Anais de Tëmallön; Os Livros Sagrados escrita por P B Souza


Capítulo 24
Capítulo 4


Notas iniciais do capítulo

VOLTEI. Tá num vai num vai essa história né!
Mas calma, os capítulos já estão escritos. É só suspense mesmo :)



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Ninsiel, quando garoto, viveu brigando. De esquina em esquina arrumava confusão e quando não, estava roubando algo de alguém.

Vindo de Piserna, ao sul de Alnia-Saed, cresceu em ruas tomadas por milicianos de comunas em constante guerra-civil, de um país anexo do Rei dos Reis, mas nunca realmente parte da Grande Tëmallön. Na sua juventude, conheceu mais de cem governantes, alguns deles governavam por dias antes de serem depostos na melhor das hipóteses. Ninsiel desde cedo aprendeu a não depender da estabilidade de um governo ou uma instituição, fosse qual fosse.

Conforme amadurecia, seus pequenos furtos que iam de comida para pulseiras ou anéis, foram se tornando mais ambiciosos e lentamente engenhosos. Vivendo nas ruas, conheceu os mais baixos dos seres, e juntou-se a quatro gangues antes de fundar a sua própria, que ciclos depois abandonara para provar de um sonho, que foi amargurado.

Nas ruas de Piserna seu nome foi se tornando conhecido, pois era o melhor no que fazia, até mesmo aprendera algumas magias defensivas com um grupo local de refugiados de Konan-Wegron, sua fama logo foi se tornando um problema para as comunas e Ninsiel com seus cada vez mais elaborados esquemas, enriqueceu e montou poderio com uma gangue dentre os milicos mais valentes. Foi quando estabilizava-se como um Lorde, controlando as ruas, o tráfico, o comércio e as próprias comunas, que Ninsiel conheceu um general, e tão depressa partiu para viver um sonho novo, conhecer Onmere e se juntar ao exército do Rei dos Reis.

Vivera até então em uma terra sem lei, livre para roubar o que quisesse, mas essa liberdade vinha com gosto de perdição, servir a mestre nenhum não lhe trazia objetivo algum, e cada esquema de sucesso tinha cada vez menos significado, quanto mais dinheiro conseguia, menos valor o ouro parecia ter. Vivia então como um rei, mas sem nenhum senso de realização. No exército poderia servir a outras causas, poderia servir a um objetivo maior.

Mesmo assim, não durou.

Ninsiel nunca foi um mago ou bruxo, mas aprendera a usar alguns feitiços simples para saber lidar com qualquer situação, das complicadas às simplórias. E seus conhecimentos, ele pensava, seriam de grande valia no exército. Mas então Tëmallön já caia nas mãos da Ordem de Carza com a caça constante aos magos. Ele não era um mago, mas não era tão bem visto como qualquer outro homem seria, chamavam-no de meio-bruxo, maguinho, diziam que era incompetente demais para ser um bruxo de verdade e coisas piores. Por seis ciclos suportou, mas o exército se tornava mais e mais extremista, e mesmo sendo uma força de Tëmallön, parecia servir estritamente aos desígnios da Ordem de Carza. Não lhe servia mais, então os deixou.

Agora Ninsiel era um guerreiro conhecido em todos os cantos, seu nome era como uma lenda, mas todo seu ouro, quando voltou para Piserna, havia sumido. Deixou dezenas de mercenários cuidando de seu império e quando regressou encontrou apenas os restos de uma gangue despedaçada em guerras internas pela liderança. Então sozinho ele viajou Tëmallön, cidade por cidade, reino por reino, nos lugares mais interessantes encontrou as mais exotéricas companhias, mas nenhuma lhe fascinou como Gÿrvanza.

E foi então que tudo mudou.

Alek no começo pensava em Ninsiel como um mercenário e apenas isso, mas depois de ouvir, dia após dia, fragmento por fragmento, a história de Ninsiel, não podia deixar de apreciar o soldado e o homem que ele era. Todos os dias pela manhã treinavam, o chefe da guarda de Gÿrvanza tomará para si pessoalmente a missão de ensinar a arte do combate para os dois; Alek e Tomiam.

Durante seis partes-de-ciclo, duzentos e setenta dias, eles treinaram e após os treinos vinha o descanso. Se sentavam à sombra de uma árvore qualquer nos Jardins de Efreanon, e Ninsiel lhes enchia de histórias, quando ia embora para cuidar da guarda a qual ele liderava, ficavam apenas Tomiam e ele.

Às vezes os dois ainda treinavam magia, mas na maioria dos dias estavam tão cansados que queriam apenas olhar o céu e jogar conversa fora. Nessas ocasiões Tomiam se deitava, apoiava a cabeça nas pernas de Alek e olhava as nuvens por entre as folhas das árvores. Eles então jogavam advinha com a forma das nuvens, e quando não acertava, Alek alterava as próprias nuvens.

