Nemuru - Desperta-me escrita por Candle Light


Capítulo 22
Truthseeker 真実の探求者


Notas iniciais do capítulo

Olá pessoal! Alguns bloqueios aqui e ali mas estamos de volta com a programação normal.
Aproveitem e boa leitura!



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Olhei para fora e percebi num sobressalto que já estava bem escuro.

—Cacete, que horas são? -perguntei já preparada para levantar.

—São...18:30. - Marina me respondeu olhando o relógio na parede. A hora tinha voado enquanto conversávamos e víamos séries para discutir.  De qualquer forma ainda bem que não estava tarde para que eu precisasse sair correndo. - Sua mãe deve estar te procurando, não?

—Ah não, ainda não está tão tarde pra isso. Ela vai se preocupar a partir de umas oito e meia. E daqui é fácil de voltar de….

Ah merda. Pensei quando lembrei que tinha vindo de BICICLETA.

—Que foi? - Marina perguntou quando eu paralisei e coloquei a mão no rosto com raiva de mim mesma por ter esquecido desse detalhe.

—Eu ‘tô de bicicleta. Tinha esquecido.

Ela fez um “a” e depois disse:

—Melhor você ir então. Já está escuro e depois que aquele cara foi morto de bicicleta na Lagoa eu fico preocupada num geral por passar la.

—Eu vou rápido - eu disse, dando-lhe um sorriso confiante, ao que ela assentiu.

Recolhi minhas coisas e Marina me levou até a porta.

—Cuidado na rua e me avisa quando chegar, ‘tá?

—Tudo bem.- eu disse acenando e me dirigindo para a escada. Desci sorrindo satisfeita com meu dia, mas também achando estranho que Marina se despediu de mim assim de longe. Geralmente dávamos um abracinho de despedida, não só um tchauzinho. Dei de ombros. Provavelmente era porque peguei as coisas meio apressada.

***

 

Eu realmente pedalei rápido. O ar da noite estava bem gelado, ainda mais à beira da água. Na verdade o lugar não ficava realmente vazio, tinha muita gente que ia fazer exercício pós trabalho então até umas nove horas eu podia contar com algum movimento na rua.Passei voando pelo clube Paquetá e desci desembestada a ladeira do heliponto. Ir rápido cansava e logo fiquei com calor. MAs ainda não deixava de observar a paisagem porque sempre me fazia refletir sobre algo e me dar novas ideias e perspectivas

Em meia hora eu estava em casa. Entrei, um tanto ofegante e deixei minha mochila no quarto.Peguei o celular para avisar Marina e vi que tinham novas mensagens da Nicole.

E aí? Como foi lá?

E aí o que? Foi legal. Que tipo de pergunta é essa?  

Respondi já meio cabreira. Nicole não perguntava casualmente como foi na casa de um amigo. Ela com certeza só estava perguntando pra saber se rolou alguma coisa. O que obviamente que não porque ela era maluca. Poucos segundos depois de eu mandar a mensagem os dois tracinhos do verificador ficaram azuis.

Você sabe do que eu to falando, sua sonsa.

Rolei os olhos com irritação.

Que saco Nicole, para de ficar inventando coisa onde não tem.

Quando você notar que eu estou certa eu quero que você me diga com todas as letras: Nicole, você estava certa.

Joguei o celular na cama com irritação sem responder. Resolvi tomar um banho quentinho e deixar minha amiga pentelha para lá por enquanto. Depois do meu banho resolvi jogar videogame e minha mãe também chegava.

—Oi filha! Onde você estava?

—Fui com a Nicole e a Marina no Parque Lage, depois fiquei na casa da Marina vendo filme.

—Marina é nova. Da faculdade? - ela perguntou, sentando no sofá ao meu lado e tirando os tênis de corrida enquanto eu ligava o Mortal Kombat.

—Aham.

—Hmm - minha mãe fez, apoiando o braço no encosto do sofá virada para mim - E o que mais?

—Jesus mãe, você quer a biografia completa da menina?

—Não Nemu, eu só gosto de saber quem são os seus amigos pra quando você me contar as histórias eu ter algum contexto dos personagens.

