de toda a operação e o almirante estava nervoso. Não o demonstrava, pois era um homem magro e rígido por natureza, controlava habilmente as suas emoções e era parco nas palavras. A sua pose era aquela que os seus oficiais costumavam ver-lhe, costas direitas, ombros tensos, mãos atrás das costas, olhar sombrio sob umas sobrancelhas espessas.

De facto, se a operação corresse mal seriam todos presos, acusados de traição e executados, a começar pelo almirante e ele estava bem consciente dos perigos que corria naquele momento em que observava a intervenção profissional dos homens sob o seu comando.

O pessoal de terra avançou e começaram a colocar andaimes debaixo da estrutura do caça, sustidos por colunas de metal com degraus tubulares que foram de pronto escalados pelos técnicos de manutenção que abriram as portinholas inferiores da nave, ligando vários circuitos às placas computorizadas que manejavam e aos androides astromec que recolhiam os seus extintores. Acenderam-se inúmeras luzes no caça TIE Advanced x1 que de pronto se apagaram com silvos e pequenos estouros.

O tempo parecia suspenso e não se escutavam outros sons naquela pista do que aqueles que o caça emitia, enquanto estava a ser apropriadamente preparado pelo grupo de homens que se afadigava em seu redor.

O momento mais aguardado aconteceu. A rampa que dava acesso ao interior do caça começou a descer aos solavancos, depois de ter sido acionada a partir do exterior. Houve alguma comoção entre os técnicos, um astromec queimou os circuitos e foi afastado com um empurrão brusco. Tentava controlar-se qualquer foco de incêndio. O pelotão de stormtroopers marchou para junto do caça. Os soldados colocaram-se de frente uns para os outros, em duas alas de um homem cada que formaram um corredor.

O almirante Muitel sentiu que as mãos suadas, postas atrás das costas num nó apertado, escorregaram uma na outra. 

O capitão responsável pela operação postou-se junto da rampa, dois técnicos subiram por esta e enfiaram o corpo pelo alçapão aberto. Viam-se apenas as suas pernas à medida que se movimentavam com extremo cuidado dentro da apertada cabina. Parecera que demoraram uma eternidade naquela posição, que estavam a debater-se com alguma impossibilidade física, com um problema insanável. Mas, finalmente, terminaram e afastaram-se, descendo pela rampa apressados.

Outra eternidade se passou.

O caça TIE Advanced x1 estremecia e oscilava. O seu único ocupante, o piloto, preparava-se para sair, abandoná-lo pela derradeira vez depois de esta nave peculiar lhe ter protegido a vida nas profundezas do espaço com aquele abraço claustrofóbico de aço e eletricidade, durante largos dias de solidão.

Então, surgiram umas botas negras que embateram na rampa ao mesmo tempo. Umas pernas, um corpo massivo também negro, uma capa amarrotada, uma cabeça escondida por uma pesada máscara abominável que impunha o respeito e o terror quando soava a sua respiração mecânica.

O almirante Muitel cerrou os dentes, realçando o osso do maxilar debaixo da pele do rosto pálido impecavelmente escanhoado. Desceu da plataforma de onde observava as operações e percorreu o corredor formado pelos stormtroopers fiéis. Postou-se no fim da rampa e fez uma ligeira vénia ao piloto tresmalhado que fora miraculosamente salvo de uma deriva mortal no espaço por uma comunicação fortuita entre star destroyers da sua frota. Darth Vader não respondeu ao cumprimento e seguiu, no seu melhor passo, dadas as circunstâncias que tivera de suportar, pelo corredor dos stormtroopers em direção à saída da pista que se iluminava mais adiante. O almirante acompanhou-o, mantendo as mãos atrás das costas.

— Lorde Vader, é um prazer recebê-lo a bordo. Estimo comprovar que se encontra em condições de saúde satisfatórias. Informo-o, meu senhor, de que apesar de se mostrar na posse plena das suas faculdades físicas, a ala médica encontra-se em alerta e está preparada para recebê-lo.