O menino era um prodígio na magia do tempo, conseguia controlar o clima quando se esforçava, mas era excepcional no controle dos raios.

Alek, porém, não conseguia aprender muito sobre aquilo, seu Dorrem lhe ensinava sobre o som e sobre o corpo humano, e depois das manhãs com espadas e as tardes de contemplação, as noites eram de estudos. Assim passaram tanto tempo que acostumaram-se, e as dores dos primeiros dias se tornaram fracas até sumirem, as cicatrizes se reforçaram até marcarem a pele e a habilidade dos dois melhorava consideravelmente.

— Pula. — Ninsiel disse.

Alek o fez, Tomiam passou a lança por baixo dos pés de Alek, teria o derrubado se não tivesse pulado. Então rolou e tentou esporá-lo, mas falhou porque Alek esquivou-se para a direita, segurando a lança pelo cabo. Com sua espada deslizando pela madeira, teria beliscado os dedos de Tomiam, que viu-se obrigado a soltar a lança e partir para as mãos.

Alek então recuou, entrando em posição de defesa, mas era péssimo para combate corpo-a-corpo, esquivou do primeiro soco, mas o segundo lhe atingiu em cheio na boca do estomago. Reclinou-se e Tomiam agarrou-o pela cintura, puxando-o do chão com um impulso que ele reconheceu; magia. E os dois caíram. Tomiam por cima.

As mãos de Alek estavam fechadas, ergueu os dois braços protegendo seu rosto, mas Tomiam focou nas costelas. Foi um soco de cada lado, e então Alek, com os braços protegendo o rosto, desceu-os como uma torrente de raiva. Uma onde varreu o gramado e Tomiam, jogando-o para trás, enquanto Alek se colocava de pé.

Faíscas saiam dos pés de Tomiam conforme ele se levantava.

— Espadas e lanças hoje. Nada de magia. — Ninsiel bradou para os dois.

Alek abaixou a guarda, arfando, e Tomiam esticou o braço para o chão, uma torrente elétrica correu pelos seus dedos em faíscas flamejantes, que atingiram o chão, chamuscando a grama.

— Sabe que ia perder.

— Só porque não é corajoso o bastante para me enfrentar só na espada. — Alek disse indo até Tomiam, os dois colidiram os ombros andando colados.

— Eu sou um mago, não é justo usarmos só a espada! — Ele sorriu, então apontou para a própria espada, jogada no chão quando fora desarmado antes de pegar a lança. — Eu estava estudando condutividade no Dorrem, e olha o que aprendi a fazer.

Alek e Ninsiel olharam para a espada, há quatro metros deles.

Riscos azulados percorreram o cabo à lâmina, e a espada, então parada, saltou do chão como se puxada por uma corda, e voou na direção de Tomiam. Alek ergueu o punho fechado no mesmo instante, e uma bolha sonora explodiu se expandindo além deles, com um som oco como um berro debaixo d’água, a onda sonora empurrou a espada para o lado, passando ao lado da cabeça de Tomiam e caindo no chão atrás dele.

— Com um pouco de aperfeiçoamento...

— Quase se matou! — Alek interveio. — Aperfeiçoe mirando no Ninsiel, assim teremos as manhãs livres para dormir.

Disse, rindo. E Tomiam sorriu também.

Então um criado veio de dentro da casa, pedindo licença por interromper os três.

— Senhor Dalahar, tem uma moça querendo falar com o senhor.

— Que moça? — Tomiam perguntou olhando para Alek.

— Não disse o nome, senhor, apenas que era urgente, ela está encapuzada, mesmo estando um sol quente, não parece boa sujeita, se quiser que mande os guardas...

— Eu já vou. — Alek respondeu prontamente. Kaedra. Lembrou-se da mulher como se lembrasse de uma memória feliz, mas todos os momentos na cadeia foram de terror. Quando olhou para trás, Ninsiel e Tomiam pareciam reprovar sua ação. Tomiam em especial parecia odiar. — Eu sei quem é!

Sabia que ela voltaria uma hora ou outra. Saiu correndo para a casa, atravessou a soleira e os corredores. Gÿrvanza estava fora, como de costume, em suas reuniões e negociações. O criado aguardava-o na porta de entrada, assim que viu Alek, começou a se retirar.

