Nemuru - Desperta-me escrita por Candle Light


Capítulo 24
Possibility 可能性


Notas iniciais do capítulo

Oi gente!
Esse capítulo tava programado pra semana passada mas bem...o Museu Nacional pegou fogo e eu trabalho lá. Foi uma semana de muita dor, muito luto, amigos meus perderam pesquisas inteiras, professores perderam trabalhos de 30 anos. Já chorei, ja fui me despedir de uma das minhas casas nos últimos 3 anos. Agora é bola pra frente.

E aqui vai o capítulo 24, podendo conter uns erros por conta de tudo de emocional bugado.

Beijos da tia, até a próxima



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Até que o feriadão passou rápido e eu logo estava no avião voltando para casa. Mandei mensagem para Marina dizendo que tinha comprado uns doces japoneses esquisitos para ela provar e ela ficou animada. Sorri. Eu sentia falta de falar com ela, de conversarmos de noite e sairmos. Bem, provavelmente nos veríamos na faculdade no dia seguinte.

Minha mãe me buscou no aeroporto e pouco conversamos no caminho, até porque queria evitar falar da empresa e coisas relacionadas a ela. Chegando em casa fui recebida pelo meu gato, de quem senti saudade também. Era engraçado como eu me acostumara com Gateau dormindo nos meus pés. Senti falta do peso e do calor dele na minha perna nos últimos dias. Abracei e apertei o gato até ele reclamar, e então o soltei, indo deixar minha bolsa no quarto.

Sem muito o que fazer, coloquei música e fui desenhar algo. Fazia algum tempo, mas rapidamente entrei no modo pintura e minha mão corria quase automaticamente com o lápis pelo papel. Os traços deram origem a um nascer do sol sobre o mar, com um morro ao fundo e uma silhueta feminina solitária caminhando na areia banhada pelas ondas. Aquilo lembrou o dia em que desenhei Marina tocando na praia, e abri uma das minhas gavetas para procurar o desenho.

Achei primeiro um retrato que fiz dela de cabeça. Não estava totalmente finalizado, ainda com a sombra clara de linhas de guia que eu tinha mal apagado, mas segurei o desenho por alguns minutos, olhando como eu tinha conseguido chegar bastante perto do real. Seu olhar ali era misterioso como quando ela ficava quieta olhando para um ponto no além. No entanto ali ela olhava diretamente para mim por debaixo dos cílios longos, a franja caindo parcialmente pelo rosto. Toquei o desenho com a ponta dos dedos...era quase como se eu pudesse sentir a sua presença. Se eu fechasse os olhos conseguia lembrar perfeitamente da sua voz. Uma sensação no fundo do estômago me tirou daquilo. “Que porra, Nemuru.”

Passei a mão no rosto, um tanto perturbada. Meu coração estava um pouco acelerado e parecia pesado no peito. Aquela sensação no estômago não tinha passado. Ansiedade?

Guardei o desenho e troquei de música. Passei sem ver e caiu em I Kissed a Girl da Katy Perry.

AAAAAAAAA

Dei um soco na mesa.

Não era possível, o universo não estava me ajudando no momento. Tirei os fones rapidamente, mas o estrago estava feito. Me peguei pensando na letra e concordando com ela! Bati algumas vezes com a testa na mesa e fiquei la por alguns segundos.

“Foda-se tudo isso, eu vou dormir”, pensei.

É, esse era meu jeito de lidar com problemas.

 

******

 

No dia seguinte, segunda-feira, apesar do que aconteceu na noite anterior levei as coisas que comprei para Marina para a faculdade, esperando encontrá-la na hora do almoço no Jardim, como sempre. Eu estava ansiosa. Desde a noite anterior, toda vez em que pensava em vê-la eu ficava assim. Que merda.

Mandei-lhe uma mensagem dizendo que a esperaria no lugar de sempre e assim o fiz pós almoço. Sentei um tanto inquieta enquanto esperava, sem nem conseguir o foco para desenhar algo no meu bloco. Que merda, por quê diabos eu estava daquela forma?

Ela estava demorando e minha inquietação só crescia. “Será que ela não vem?” Eu pensava. Tentei pensar em qualquer outra coisa e olhei para cima - observar o céu, ou no caso a copa da árvore, geralmente me acalmava.

Funcionou até, e resolvi deitar e respirar fundo algumas vezes, sentindo a sensação desvanecer até que eu não prestasse mais atenção nela.

—Nemu!

Meu esforço estilhaçou naquele segundo. Meu coração pulou de susto quase dolorosamente e meu estômago pareceu ter virado ao contrário. Levantei de um pulo, quase chutando Marina na barriga quando estiquei as pernas dando impulso pra sentar.

—Wow, calma lá - Ela riu, desviando da minha perna - Te assustei? Foi mal.

Seu sorriso era iluminado e daquele jeito sempre pra cima. Usava um cardigã cinza por cima de uma blusa branca com coisas escritas e shorts, carregando o sempre fiel violino no ombro. Estava mais bonita do que eu lembrava.