Ela sorriu. Que dissimulada! Sabia que ela estava sendo curiosa. Eu sorri também, isso não me incomodava geralmente.

— Ela faz Música… - mordi a língua quase falando que eu fazia artes. - Toca violino entre outros instrumentos. Mora no jardim Botânico, sozinha. Os pais moram em Niterói e ajudam ela a morar aqui por causa da faculdade. E… sei lá - pensei no que mais falar, já um tanto engrenada no assunto -Ela é bonita, muito bonita. De ascendência árabe.

Minha mãe sorria e eu percebi que eu também sorria. Por quê que eu estava sorrindo assim? Uh, isso foi uma cena um tanto estranha.

—Ela parece ser uma ótima pessoa. Bem - ela disse se levantando - Vou deixar você aí com o seu jogo enquanto eu vejo o que tem para comermos.

No final minha mãe ficou com preguiça de fazer comida e pediu pizza para nós, coisa que eu não reclamei em momento algum. Adorava quando o jantar era pizza. Depois, ja alimentada e confortável em minha calça de moletom e uma blusa maior que eu, troquei de jogo e coloquei God of War. Era bem brutal, mas a história era muito boa, a mitologia e tudo o mais.

Meu fim de sábado foi bem normal, e antes de dormir dei uma olhada nos rascunhos que eu tinha feito no Parque Lage. O último já quase estava pronto, faltavam apenas alguns sombreamentos e detalhes. A água era a pior parte de fazer, mas estava quase finalizada também, juntamente com Marina na beira do lago, sentada.

Meu celular vibrou e era Nicole, mas dessa vez mandando fotos do dia de hoje. Em uma delas eu e Marina estávamos lado a lado numa das estradas, eu olhava para cima falando algo sobre as copas das árvores provavelmente e ela olhava para mim. Embaixo Nicole dizia “Essa foto não te diz nada não?”

Rolei os olhos e respondi:

Não, Nicole.”

“Nemu, você é mesmo muito cega”

Olhei a foto de novo, mas não vi nada do que Nicole pudesse estar vendo. Eu olhava para cima, Marina olhava para mim com um sorriso sutil, as mãos nos bolsos. Nada demais. Resolvi ignorá-la mais uma vez.

Marina havia me respondido também quando disse que tinha chegado em casa com todas as minhas partes.

“Que bom! Uma pena que você foi embora, ‘tô fazendo uma maratona terror aqui”

“Credo, então que bom que fui embora”

Ela mandou uma carinha rindo e continuamos conversando até eu ter sono demais para digitar.



Domingo amanheceu chovendo muito. O céu branco de nuvens e muita água caindo. A temperatura também estava consideravelmente mais baixa, de forma que levantei da minha cama já vestindo um moletom. Meu planejamento do dia de hoje era fazer nada e organizar minhas coisas para a semana, mas não demorou muito para alguém me procurar. Dessa vez era o Pedro. Ele queria reunir todo mundo para saírmos porque fazia tempo que ele não nos via. De fato, ele estava sempre bastante ocupado. Eu aceitei porque sou uma pessoa boa. Além disso meu pai mandara minha passagem por e-mail, me lembrando de que viajaria na próxima semana. Oh Droga, eu tinha esquecido.

Aproveitei o tempo que eu tinha para arrumar as coisas que no meu quarto que ficava uma bagunça semana sim e semana também. As roupas sempre ficavam no canto até eu ter vontade de ver o que tinha que ir pra lavar e alguns sapatos também acabavam acumulados ao lado da minha mesa.Eu consigo perder um dia inteiro nessa arrumação mas pouco antes da hora combinada peguei meu guarda chuva e minha jaqueta de couro e fui me encontrar com eles.

Marcaram num bar não muito longe da minha casa então fui a pé, sem problema, apenas talvez a desvantagem de molhar as barras da calça, mas é a vida. Quando cheguei só havia Nicole na mesa me esperando, e algo me disse que não viria mais ninguém.

—Cadê os meninos? - me fiz de burra mesmo assim. Quem sabe não era uma trap afinal.

—Sou só eu. - ela se inclinou muito séria sobre a mesa. - Pedi pro Pedro fazer isso porque eu sabia que você não ia aceitar se fosse só eu.