— Compreendido, almirante Muitel – respondeu Darth Vader na sua voz profunda. – Irei aproveitar essa sua gentileza para recuperar as minhas forças. Foram demasiados dias no espaço. No entanto, aviso-o de que estou ao inteiro dispor do Imperador e que me poderei comunicar com ele logo que este o desejar, mesmo que me encontre na ala médica.

— Muito bem, senhor.

O imponente senhor negro passou pelo dispositivo médico de emergência que aguardava na pista, para qualquer eventualidade. Androides médicos, androides auxiliares, máquinas de suporte à vida, uma cápsula médica equipada com maca confortável, aparelhos de monitorização e medicamentos primários de primeiros socorros. Se o almirante lhe votou um olhar de esguelha, o mesmo não se passou com Darth Vader que ignorou completamente aquela parafernália de aparelhos e instrumentos brancos que se destacavam naquele hangar pelo inusitado da cor.

Se recusou a cápsula médica, não recusou, embora tacitamente, o tratamento médico e aceitou ser transportado num vai-e-vem que abreviaria a distância até à enfermaria. Darth Vader instalou-se no assento do pequeno transportador em forma de cilindro, ao lado de Muitel. Não voltaram a trocar palavra e mantiveram, cada um, as suas posturas irrepreensíveis. O almirante conseguiu perceber o esforço do lorde negro em manter-se consciente e chegou a reparar no tremor das mãos enluvadas, mas não teceu qualquer comentário. A ameaça de serem todos presos, acusados de traição e executados ainda pendia sob a sua cabeça e a dos seus homens. Estava a fazer tudo o que lhe era possível e nos píncaros da perfeição, considerava. A primeira e mais importante etapa fora concluída com sucesso: recuperar o caça TIE Advanced x1 e resgatar o seu piloto. A segunda etapa haveria de conhecer a mesma boa fortuna, recuperar a boa forma física e psicológica do piloto.

Chegados à ala médica, Vader entrou, por fim, na segunda cápsula médica que o esperava e deixou-se abater sobre a maca. A sua respiração cavada prosseguia como habitualmente, pois era controlada pelo computador embutido no fato que envolvia o seu corpo perecível, mas isso não provava que não estivesse a precisar de cuidados intensivos. Chegava até a ser um entrave à atuação dos androides médicos, pois camuflava o real estado do paciente. Por isso, a primeira ação realizada foi ligar um dos androides especialistas ao computador e começar a partir desse ponto.

Muitel assistiu à azáfama que rodeou Vader que se deixara sucumbir às suas fraquezas, agora que as testemunhas do seu abatimento e prostração se tinham reduzido a um punhado de operadores anónimos, a uma impressionante legião de máquinas e ao almirante. Uma situação controlável. O lorde negro estava claramente inconsciente, parecendo desligado, apesar de a sua respiração se manter no mesmo registo cadenciado. Agora era um androide auxiliar que substituía os circuitos vitais computorizados de Vader, compilando inúmeros dados que eram descodificados, analisados, verificados e corrigidos por dois androides médicos, que agiam com rapidez. Tentavam estabilizar o doente, definir as mazelas e aplicar o tratamento mais adequado. O prognóstico era de fadiga e exposição extrema a radiações. O diagnóstico parecia ir um pouco além disso, acrescentando definhamento de músculos e esgotamento mental.

— Quero relatórios pormenorizados a cada hora-padrão – exigiu o almirante ao chefe da equipa médica. – Não pode haver falhas. O Imperador já está ao corrente de que lorde Vader se encontra a bordo deste star destroyer e sob os meus cuidados. Aguardamos a qualquer instante uma comunicação holográfica de Coruscant a indagar sobre o estado de saúde do nosso famoso doente.

— Sim, senhor – respondeu o cirurgião, que apartou por momentos a sua atenção dos androides médicos e das luzes de alarme que se acendiam nos diversos painéis, criando um cenário pouco tranquilizador.

— Confio que a situação não seja tão desesperada como parece.