Ah merda

O susto bugou um pouco minhas reações mas consegui lhe dar um sorriso e um “oi" antes que ficasse esquisito.

— Como foi la? - perguntei

—Foi legal. - ela disse, dando de ombros e colocando a caixa de instrumento no chão - Tentamos ir em todas as praias mesmo com chuva, mas não deu tempo de fazer tudo. De noite bebíamos, jogávamos jogos...essas coisas.

Acenei com a cabeça, sorrindo. Internamente queria ter estado la também.

—E você?

— Ah, nada demais -respondi - Meu pai me levou na empresa de novo, andamos pela cidade, fui na Liberdade...o que me lembra!

Abri minha mochila e tirei uma sacola que eu preparara com as coisas japonesas para ela provar.

— Suas comidas estranhas pra provar.

Ela pegou o pacote com um sorriso e começou a revirar o que tinha dentro.

— O que é isto?

—Lula desidratada.

Ela franziu o cenho numa cara de “mas que porra" muito ótima que eu não pude deixar de rir.

— Preciso provar esse troço - Ela disse abrindo o pacote e tirando uma lula, que na verdade parecia mais um pedaço de casca de árvore. Deu uma cheirada e finalmente, com um dar de ombros, mordeu um pequeno pedaço. - Mano, isso é muito estranho. Não sei se eu gostei ou não.

Eu ri, divertida. Não esperava que ela gostasse de qualquer forma, queria mais era ver a cara dela

—ﹰTem outras coisas. Te trouxe mochi e um biscoito coberto de chocolate famoso em animes, o Pocky.

—Esse parece mais o meu negócio. Por quê é famoso em animes?

Senti um rubor subir pela minha coluna até meu rosto. Foi impossível esconder e ela percebendo, me lançou uma cara ainda mais intrigada e provocativa.

—Bem…  - engoli em seco - Eles usam pra fazer um jogo de aposta que geralmente serve pra beijar a outra pessoa.

Ela ergueu uma sobrancelha e ficou sem reação

—Não que seja uma indireta!

Apressei-me em completar. Ela finalmente riu.

—Talvez eu guarde para usar dessa forma. - disse, completando com uma piscada. - Obrigada por lembrar de mim.

Meu sorriso aumentou nesse momento, uma onda de felicidade me atingindo.

— Ah - ela fez, lembrando de algo e remexendo em sua bolsa - Aqui. Eu vi isso numa loja e achei que gostaria.

Ela me estendeu um chaveiro onde pendurava-se uma paleta de pintor com pincéis e tubos de tinta de metal. Era uma coisa tão simples mas meu coração quase parou e pareceu esquentar de felicidade. Ela tinha lembrado de mim também! Minha expressão devia estar perplexa, mas logo depois se transformou num enorme sorriso.

Marina sorriu também, levando a mão ao cabelo, como se estivesse embaraçada. Isso era realmente...fofo(?)

—Obrigada. - eu disse com toda a sinceridade dentro de mim. Ela me sorriu de volta, tirando a mão do cabelo que ela tinha bagunçado um pouco.

—Então...quer ir na Mureta depois das aulas? Vai uma galera pra lá.

—Tá bom - eu disse acenando a cabeça.

—Te vejo lá então. - ela disse, colocando o violino de volta no ombro. Tão já? - mas agora preciso ir. Tenho um ensaio agora antes da aula.

Nos acenamos uma despedida e observei-a desaparecer no corredor do centro de Artes. Respirei fundo e olhei meu novo chaveiro. Era bonito,colorido e simples. Eu realmente precisava de um novo para pôr minhas chaves. O atual era um ratinho de couro que parecia ter passado por uma lixa de tão acabadinho e puído coitado.

 

***

 

No fim das aulas, reuní minhas coisas para ir para a mureta.

—Com pressa, Nemu? - Jessica falou por trás de mim.

—Ah, não exatamente. Marina me chamou pra ir na Mureta com um pessoal. Quer vir?

—Marina? - ela levantou uma sobrancelha - É aquela sua amiga que mora no Jardim Botânico?

—É, por quê?

Ela me olhou com travessura.

—Que foi? - perguntei sem entender sua expressão.

—Nada. Entendi sua pressa.Vai lá Nemu.

—Você vem? - eu disse, com muitos pontos de interrogação na testa.

—Não - ela sorriu - Melhor você ir sozinha.

Ela se foi e dei de ombros. “Que foi isso?” me perguntei. Será possível que Jessica estava ficando igual Nicole? Duas no meu pé era demais.

De qualquer forma, eu precisava ir.

 

A Mureta estava bem cheia. Um mar de pessoas sentadas e em pé se acumulava próximo ao guarda corpo de pedra. Passei os olhos por elas procurando um rosto conhecido. Lá no meio, vi Marina e acenei. Meu estômago se contorceu bizarramente, talvez por antecipação. Eu era um tanto ansiosa afinal.

Ela esticou o pescoço para me ver melhor e acenou de volta, chamando para me juntar a eles. Olhei as pessoas em volta e reconheci os meninos da foto e uma das meninas, a de cabelo curto.