Rolei os olho e bufei, me soltando sobre o encosto da cadeira e cruzando os braços. Ela estava certa: eu não aceitaria mesmo.

—Não me diga - disse - Você veio aqui insistir sobre aquilo de novo. Por quê você ‘tá insistindo tanto? E o que você disse pro Pedro?

Nicole suspirou.

—Eu não falei nada pra ele. Só disse pra ele marcar com você porque você estava bolada comigo. Mas olha, eu prometo que eu não insisto mais, eu até acredito que você não gosta da Marina - olhei feio mas ela ignorou -  mas você tem que ver essa foto. Eu estava olhando todas, triando aquelas que ficam feias, ou muito repetidas e achei esta aqui muito interessante.

Ela puxou um tablet e depois de alguns toques na tela me estendeu o aparelho. Eu estava olhando para uma foto do Lago dos Patos. Eu estava na escada, concentrada desenhando de costas no canto da imagem. Lá na beira do lago estava Marina olhando na minha direção com o violino sobre o ombro. Ela estava virada para o lago e parecia ter olhado para mim deliberadamente e de uma forma curiosa. Geralmente eu a via tocar de olhos fechados ou olhando num ponto aleatório à frente, mas ali ela não estava fazendo nenhum dos dois.

—Tá, e o que isso quer dizer? - perguntei.

—Nemu, eu observei a cena. A Marina te olhava de tempos em tempos dessa forma e pra mim não parece algo que apenas amigas fariam.

Devolvi o tablet para ela.

—Ainda não me prova nada. Você perdeu.

Nicole levantou as mãos em sinal de rendimento e apertou os lábios.

—’Tá bom. Como eu disse, não vou mais insistir. Mas vou continuar acompanhando essa tour.

Não me demorei muito mais lá, mas quando voltei para casa estava escuro. E mais frio. Ainda não acreditava que Nicole tinha armado essa. A imaginação dela não tem limites.

Chegando em casa fui ao meu quarto e resolvi olhar meus últimos rascunhos que estavam empilhados na lateral da mesa e guardá-los.Basicamente era o que tinha faltado da arrumação de mais cedo. No meio deles, encontrei o casal que eu tinha começado a desenhar. Ainda estava nas formas primárias, cheias de linha e sem nenhum detalhe. Lembrei que tinha deixado por fazer porque percebi que não tinha nenhuma referência a não ser aquelas duas meninas na festa, o que não ajudava nem um pouco porque estava muito escuro.

Resolvi terminar o desenho porque tinha me animado em fazer algo diferente e que de certa forma despertou um fascínio inexplicável em mim. O quão difícil seria buscar material de referência? Tinha medo de digitar “casal lésbico” no Google porque provavelmente apareceriam coisas de pornô escroto que eu definitivamente não queria. Mas resolvi tentar mesmo assim, e tal foi minha surpresa de achar imagens legais e fofas. Fuxicando acabei descobrindo mais material legal que eu imaginava, mas eram coisas não muito conhecidas. Encontrei séries, filmes, animes e mangás (que eu devo dizer que me decepcionaram, fora umas exceções coreanas). Uau, era um mundo inteiro que ficava escondido pelos padrões sociais. Bem, talvez só “escondido”. Não creio que muitas pessoas hétero pesquisassem esse tipo de coisa. Bem, a não ser se for pra mexer com o fetiche delas.

Escolhi algumas referências de posicionamento e estilo e comecei a finalizar o desenho. Passei horas com ele, lapidando os traços, adicionando sombras e notei que quase inconscientemente eu olhava para aquela duas personagens que eu acabara de criar e sorria. Elas tinham rostos felizes e apaixonados e tudo o que eu pensava era como aquilo era lindo e em como as pessoas podiam achar ruim ou nojento.

O mundo estava todo errado. E eu...talvez esse fosse também o meu erro? Ignorar esse caminho, como se essas pessoas não existissem ou estivessem erradas? Será?

De repente um frio se apoderou do meu estômago. Um medo louco, uma dúvida que nunca me permiti ter.

Apoiei os cotovelos na mesa com o rosto nas mãos, o coração acelerado de repente. Um mundo acabara de cair sobre mim.

Puta merda.


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