— Estamos perante um quadro grave, senhor – aquiesceu o cirurgião tentando moderar a sua preocupação –, mas não irrecuperável. Lorde Vader esteve submetido, acredito, a condições muito adversas, mesmo para alguém como ele que é parte cibernético.

— O que me está a querer dizer, cirurgião?

— Estou a querer dizer, senhor, que estamos perante um quadro grave – repetiu. – A recuperação vai ocorrer, mas tudo vai depender, como habitualmente, da reação do paciente à nossa intervenção e da sua força de vontade. Estamos preparados, temos nesta ala médica a mais alta tecnologia em termos de cuidados médicos, mas existe sempre uma probabilidade de rejeição ao tratamento que tornará tudo mais imprevisível. E lorde Vader não é um doente comum. As premissas para lhe dispensar cuidados médicos não são as mesmas que usamos em qualquer humano ou criatura alienígena desta galáxia. Felizmente, tivemos acesso aos registos de Coruscant e estamos em posição de antever qualquer condição menos habitual.

Muitel inspirou fundo, apertando os lábios.

— Falhar não é opção.

— Não, senhor.

A cápsula médica cobriu-se com uma cúpula transparente, selando o doente numa atmosfera pura que o haveria de proteger durante a recuperação. Junto ao corpo inanimado de Vader piscavam luzes, enrolavam-se cabos e outros apêndices metálicos que os androides tinham ligado às máquinas vitais. Apitos e um zumbido persistente enchiam a enfermaria, cujo branco se tornara carregado e sombrio. O almirante deu-se por satisfeito e regressou ao vai-e-vem. Deu ordem para seguirem novamente para a pista de aterragem onde o drama se tinha iniciado.

De facto, falhar não era, de todo, uma opção.

Confiava nas capacidades da equipa médica liderada pelo cirurgião, mas não lhe podia dizer isso ou deitaria tudo a perder. O elogio fácil antes do resultado de uma operação delicada condizia à soberba e ao desleixo, logo, ao desastre. Ele também não era homem de distribuir louvores e aqueles que o serviam conheciam bastante bem a sua rigidez, autoridade e exigência. Temiam, sobretudo, os castigos e as despromoções que ele não hesitava em aplicar. Acreditava, contudo, que teriam mais medo das reações do Imperador que era menos perdulário do que ele e se a sua natural autoridade não fosse suficiente, a menção do nome de Palpatine sê-lo-ia.

Na pista de aterragem, começavam os trabalhos para o desmantelamento do caça inutilizado que parecia ter perdido a alma e a imponência ao ser privado do seu único ocupante, aquele que estivera a conduzi-lo através das estrelas, o piloto Darth Vader. A carcaça já teria arrefecido pois não chiava, a fuselagem enegrecera, parecia até que se tinha contraído e perdido envergadura. Muitel postou-se na plataforma a observar o que acontecia mais abaixo. Não precisava de supervisionar o que ele próprio tinha ordenado, mas entre os desenvolvimentos da ala médica e aqueles da pista de aterragem, os últimos eram seguramente os menos perturbadores.

O TIE Advanced x1 era um protótipo que ainda estava a ser desenvolvido pela companhia Sienar Fleet Systems. O Imperador concordara em fazer testes ao protótipo, recebendo uma pequena flotilha de cinco caças que ficara estacionada na Estrela da Morte, estação espacial que constituía uma potente arma imperial e que servia como símbolo máximo da propaganda de invencibilidade do sistema político que governava atualmente a galáxia. De resto, era uma bandeira aparentemente perfeita. Massiva, indestrutível, com o poder de fogo capaz de destruir um planeta em poucos segundos, dissuasora de qualquer tentativa de levantamento de uma revolução por aplicar uma sentença tão definitiva e avassaladora. A mensagem era clara. Quem ousasse lutar contra o Império Galáctico seria sumariamente destruído.

Mas voltando ao caça, pensou Muitel, organizando o seu raciocínio.