— Obrigado. — Agradeceu, puxando a porta, e então deparou-se com um rosto familiar. Não é Kaedra. — Lady Skylar. — Suspirou. Não esperava voltar a vê-la... havia feita a proposta, mas não esperava que ela aceitasse. Se ama o que faz, pararia de fazê-lo? Perguntou-se, lembrando da magia, lembrando do que seu pai lhe disse a vida toda, e pensando se ele estava se tornando uma pessoa ruim, se as trevas surgiam daqueles treinos diários.

— Você está bem? — Ela quem perguntou.

Alek começara a divagar, e então retornou à realidade.

— Pois sim, eu só... Estava longe, pensando no meu pai. — Disse, honesto.

— Só estava passando, pensei em parar... Eu fiquei pensando no que você disse. — Ela começou então. Olhou para os lados e com uma expressão assustada continuou, falando baixo; — às vezes coisas estranhas acontecem, coisas que eu não sei explicar como aconteceram. Meu tio era um bruxo, e a família toda sofreu com o tratamento até ele morrer.

— Esses tratamentos...

— Hoje em dia é diferente, sabe. — Ela interrompeu Alek. Ele continuaria falando, mas viu-se abraçado pela sutileza da voz, pelo charme de Lady Skylar. Quando ela falava, todos se calavam. — Ouvi dizer que sequer sentimos dor. É uma saída se entregar. A magia causa problemas sempre que ficamos negando, então eu pensei, você estava certo, eu precisava assumir para mim mesma, só assim posso começar a tratar...

— Perdão, eu... Não foi isso que quis dizer. Ou melhor, você precisava assumir para si mesma, mas não é uma doença. — Alek interveio. — Não há tratamento, aquilo é castração e aquilo sim causa doenças. Nosso corpo interage com o Véu, é de onde vem à verdadeira magia. Não somos diferentes, apenas somos receptáculos, podemos receber e usar essa energia como bem entendermos. Nascemos assim, e se você isola isso, tudo piora. O véu continua tentando invadir seu corpo, todo dia, e daí o sofrimento que a castração dos Carza trás, a dor é por causa disso! E assim acontece os desastres, quando o corpo não aguentar mais ou ele explode pra fora e você causa uma destruição enorme, ou explode pra dentro e você acaba se matando. Não há cura, porque não é doença!

— Se eu não fizer isso, eu sinto que está crescendo dentro de mim. Eu não quero isso, nunca pedi por isso!

— Se começar a castração vai perder sua magia, Lady Skylar. — Alek apontou para a garganta dela. — Você nunca mais cantará, e como pode viver sem fazer o que ama?

Nisso um casal surgiu pela esquina da propriedade, vido pela calçada na direção deles.

— Se eu não fizer outros descobrirão, assim como você descobriu. — Ela disse, agora arisca. — E os Carza não perdoarão se souberem disso, dirão que usei a voz para conseguir ludibriar os homens.

E foi o que fez, talvez sem saber, mas com toda certeza fez. As canções afetavam a todos, até mesmo Alek. Ele mesmo sabendo que era um truque, caia, esse era o poder de Lady Skylar.

— Veio pedir autorização para se mutilar. — Alek concluiu. — Ou para tentar encontrar razão que a fizesse desistir dessa ideia estúpida?

— Você não está ajudando. — Ela olhou para o casal, cada passo mais próximo.

— Fique, Mestre Gÿrvanza poderá explicar melhor. Ele vai te fazer entender... É o que queremos; juntar os magos, precisamos nos unir...

— Vir aqui foi um erro. — Ela disse então, recuou um passo.

Alek olhou para ela, esticando a mão.

O casal cada vez mais próximo.

— Pense a respeito. — Pediu, vendo que ela iria embora.

— Não conte a ninguém. — Ela retrucou, e com seu medo comum, se virou e saiu andando como se fugisse de tudo e de todos, mas mais que isso, fugia de si mesma.

Alek então entrou. Fechou a porta atrás de si.

Tomiam estava no hall, na outra extremidade.

— Não era Kaedra.

— Não...

— O que ela queria aqui?

Alek abaixou a cabeça, pensou um pouco. Sabia a importância dos segredos, e aquele era a única coisa que lhe dava algum mérito com Skylar.

— Não disse. Falou que foi um erro vir aqui.

Tomiam tinha os braços cruzados e uma expressão ranzinza. Alek não entendeu o motivo, mas ele encerrou com a voz grossa;

— Nisso ela esta correta! — Se virou e deixou-o sozinho no Hall.


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Notas finais do capítulo

Ok, os próximos capítulos podem começar a dividir águas... a história finalmente ~e dessa vez é sério~ vai começar a engrossar. Os plots vão se revelar... é esse o momento. O tempo passou, o nosso herói já aprendeu o que precisava ~ou quase isso~ e agora, como diria O Coisa no filme do Quarteto Fantastico; Tá na Hora do Pau!!!!
Até o próximo :D



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