—Nemu! Chega aí. Estes são Felipe e Bruno, meus amigos que foram para Búzios também - ela disse indicando os dois meninos. Felipe tinha pele escura e cabelo bem cacheado, um black e Bruno parecia um cara bem padrãozinho, cabelo liso, castanho e uma barba por fazer. Cumprimentei-os de forma cordial, embora ficasse meio desconfortável com pessoas novas . Bruno me ofereceu a cerveja que eles estavam dividindo e aceitei mais por educação já que não gosto tanto assim.

O fim de dia estava muito bonito - o mar e os barcos placidamente flutuando na enseada, observei. Nunca deixava de fazê-lo, o que me deixava mais calma. As ondas ritmadas, a maresia. Eu estava de pé ao lado de Marina que conversava animadamente com as outras pessoas - eu por outro lado, estava meio deslocada. Minha atenção acabou se voltando para ela, observando como ela socializava, sempre sorridente e brincando, as vezes empurrando de forma brincalhona um dos meninos.As vezes percebia um leve olhar para mim, como se certificando que eu estava bem.

—E você Nemuru? - o menino Felipe perguntou, parecendo de repente querer me incluir. Do que eles estavam falando? Eu não estava prestando atenção fazia algum tempo. Voltei a mim de sopetão, caindo de paraquedas na conversa

—O quê?

—De que tipo de pessoa você gosta?

—Que tipo de pergunta é essa? - inquiri, sem entender o que eles queriam dizer.

—Ah, você sabe. Físico, personalidade, homens, mulheres...essas coisas. Aqui parece que todos gostamos de mulheres. - Bruno riu, o padrãozinho. - Embora eu ache que a Marina aqui seja um enorme desperdício.

Fiquei sem reação e não soube o que responder, mas fiquei com uma enorme vontade de retrucar aquela afirmação de desperdício. Mas não foi necessário, Marina sabia responder muito bem.

— Desperdício é você, um cara tão bonito falar essas merda que tu fala.

— UI!

Doeu até em mim de forma que não pude deixar de rir e levantei minha mão para um hi five. Mas em vez de bater a palma na minha, Marina pareceu fascinada com o gesto, olhando longamente para minha mão e devagar levantou a própria e tocou a minha, primeiro as pontas dos dedos e depois o resto da mão, muito de leve.

Meu sorriso se desfez e meu olhar prendeu-se em nossas mãos. O toque pareceu mandar eletricidade desde a ponta dos dedos até a nuca, arrepiando meus pelos. Eu sentia perfeitamente a temperatura da sua pele e parecia quase queimar. Sentia como se cada célula da ponta dos meus dedos encontravam as dela e eu tinha noção de cada uma. Meu coração acelerou e aquela sensação no estômago voltou com força total, a respiração travou, meu corpo todo travou, como quando dá tela azul no Windows e você tem que reiniciar o sistema. Engoli com toda a força o desejo de segurar sua mão, estender o toque, sentir aquela pele quente, saber como era.

Tão de surpresa como o gesto começara, ele também acabou. Marina desviou os olhos e tirou sua mão, voltando os olhos para baixo com um sorriso tímido e envergonhado. Os meninos olhavam dela para mim sem parar, sem saber que raios foi aquilo. Não os culpava. Eu também não fazia a menor ideia. Recolhi minha mão, piscando para voltar ao tempo real, voltar a funcionar normalmente.

O assunto morreu totalmente, e Marina, como se nada tivesse acontecido, puxou um assunto aleatório qualquer, sobre música. Tentei voltar à conversa, mas foi inútil. Dei uma desculpa qualquer para sair dali, era melhor ir para casa. Me despedi de todos e fui para o ponto de ônibus o mais rápido possível para não ser estranho.

Chegando em casa larguei tudo e fui pro banho, meu lugar favorito para pensar. O que foi aquilo? Que diabo foi aquilo?

Olhei minha mão e quase ainda podia sentir as pontas dos dedos da Marina nos meus.Novamente meu estômago parecia que queria dar uma cambalhota e respirei fundo, soltando pela boca lentamente. O que tinha acontecido ali? Foi algo que eu nunca tinha sentido, nunca tinha experienciado.Encostei a testa na parede, tentando encontrar meu centro, mas ele estava perdido em algum lugar no meio daquele redemoinho de coisas dentro de mim. Saí do banho e encontrei meu desenho ainda em cima da mesa - eu não tinha guardado. Marina me olhava daquela folha de papel, misteriosa. Me senti ansiosa. Quase inconscientemente toquei o papel e me senti idiota. O que eu estava fazendo? O que era aquilo que eu estava sentindo? Que porra! Um único toque diferente daquela garota parecia que tinha me quebrado. Que tipo de poder é esse?

Sentei na cama passando as mãos no rosto.

Aquele sentimento ainda sem nome na minha boca, ainda meio disforme só me trazia o pensamento de que isso significava problema.

Dos grandes.


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Notas finais do capítulo

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