Lorde Vader era um entusiasta do protótipo. Costumava pilotá-lo, testá-lo, explorá-lo, enviava relatórios com alterações e outras melhorias. Ele tinha escutado uma história mirabolante sobre Vader ter conseguido abater uma importante nave da Aliança Rebelde, sozinho, num ataque impossível sem qualquer apoio, esquivando-se entre os caças inimigos enquanto pilotava o protótipo. Desde esse então, Vader tinha-se empenhado no desenvolvimento do TIE Advanced x1 e esperava, contava-se, ter vários esquadrões sob o seu comando quando passasse à produção definitiva.

Naquele momento, a dedicação ao caça tinha-lhe quase custado a vida. Darth Vader estava em coma induzido na ala médica do star destroyer do almirante Harish Muitel por ter desejado tanto ser comandante de uma esquadra de caças TIE Advanced x1.

O que colocou uma grande interrogação na mente do almirante, relacionada com a presença de Vader e do seu caça num local tão remoto da galáxia, em condições tão especiais. O mais provável seria tratar-se de mais um dos habituais testes à funcionalidade da nave de assalto que teria corrido muito mal. Mas também podia haver outra história por detrás daquele evento extraordinário. No fim de contas, a flotilha de caças experimentais estacionava-se na Estrela da Morte.

Não se imaginava a interrogar Darth Vader sobre aquele assunto. Nem sequer concebia tratar Darth Vader como um inimigo imperial, quando este gozava de uma posição privilegiada junto do Imperador Palpatine, considerado um dos seus mais especiais agentes. Mas haveria de lhe ser exigido descobrir a verdade dos acontecimentos.

Muitel desconfiava de que os seus problemas com Coruscant, o sistema capital do Império, apenas tinham começado.

***

O Imperador desejou comunicar-se com o seu fiel servidor uma semana depois do seu resgate. Os relatórios exigidos a cada hora-padrão pelo almirante Muitel provaram ser de muita utilidade, pois desse modo conseguiram manter Palpatine ao corrente da evolução do infame paciente e este nunca exigiu, apesar de Darth Vader se ter colocado prontamente à disposição da vontade imperial, um colóquio enquanto durava a convalescença. Respeitou sempre os conselhos médicos, nunca se insurgiu contra as recomendações de descanso absoluto e de redução de contacto com o exterior da ala médica. Essa atitude não foi estranha, pois era bem conhecida a predileção do tenebroso governante para com o lorde negro.

Vader não estava totalmente recuperado quando recebeu a transmissão holográfica do palácio imperial de Coruscant, mas estava na posse da maioria das suas capacidades físicas e cognitivas. O mais importante, começava a lembrar-se de determinados detalhes e sensações que eram fundamentais debater com o seu mestre.

A Batalha de Yavin estava bem presente nas suas memórias, que ele nunca perdera totalmente depois de ter sofrido privações várias durante o tempo que passou tresmalhado pelo espaço, com o hiperpropulsor do caça TIE avariado e o painel de comunicações em curto-circuito. Para além daquilo que ele tinha efetivamente presenciado, antes e depois de entrar em ação, como comandante de esquadrilha, havia o que ele tinha sentido através da Força e essa impressão não era satisfatória, mesmo quando já se tinha passado uma semana desde que entrara naquela ala médica. Julgara que aquele mal-estar entranhado na parte humana de si próprio e as dores de cabeça se deviam à sua debilidade quando fora resgatado. Mas esses sintomas persistiam e só havia uma explicação possível.

Vader foi com um joelho ao chão, dobrou o pescoço e disse:

— Estou ao teu serviço, meu mestre.

Diante dele, uma plataforma holográfica redonda portátil, colocada na ala médica que fora evacuada para proporcionar a necessária privacidade à conversa que se iria seguir. Estava sozinho numa imaculada sala branca, exibindo o seu respeito e subserviência. Sobre a base da plataforma, a imagem azulada do Imperador Palpatine, velado pelo seu hábito escuro, recebia com um esgar sorridente toda aquela mesura.

— Lorde Vader, é com muita satisfação que comprovo que estás a recuperar a tua forma física e que em breve poderei contar contigo à frente da minha frota estelar.

— O meu corpo é fraco. Estou envergonhado – confirmou Vader sem levantar a máscara para encarar o Imperador. – Nunca esperei que ficasse tão afetado por este acidente sem importância. A minha fraqueza é imperdoável.

— O que suportaste foi um desafio a que poucos sobreviveriam, ou não te deixarias afetar dessa maneira. Mas os nossos inimigos desconhecem o teu imenso poder, que nunca poderão combater ou abater. O lado negro da Força protege-te e fá-lo-á sempre, não o esqueças.

— Nunca me esqueço dessa verdade, mestre.

— Sabes por que razão pedi para falar contigo, ainda que não estejas totalmente recuperado.

— Sei, mestre.

— Existe uma perturbação na Força.

— Senti essa perturbação quando combatia para defender a Estrela da Morte do ataque rebelde, mestre. Um piloto de um X-Wing.

— Deverás descobrir quem era esse piloto. Poderá ser um adversário formidável... Não podemos deixar que desenvolva as suas capacidades ou deixará de ser um alvo fácil. Precisamos de o recrutar para o lado negro antes que perceba que pode escolher a luz.

— Sim, mestre. Descobrirei quem será esse piloto, embora desconfio de que...

— Conta-me as tuas suspeitas.

— Poderá ser o filho de Anakin Skywalker.

— Outro Skywalker?! Pensei que essa linhagem se tinha extinguido com a morte de Anakin pelas tuas mãos, lorde Vader!

Houve uma pausa. Houve uma respiração completa de Darth Vader.

A ira do Imperador fez estremecer o coração de pedra do homem mascarado. Ainda não tinha encarado o seu senhor, nem o faria se não fosse convidado a fazê-lo. Temia os seus poderes negros, aceitava as suas lições profundas que lhe ensinavam a ser, como ele definira, um dos homens mais poderosos da galáxia, que não podia ser combatido ou abatido, o mais temido dos agentes imperiais, apoiado nessa noção mística que era a Força, transmutada no seu lado mais sombrio. Esperava a reprimenda, a incredulidade, a raiva. A curiosidade velada. Esperava tudo isso e, ainda assim, não conseguiu conter o estremecimento.

— Existiram segredos que me foram ocultados – respondeu Darth Vader, sabendo que a desculpa era patética.

— Claramente!

— Não se tratou de uma coincidência eu ter encontrado o velho Kenobi na Estrela da Morte. Ele estava a ajudar os rebeldes e fazia parte do grupo que libertou a princesa de Alderaan. Ele conhecia esses segredos, protegeu-os desde o início, enquanto se isolava num planeta remoto da galáxia, fora do meu alcance. Se existia outro Skywalker... ele sabia-o!

— Estás a querer dizer que provavelmente não o devias ter matado?

— Kenobi e eu tínhamos velhas contas a acertar, não podia esperar mais para saldá-las. Não me arrependo por ter eliminado o meu antigo mestre. Foi um ato necessário para me libertar dos restos inúteis do meu passado. Se Kenobi conhecia esses segredos nunca mos iria revelar, nem sob tortura, nem com a ameaça do lado negro da Força. Sempre foi demasiado... orgulhoso.

— Nesse aspeto do orgulho, Kenobi ensinou-te bem.

— Obrigado, mestre.

A imagem holográfica moveu-se, o Imperador resguardou as mãos ossudas e transparentes nas largas mangas do seu hábito. Sentenciou:

— Deves descobrir rapidamente a identidade do piloto, lorde Vader. O perigo aumentou com a possibilidade... de ser um Skywalker.

— Sim, mestre. Compreendo a tua exigência e partilho contigo da vontade de encerrarmos este mistério.

— Não me agrada esta situação. Lorde Vader, exijo respostas brevemente.

— Sim, mestre.

— Tenho outra preocupação relacionada com a Estrela da Morte, mas iremos debatê-la quando estiveres em Coruscant.

— Quando me esperas na capital imperial, mestre?

— Dou-te mais uma semana. O almirante Muitel deverá trazer-te pessoalmente até Coruscant.

— Compreendido, mestre.

— Desejo-te a continuação de uma excelente recuperação, lorde Vader. Vou precisar de ti nas melhores condições, no máximo do teu poder, no auge da tua ambição. A guerra apenas começou e não desejo que o conflito se alastre a um ponto que deixe de ser controlável... e vencível.

A plataforma holográfica apagou-se. Na sala restou o zumbido elétrico da maquinaria médica, dos diversos androides, dos restos da transmissão importante que tinha acabado de receber.

Darth Vader levantou, por fim, a cabeça, os olhos opacos da sua máscara fixaram o lugar onde estivera a imagem do Imperador. Para além de intrigado com a perturbação na Força, que lançara um estranho alarme na sempre controlada postura de Palpatine, ficara curioso. E ele não gostava da curiosidade. Conduzia a atitudes imprudentes e potencialmente desastrosas.

A sensação fora esmagadora, recordava-se incomodado com a sua permeabilidade àquela insignificância. Seria de menosprezar noutros tempos, quando o Império cravava os seus estandartes em cada sistema da galáxia, conquistando-os um por um. Ele rir-se-ia da insinuação, nem lhe ocuparia um segundo pensamento.

Mas agora, os anos tinham passado. Os anos suficientes para que um filho de Anakin Skywalker tivesse a idade certa...

Recordava-se.

Perseguia os caças rebeldes e derrubava-os, um por um, quando percorriam a trincheira central da estação espacial em busca do ponto fraco daquele magnífico feito da engenharia imperial. A base secreta tinha sido descoberta. Os rebeldes estavam no sistema de Yavin... A base iria ser pulverizada, juntamente com a lua onde se tinha implantado. Num complexo de templos antigos outrora controlados pelos Sith, diziam os relatórios dos serviços de inteligência. A ironia!

Um primeiro grupo de caças rebeldes fora facilmente aniquilado. Veio um segundo grupo, mais três X-Wing. Disparos laser choviam sobre os caças rebeldes que se movimentavam em desespero para atingir o objetivo e escapar à destruição de um rebentamento. Dois asas cobriam o líder. Um caça foi atingido, danificado, desistiu da trincheira. O segundo caça foi derrubado. Os asas estavam fora de combate. Restava o líder.

A Força neste é forte!”.

Depois, o caos. O seu caça TIE Advanced x1 a rodopiar pelo espaço após uma colisão inesperada. Um curto momento de desorientação, inconsciência. Seguiram-se dias de solidão, de uma sensação amarga. A nave avariada, depois de uma utilização indevida do hiperpropulsor. O início daquela dor de cabeça esquisita, do sofrimento físico, da resignação e da revolta, da dúvida e da certeza. Do seu salvamento pelo star destroyer do almirante Harish Muitel.

A perturbação na Força. O piloto do X-Wing que ele precisava de identificar.

Ergueu-se sobre as suas pernas com resolução. Atrás da máscara sentiu-se a endurecer, como couro de bantha. Respirou profundamente, maquinalmente. Cerrou os punhos.

Haveria de descobrir quem era o piloto. Já não suportava aquela dor de cabeça.

E se fosse um Skywalker... Bem, seria outra ironia.


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Notas finais do capítulo

Com este capítulo temos a introdução de Darth Vader, o Imperador Palpatine e o Império Galáctico nesta história. Assim se define a nomenclatura da mesma - ou seja, teremos sempre um conjunto de três capítulos em que veremos o que andam a fazer os rebeldes e depois um quarto capítulo com o ponto de vista do Império.

Imaginei Vader vulnerável depois de ter conseguido escapar da explosão da Estrela da Morte - como vimos no fim do episódio IV - e isso será algo que ele não vai tolerar e haverá sempre alguma raiva contra o almirante Muitel, apesar de o homem o ter salvado.
Temos neste capítulo, portanto, o início da perseguição do Império ao piloto rebelde... que poderá ser um Skywalker.
Recordem-se de que não se sabe de nada do que irá acontecer a partir do episódio V...

Próximo capítulo:
Comunicações alarmantes.